L�ri (Simone Spoladore) decide enfrentar os pr�prios traumas e a solid�o (foto: Wladimir Fontes/divulga��o)
Uma livre adapta��o da obra liter�ria de Clarice Lispector para o cinema. Quem poderia imaginar algo t�o ousado na hist�ria da cultura brasileira e transportar a escrita melanc�lica, profunda e reflexiva da escritora para o cinema? A diretora Marcela Lordy n�o s� pensou, como lan�ou o filme “O livro dos prazeres”, baseado no livro hom�nimo da autora.
“Literatura � uma coisa e cinema outra, por isso ter a liberdade de 'brincar' com a simbologia foi um prato cheio, porque gosto do l�dico e do sensorial. Conseguimos trazer a escrita da Clarice para o cinema, que � a��o, usando elementos de outros contos dela, al�m de experi�ncias e refer�ncias pessoais para fazer isso funcionar”, explica Marcela.
"A Simone tem o mist�rio da Clarice, � uma mulher que sabe silenciar. O livro narra a evolu��o de uma pessoa que aprende a olhar as suas feridas. � um filme de cura"
Marcela Lordy, cineasta
L�ri e Ulisses
Na trama, a protagonista L�ri, interpretada por Simone Spoladore, � uma professora do ensino fundamental, nascida em uma fam�lia tradicional do Rio de Janeiro, que tem dificuldade de estabelecer rela��es afetivas. Sua vida muda quando conhece o professor de filosofia Ulisses, papel do ator argentino Javier Drolas, que desperta a necessidade de transforma��o em L�ri e a faz mergulhar em seus traumas e enfrentar a solid�o, at� que esteja curada e pronta para amar.
Na vers�o da diretora, os personagens principais s�o bem menos conservadores que na obra original, publicada em 1969, o que n�o significa uma Clarice retr�grada. No livro, ela inverte a narrativa patriarcal, em que o homem � o grande aventureiro. L�ri � quem toma a iniciativa e decide encontrar o seu eixo antes de se entregar ao amor.
“A escritora bagun�a essa quest�o de g�nero e isso est� retratado tanto no livro quanto no filme”, diz a diretora, que faz quest�o de ressaltar que a produ��o delicada e po�tica vem ao encontro do que as pessoas est�o procurando atualmente: o amor. “Estamos carentes (risos)”.
Ideia de Walter Salles
Da ideia – vinda de Walter Salles, com quem Marcela Lordy trabalhou durante muitos anos – at� o lan�amento do longa foram 12 anos de dedica��o. Os dois primeiros ela correu atr�s da compra da licen�a e dos direitos de Clarice. Mais sete anos se passaram at� a finaliza��o. S� que “O livro dos prazeres” foi afetado pela pandemia e o lan�amento oficial, que seria em 2020, acabou adiado. O que, segundo a diretora, coincidiu com a trama.
“O contexto do filme mudou, mas a nosso favor. L�ri resolveu se isolar para uma jornada de autoconhecimento. Na vida real, passamos por um per�odo de isolamento compuls�rio, mas que nos ensinou a gostar de ser uma companhia na solitude, o que se assemelha com a personagem”, conta.
Figura onipresente no longa, Simone Spoladore traduz as mulheres de Clarice Lispector com sua aura misteriosa e exc�ntrica.
“A Simone tem o mist�rio da Clarice, � uma mulher que sabe silenciar. O livro narra a evolu��o de uma pessoa que aprende a olhar as suas feridas. � um filme de cura, e a Simone tem essa profundidade, que tamb�m combina comigo”, celebra a diretora.
A cr�tica consagrou a produ��o. “O livro dos prazeres” foi exibido em mais de 15 festivais e recebeu premia��es no Bafici (competi��o americana), com o trof�u de Melhor atriz para Simone Spoladore e Men��o honrosa para o longa. No Festival de Cinema de Vit�ria, recebeu o pr�mio de Melhor roteiro, Melhor interpreta��o (Simone Spoladore) e Men��o honrosa para fotografia de Mauro Pinheiro J�nior. Tamb�m foi premiado no Festival do Rio 2021.
Aos 48 anos, Marcela Lordy tem longa trajet�ria profissional dedicada �s artes visuais. Cineasta, roteirista e produtora, “O livro dos prazeres” marca sua estreia na dire��o de longa-metragem de fic��o, mas sua jornada no cinema re�ne “A musa impass�vel” (2010), telefilme produzido para a TV Cultura, “Ouvir o Rio: Uma escultura sonora de Cildo Meireles” (2012), “Ser o que se �” (2018) e “O amor e a peste' (2022), entre outros. � dela a dire��o do longa “Turma da M�nica” (2022), da Globo Filmes.
O trabalho de Marcela cruzou as fronteiras e chamou a aten��o de uma das principais revistas de entretenimento e cultura do mundo, a americana Variety. A publica��o diz que ela faz parte da “nova gera��o de jovens cineastas brasileiras que � um dos fen�menos mais interessantes vistos atualmente no cinema da Am�rica Latina.”
A diretora Marcela Lordy afirma que Clarice Lispector "bagun�a a quest�o de g�nero", aspecto presente no filme e no livro
(foto: Gabriela Bernd/divulga��o)
Cientista surda
Transitar pelas mais diversas m�dias e para diferentes p�blicos continua nos planos de Marcela Lordy, que est� concluindo a produ��o de “O sil�ncio de Aline”, hist�ria de uma cientista surda, comunicativa e barulhenta, vizinha de musicista que precisa de sil�ncio para criar. Leandra Leal est� confirmada como protagonista.
Al�m disso, a diretora trabalha na ideia de uma s�rie que ter� como pano de fundo o kung fu, arte marcial que considera essencial para sua disciplina, equil�brio, mem�ria e concentra��o.
Prepare-se, pois “O livro dos prazeres” � mergulho nas pr�prias feridas como s� Clarice Lispector soube descrever.
“O ensinamento desta obra � que o amor � cada um na sua, do seu jeito e com alguma coisa em comum. A alma � �mpar e n�o g�mea. Esse � o amor poss�vel para Clarice”, finaliza Marcela Lordy.
“O LIVRO DOS PRAZERES”
Brasil, 2020. De Marcela Lordy. Com Simone Spoladore, Javier Drolas e Felipe Rocha. A professora L�ri vive sozinha, dedicada � rotina das aulas e a seu cotidiano mon�tono. Tudo muda quando ela conhece o professor Ulisses e se depara com o amor. Em cartaz na sala 3 do UNA Cine Belas Artes, �s 14h10.
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