(none) || (none)
UAI
Publicidade

Estado de Minas M�SICA

Otto manda recado para o 'mundo chapa quente' no disco 'Canicule sauvage'

Crise clim�tica, guerra e intoler�ncia beligerante que avan�a no planeta inspiraram o cantor e compositor. Mas ele tem esperan�a: "A alegria pode voltar", diz


02/05/2022 04:00 - atualizado 01/05/2022 22:37

Cantor Otto, sem camisa, olha para a câmera. No peito dele está tatuada a palavra Harmon. Ao fundo vê-se o maquinário de uma indústria
Otto diz que "Canicule sauvage" nasceu da ''solid�o necess�ria'' que vivenciou nos �ltimos tempos. Em 16 de julho, ele canta n'A Aut�ntica, em BH (foto: Rui Mendes/divulga��o )

"Gosto da diversidade, acho que estou transmitindo isso melhor. Talvez tenha dominado um pouco mais o meu caos, que � indom�vel, ou talvez meu caos tenha me dominado, o que tamb�m organiza tudo"

Otto, cantor e compositor



Ao longo de sua trajet�ria, o cantor e compositor pernambucano Otto trouxe � luz �lbuns que eram uma esp�cie de retrato – o registro de si mesmo, do que o cerca e do tempo ao qual pertence. Em seu novo trabalho, “Canicule sauvage” (“Onda de calor selvagem”, em livre tradu��o do franc�s), n�o � diferente. Produzido por Apollo 9 e com participa��es especiais de Tulipa Ruiz, Ana Ca�as, Lirinha e Junio Barreto, o disco aborda o planeta e a humanidade convulsionados, em ebuli��o.

“O nome j� diz tudo, o disco � essa chapa quente que estamos vivendo”, diz Otto, chamando a aten��o tanto para a crise clim�tica quanto para polariza��es, conflitos e guerras no Brasil e no planeta. A casa de shows A Aut�ntica anuncia para 16 de julho o show do pernambucano em BH.

Ao explicar o conceito do trabalho, o compositor evoca “Hemodialisis”, faixa de seu segundo �lbum de est�dio, “Condom black” (2001), cuja letra diz que o sangue est� para o homem assim como os rios est�o para a Terra.

GELEIRAS DERRETIDAS

Otto comp�s a faixa-t�tulo em Marseille, na Fran�a, onde conversava com amigos sobre as mudan�as clim�ticas e suas consequ�ncias, como o derretimento das geleiras. “H� quatro ou cinco anos, os amigos de l� me diziam que a temperatura passaria a subir absurdamente, o que est� acontecendo agora. O disco fala disso, da devasta��o da natureza, e tamb�m do homem e do mercado, que parecem precisar da guerra”, diz.

O Brasil, de uma hora para outra, se tornou belicoso, cindido e com sua democracia deturpada, observa Otto.

“Desde o golpe contra Dilma (Rousseff) venho falando disso, do que est� acontecendo com a gente. Os direitos dos trabalhadores est�o sendo retirados, os povos origin�rios massacrados. Que extrema-direita � essa que chegou ao poder? Sempre lidei com o conservadorismo, sempre respeitei as opini�es diversas, mas o cen�rio atual est� al�m de qualquer compreens�o. Nos tornamos um pa�s abandonado, com um povo abandonado. A gente sente muito mais esse ‘canicule’, ele est� em tudo o que estamos passando”, aponta.

Com o novo �lbum, o cantor e compositor pernambucano diz que pretende traduzir este tempo “triste e opressor”, mas temperando a melancolia com uma dose de esperan�a.

“A gente fica se sentindo muito impotente diante de tudo, mas n�o perde a f� na melhora das coisas”, ressalta. A f� se sustenta, por exemplo, na possibilidade do reencontro com o p�blico. Antes mesmo do lan�amento de “Canicule sauvage”, Otto j� vinha fazendo shows baseados em seu novo repert�rio, planejando a agenda futura. “Est� dando para ver um horizonte; a crise est� a�, mas a alegria pode voltar”, confia.

O processo criativo dele � ininterrupto. Terminado um disco, conta que j� planeja o pr�ximo. “Canicule sauvage” come�ou a ser arquitetado em 2018, um ano depois do lan�amento de “Ottomatopeia”. Em 2019, ele deu in�cio �s grava��es, mas de modo peculiar, apenas registrando ideias dispersas em seu iPhone. A pandemia acabou por moldar a forma de construir o rep�rt�rio, marcada pelo caminho solit�rio.

Durante o isolamento social, Otto come�ou a trabalhar com o software GarageBand, que permite a cria��o musical a partir do celular. Dessa forma, foi estruturando as faixas antes de lev�-las para o produtor Apollo 9.

“Isso foi um pouco determinado pela pandemia, mas tamb�m pela necessidade de fazer meu pr�prio trabalho, de forma artesanal. Est� todo mundo tentando renascer das cinzas. Eu estava um pouco distante da minha pr�pria cria��o. Fui para uma solid�o necess�ria e estou voltando agora”, afirma.

GARAGEBAND 

Na verdade, antes de chegar a Apollo 9, o disco foi totalmente feito a partir do GarageBand – processo um pouco ca�tico, admite. “Registrei umas 250 c�lulas musicais ou mais, at� parei de calcular. Para arrancar 10 disso da� foi um trabalho danado, o processo maior foi no sentido de enxugar. Fazer m�sica no iPhone tem isto: voc� est� ali, a toda hora, ent�o as coisas v�o saindo o tempo inteiro. � o deus digital, como um v�cio, mas acredito que da� vir� uma nova humanidade”, opina.

“Estou com 54 anos, podia ficar longe dessa revolu��o, mas n�o, estou fazendo um disco em casa, com iPhone, barato. Os fonogramas s�o meus”, diz.“Sou como menino de 17 anos no GarageBand, aprendendo, porque � importante voc� estimular o aprendizado de ir para outros lugares”, acrescenta.

Produtor do celebrado �lbum de estreia de Otto, “Samba pra burro” (1998), Apollo 9 era a pessoa que poderia melhor organizar tantas ideias, diz o compositor. Por�m, desta vez o processo foi outro, pois ele j� chegou ao produtor com as c�lulas musicais executadas.

“Sei como Apollo trabalha e precisei do parceiro que pudesse dar um panorama, abrir e limpar as ideias. � uma felicidade trabalhar com ele, porque, al�m de grande produtor, � um cara que toca de tudo, tem todos os sintetizadores poss�veis. ‘Canicule sauvage’ � um trabalho de dupla, de cria��o e produ��o”, diz.

Com efeito, Apollo 9 comparece em todas as faixas. Toca de gaita a minimoog, passando por guitarras, viol�es e baixo. Tamb�m participaram do �lbum Pupillo (Na��o Zumbi) e o violonista Juliano Holanda.

''Estou com 54 anos, podia ficar longe dessa revolu��o, mas n�o, estou fazendo um disco em casa, com iPhone, barato. Os fonogramas s�o meus. Sou como menino de 17 anos no GarageBand, aprendendo, porque � importante voc� estimular o aprendizado de ir para outros lugares%u201D

Otto, cantor e compositor



Se o processo de constru��o das c�lulas musicais se deu por caminhos tortuosos, o mesmo ocorreu com as letras. Otto conta que h� alguns anos n�o se d� ao trabalho de parar, elaborar e escrever o que vai cantar. “Estou nessa do MC de freestyle: criar na hora. Sempre tive isso, coisa que vem do repentista e se relaciona com minha inf�ncia. Em meus �ltimos discos foi assim, n�o paro para pensar na letra, n�o escrevo. Me dei esse direito”, conta.

O pernambucano comenta que no Brasil n�o o associam ao rap, ao contr�rio do que ocorre no exterior. Para ele, o fato de trabalhar sozinho, valendo-se apenas do celular, acentuou sua verve eruptiva. “Dentro de casa, de noite, voc� sozinho com seu iPhone, estudiozinho... Tinha que ser desse jeito. O pensado j� � o executado.”

De acordo com Otto, os artistas que convidou para participar do �lbum s�o “grandes amigos”. Alguns gravaram de forma remota, como Tulipa Ruiz e Nina Miranda. Com Ana Ca�as, ele dividiu o est�dio, para onde levou Junio Barreto, que, no entanto, finalizou sua colabora��o do Recife, para onde voltou depois da temporada em S�o Paulo.

“Sempre busquei outras vozes nos meus discos. Para ‘Canicule sauvage’, chamei essa turma pela admira��o e pela amizade. Amo a voz de Tulipa Ruiz, a queria muito na faixa ‘Tinta’, e ela se colocou ali dentro. A mesma coisa com a Ana Ca�as. A faixa ‘Menino vadio’ tem uma frieza, e ela trouxe calor, uma coisa quente, muito bonita. Lirinha � companheiro da vida toda, tamb�m � do repente, um dos maiores poetas que conhe�o. Gosto de entregar para ele interagir comigo”, detalha. A cantora e atriz baiana Lav�nia Alves, namorada de Otto, tamb�m compareceu no est�dio e participa dos shows.

CAOS

 Outra presen�a marcante � a cantora franco-senegalesa Ana�s Sylla na faixa-t�tulo. “Com esse disco, presto homenagem � Fran�a, pa�s pelo qual sou apaixonado. Depois que voc� conceitua um �lbum, pode caber de tudo nele, misturar a esfera pol�tica com a esfera cultural, falando de outras l�nguas, por exemplo. Gosto da diversidade, acho que estou transmitindo isso melhor. Talvez tenha dominado um pouco mais o meu caos, que � indom�vel, ou talvez meu caos tenha me dominado, o que tamb�m organiza tudo”, garante.

Cantor Otto posa, com a mão na cintura, ao lado de uma fornalha onde se vê fogo
Nublu Records/reprodu��o
“CANICULE SAUVAGE”

• Disco de Otto
• Nublu Records
• 11 faixas
• Dispon�vel nas principais plataformas


receba nossa newsletter

Comece o dia com as not�cias selecionadas pelo nosso editor

Cadastro realizado com sucesso!

*Para comentar, fa�a seu login ou assine

Publicidade

(none) || (none)