Atriz Rebecca Marder está de frente, ensaiando, e tem mulher segurando folhas de papel à sua frente, numa cena do filme A garota radiante

Rebecca Marder � Irene, jovem que se dedica arduamente �s aulas de teatro, enquanto a persegui��o aos judeus vai se alastrando na Fran�a

Film Movement


Em sua estreia na dire��o, a experiente atriz Sandrine Kiberlain opta por um olhar simples e agudo para abordar tema complexo e exaustivamente retratado no cinema: a opress�o nazista na Fran�a durante a ocupa��o dos anos 1940.

Assim, comp�e em “A garota radiante”, lan�ado na Semana da Cr�tica de Cannes do ano passado, um roteiro que sintetiza a explos�o da juventude numa �nica personagem, Irene – vivida por Rebecca Marder, revela��o da Com�die-Fran�aise –, dispensando ambienta��es muito marcadas de �poca, como bandeiras nazistas ou soldados pelas ruas.
 
O minimalismo de cen�rios e figurinos, reduzidos ao essencial na caracteriza��o de personagens vivendo em 1942, tem a vantagem de concentrar a energia da hist�ria naquilo que a diretora considera essencial: os sentimentos e planos de uma jovem que sonha em se tornar atriz e emprega todas as suas energias no preparo para o dif�cil exame de admiss�o no conservat�rio.

Iniciando o filme com um ensaio da pe�a do teste, “L'�preuve”, de Pierre de Marivaux, a diretora desencadeia um processo que mistura �pocas na pr�pria estrutura da hist�ria.

Can��es de Tom Waits e pe�a do s�culo 18

Recorre assim ao texto de Marivaux, de 1740, incorporado ao cotidiano dos aspirantes a atores que revisitam as paix�es do s�culo 18 pela �tica de um in�cio de s�culo 20 abalado por restri��es fascistas. Ao mesmo tempo, Sandrine Kiberlain permite-se a liberdade de inserir, na trilha sonora, can��es contempor�neas da banda inglesa Metronomy e do cantor norte-americano Tom Waits.

Essa dilui��o de uma temporalidade estrita permite ao filme viajar com mais fluidez na sensibilidade das plateias atuais.

Isso possibilita identificar com mais clareza o fen�meno da intoler�ncia e da opress�o contra os judeus que se infiltra venenosamente na sociedade francesa de 1942, subvertendo o cotidiano de uma fam�lia at� ali completamente normal e assimilada � sociedade.

Humaniza-se, dessa forma, o n�cleo familiar de Irene, composto pelo pai contador, Andr�, vivido por Andr� Marcon, o irm�o m�sico Igor, papel de Anthony Bajon, e a av� Marceline, encarnada por Fran�oise Widhoff, deixando notar os sinais de que a viol�ncia pr�-nazista est� come�ando a cerc�-los, o que imp�e � fam�lia o carimbo em vermelho da palavra judeu em seus documentos e a proibi��o de ter r�dios, telefones e at� bicicletas em casa, �bvia met�fora ao sufocamento de suas vozes.
 

Esse estilo de narrativa leva a que o filme se situe, em boa parte do tempo, em momentos que remetem aos relacionamentos afetivos, seja dentro da fam�lia, seja fora dela, com os flutuantes interesses amorosos de Irene, oscilando entre Gilbert, papel de Jean Chevalier, e Jacques, vivido por Cyril Metzger, traduzindo a normal volatilidade emocional de uma garota de 19 anos.
 
Essa op��o revela a inten��o maior de apegar-se �quilo que constitui uma fam�lia comum, uma jovem como qualquer outra, seus amigos e amores, permitindo ao espectador antecipar a trag�dia daquilo que se perder�, com amea�as cada dia menos sutis e mais pr�ximas.

Na captura precisa dessa atmosfera, a diretora de primeira viagem demonstra seguran�a admir�vel, produzindo empatia num relato que se inspira em suas origens familiares, mas aspira muito mais a se tornar universal do que autobiogr�fico, mostrando-se capaz de referir-se �s intoler�ncias que ressurgem nos dias atuais.

“A GAROTA RADIANTE”

• Fran�a, 2021. Dire��o de Sandrine Kiberlain.
• Com Rebecca Marder, Andr� Marcon e Anthony Bajon.
• Em cartaz no Centro Cultural Unimed-BH, �s 18h10.