Livro resgata a import�ncia de Mozart Secundino, pioneiro do choro em BH
Fiel � tradi��o do viol�o de seis cordas, ele foi o elo entre a velha guarda e jovens m�sicos da capital. Lan�amento ser� neste domingo (21/5)
O m�sico Mozart Secundino � protagonista da hist�ria de Belo Horizonte, onde manteve a tradi��o do choro
Beto Magalh�es/EM/D.A Press/4/10/09
“Ele bebeu da juventude. Tanto � que morreu menino” – as palavras do bandolinista, violonista e compositor Marcos Frederico se referem a Mozart Secundino (1923-2015) e aludem ao fato de que o m�sico, ao longo de uma trajet�ria de mais de 60 anos, se tornou, para diferente gera��es, a refer�ncia do viol�o de seis cordas no circuito do choro em Belo Horizonte.
O depoimento de Frederico est� no livro “O choro em contexto: nas baixarias de Mozart Secundino”, do m�sico, professor e etnomusic�logo Humberto Junqueira, que ser� lan�ado neste domingo (21/5), a partir das 10h30, no bar O Muringueiro, no Bairro da Gra�a – reduto de chor�es da cidade.
Um dos fundadores do Clube do Choro de Belo Horizonte, em 1977, Mozart Secundino era um baluarte da velha guarda, mas transitava com desenvoltura entre a juventude interessada no g�nero que tem em Pixinguinha, Jacob do Bandolim e Waldir Azevedo alguns de seus principais expoentes. Esse tr�nsito fluido, ali�s, garantiu ao m�sico o amplo – e tardio – reconhecimento p�blico a partir do final dos anos 2000, observa Junqueira.
O autor de “O choro em contexto” diz que a conviv�ncia com Secundino o motivou a escrever o livro, que, na verdade, � desdobramento de sua tese de doutorado realizada com dupla tutela, da �cole des Hautes �tudes en Sciences Sociales (Fran�a) e da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), e defendida em dezembro de 2020.
Livro e tese do m�sico e pesquisador Humberto Junqueira nasceram de sua estreita rela��o com Mozart Secundino
Beth Freitas/divulga��o
Biografia, etnografia e cartografia
Junqueira destaca que se trata de um misto de biografia de Mozart Secundino, do relato pessoal de sua rela��o com ele, da cartografia do choro em Belo Horizonte e do estudo da t�cnica do viol�o de seis cordas – sem carregar, no entanto, o comprometimento estrito com nenhuma dessas frentes.
“N�o � a etnografia cl�ssica de uma cultura, de um povo ou de um territ�rio, mas tem perspectiva etnogr�fica. Tamb�m n�o � bem uma biografia, mas tem dados biogr�ficos. N�o pretende destrinchar uma t�cnica violon�stica, mas traz muitas informa��es sobre o choro, uma gram�tica da t�cnica de Mozart Secundino, bem como hist�rico bastante aprofundado sobre o g�nero”, aponta.
Nesse lugar de converg�ncia, Junqueira tentou fazer abordagem do choro n�o de modo abstrato ou gen�rico, mas vinculada � figura de Mozart Secundino e suas pr�ticas sociomusicais. “A m�sica n�o aparece como algo meramente te�rico, ela aparece concretamente no fazer, de uma forma mais f�cil de ser entendida”, destaca.
Al�m da proximidade com Secundino, ele diz que o elegeu como tema de sua tese – iniciada no ano da morte do m�sico – pela singularidade de sua trajet�ria, por ser o guardi�o da tradi��o do choro e por sua import�ncia para a cena local.
“Recentemente, participei de uma roda com m�sicos jovens, que n�o chegaram a tocar com Mozart, mas que o conhecem e o reverenciam, porque ele teve um papel importante na cena de Belo Horizonte e de Minas Gerais”, diz.
Mozart Secundino s� alcan�ou notoriedade depois dos 80 anos, inclusive na esfera pol�tica, ao ser agraciado com honrarias pela C�mara Municipal de Belo Horizonte. O autor acredita que essa popularidade foi conquistada em fun��o das costuras que o m�sico naturalmente fazia. “Era um personagem que circulava muito entre a juventude; um anci�o, um s�bio que transitava por esses ambientes compartilhando sua experi�ncia”, pontua.
'Se voc� conversa com m�sicos do choro na faixa entre 30 e 70 anos, todos v�o falar que viram Mozart tocar, e isso serviu de est�mulo para a carreira. Ele contava hist�rias da forma��o de Belo Horizonte, da constru��o do aeroporto, do bonde, dos edif�cios hist�ricos'
Humberto Junqueira, etnomusic�logo
Mem�rias de inf�ncia
Junqueira conheceu o trabalho do chor�o cerca de uma d�cada antes de ele se tornar figurinha carimbada no circuito musical. Quando tinha 10 ou 11 anos, no in�cio da d�cada de 1990, era levado pela av� paterna a rodas de choro e bailes de gafieira em que Mozart Secundino tocava. Seus familiares j� conheciam o veterano m�sico, porque ele se apresentava habitualmente no restaurante no qual a irm� de sua av� trabalhava.
“� uma lembran�a que tenho da pr�-adolesc�ncia. Depois, quando tive contato mais pessoal com ele, j� estava iniciando minha trajet�ria musical. A� j� foi uma conviv�ncia muito pr�xima mesmo, que durou de 2003 at� 2015, quando ele faleceu, com 92 anos.”
Quando come�ou a ser chamado frequentemente para se apresentar em eventos p�blicos, Secundino resolveu criar o grupo Quem N�o Chora N�o Mama, o qual Humberto Junqueira foi convidado a integrar.
Esse contato estreito – musical e pessoal – serviu como uma luva ao prop�sito de realizar um trabalho que estabelecesse di�logo org�nico entre a m�sica e a etnografia.
“A tutela francesa da tese de doutorado apontava para o caminho dos estudos avan�ados em ci�ncias sociais, ent�o ocupo um lugar tamb�m como ator nessa pesquisa, falando da minha experi�ncia. N�o tento ficar isento, como mero observador, eu participo das cenas. Quando relato fatos, estou presente ali tamb�m, com o meu ponto de vista”, ressalta Junqueira.
Quando fala de Mozart Secundino como guardi�o da tradi��o, ele se refere ao fato de o m�sico ter se mantido fiel a um estilo violon�stico que foi caindo em desuso. O viol�o de sete cordas se tornou bastante difundido no choro, ocupando, a partir de meados do s�culo passado, o lugar que era cativo do viol�o de seis cordas, aponta.
Humberto Junqueira afirma que Mozart Secundino foi o mantenedor de uma pr�tica que foi se transformando. “� como se ele fosse um elo entre o passado e o presente, por essa fidelidade a uma corrente violon�stica”. O tema � aprofundado no livro, que aborda o lugar do viol�o de seis cordas no choro e nos chamados conjuntos regionais, a partir da virada do s�culo 19 para o s�culo 20.
“Trato de como a m�sica era feita e como foi a evolu��o dos conjuntos regionais, com o viol�o de seis cordas, at� seu apogeu, na Era do R�dio”, destaca.
Mozart Secundino em roda de choro na capital mineira
Facebook/reprodu��o
Hist�ria de BH
A prop�sito, o autor chama a aten��o para o fato de que a vida de Mozart Secundino – que completaria 100 anos em 2023 – estabelece um paralelo n�o apenas com a hist�ria do choro em Belo Horizonte, mas com a pr�pria cidade. O m�sico nasceu em um distrito de Betim, mas se mudou, com pouco mais de 10 anos, para a capital que ainda engatinhava.
“Se voc� conversa com m�sicos do choro na faixa entre 30 e 70 anos, todos v�o falar que viram Mozart tocar, e isso serviu de est�mulo para a carreira. Ele contava hist�rias da forma��o de Belo Horizonte, da constru��o do aeroporto (em cuja obra o pai trabalhou), do bonde, dos edif�cios hist�ricos. Quer dizer, n�o � algo s� do ponto de vista do viol�o ou da evolu��o do choro, mas da hist�ria da cidade”, diz Junqueira.
O lan�amento de “O choro em contexto” contar� com bate-papo com familiares, m�sicos e amigos do m�sico. E, dependendo da ades�o, tamb�m com uma roda de choro.
V�o participar da conversa os filhos Alana M�rcia e Mozart J�nior; o genro Edir Oliveira; os m�sicos Z� Carlos, Artur P�dua e Gustavo Monteiro; a pesquisadora L�cia Campos; e Daniela Meira, diretora do document�rio “Simplicidade – Mozart Secundino de Oliveira”, lan�ado em 2015.
“Convidei pessoas que conhe�o e sei que s�o muito importantes na vida e na trajet�ria do Mozart. Z� Carlos, cavaquinista, foi um grande parceiro, fez parte do Quem N�o Chora N�o Mama. Chamei dois violonistas que, como eu, tocaram muito com ele; o Artur P�dua, ali�s, acabou herdeiro da tradi��o do viol�o de seis cordas no choro. A ideia � lembrar e partilhar as hist�rias do Mozart, mas n�o existe pauta preestabelecida, o papo vai rolar de forma descontra�da”, diz Junqueira.
O evento ser� norteado pelo mesmo esp�rito de informalidade e congra�amento dos ambientes em que Mozart Secundino se apresentava.
“Eu vou com meu viol�o, Z� Carlos deve levar o cavaquinho e quem mais quiser levar o instrumento e estiver disposto, entra na roda. Mas ela vai depender da ades�o, porque n�o tem cach� nem nada. Se n�o tiver roda, fa�o l� umas duas ou tr�s m�sicas para lembrar o Mozart e � isso mesmo”, conclui.
Capa do livro O choro em contexto traz o desenho de um viol�o
Reprodu��o
O CHORO EM CONTEXTO
Nas baixarias de Mozart Secundino
• Livro de Humberto Junqueira
• Cancioneiro
• Lan�amento neste domingo (21/5), a partir das 10h30, no bar Muringueiro (Rua Juacema, 416, Bairro da Gra�a).
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