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Estado de Minas AUDIOVISUAL

Com 'Gaivota', de Tch�khov, Cia. BR116 explora fus�o entre cinema e teatro

Batizada de 'teatrofilme', linguagem une a pot�ncia do texto c�nico com as possibilidades das c�meras; pe�a pode ser vista on-line


17/10/2021 04:00 - atualizado 17/10/2021 07:22

Cena do teatrofilme 'Gaivota', baseado no texto de Tchékhov, da Cia. BR116. Na imagem, Luiza Curvo, que vive Nina, está com os braços abertos. Ela é abraçada por Matheus Campos, que vive Treplev
Segunda experi�ncia no formato teatrofilme da Cia. BR116, "Gaivota" foi gravado ao longo de 20 dias em um s�tio em Itu (SP). Montagem n�o tem roteiro, com encena��o do texto teatral diante das c�meras (foto: fotos: Cia. BR116 / Divulga��o )

H� exatos 125 anos, era encenada pela primeira vez a pe�a “A gaivota”, de Anton Tch�khov (1860-1904). Se hoje ela � incensada como uma das mais importantes do dramaturgo russo, naquela noite de 17 de outubro de 1896 as coisas foram um pouco diferentes. Agressivo e irritado, o p�blico do teatro Alexandrinsky, em S�o Petersburgo, vaiou tanto a encena��o que Tch�khov cogitou desistir de escrever novas pe�as – o que, felizmente, n�o foi o caso.  

Se algum integrante daquela intrat�vel plateia surgisse de repente no s�culo 21, o objeto de seu estranhamento talvez n�o fosse mais a pe�a em si, mas o seu formato. Capitaneada pelo diretor Gabriel Fernandes e pela atriz e tamb�m diretora Bete Coelho, a Cia. BR116 elegeu “A gaivota” para aprofundar sua pesquisa em torno da linguagem batizada de teatrofilme, desenvolvida ao longo da pandemia e que testa os limites de coexist�ncia entre o teatro e o cinema. 

A produ��o, que tem a pr�pria Bete com protagonista, no papel de Ark�dina, estreou no �ltimo dia 12 e segue em temporada on-line at� 21 de novembro, dispon�vel tanto no site da Cia. BR116 e quanto na p�gina no YouTube do grupo.

“Gaivota” – como a trupe optou por grafar, sem o artigo “A” – sucede uma primeira experi�ncia de teatrofilme, com “Medeia”, de Eur�pedes, na recria��o textual da dramaturga Consuelo de Castro, que estreou no in�cio deste ano. Segundo Bete, o teatrofilme surge como um casamento entre o cinema e o teatro, onde n�o h� um roteiro cinematogr�fico, mas sim, a encena��o diante das c�meras do texto como ele foi escrito.

Cena do teatrofilme ''Gaivota'', baseado no texto de Tchékhov, da Cia. BR116. Na imagem, Bete Coelho, como Arkádina, abraça Matheus Campos, que vive Treplev
Bete Coelho (de preto), que vive a protagonista Ark�dina, destaca que tens�o durante a filmagem foi similar � da estreia de uma pe�a no palco, mas sem a presen�a do p�blico

“Assim como em ‘Medeia’, o que a gente faz com o texto s�o apenas alguns cortes, para entrar o cinema. Isso nos possibilita focar num gesto, numa emo��o, num sentido, o que contribui para o entendimento da pr�pria hist�ria”, explica. De resto, todo o processo segue a l�gica do teatro, no sentido dos ensaios, da prepara��o e da encena��o. “Inclusive financeiramente � um or�amento de teatro”, destaca.

Gabriel Fernandes aponta que a produ��o se pauta, tamb�m, pela artificialidade do teatro, sem tentar ou se pretender realista demais. “As flores s�o feitas com jornal, assim como a gaivota. A gente n�o entra numa casa, os c�modos n�o s�o c�modos, s�o cen�rios. Isso � uma coisa que a gente traz do teatro para o cinema”, explica. 

ISOLAMENTO

A grava��o de “Gaivota” ocorreu ao longo de 20 dias, seguindo todos os protocolos de preven��o � COVID-19 em um s�tio em Itu (SP), onde a equipe e o elenco ficaram isolados. A obra conta a hist�ria de um n�cleo familiar e seus agregados, enfatizando o conflito entre Ark�dina, uma c�lebre atriz; seu filho Treplev (Matheus Campos), que pretende ser dramaturgo e escritor; a jovem aspirante a atriz Nina (Luiza Curvo), por quem ele � apaixonado; e o famoso escritor Trig�rin (Fl�vio Rocha), companheiro de Ark�dina.

“Isso de ficarmos isolados em um s�tio acabou contribuindo para o coletivo, para a concentra��o, para o foco no trabalho, que p�de ser assimilado mais rapidamente e com muita intensidade. Foi, tamb�m, o que nos tornou capazes de fazer um filme com or�amento de teatro”, avalia Bete. 

A confian�a adquirida pela trupe com “Medeia” permitiu justamente que Gabriel, que tem forma��o em cinema, explorasse mais os recursos da linguagem audiovisual. Numa compara��o com “Medeia”, Bete destaca que “Gaivota” contou com uma equipe maior e com novas complexidades. O palco virou cen�rio e foi parar no meio do mato, invertendo o pensamento comum de colocar o campo e a natureza, onde transcorre a pe�a, sobre o tablado.



Se a obra de Tch�khov se passa no g�lido campo russo, a adapta��o da Cia. BR116 recebeu contornos brasileiros: � uma pe�a de terreiro e de bando. “Essa � mais uma ‘Gaivota’ entre tantas bem-sucedidas, mas ela est� imbu�da da for�a art�stica brasileira e da beleza genu�na no embate entre o novo e o velho, entre o ser e o n�o ser”, afirma a diretora e atriz.

OUTRA PERSPECTIVA

Dentro dessa experi�ncia do teatrofilme, ela chama a aten��o para a singularidade n�o s� do resultado para os espectadores, mas tamb�m do processo para os atores e para a equipe envolvida – pessoas formadas fundamentalmente no campo das artes c�nicas. “No dia da estreia, est�vamos t�o tensos e nervosos como se fosse teatro mesmo. Eu fiquei com o sentimento de estar atuando, n�o consegui sequer assistir direito, tamanha minha tens�o. Costumamos dizer, no meio teatral, que o segundo dia de uma pe�a � quando d� tudo errado, porque os atores relaxaram depois da estreia, ent�o costuma ser o pior dia da temporada. S� que nesse caso n�o existia essa possibilidade, porque � uma obra audiovisual”, aponta.

Na avalia��o de Gabriel Fernandes, o formato guarda algo de frustra��o. “Os atores v�o l�, ensaiam, trabalham, fazem as cenas e acabou. Fica aquele sentimento de ‘Ah, amanh� n�o tem mais? N�o vamos fazer uma temporada?’ � no reencontro di�rio com o p�blico que o ator tem a possibilidade de mudar alguma coisa, melhorar o personagem, caprichar mais numa cena e, nesse caso, obviamente, isso n�o � poss�vel. Tem essa lacuna, falta esse preenchimento do dia a dia do teatro”, observa.

Bete corrobora esse sentimento: “Sou basicamente uma atriz de teatro, e numa temporada, cada dia voc� transforma alguma coisa, muda sua atua��o de acordo com a plateia, com o tipo de recep��o que a pe�a est� tendo naquele momento. Parece que n�o, mas toda encena��o � sempre bem diferente de um dia para o outro. No cinema, voc� tem que desapegar, tem que entregar, porque depois do produto pronto, n�o h� a possibilidade de mudar mais nada”.

Se a experi�ncia do teatrofilme implica, por um lado, nessa mudan�a de perspectiva por parte de quem est� fazendo, por outro representa a possibilidade de maior alcance, de fazer o trabalho chegar a uma plateia numericamente ilimitada. “O acesso � sua obra � muito interessante, muito democr�tico. O ritual do teatro, o olhar, os sil�ncios, isso tudo � uma for�a impressionante, insubstitu�vel, mas com uma obra audiovisual, no ambiente on-line, voc�, claro, chega a muito mais pessoas”, aponta Bete.

Cena do teatrofilme ''Gaivota'', baseado no texto de Tchékhov, da Cia. BR116. Na imagem, Bete Coelho, como Arkádina, abraça Matheus Campos, que vive Treplev
Bete Coelho (de preto), que vive a protagonista Ark�dina, destaca que tens�o durante a filmagem foi similar � da estreia de uma pe�a no palco, mas sem a presen�a do p�blico

ACESSO AO P�BLICO

Com “Medeia”, a Cia. BR116 fez a experi�ncia de disponibilizar a produ��o em determinados dias e hor�rios, como se fosse mesmo uma pe�a em cartaz. J� “Gaivota” pode ser acessada a qualquer momento pelos canais da trupe. Essa op��o se deve ao arrefecimento da pandemia da COVID-19, o que vem permitindo uma retomada das rotinas que, nem sempre, permitem que o p�blico reserve um hor�rio espec�fico para a frui��o de uma obra.  

Mas para manter o tom de temporada, a Cia. BR116 est� promovendo uma s�rie de encontros e reflex�es em torno dos temas que circundam “Gaivota”, desde elementos t�cnicos para a produ��o do teatrofilme, como fotografia e cenotecnia, at� di�logos e cruzamento do texto de Tch�khov com o contexto social e pol�tico do Brasil atual. Os encontros, que re�nem convidados especiais e artistas parceiros, acontecem atrav�s do perfil da companhia no Instagram e, tamb�m, do seu canal no YouTube.

Segundo Bete, os encontros surgiram como uma contrapartida exigida pela Lei Rouanet, mas foram abra�ados e aperfei�oados pela trupe. “Em vez de fazer uma coisa s� por fazer, o que � comum – muitas vezes as pessoas executam essa contrapartida de maneira frouxa –, resolvemos elaborar e fazer algo legal, que tem a ver com forma��o. Criamos roteiros, pensamos em temas, ent�o � um neg�cio que pode ser estimulante para pessoas interessadas em teatro. Estamos gostando muito desse ciclo, porque estamos tendo um retorno bacana”, diz.

Gabriel acrescenta que tanto os integrantes da Cia. BR116 quanto os convidados e artistas parceiros falam da pr�pria experi�ncia no fazer art�stico, desmontando mitos, dissipando d�vidas e “tirando o glamour ou colocando quando precisa ser colocado”. 

“Dividimos em temas, falando do papel da arte, por exemplo, ou sobre  a fun��o do diretor, o que � fazer teatrofilme, o que � preciso para manter uma companhia, enfim, toda essa estrutura que a gente resolveu dividir com pessoas interessadas, sobretudo com jovens, alunos ligados em teatro”, refor�a Bete.

RAIO X

A Cia. BR116 foi fundada h� 11 anos por Bete Coelho, Gabriel Fernandes e Ricardo Bittencourt, a partir da montagem do espet�culo “O homem da tarja preta”, de Contardo Calligaris (1948-2021). Em seu repert�rio est�o os espet�culos como “O terceiro sinal” (2010), de Otavio Frias Filho, que realizou temporada hist�rica no Teatro Oficina, em 2018, onde recebeu quase 3 mil pessoas; e “M�e coragem” (2019), de Bertolt Brecht, que reuniu cerca de 8,5 mil pessoas em sua temporada no Sesc Pompeia. 

“Gaivota”

De Anton Tch�khov, com a Cia. BR116. Dispon�vel em 4k no site da Cia. BR116 (www.ciabr116.com) ou no YouTube ( www.youtube/ciabr116) com legendas em ingl�s, espanhol e portugu�s descritivo, em tempo integral, at� 21 de novembro.


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