Rita Lee defendeu, nas letras e nas atitudes, a liberdade feminina para criar, ousar, amar, transar, e n�o se levar a s�rio
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Face angelical e voz suave das loucuras lis�rgicas que aprontava com os irm�os Arnaldo Baptista e S�rgio Dias, Rita Lee n�o sumiu ap�s a sa�da tempestuosa de Os Mutantes. Muito pelo contr�rio: assumiu outra banda, Tutti Frutti, fez quatro discos (“Atr�s do porto tem uma cidade”, “Entradas e bandeiras”, “Babil�nia” e, especialmente, “Fruto proibido”) que se tornaram marcos do rock nacional nos anos 1970. As guitarras cruas e furiosas de Lu�s S�rgio Carlini, � la Rolling Stones, e o baixo pulsante de Lee Marcucci emolduravam as letras cada vez mais inspiradas da cantora que consolidava, assim, a vertente roqueira explicitada em “Agora s� falta voc�”, “Esse tal de Roque Enrow” e na balada “Ovelha negra”, hino de uma gera��o.
Sem medo de repres�lias, Rita Lee fez da m�sica o exerc�cio da paix�o e da liberdade. Ergueu trincheira particular contra o autoritarismo, o machismo e a caretice vigentes nos �ltimos anos da ditadura militar. Qual compositora teria coragem de submeter � censura versos como “Me deixa de quatro no ato”? Ela teve. A mesma Rita que, depois de todas as viagens alucin�genas dos anos 1960 e 1970, anteciparia o lema de um novo come�o de era ao bradar: “Quero mais sa�de”. E que falou sobre menstrua��o (“Mulher � bicho esquisito, todo m�s sangra”) no tema de abertura (“Cor de rosa choque”) de um programa matinal (“TV Mulher”) na tev� aberta. Por isso, a defini��o de “rainha do rock” reduz as m�ltiplas dimens�es de Rita Lee.
Ela exerceu muito mais do que a soberania de um g�nero musical. Rita foi rock, pop, bossa, bolero, chanson fran�aise, psicodelia, farra e fanfarra, cinema e novela, garota moleca e vov� sapeca, Jagger & Richards, Gil & Caetano, Carmen Miranda & Leila Diniz. Com talento inigual�vel para imitar vozes e criar personagens, Rita era capaz de interpretar todas as mulheres do mundo.
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Nas �ltimas d�cadas, os sucessos vieram em menor quantidade, mas os projetos de revis�o da carreira – “Bossa’n’roll”, “Ac�stico MTV”, remixes e celebra��es – ajudaram a consolidar a cantora como refer�ncia obrigat�ria das novas gera��es. Mesmo afastada dos palcos at� a morte em maio de 2023, continuou a desafinar o coro dos contentes com observa��es perspicazes e ir�nicas em programas de tev� e nos livros que lan�ou. Foi vista, lida e relida. Virou meme e musa. Tudo porque, como escreveu em “Luz del fuego”, Rita representou a loucura e tudo mais o que quis. Cheia de gra�a, fazendo um monte de gente feliz, amanh� e sempre.
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