WeWork: empresa revolucion�ria ou uma grande fraude?
Adiamento de abertura de capital, manobras cont�beis suspeitas e den�ncias contra o fundador mostram que crescer r�pido demais nem sempre pode ser um bom neg�cio
postado em 24/09/2019 04:00 / atualizado em 23/09/2019 21:05
Sede da WeWork em Nova York: fundada nos EUA em 2010, a empresa tem 528 pr�dios em 111 cidades de 29 pa�ses (foto: WeWork.com/Reprodu��o
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S�o Paulo – Na semana passada, investidores do mundo inteiro receberam uma informa��o inesperada: o IPO (oferta p�blica inicial, na sigla em ingl�s) da empresa de escrit�rios compartilhados WeWork n�o iria mais ocorrer. O adiamento da abertura de capital surpreendeu por duas raz�es principais: a WeWork chegou a ser avaliada pelo banco americano Goldman Sachs em US$ 65 bilh�es e, nos �ltimos anos, se tornou uma das companhias de crescimento mais acelerado do planeta.
Agora, o que era para ser uma fant�stica f�brica de inova��o est� se revelando, na realidade, uma grande fantasia. Depois do an�ncio de que pretendia abrir o capital, a WeWork passou a ser escrutinada por analistas ansiosos por conhecer de perto as informa��es de uma empresa que parecia ser uma m�quina de gerar dinheiro. O que eles descobriram � alarmante.
Sem meias palavras, o relat�rio publicado por Sam McBride, analista da corretora americana New Constructs, � devastador. “WeWork pode n�o ser o maior IPO de 2019, mas � certamente o mais rid�culo e perigoso”, escreveu o especialista. “A companhia queima montanhas de caixa, carrega graves riscos no caso de uma recess�o e tem uma das piores pr�ticas de governan�a que j� vimos.”
Um dos aspectos discutidos pelos analistas diz respeito ao modelo de neg�cios da empresa. A WeWork, dizem eles, n�o � uma empresa de tecnologia, ao contr�rio do que os seus executivos apregoam. � apenas uma companhia imobili�ria que opera muito acima da capacidade que tem de gerar receitas financeiras.
A WeWork aluga espa�os em pr�dios comerciais e os subloca para empreendedores, principalmente jovens que abriram ou trabalham em startups. O problema � que, para crescer – e chamar a aten��o de todo mundo – a empresa aluga esses lugares por pre�os abaixo dos praticados pelo mercado.
O mecanismo � simples. Para entender como a estrat�gia funciona, basta recorrer a um modelo hipot�tico. A WeWork aluga o andar inteiro de um pr�dio comercial em Nova York e paga por isso, digamos, US$ 10 mil. Para o espa�o n�o ficar vazio, ela subloca o espa�o por US$ 9 mil.
Como seus pre�os s�o subavaliados, ela aluga o lugar mais rapidamente do que os concorrentes. O problema � que a conta, claro, n�o fecha. A empresa faz isso em diversas partes do mundo e o resultado que se v� � um crescimento espantoso dos metros quadrados alugados.
“Ou seja, parece que a WeWork � um fen�meno de inova��o que revelou uma f�rmula m�gica para ganhar o mundo”, diz o consultor Rodrigo Rossetti, especializado na �rea de tecnologia. “A quest�o � que os resultados da companhia mostram o contr�rio. Na realidade, o sucesso da WeWork parece ser um grande castelo de cartas pronto para desmoronar.”
Fundada nos Estados Unidos em 2010, a WeWork tem 528 pr�dios em 111 cidades de 29 pa�ses. H� dois anos, eram 400 edif�cios em cerca de 70 cidades. O sucesso foi t�o veloz que a empresa seduziu o conglomerado japon�s Softbank, que j� despejou na empresa US$ 11 bilh�es.
Em uma an�lise superestimada, o Softbank chegou a avaliar a WeWork em US$ 47 bilh�es na �ltima rodada de investimentos, mas ningu�m parece ter se convencido do potencial da companhia. Desde 2016, o Softbank � o �nico fundo a investir na WeWork.
Agora, � consenso entre os especialistas que o Softbank exagerou na dose. Estima-se que a empresa valeria, no m�ximo, US$ 10 bilh�es, ou nem isso. “A WeWork chegou numa encruzilhada”, diz o consultor Rodrigo Rossetti. “Se ela cancelar definitivamente o IPO, n�o vai mais conseguir os recursos necess�rios para financiar o seu crescimento. Se abrir o capital, talvez seja obrigada a encarar um grande fracasso.”
PREJU�ZOS
O modelo de neg�cios extravagantes da WeWork tem gerado preju�zos em s�rie. Em 2016, a empresa perdeu US$ 400 milh�es. Em 2017, US$ 900 milh�es. No ano passado, as perdas totalizaram US$ 1,9 bilh�o, enquanto as receitas foram de US$ 1,8 bilh�o. Em nove anos de exist�ncia, a WeWork nunca deu lucro e muitos analistas acham que ela jamais ser� capaz de fechar o balan�o no azul.
Um dos problemas da WeWork pode estar na figura de seu pr�prio fundador. Israelense radicado nos Estados unidos, Adam Neumann, de 40 anos, tem adotado atitudes question�veis na gest�o da empresa. Neumann � o pior exemplo poss�vel quando se fala em governan�a corporativa.
Uma de suas estrat�gias recorrentes � pegar dinheiro emprestado com a WeWork para comprar im�veis, que, depois, ele aluga para a pr�pria empresa. Al�m do ineg�vel conflito de interesses, a t�tica gera preju�zos para os cofres da empresa, embora encha os bolsos de seu fundador. Entre 2016 e 2017, o artif�cio rendeu US$ 12 milh�es a Neumann.
Neumann tamb�m n�o teve pudores em exigir da WeWork o pagamento de US$ 6 milh�es pelos direitos de uso da palavra “we” (n�s, em portugu�s). A marca We pertence a uma outra empresa de Neumann, e ele s� liberaria o seu uso mediante compensa��o financeira. Revelado pela imprensa americana, o caso revoltou funcion�rios da pr�pria WeWork, e o pagamento acabou sendo desfeito.
BOMB�STICO
Al�m das manobras cont�beis, o fundador da WeWork demonstrou ser uma personalidade n�o apenas exc�ntrica – mas exc�ntrica demais. Funcion�rios da WeWork revelaram que foram obrigados a participar de festas que duraram v�rios dias, e que muitas delas acabaram se tornando uma grande orgia.
Neumann tamb�m em sido alvo de den�ncias sobre o uso de drogas e �lcool no ambiente de trabalho. Quando demite algu�m, ele costuma oferecer ao demitido um pouco de tequila, “para equilibirar a energia”. N�o s�o incomuns os casos de pessoas que foram desligadas da empresa sob o argumento de que tinham “energia negativa demais”.
Suas entrevistas s�o sempre bomb�sticas. Numas delas, declarou que pretende viver para sempre e, em outra, afirmou que ser� o pr�ximo presidente dos Estados Unidos (como israelense de nascimento, a Constituti��o americana n�o permite).
Durante um bom tempo, Neumann foi visto apenas como um vision�rio de ideias incomuns. Agora, por�m, com as artimanhas que tem usado para embolsar milh�es de d�lares e fazer sua companhia crescer artificialmente, muita gente parece ter percebido que ele representa um perigo – inclusive para a pr�pria companhia que fundou.
O SoftBank, maior investidor da WeWork, tem atuado nos bastidores para tirar Neumann da gest�o da companhia. Essa seria a condi��o para novos aportes financeiros e para a futura abertura de capital da empresa. Enquanto isso n�o ocorrer, a WeWork continuar� despertando a desconfian�a dos investidores.
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A febre dos escrit�rios compartilhados
Apesar das dificuldades enfrentadas pela WeWork, os espa�os de trabalho compartilhados se tornaram febre no Brasil e no mundo. A tend�ncia traz in�meras vantagens: oportunidade de conviver com profissionais de outras �reas, diminui��o de custos e inser��o da empresa e do profissional em ambientes mais din�micos.
Segundo o Censo Coworking Brasil, realizado pelo site especializado Coworking, em 2018, havia aproximadamente 1,2 mil escrit�rios compartilhados no pa�s, localizados nos 26 estados e no Distrito Federal. Nos �ltimos tr�s anos, a quantidade de espa�os desse tipo cresceu 500% no pa�s, muito acima do ritmo da expans�o da m�dia mundial, que foi de 200%. Em 2018, o setor movimentou no Brasil R$ 130 milh�es.
Uma das tend�ncias do setor � a cria��o de escrit�rios tem�ticos, que concentram no mesmo endere�o profissionais de um �nico segmento. J� existem em Belo Horizonte, Rio de Janeiro e S�o Paulo espa�os dedicados a empresas da �rea de moda, arquitetura, tecnologia e agroneg�cio.