Colet�nea de cr�nicas comemora o centen�rio de Pl�nio Barreto
'Os causos do Pl�nio' ser� lan�ado nesta ter�a (9/5), em BH. Jornalista do Estado de Minas deixou relatos importantes sobre o futebol e a hist�ria da capital
Pl�nio Barreto na reda��o do Estado de Minas. Bem-humorado e fiel aos fatos, ele se destacou na cr�nica esportiva e era 'acervo' das mem�rias de BH
Juarez Rodrigues/EM/D.A Press/28/5/09
'O futebol persiste em estar no meu cotidiano como visgo nos p�s de quem pisa as am�ndoas do cacau. Eu gosto. Uma vez metido no chamado 'esporte bret�o', dif�cil dele se livrar'
Pl�nio Barreto, na cr�nica 'Lembran�as de um av�'
Pl�nio Barreto era um inspirado cronista do Estado de Minas. Quer dizer, foi o nosso contador de causos neste caderno EM Cultura, aos s�bados. Tinha o dom de gostar da vida e de seus personagens – n�o deixou que o baixo astral o contaminasse nem mesmo durante a luta contra o c�ncer �sseo, que o levou em outubro de 2015, aos 93 anos.
Bom de prosa, aos poucos foi se despedindo do leitor em nossa p�gina 2. Naqueles �ltimos textos, falava de delicadezas, como as min�sculas flores do limoeiro. “A vida � para ser vivida – e n�o lamentada”, avisou.
Com v�rias cr�nicas publicadas no EM, o livro “Os causos do Pl�nio” (N�mero 1 Editora) ser� lan�ado nesta ter�a-feira (9/5), a partir das 18h, no Bar Monumental, no Bairro Cidade Nova. O volume foi organizado por Luiz Barreto e Rosanina Barreto Corgozinho, filhos de Barreto.
A jovem BH
Pl�nio conheceu bem a jovem Belo Horizonte. Dela, sua prodigiosa mem�ria guardou muitos causos. O jornalista estreou no jornal Tribuna de Minas, nos anos 1950, bateu ponto na �ltima Hora, no Rio de Janeiro, voltou para BH e fez parte das reda��es do Estado de Minas, Di�rio da Tarde, R�dio Guarani, TV Itacolomi e R�dio Inconfid�ncia.
Rep�rter e cronista esportivo, escreveu os livros “Futebol no embalo da nostalgia” (1975), “Lagoinha meu amor” (1995) e “De Palestra a Cruzeiro” (2000), com o filho Luiz Barreto, reeditado em 2022. Era cruzeirense apaixonado.
No pref�cio da colet�nea, o jornalista Nilseu Martins relembra as “tert�lias nas manh�s de domingo no Tip Top”, tradicional bar de BH, nas quais amigos, por anos a fio, se deliciaram com os causos de Pl�nio.
O repert�rio ali sempre foi variado. Da “briga memor�vel” num jogo de futebol entre os times do Vila Nova e do Sete de Setembro, no Horto, � festa de carnaval no Bairro de Santa Tereza, Nilseu ressalta o compromisso do cronista com a verdade. S�o causos que ficaram, literalmente, na hist�ria.
“Lembrar-se dos traumas e vertigens da grande metamorfose da cidade em que nasceu e que tanto amou � privil�gio para poucos”, comenta Nilseu.
As p�ginas de “Os causos do Pl�nio” s�o como um encontro com o veterano jornalista l� no Tip Top. Logo no in�cio, vem a deliciosa narra��o do dia em que o mataram – oficialmente – nos alto-falantes do Mineir�o e do Independ�ncia. Aconteceu durante os jogos de 17 de mar�o de 1991. Teve at� um minuto de sil�ncio.
Em casa, “curtindo as dores de duas costelas fraturadas em acidente sem outras maiores consequ�ncias”, o “falecido” atendia telefonemas de amigos e parentes, tranquilizando-os. “� confortador estar vivo para agradecer, de cora��o, a tantos quantos que se sentiram profundamente abalados pelo meu 'empacotamento'”, escreve Pl�nio, com um dedo de chiste, em “Quando eu morri”.
'Antes de encerrar, n�o poderia deixar de tornar p�blicas as minhas desculpas a quantos tenham tomado conhecimento de minha 'morte' e, posteriormente, me reconhecendo na rua, pelo susto que, involuntariamente, tenha lhes causado'
Pl�nio Barreto, na cr�nica 'Quando eu morri'
Mas gl�ria suprema, mesmo, foi saber pelo amigo Adelchi Ziller que a torcida do Atl�tico n�o vaiara seu nome azul-celeste. “Muito contrita, fizera um minuto de sil�ncio em homenagem �quele que, ela sabia, at� depois de morto continuaria cruzeirense”.
Nesta cr�nica, Pl�nio brinca com a morte, sugerindo a trilha sonora do an�ncio de seu “empacotamento”: a “Marcha f�nebre”, de Chopin.
Cronista mostra onde est� alojada a bala do tiro que levou aos 10 anos, em BH, durante conflito na Revolu��o de 32
Marcelo Sant'Anna/EM/D.A Press/28/2/08
Tiro na perna
Al�m de contador de causos, ele foi um personagem e tanto. Personagem hist�rico, ali�s. Aos 10 anos, brincava na rua em Belo Horizonte quando levou um tiro na perna, durante a Revolu��o de 1932. A bala perdida do embate entre getulistas e advers�rios ficou ali, alojada para sempre.
Anos depois, volta e meia Pl�nio exibia a perna em reportagens sobre o fracassado movimento paulista para derrubar Get�lio Vargas. Naquele momento crucial, o presidente ga�cho contara com o apoio de Oleg�rio Maciel, que governava Minas e o ajudara a chegar ao Pal�cio do Catete em 1930. Por isso BH foi palco da efervesc�ncia pol�tica nacional.
Esta colet�nea traz p�ginas e p�ginas com as mem�rias futebol�sticas de Pl�nio Barreto, nome de ponta da cr�nica esportiva mineira. Uma delas revela seu espanto ao saber, via recorte do di�rio oficial Minas Gerais, que Jules Rimet – o homem que deu nome � cobi�ada ta�a da Copa do Mundo – veio a Belo Horizonte em agosto de 1930.
Recepcionado no bar do Grande Hotel, onde hoje fica o Edif�cio Maletta, n�o � que o presidente da Fifa, segundo Pl�nio, “exagerou na champanhota”? E mais: fez gafe. Assistira � partida entre Atl�tico e Fluminense e considerou “justa” a vit�ria do escrete mineiro por 2 x 1, quando, na verdade, o jogo terminou em 1x1.
� que o primeiro gol do Galo fora anulado, informa o jornalista. O cronista Pl�nio faz gra�a com a declara��o de Rimet de que, pela primeira vez, assistira (em BH!) a uma partida noturna � luz de refletores. “Ser� que a Europa – Fran�a, Inglaterra, It�lia, Portugal – �quela �poca, 1930, n�o possu�a ilumina��o em seus est�dios?”, repara.
Hist�ria do coche da BH do in�cio do s�culo 20 ganhou cr�nica de Plinio
Marcos Silveira/divulga��o
T�lburi hist�rico
N�o s� de seu querido futebol vivia o cronista. Ele relembra bate-papos � porta do Caf� Nice, na Pra�a Sete; o reencontro com a turma no Mercado Central; a descoberta de que o pai do amigo H�lio Volpini, o italiano Eug�nio, conduzia um t�lburi na BH dos anos 1910.
Orgulhoso de ser pioneiro do transporte na ent�o jovem capital mineira, l� est� o imigrante de Arezzo na foto descrita pelo cronista, conduzindo elegante fam�lia inglesa no coche com dois cavalos, durante o carnaval na Pra�a Sete.
Do t�lburi, Eug�nio passou para o Studbaker na era dos “carros de aluguel”. E, assim, Pl�nio nos conta a trajet�ria daquele t�lburi guardado no terreiro de H�lio Volpini por anos, que hoje faz parte do acervo do Museu Hist�rico Ab�lio Barreto.
'Olhava aquela placa, embevecido. Podem n�o acreditar, mas senti �midos meus olhos j� cansados. Acaso passasse algu�m naquele momento e flagrasse o enlevo que me postara a olhar, certamente iria julgar-me, na melhor das hip�teses, um bobalh�o. Dedu��o at� certo ponto l�gica para quem desconhecia a raz�o de ser do sorriso endere�ado �quele peda�o de lata, ou seja, de que metal for, com aquele nome t�o simples: Maria de Mello'
Pl�nio Barreto, na cr�nica 'Na esquina de volta aos anos 30'
A Lagoinha, onde o autor foi criado, est� presente em v�rias cr�nicas. Bairro dos times Fluminense e Guarani (“o alvinegro ind�gena”), cujas sedes sociais abrigavam festas inesquec�veis. Ao se deparar com a placa da Rua Maria de Mello, Pl�nio nos apresenta � amiga de sua m�e, tamb�m conhecida como dona Quinha. Vi�va muito jovem, Maria lutou bravamente para criar os filhos.
Na Rua Itapecerica, o Bar do Papa fecha as portas para a passagem do cortejo silencioso que acompanha o corpo de Jesus, durante a gelada Semana Santa. Ver�nica, inteiramente vestida de negro, � Anita, a prima do cronista. “Isto foi nos tempos em que fazia frio no m�s de abril. Coisa dos anos 30”, brinca ele.
Testemunha ocular do Estado Novo
Por falar em anos 30, Pl�nio relembra o dia em que o Estado Novo foi implantado no Brasil. Funcion�rio da Charutaria Flor de Minas, pertencente a seu cunhado espanhol, o adolescente subia a Rua da Bahia para levar uma caixa do famoso charuto Havana � casa de Domingos Sabino, pai de Gerson, jogador de basquetebol, e Fernando, futuro autor de “O encontro marcado”, nos arredores da Pra�a da Liberdade.
Ao notar o movimento de tropas no Pal�cio da Liberdade (que n�o tinha grades), o curioso Pl�nio se juntou ao corre-corre. “Misturei-me � turba, quase fui preso”, relembra. Ao voltar � charutaria, trouxe a novidade e nem foi repreendido pela demora. Come�ava ali a ditadura Vargas, devidamente apoiada pelo governador mineiro Benedito Valadares. Nascia ali, quem sabe, o rep�rter Pl�nio Barreto.
'Garimpo' nas ruas
Muitas d�cadas depois, ao se aposentar da lida na imprensa, o cronista planejou seu “�cio produtivo”. Passa, ent�o, a garimpar causos em bancos de pra�a, em bate-papos nos �nibus e no metr�, nas filas de banco. N�o � exagero dizer: narrador da trajet�ria de BH, ele faz parte da hist�ria desta cidade.
Quando deixou de publicar cr�nicas em jornais, Carlos Drummond de Andrade se despediu do leitor explicando que n�o se exige do cronista informa��o ou coment�rio precisos. “O que lhe pedimos � uma esp�cie de loucura mansa, que desenvolva determinado ponto de vista n�o ortodoxo e n�o trivial e desperte em n�s a inclina��o para o jogo da fantasia, o absurdo e a vadia��o de esp�rito.”
Neste jogo da fantasia, foram muitos os gols de placa de Pl�nio Barreto.
Foto de Pl�nio Barreto na capa do livro Os causos do Pl�nio
Reprodu��o
“OS CAUSOS DO PL�NIO”
• Colet�nea de cr�nicas de Pl�nio Barrreto
• Org: Luiz Barreto e Rosanina Barreto Corgozinho
• N�mero 1 Editora
• 326 p�ginas
• Lan�amento nesta ter�a-feira (9/5), a partir das 18h, no Bar Monumental (Rua Coronel Pedro Paulo Penido, 495, Cidade Nova)
*Para comentar, fa�a seu login ou assine