O cantor e compositor Paulinho da Viola

Paulinho da Viola abre o show com "Ele", uma "afirma��o" do que foi sua vida e uma "exalta��o ao samba", conforme explica: "O 'Ele' do t�tulo � ao mesmo tempo o samba e o compositor de sambas"

Leo Aversa/Divulga��o

H� quase seis d�cadas, mais precisamente em 1965, o jovem m�sico Paulo C�sar Batista Faria colocava os p�s em um palco pela primeira vez, acompanhando Clementina de Jesus, Aracy Cortes e Z� Keti no espet�culo “Rosa de ouro”, idealizado e dirigido por Herm�nio Bello de Carvalho. A partir daquele momento, Paulinho da Viola, como ficou conhecido posteriormente, construiu uma carreira que o colocou entre os maiores nomes da m�sica popular brasileira.

Esse percurso � revisitado no show que celebra seus 80 anos de vida, completados em novembro do ano passado, que chega a Belo Horizonte, em �nica apresenta��o, neste s�bado (1/7), na Arena Hall. Na apresenta��o – que integra a turn� iniciada, com o mote da efem�ride, em mar�o deste ano –, o cantor e compositor carioca repassa uma discografia composta por quase 20 �lbuns de est�dio, pin�ando composi��es sem prazo de validade do cancioneiro nacional, que atravessaram d�cadas mantendo o vi�o.

Passado o per�odo severo da pandemia, quando ficou o mais recluso que p�de, Paulinho da Viola voltou � estrada no ano passado. O show que chega agora � capital mineira j� estava, portanto, formatado e devidamente testado antes que ganhasse a chancela de evento comemorativo, segundo o m�sico. “N�o tinha ainda a denomina��o de turn� de 80 anos. Algu�m deu essa ideia e passamos a chamar assim, mas eu j� estava circulando com essa proposta de revisitar a carreira”, conta.
 

"Nunca fui de compor todo dia. �s vezes fico muito tempo sem fazer m�sica; outras vezes, come�ava a escrever, mas o resultado n�o me agradava e eu seguia mexendo, reescrevendo, num processo que podia durar muito tempo. �s vezes, uma ideia vem e logo se desenvolve. Em outras situa��es, s�o anos at� terminar uma m�sica"

Paulinho da Viola, cantor e compositor

 

P�blico generoso

Paulinho n�o esconde o contentamento pelo reencontro presencial com seu p�blico. Em todas as casas de shows das cidades por onde j� passou, as apresenta��es tiveram ingressos esgotados, conforme comenta.  “� um prazer enorme. O p�blico tem sido muito generoso. Estive no Rio de Janeiro na semana passada e foram duas noites de plateia lotada. Tivemos que agendar uma nova data para setembro”, diz.

Entre os muitos sucessos que pontuam a carreira de Paulinho, o roteiro do show inclui “Pecado capital”, “Foi um rio que passou em minha vida”, “Cora��o leviano”, “Timoneiro” e “Coisas do mundo, minha nega”, registrada em seu primeiro �lbum solo, de 1968. Ele observa que de “Rosa de ouro” n�o entra nada no repert�rio, que, no entanto, inclui temas compostos com seus parceiros inaugurais e tamb�m de artistas que alavancaram sua carreira, como Elton Medeiros, Z� Keti, Cartola e Herm�nio Bello de Carvalho.
 
 

O sambista reconhece que, com uma obra t�o vasta, � sempre penoso montar um roteiro musical. “� dif�cil pensar uma sele��o que, de alguma forma, possa ser uma s�ntese de tantos anos. Primeiro eu separo aqueles temas que n�o podem ficar de fora, os mais conhecidos do p�blico. Depois vem o mais dif�cil, que � escolher entre as coisas que eu gosto, minhas e de outros autores, de pessoas que foram importantes na minha trajet�ria. A� entra a intui��o mesmo, o crit�rio � seguir para onde o cora��o aponta”, pontua.

Primeiro �lbum

O espet�culo n�o obedece a uma ordem cronol�gica, mas perfaz todos os momentos de sua carreira. A partir do �lbum que precedeu a estreia solo de Paulinho, “Samba na madrugada”, gravado com Elton Medeiros em 1966, a turn� de 80 anos joga luz sobre uma produ��o intensa e regular, com lan�amentos anuais – ou a cada dois anos, no m�ximo – entre as d�cadas de 1960 e 1990. “Claro que n�o d� para entrar tudo, muita coisa ficou de fora, mas acho que � um bom panorama”, avalia.

Curiosamente, ele diz que nunca foi um artista muito aplicado quando o assunto � a composi��o. Paulinho usa esse argumento para justificar o fato de estar h� 27 anos sem lan�ar um �lbum de in�ditas. “Nunca fui de compor todo dia. �s vezes fico muito tempo sem fazer m�sica; outras vezes, come�ava a escrever, mas o resultado n�o me agradava e eu seguia mexendo, reescrevendo, num processo que podia durar muito tempo. �s vezes, uma ideia vem e logo se desenvolve. Em outras situa��es, s�o anos at� terminar uma m�sica”, ressalta.

Ele explica que o ritmo que ditou sua produ��o nos anos 1960 e 1970 era, na verdade, determinado pela pr�pria engrenagem do mercado fonogr�fico – n�o necessariamente por um �mpeto criativo transbordante. “Naquele per�odo, sim, a gente gravava todos os anos. Em 1971 cheguei a lan�ar dois discos e em 1976 tamb�m. A gente chegava perto do produtor, falava que estava com alguma coisa pronta e ele j� marcava est�dio. Muitas vezes eu at� mudava a letra ou a melodia durante as grava��es. Minha disciplina era para aquele momento”, conta.

As profundas reconfigura��es nas formas de produ��o e circula��o de m�sica ocorridas ao longo das �ltimas d�cadas ainda n�o foram totalmente absorvidas por Paulinho, o que tamb�m explica o longo hiato sem um trabalho de in�ditas. “Tudo mudou. Hoje em dia muitos artistas gravam uma m�sica, duas, e v�o lan�ando aos poucos. Eu ainda n�o me acostumei muito com isso, mas espero apresentar em breve um trabalho novo. Material eu tenho para isso, meu e dos outros”, diz, alimentando a expectativa de seus f�s.

Na verdade, esse material de que fala j� vem sendo posto � prova. A m�sica que abre o show da turn� comemorativa, por exemplo, batizada como “Ele” e composta como uma ode ao g�nero com que Paulinho � mais identificado, � in�dita, “O come�o do espet�culo � uma esp�cie de afirma��o do que foi minha vida. Como j� fiz muitos sambas e gravei um punhado de outros autores, essa m�sica de abertura � uma exalta��o ao samba. O 'Ele' do t�tulo � ao mesmo tempo o samba e o compositor de sambas”, pontua.

 

 Elton Medeiros e Paulinho da Viola cantam em frente ao microfone

Elton Medeiros e Paulinho da Viola s�o parceiros em dois cl�ssicos: '14 anos' e 'Ame'

Reprodu��o
 

Volta ao viol�o

Paulinho revela que tem outras melodias prontas, algumas esperando letra, outras j� apresentadas em trabalhos alheios no formato instrumental. Ele observa que a pandemia teve um papel importante na retomada mais sistem�tica do processo de composi��o, o que tem a ver com seu reencontro com um instrumento que, durante muitos anos, andou meio encostado.
 
“Durante o per�odo de isolamento, passei a tocar um pouco mais de viol�o. A partir de 1974, quando meu pai (C�sar Faria, um dos fundadores do grupo de choro �poca de Ouro), que toca viol�o, passou a fazer parte da banda que me acompanhava, sempre toquei mais o cavaquinho nos shows e grava��es. Com a pandemia, comecei a tocar mais viol�o, uma coisa que eu mesmo determinei para mim. Aconteceu que, nesse processo, fiz alguns choros, sendo que dois deles j� foram gravados pelo Jo�o Camarero”, explica.

Ele diz, a prop�sito, que chegou a cogitar, no show da turn� comemorativa, um bloco tem�tico dedicado ao g�nero basilar em sua forma��o, que abasteceu um dos �lbuns lan�ados em 1971, “Mem�rias chorando”. “Os m�sicos que tocam comigo sugeriram, eu j� fiz v�rios shows com choros instrumentais e sempre falei da import�ncia do g�nero na minha vida, mas achei que agora n�o era o momento”, diz, pontuando que, de todo modo, o repert�rio inclui um choro cantado, “Cora��o imprudente”, feito em parceria com Capinam.
 

Herm�nio: amizade e parceria

Voltando ao “Rosa de ouro” – espet�culo e �lbum que se firmaram como marcos da m�sica brasileira –, Paulinho destaca que guarda muitas lembran�as marcantes daquele per�odo, em especial de Herm�nio Bello de Carvalho, que completou 88 anos no �ltimo m�s de mar�o. O cantor e compositor diz que o conheceu em uma situa��o incomum, quando ainda trabalhava como banc�rio.
 
“Ele foi ao banco fazer um pagamento, eu o vi e fiquei pensando de onde o conhecia. Era uma se��o com pouca gente, ent�o levantei da minha mesa, me aproximei, disse que tinha a impress�o de que o conhecia e come�amos a conversar. Descobrimos que a �nica vez em que t�nhamos nos encontrado foi numa reuni�o na casa de Jacob do Bandolim, onde meu pai tamb�m estava presente, uns cinco ou seis anos antes. A gente criou ali uma amizade, fui visit�-lo, ele me mostrou algumas letras e acabou se tornando meu primeiro parceiro”, recorda.

Paulinho conta que, na ocasi�o, fizeram juntos duas m�sicas, que ficaram anos engavetadas – “Valsa da solid�o” e “Duvide-o-d�”, gravadas, muito tempo depois, respectivamente por Elizeth Cardoso e Isaurinha Garcia. “Depois disso, fizemos muitas coisas juntos, muitas composi��es, e ele dirigiu shows meus. Agora mesmo Herm�nio fez um disco, que ainda n�o foi lan�ado, em que eu participo cantando 'Valsa da solid�o”. S�o muitos anos de hist�ria e amizade”, ressalta.

Sobre o �xito de uma carreira que se mistura com a hist�ria do samba, ele afirma se sentir realizado ao olhar para tr�s e ver o que construiu. “� um orgulho fazer parte disso. S�o tantos compositores que constru�ram essa hist�ria ao longo de d�cadas que ser colocado ao lado deles � uma satisfa��o", afirma.
 
No show deste s�bado, Paulinho estar� acompanhado por Adriano Souza (piano), M�rio S�ve (sopros), Dininho (baixo), Ricardo Costa (bateria), Esguleba e Celsinho (percuss�o) e seu filho Jo�o Rabello (viol�o). 

“TURN� 80 ANOS”

• Show de Paulinho da Viola, neste s�bado (1/7), �s 22h, na Arena Hall (av. Nossa Senhora do Carmo, 230, Savassi), com abertura da casa �s 20h.
• Ingressos para arquibancada a partir de R$ 100; para o setor Prata a partir de R$ 150; e para o setor Ouro a partir de R$ 190. Ingressos para o setor Bronze est�o esgotados.
• � venda na bilheteria da Arena Hall e pelo site sympla.com.br.
• Meia-entrada social para o p�blico de todas as idades, mediante doa��o de 1 kg de alimento n�o perec�vel na entrada do show (promo��o n�o cumulativa e v�lida apenas para ingressos de inteira).
• Informa��es: (31) 97222-2424.