Marcelo D2 em 'B O R U - Que Sejam Ouvidas Nossas S�plicas'
N�o � de hoje que o m�sico se encontra entre o samba e o hip-hop. Depois de despontar com o Planet Hemp, banda de rap com rock, na d�cada de 1990, D2 construiu a sua carreira rimando sobre bases com samples de m�sica brasileira —entre muitas delas o samba— e batidas eletr�nicas.
"Este disco para mim � uma roda de samba em frente a um sound system, uma feijoada dentro da caixinha de batata frita do McDonald’s", diz. Sonoramente, isso significa que a percuss�o de samba ganha novo verniz sint�tico, com graves de hip-hop e batidas e cita��es ao funk e ao trap.
Mas n�o s�. D2 agora faz samba com uma mentalidade de hip-hop. O �lbum � permeado por interl�dios, samples de di�logos, trechos de outras m�sicas e um m�todo de composi��o a partir de recortes.
Diferente de quando sampleou Fundo de Quintal em "Batucada", de seu �lbum de estreia, "Eu Tiro � Onda", de 1998, agora h� uma esp�cie de "autossample". Ou seja, as grava��es de D2 com banda foram cortadas, remontadas e ganharam outros timbres na produ��o de Nave, MarioCaldato Jr. e Kiko Dinucci.
Nas faixas, h� participa��es ainda de Met� Met�, Mateus Aleluia e dos companheiros de Planet Hemp, BNeg�o e Pedro Garcia, al�m de uma sele��o de sambistas cantando ou compondo, incluindo Zeca Pagodinho, Alcione, Xande de Pilares, Nega Duda, Mumuzinho, Diogo Nogueira, Arlindinho e Moacyr Luz.
Entre as influ�ncias de D2 est�o Clementina de Jesus, os �ltimos discos de Tyler the Creator e Kendrick Lamar e os artistas pl�sticos Elian Almeida, Manuela Navas e Maxwell Alexandre. Mas a presen�a externa mais determinante no projeto talvez seja a do escritor e historiador Luiz Ant�nio Simas, coautor de duas m�sicas.
"A aproxima��o com ele foi essencial", diz D2. "Tem muita gente que pensa como ele, mas ele verbaliza muito bem e abriu esse leque. A� come�a a ideia de como chegar a esse lugar que o Simas prop�e."
O rapper se refere a uma conversa que eles tiveram em 2020, quando D2 fez o �lbum "Assim Tocam Meus Tambores", criado ao vivo em transmiss�es na internet na pandemia. "Hoje, toda a m�sica pop bebe do grave do hip-hop, de Anitta a Luisa Sonza", ele diz. "E o samba, por ter o surdo, demorou mais. A� veio esse balan�o da ancestralidade e do sub�rbio que o Simas trouxe com tudo o que trago da cultura hip-hop."
O conceito de ancestralidade de futuro, proposto pelo artista, tamb�m se relaciona com as religi�es com matriz africana —ele se iniciou no if� depois da morte de sua m�e, Paulete Peixoto, h� dois anos.
"Tinha um medo de religi�o. Achava que ia me doutrinar e ia virar ovelhinha", afirma. "Depois que minha m�e partiu, fiquei perdido. O if� me deu conforto, de ter um padrinho para conversar, entender como a vida funciona, que a morte n�o � o final, a ancestralidade."
Em "Iboru", essa ideia surge como um di�logo com o tempo, embolando passado, presente e futuro. Na est�tica, ele combina o estilo esportivo do hip-hop com as vestimentas dos bambas e malandros do samba. No filme que acompanha o �lbum, retrata vers�es jovens de Pixinguinha, Jo�o da Baiana e Clementina de Jesus sob a lente da atualidade.
O pr�prio Marcelo D2 faz uma esp�cie de retorno no tempo, lembrando duas d�cadas atr�s, logo antes de lan�ar "A Procura da Batida Perfeita", �lbum que o al�ou � fama depois da passagem pelo Planet Hemp. Hoje, o trabalho n�o pode ser ouvido no streaming por uma desaven�a financeira entre artista e gravadora.
Assim como em seu disco mais c�lebre, D2 sente de novo que "descobriu uma parada". "Pode n�o mudar o mundo, mas vai mudar o meu mundo. � o que estou chamando de novo samba tradicional."
Tamb�m � daquela �poca o fim do Planet Hemp —decretado no camarim depois de um show no festival Mada, em Natal, no meio de uma entrevista para a MTV. "BNeg�o queria sair, Rafael queria sair. Pegamos uma garrafa de champanhe e falamos ‘� isso, cada um segue sua vida’."
Neste ano, D2 tamb�m lan�ou com o Planet Hemp o primeiro �lbum da banda desde o epis�dio no Rio Grande do Norte. Se "Iboru" imagina um futuro ut�pico, "Jardineiros", da banda de rock, � um retrato da distopia —como o rapper trata o governo Bolsonaro.
"Pago o pre�o por ser alvo de uma extrema direita que � hip�crita", diz. "Os �ltimos quatro anos foram dif�ceis. S� de me xingarem e falarem que s�o contra [mim], isso passa por mim para caramba."
D2 fala da luta por liberdade de express�o encampada pelo Planet Hemp —que acabou os levando � cadeia. Hoje, ele cr� que tem de haver limites para o que pode ser dito. "Falar que � um direito ter um partido nazista, acho que tem um limite de tudo", diz.
"Quero ver o cara sentar na minha frente e falar ‘eu quero ser racista’. Ningu�m fala que quer ser racista. Eles querem liberdade para isso, mas ningu�m tem coragem de falar. Eu tenho coragem de falar que quero liberdade para discutir as leis sobre drogas", acrescenta. "Numa sociedade, n�o se pode tudo. � foda o cara que fala ‘fodam-se as leis e todas as regras’ estar falando isso agora, mas, quando a gente cai nesse lugar que afeta o outro, tem que ter um limite."
Possivelmente o artista mais importante no ativismo a favor da maconha no pa�s, D2 diz que nunca imaginou que a discuss�o sobre a droga evoluiria t�o rapidamente —o Supremo Tribunal Federal se prepara para discutir a suspens�o de um artigo da Lei Antidrogas.
"Sinceramente, n�o acreditava que ia fumar maconha na rua de Nova York", diz. "Tem v�rias maneiras de se fazer isso [legalizar a droga] corretamente no Brasil. Mas uma certeza que eu tenho � que a proibi��o � o pior caminho."
Hoje, mais do que o direito de falar sobre maconha, tr�fico e sociedade, a busca de D2 � pela valoriza��o da cultura que o formou. Cria do Andara�, na zona norte carioca, ele cresceu vendo Mestre Andr�, da Mocidade Independente de Padre Miguel, revolucionar a bateria de escola de samba, conviveu com gigantes no auge do Cacique de Ramos e se tornou amigo de Zeca Pagodinho e Bezerra da Silva.
Segundo ele, o samba desenvolvido no Cacique de Ramos, de Beth Carvalho ao Fundo de Quintal e dissid�ncias, deveria ter o mesmo reconhecimento da tropic�lia ou da bossa nova.
"O Brasil d� pouco valor para essas coisas", afirma. "N�o foi para a TV. Ia a bossa nova, o tropicalismo, porque era uma coisa branca. Ficava bonito aos olhos dessa classe m�dia. N�o sei como o Cacique n�o foi para o mundo todo. A gente conhece, mas merece mais reconhecimento do que isso."
IBORU, QUE SEJAM OUVIDAS NOSSAS S�PLICAS
Quando A partir de quarta-feira (14)
Onde Nas plataformas digitais
Autoria Marcelo D2
Produ��o Nave, Mario Caldato Jr. e Kiko Dinucci
Gravadora Pupila Dilatada
MARCELO D2 E UM PUNHADO DE BAMBA EM S�O PAULO
Quando 16 de junho (sexta-feira), �s 22h
Onde Audio - av. Francisco Matarazzo, 694, S�o Paulo
Pre�o a partir de R$ 80
Classifica��o 18 anos
Link: https://audiosp.com.br/930-marcelo-d2-e-um-punhado-de-bamba
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