Festival de videoarte e cinema experimental Timeline come�a em BH

A partir de 2010, os gregos foram em massa para as ruas de Atenas protestar contra medidas econ�micas tomadas pelo governo no intuito de conter a crise. Entre os manifestantes, um dos maiores destaques foi Loukanikos, um cachorrinho vira-lata que se tornou uma das vozes mais ferozes contra a repress�o policial - sem obedecer o comando de ningu�m, ele latia e avan�ava nos militares. 

Depois de chamar a aten��o da imprensa local e internacional, descobriu-se que Loukanikos era um c�ozinho de rua que j� acompanhava protestos desde 2008, sempre contra a pol�cia.

Em 2018, o carioca Carlos Antonio Mattos, o Tant�o, um m�sico e artista pl�stico brasileiro considerado “perturbado” e de “dif�cil conviv�ncia” pelos amigos, foi convidado para fazer uma exposi��o em Berlim, na Alemanha. Integrar uma mostra internacional poderia ser uma chance de destruir a percep��o de “perturbado” que se criou em torno dele. 

No entanto, as preocupa��es com a organiza��o da exposi��o deixaram evidente que Tant�o, de fato, n�o � psicologicamente est�vel.

As duas hist�rias nada teriam em comum a n�o ser o fato de virarem filmes e se tornarem destaque em seus respectivos programas na s�tima edi��o do Festival de videoarte e cinema experimental de Belo Horizonte (TIMELINE). O evento estar� em cartaz a partir desta quarta-feira (2/11) at� domingo (6/11), no MIS Cine Santa Tereza e no atelier ESPAI, no Bairro Santa Efig�nia.

Foram mais de 500 trabalhos experimentais realizados em diferentes pa�ses - entre filmes e videoinstala��es - inscritos para esta edi��o. Desse total, os curadores S�vio Leite, Joac�lio Batista, Ana Moravi e Sara N�o Tem Nome selecionaram 46 para serem distribu�dos em cinco programas distintos.

“Esse processo de sele��o dos filmes passa por uma via muito metaf�sica. Eu, por exemplo, me pauto pela qualidade de deslumbramento do trabalho, a capacidade que ele tem de impactar. Al�m disso, costumo selecionar aqueles filmes que fazem com que eu sinta vontade de t�-los dirigido”, afirma S�vio Leite, que al�m de curador � o idealizador do festival.

Entre as produ��es que ca�ram no gosto do curador est�o justamente a do militante vira-lata grego - que deu origem ao curta de 2021 “For a while: The story of Loukanikos” (Por enquanto: a hist�ria de Loukanikos, em tradu��o livre), do canadense Pierre Chaumont -, e a de Tant�o - que se tornou o m�dia-metragem “Di�rios de uma paisagem” (2022), dos brasileiros Anne Santos e Gabraz Sanna. 

“‘For a while’ n�o � apenas a hist�ria do cachorro que acompanhou os protestos na Gr�cia. � um filme que foi feito pela perspectiva desse cachorro. E isso foi uma das coisas mais interessantes que o diretor fez”, afirma S�vio Leite.

O curador ainda destaca outros filmes, como "Espasmo" (2022), de Cristina Saraiva, e "Deep Blue" (2020), de Sebastian Wiedemann.

O festival vai contar tamb�m com a proje��o de 10 obras na parede externa do atelier ESPAI. A iniciativa faz parte da sess�o Wildcards, uma esp�cie de complemento curatorial realizado pelos poloneses Wera Morawiec e Robert Sochacki.

“Eles trouxeram essa ideia de sair do espa�o fechado do cinema, a fim de fazer a proje��o em locais urbanos, mais precisamente nos muros”, explica o curador. “Mas � muito dif�cil conseguir autoriza��o para esse tipo de projeto.” 

“N�s temos visto que cresceu o n�mero de proje��es em muros de pr�dios aqui no Brasil, principalmente com o cunho pol�tico. No entanto, isso � feito, na maioria das vezes, sem a autoriza��o dos respons�veis pelo local”, diz ele.

Depois de ter suas atividades suspensas em 2020 em decorr�ncia da pandemia e de ter se adaptado para o formato virtual no ano seguinte, o TIMELINE chega � sua s�tima edi��o com todas as exibi��es realizadas presencialmente e com modifica��es significativas, conforme garante S�vio.

O primeiro processo de mudan�a ocorreu no corpo curatorial. Os curadores das edi��es passadas eram, majoritariamente, homens. 

“A gente acabava fazendo isso sem perceber”, comenta. “Mas, a partir do momento em que percebemos isso, tratamos de mudar. Convidamos a Ana Moravi e a Sara N�o Tem Nome para que tiv�ssemos um corpo curatorial bastante equilibrado.”

O resultado foi um crescimento na participa��o de mulheres e pessoas trans. � o caso de “Ra�zes” (2021), curta do m�sico Edgar e TRANS�LIEN (nome que a multiartista Ana Giselle d� para sua “identidade p�s-humana h�brida de uma alien�gena e transexual, que ressignifica os pressupostos equivocados de abje��o acerca das corporeidades trans”).

Ainda nesta edi��o do TIMELINE haver� homenagem ao centen�rio de nascimento do cineasta lituano Jonas Mekas (1922-2019), um dos mais importantes nomes do cinema experimental.

“Ele nasceu na Litu�nia, mas foi para os EUA com menos de 20 anos, fugindo dos campos de concentra��o nazistas que havia na Uni�o Sovi�tica”, lembra S�vio. “Nos EUA,  ele se estabeleceu no segmento do cinema e come�ou a desenvolver sua pr�pria forma de fazer cinema.”

Para homenagear Mekas, o festival vai exibir o longa de 2000 “As I was moving ahead occasionally I saw brief glimpses of beauty” (Enquanto eu seguia em frente, ocasionalmente vi relances de beleza, em tradu��o livre), que tem quase cinco horas de dura��o. O filme � um document�rio experimental da pr�pria vida do diretor, com cenas gravadas por cerca de 30 anos.

“Como o filme � muito longo, vamos fazer em uma tarde inteira, como se fosse um dos programas”, diz S�vio. “� um trabalho muito bom dele, uma verdadeira aula de cinema”, garante o curador.

Festival de videoarte e cinema experimental de Belo Horizonte. Desta quarta-feira (2/11) a s�bado (5/11), a partir das 18h; domingo (6/11), a partir das 15h. No MIS Cine Santa Tereza (Rua Estrela do Sul, 89, Santa Tereza) e no atelier ESPAI (Rua Tenente Anast�cio de Moura, 683, Santa Efig�nia). Entrada franca. Informa��es e programa��o completa aqui.