Maurice e Katia aparecem lado a lado, com jaqueta azul, observando vulcão

Vida de Maurice e Katia Krafft � contada em document�rio que concorre ao Oscar

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Em 1985, um epis�dio marcou a vida do casal de vulcan�logos Katia e Maurice Krafft.

A erup��o do Nevado del Ruiz, na Col�mbia, deixou mais de 23 mil mortos, numa das maiores trag�dias causadas por vulc�es da hist�ria.

A cidade de Armero foi completamente soterrada e, literalmente, deixou de existir, ap�s a erup��o derreter as geleiras da montanha e gerar os chamados lahars - uma avalanche de lama, terra e detritos vulc�nicos.

Na �poca, especialistas em vulc�es tentaram alertar autoridades sobre riscos da iminente erup��o e da necessidade de evacuar cidades, mas n�o foram ouvidos.

Maurice e Katia, que j� haviam ganhado fama no mundo por "ca�arem" e registrarem vulc�es em todos os continentes, fizeram coro ao aviso. Mas tamb�m n�o foi suficiente.

"Ficamos com vergonha de nos considerarmos vulcan�logos", disse Katia em entrevistas na �poca.

"Meu sonho � que vulc�es deixem de matar", afirmou Maurice.

Abalado pela trag�dia, o casal decidiu que precisava fazer mais do que j� faziam — ou seja, gravar de perto atividades vulc�nicas amea�adoras para, assim, demonstrar o poder destrutivo e convencer autoridades sobre os riscos.

Em junho de 1991, eles viajaram ao Jap�o para registrar a for�a da erup��o do Monte Unzen.

Nas �ltimas imagens em que aparecem com vida, Katia e Maurice olham para a montanha, ao lado da c�mera. Eles morreram minutos depois, ele aos 45 anos, ela aos 49. Os corpos foram encontrados lado a lado.

"Todos n�s sab�amos que eles iam morrer em um vulc�o, e eles mesmo sabiam", disse � BBC News Brasil a brasileira Rosaly Lopes, astr�noma e vulcan�loga da Nasa que conheceu o casal em palestras e eventos. Os dois, conta Lopes, eram tratados como estrelas no mundo da vulcanologia.

As impressionantes imagens que os Krafft registraram ao longo de d�cadas de trabalho est�o no document�rio Vulc�es: A Trag�dia de Katia e Maurice Krafft, que concorre ao Oscar da categoria. No Brasil, � poss�vel assistir � produ��o dirigida por Sara Dosa pelo servi�o de streaming Disney+.


Katia Krafft aparece com roupa parecida com astronauta, na frente de lava vulcânica vermelha

Casal recolhia amostras de material vulc�nico para pesquisas

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Amor pelo fogo

Foi em 1966, quando frequentavam a Universidade de Estrasburgo, na Fran�a, que Katia e Maurice se conheceram. Ela, geoqu�mica; ele, ge�logo. Mas logo descobriram um interesse em comum: vulc�es.

"Come�amos na vulcanologia porque est�vamos decepcionados com a humanidade. E, como um vulc�o � maior do que os homens, sentimos que era o que precis�vamos. Algo al�m da compreens�o humana", disse Maurice em uma entrevista mostrada no document�rio. Ele era considerado mais "midi�tico" do que Katia.

Era um per�odo do p�s-guerra, com grande avan�o cient�fico. Em 1967, as placas tect�nicas foram descobertas, permitindo entender intrigantes mist�rios da natureza, como os terremotos e a forma��o de vulc�es.

Na Isl�ndia, em 1968, os Kraffts tiveram a primeira experi�ncia juntos na explora��o de vulc�es. A partir dali, come�aram a registrar erup��es em v�deo e fotos — o que acabaria se tornando uma fonte de renda do casal, que passou a vida viajando.

"Quando voc� v� uma erup��o, n�o consegue mais viver sem, porque � t�o grandiosa, t�o forte, que temos um sentimento de insignific�ncia", explicava Katia. Dois anos depois, se casaram e escolheram n�o ter filhos.

"Eles n�o poderiam fazer o que fizeram se n�o fosse o outro. Eles tinham um relacionamento entre os dois, e entre eles e os vulc�es", diz a vulcan�loga Rosaly Lopes.


Katia Krafft com roupa para explorar vulcões

Filme mostra a paix�o de Katia Krafft pelos vulc�es

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Al�m da venda de parte do material audiovisual, Katia e Maurice filmavam todas as expedi��es com a inten��o de rever as erup��es e estud�-las. E passaram a querer chegar cada vez mais perto.

Para Rosaly Lopes, o casal, mesmo que n�o se destacasse pela produ��o acad�mica em si, deixou um grande legado cient�fico e para a humanidade.

As filmagens que mostram lava, explos�es e fluxos pirocl�sticos (a mistura de g�s, mat�ria vulc�nica, cinzas e fragmentos de rocha expelida nas erup��es) rodaram o mundo e foram usadas por pesquisadores para entender e criar modelos sobre o comportamento dos vulc�es.

Os dois tamb�m traziam material "jovem" expelido nas erup��es para estudos em laborat�rios geof�sicos.

"Mas acho que o legado principal � de educa��o, de ensinar que vulc�es s�o muito bonitos, por�m perigosos. E tamb�m que, �s vezes, voc� pode ir a um vulc�o, perto da lava, sem correr muito risco", diz Lopes, que escreveu um livro sobre as possibilidades de se fazer turismo em �reas com atividade vulc�nica.


Maurice e Katia sorrindo numa mesa de escritório

Imagens de arquivo s�o mostradas no document�rio "Fire of Love"

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'Isso vai me matar, mas n�o me importo'

Katia e Maurice adotaram duas classifica��es para vulc�es.

Os "vermelhos" seriam aqueles em que h� os "rios" de lava e sem fortes explos�es. Eram esses, menos perigosos, que os Krafft se dedicaram inicialmente a explorar.

J� os "cinzas" eram os explosivos, que acumulam press�o e calor at� sua libera��o catacl�smica. Eram os chamados de "assassinos", menos conhecidos e mais dif�ceis de acessar.

Ap�s a erup��o do vulc�o "cinza" do Monte Santa Helena, nos Estados Unidos, que deixou 57 mortos em 1980, o casal decidiu mudar o foco de suas expedi��es para esses mais arriscados.

Elas foram atr�s de erup��es no Alasca (Estados Unidos), Indon�sia e Col�mbia, onde registram o rastro de destrui��o da trag�dia em Armero.

Em junho 1991, eles receberam a informa��o de que o monte Unzen, no Jap�o, entraria em erup��o. Eles viajaram ao pa�s e foram ao encontro de mais uma miss�o - sua �ltima.

Na ocasi�o, Katia e Maurice decidiram se manter a uma dist�ncia que acreditavam ser segura, com outros cientistas, jornalistas e bombeiros. Mas um fluxo pirocl�stico muito mais forte do que o esperado levou � morte de 43 pessoas, incluindo o casal.

As marcas no solo depois da trag�dia indicaram que Katia e Maurice estavam perto um do outro.

Nas imagens mostradas no document�rio, h� a men��o a um texto em que Maurice escreveu que preferia uma "vida intensa e curta que longa e mon�tona", justificando sua ca�a aos vulc�es. E Katia, em certo ponto, disse: "Se ele morrer, prefiro ir com ele".