Joias deslumbrantes costumam esconder hist�rias fascinantes %u2013 algumas, de amor, como esta coroa da rainha Vit�ria, outras muito mais sombrias
O emblem�tico diamante Koh-i-Noor � apenas mais uma joia famosa a aparecer no notici�rio. Recentemente, ele esteve no centro de uma pol�mica envolvendo a coroa��o do rei Charles 3°.
Em janeiro, a estrela de TV Kim Kardashian virou manchete ao comprar um pingente em forma de crucifixo que era usado com frequ�ncia pela princesa Diana, por um valor impressionante: 163.800 libras (cerca de R$ 1,02 milh�o). Kardashian j� havia comprado o rel�gio Cartier Tank de Jacqueline Kennedy em 2017. Acredita-se que ela est� formando uma cole��o de joias para homenagear as mulheres que a inspiram.
"Um passado ilustre pode acrescentar imenso valor a uma joia, especialmente se o dono anterior tiver sido algu�m extremamente glamouroso, que tenha formado uma cole��o de joias, como a princesa Margaret ou Elizabeth Taylor", afirma Helen Molesworth, curadora de joias do Museu Victoria & Albert, de Londres.
Ao longo do tempo, diversas gemas not�veis e desenhos de joias excepcionais reuniram hist�rias que fizeram com que passassem a ser �cones inquestion�veis ou talism�s malditos – de s�mbolos da devo��o do amor at� representa��es de conquistas coloniais; de diamantes “amaldi�oados” at� acess�rios de estilos ousados.
Aqui, revelamos as hist�rias por tr�s de 10 das joias mais lend�rias do mundo.
1. A Cruz de Attallah

Diana, Princesa de Gales, usou v�rias vezes a Cruz de Attallah, recentemente adquirida por Kim Kardashian.
Sotheby'sA joia que chamou a aten��o de Kardashian, com suas ametistas lapidadas em quadrados e ofuscadas por diamantes de 5,2 quilates, foi criada nos anos 1920 pela joalheria londrina Garrard.
A empresa era uma das favoritas de Diana, Princesa de Gales (1961-1997), e desenhou seu anel de noivado. Mas a joia, na verdade, nunca pertenceu a Diana. Ela foi emprestada para a princesa em v�rias ocasi�es, por Naim Attallah, que d� o nome � joia.
Attallah era amigo pr�ximo de Diana e, na �poca, um dos diretores-gerentes da Asprey & Garrard. Segundo seu filho, a princesa foi a �nica mulher que ele permitiu que usasse a pe�a.
Para Molesworth, Kardashian � uma propriet�ria adequada para a joia: "� uma mulher empreendedora, comprando para ela pr�pria – um grande s�mbolo de igualdade de classe e de g�nero no mundo das cole��es comerciais".
Brilhante e arrojado, o crucifixo representa uma mudan�a no estilo cada vez mais empoderado de Diana nos anos 1980.
Kristian Spofforth, chefe de joalheria da casa de leil�es Sotheby’s, de Londres, observou antes da venda que "at� certo ponto, este pingente incomum � um s�mbolo da crescente autoconfian�a da princesa nas suas escolhas de roupas e joias, naquele momento espec�fico da sua vida".
Spofforth refere-se ao m�s de outubro de 1987, quando a princesa usou o crucifixo gigante no baile de caridade da organiza��o Birthright. Ela combinou a pe�a com um colar de p�rolas que se acredita ter pertencido a ela pr�pria e um vistoso vestido em estilo elisabetano, da mesma cor p�rpura do crucifixo.
2. O 'amaldi�oado' diamante negro Orlov

O diamante negro Orlov foi considerado 'amaldi�oado' e apontado como a causa da morte dos seus propriet�rios
Getty ImagesDiamantes negros cristalinos, por si s�, j� s�o especiais. � por isso que o diamante negro Orlov talvez seja o mais raro da sua esp�cie.
O Orlov � uma pedra de 67,49 quilates em forma de almofada, com distinta tonalidade met�lica e uma lenda de arrepiar.
A hist�ria conta que o diamante original, com cerca de 195 quilates, foi roubado de uma est�tua do deus hindu Brahma, em um santu�rio indiano do s�culo 19.
O diamante teria sido ent�o amaldi�oado. Ele teria causado a morte do ladr�o e o suic�dio de tr�s dos seus donos: uma princesa russa chamada Nadia Vygin-Orlov, uma de suas parentes e J. W. Paris, o negociante de diamantes que importou a pedra nos Estados Unidos.
Pesquisas recentes lan�aram d�vidas sobre esta hist�ria. Especialistas consideram improv�vel que o diamante tenha se originado na �ndia e duvidam que a princesa Orlov tenha realmente existido.
O que se sabe � que o diamante foi novamente lapidado para formar tr�s gemas individuais, na esperan�a de quebrar o feiti�o. E os donos seguintes do Orlov – agora disposto na forma de pingente, rodeado por uma coroa de louros feita de diamantes – aparentemente escaparam da maldi��o.
3. A p�rola La Peregrina

A p�rola La Peregrina foi um presente do rei espanhol Filipe 2� para sua noiva, a rainha Maria 1� da Inglaterra. S�culos depois, o ator Richard Burton a comprou para Elizabeth Taylor
AlamyLa Peregrina � uma p�rola deslumbrante em forma de pera encontrada na costa do Panam� em 1576. Ela conta uma hist�ria t�o interessante quanto seu formato.
"� simplesmente uma das p�rolas mais perfeitas do mundo, se n�o a mais perfeita. E tem por tr�s grandes hist�rias e um romance", explica Helen Molesworth.
A p�rola pesa 202,24 gr�os (50,56 quilates) e foi comprada inicialmente pelo rei Filipe 2º da Espanha para sua noiva, a rainha Maria 1ª da Inglaterra (1516-1558). Ela foi passada de gera��o em gera��o na realeza espanhola, at� cair nas m�os de Joseph-Napol�on Bonaparte, irm�o mais velho de Napole�o.
Muito depois, em 1969, ela foi comprada por Richard Burton para Elizabeth Taylor e remontada em um colar desenhado por Cartier.
"� uma grande hist�ria de amor, mas tamb�m engra�ada", segundo Molesworth. "Taylor contou na sua autobiografia que, certa vez, estava sentada no sof� com Burton, quando percebeu que a p�rola havia ca�do da corrente."
"Ela olhou para baixo e encontrou seu filhote de cachorro mastigando algo no tapete - a p�rola estava entre seus dentes. Felizmente, ela conseguiu recuper�-la relativamente inc�lume."
La Peregrina foi vendida em 2011 pela casa de leil�es Christie's de Nova York, nos Estados Unidos, por US$ 11.842.500 (cerca de R$ 61,6 milh�es, em valores atuais), tornando-se a p�rola natural mais cara j� leiloada na �poca.
4. O 'amaldi�oado' diamante Hope
Outro diamante enfeiti�ado por um passado sinistro � o diamante Hope, a joia da coroa da Cole��o Nacional de Gemas do Museu Smithsonian, nos Estados Unidos.
"� um diamante azul-escuro muito raro, que recebeu o nome dos seus donos", explica Arabella Hiscox, especialista em joias da casa de leil�es Christie's de Londres. A pedra tem 45,52 quilates - o maior diamante do seu tipo conhecido.
"Quando exposto � luz ultravioleta, seu brilho � vermelho-sangue, o que s� aumenta o seu mist�rio", afirma Hiscox.
O escritor Karl Shuker conta as origens lend�rias do diamante Hope no seu livro The Unexplained ("O n�o explicado", em tradu��o livre), de 1996. A pedra teria sido "impiedosamente arrancada [da] testa de um �dolo em um templo indiano" por um sacerdote hindu. Conta-se que ele teria despertado a maldi��o e sofrido com ela.
Em 1668, o diamante foi comprado pelo rei Lu�s 14, da Fran�a - e roubado durante a Revolu��o Francesa, entre coment�rios de que o rei e Maria Antonieta teriam sido v�timas da maldi��o.
Pierre Cartier foi o respons�vel pelo belo colar de diamantes brancos que agora sustenta o diamante Hope. Ele o vendeu para a herdeira da minera��o Evalyn Walsh McLean em 1912 — o que teria condenado seu destino.
"Conta-se que dois filhos de McLean morreram enquanto ela estava usando o diamante", segundo Hiscox.
Em 1958, o ent�o dono do Hope, o joalheiro Harry Winston, doou a joia para o Smithsonian, no que Hiscox considera "uma jogada de isen��o de impostos muito inteligente". Agora guardado, sua maldi��o parece ter desvanecido.
5. O bracelete Pantera de Cartier, de Wallis Simpson

O bracelete personalizado em forma de pantera, ornamentado com �nix e diamantes e desenhado por Cartier em 1952 para Wallis Simpson, foi o astro de um leil�o da casa Sotheby%u2019s em 2010
Getty ImagesO famoso caso de amor entre Wallis Simpson e o rei Eduardo 8°, que abdicou do trono brit�nico em 1936 para casar-se com a socialite norte-americana, pode ser acompanhado de muitas formas, atrav�s da deslumbrante cole��o de famosas joias Cartier que o casal encomendou, um para o outro, ao longo da vida. Grande parte da cole��o foi vendida pela Sotheby’s em 2010.
O astro do leil�o foi o bracelete de pantera de Simpson, ornamentado com �nix e diamantes e olhos de esmeralda arrebatadores – um presente que ela ganhou de Eduardo em 1952, durante o ex�lio do casal em Paris.
"Esta pe�a possui quase todas as qualidades que fazem uma joia ic�nica", afirma Magali Teisseire, chefe de joalheria da Sotheby’s de Paris.
"� muito importante para a hist�ria da Cartier", prossegue ela. "Foi projetada por Jeanne Toussaint [mulher pioneira no design de joias] e apelidada La Panth�re por Louis Cartier, que concebeu o desenho de pantera original. Voc� tem ent�o a qualidade, o design hist�rico e, � claro, a origem rom�ntica."
Na �poca do leil�o, Madonna estava filmando sua cinebiografia de Simpson, intitulada WE. Conta-se que ela chegou a colocar o bracelete, mas o nome do comprador — que pagou a inacredit�vel quantia de 4,5 milh�es de libras (cerca de R$ 28,2 milh�es) pela pe�a em forma de felino — nunca foi revelado.
6. O diamante Koh-i-Noor

O famoso diamante Koh-i-Noor pertenceu ao maraj� Duleep Singh e, mais tarde, � rainha Vit�ria
AlamyO Koh-i-Noor � um dos maiores diamantes lapidados do mundo. Ele tem 105,6 quilates e tamb�m � um dos mais controversos entre as joias da coroa brit�nicas.
Acredita-se que ele tenha sido originalmente extra�do no sul da �ndia, na era medieval. Mas as origens escritas do diamante remontam a 1628, quando ele adornou o trono incrustado de gemas do ent�o imperador mogol Shah Jahan.
Em 1739, o trono foi pilhado pelo governante persa Nader Shan durante a invas�o de D�li, na �ndia, e o diamante foi levado para o territ�rio que hoje � o Afeganist�o.
Segundo a Smithsonian Magazine, a pedra ent�o "passou pelas m�os de diversos governantes, entre um epis�dio sangrento e outro", at� ressurgir na �ndia, no colo do maraj� sikh Ranjit Singh, em 1813.
A companhia brit�nica East India Company, em meio � coloniza��o de grande parte do subcontinente asi�tico na �poca, tomou conhecimento do diamante. Encantada pela mitologia envolvida, decidiu reivindic�-la.
E assim o fez em 1849, for�ando o maraj� Duleep Singh - herdeiro do trono punjabi, que tinha 10 anos de idade - a abrir m�o do diamante e da sua soberania. A companhia ent�o presenteou o Koh-i-Noor � rainha Vit�ria.
A pedra foi mostrada ao p�blico na Grande Exposi��o de 1851, quando foi ridicularizada pela sua falta de brilho. Em meio a rumores de uma maldi��o, a pedra foi ent�o novamente lapidada e polida.
Atualmente, o Koh-i-Noor ornamenta a coroa da falecida rainha-m�e brit�nica, mas os governos da �ndia, Paquist�o, Ir� e Afeganist�o j� exigiram a devolu��o desse s�mbolo singular de conquista colonial.
7. O anel de sinete de Maria Antonieta

Um min�sculo anel de sinete, com monograma de diamantes, que pertenceu � rainha francesa Maria Antonieta foi leiloado em 2018
Alamy"Quando se fala em pessoas que voc� gostaria que tivessem sido donas das suas joias, Maria Antonieta est� no topo da lista", afirma Arabella Hiscox.
A prova � um conjunto de 10 joias que pertenceram � rainha francesa, que foram comprados pela fam�lia Bourbon-Parma e novamente vendidos por uma fortuna, em um leil�o recordista da Sotheby's em 2018.
Um belo pingente de p�rola natural foi a pe�a que atingiu o maior pre�o de venda. Ele havia sido embalado a m�o e colocado em um ba� de madeira pela pr�pria Maria Antonieta e enviado para Bruxelas pouco antes da captura da rainha.
Mas Magali Teisseire considera um min�sculo anel com monograma como a pe�a de maior destaque da cole��o hist�rica.
"Ele possui as letras MA em diamantes e, dentro, h� uma mecha dos cabelos de Maria Antonieta", explica ela. "� uma pe�a incrivelmente �ntima e um anel que ela usou com muita frequ�ncia."
"Eu me lembro de perguntar ao especialista que avaliou as joias quanto essa rara pe�a poderia render", ela conta. "A resposta foi: muito. A estimativa era de 8 a 10 mil francos su��os [R$ 44,5 a 55,5 mil] e n�s a vendemos por 50 vezes este valor."
8. O diamante de ‘Bonequinha de Luxo’

O diamante singular ficou famoso em 1961 pelas fotos de publicidade do filme %u2018Bonequinha de Luxo%u2019, com Audrey Hepburn
Getty ImagesComprado nos anos 1870 por Charles Lewis Tiffany, fundador da joalheria americana Tiffany & Co., a pedra ficou famosa quando Audrey Hepburn a usou nas fotos publicit�rias do filme Bonequinha de Luxo, de 1961. Este diamante amarelo �nico, visualmente espetacular e culturalmente adorado, tem um passado problem�tico.
A gema de 128,54 quilates, at� hoje, s� foi usada por quatro mulheres: a socialite Mary Whitehouse, Hepburn (que a usou no colar Ribbon Rosette do joalheiro da Tiffany Jean Schlumberger), Lady Gaga e Beyonc�. As duas �ltimas usaram a joia em um contexto atualizado: um colar de 2012 com diamantes brancos que somavam 100 quilates de pedras.
Mas o ar de exclusividade do magn�fico diamante trouxe com ele a controv�rsia das suas origens muito mais obscuras.
O diamante foi desenterrado em 1877 na mina de Kimberley, na �frica do Sul. A mina era conhecida pelas condi��es assustadoras que os trabalhadores negros eram for�ados a enfrentar e pelos baix�ssimos sal�rios durante o regime colonial brit�nico.
Em uma coluna publicada no jornal The Washington Post em 2021, a escritora Karen Attiah defende que, embora a express�o “diamante de sangue” designe normalmente “recursos usados por mil�cias perigosas e senhores da guerra para financiar suas opera��es”, essa denomina��o deveria ser estendida para incluir diamantes como este, em reconhecimento �s “milhares de vidas africanas perdidas e comunidades destru�das na corrida colonial para controlar os recursos do continente”.
9. A coroa de safiras e diamantes da rainha Vit�ria
Um dos tesouros mais simb�licos da cole��o de joias ilustres do Museu Victoria & Albert � o que Helen Molesworth descreve como uma "coroa de safiras e diamantes bela, mas compacta".
O pr�ncipe Albert a desenhou para a rainha Vit�ria no ano em que eles se casaram (1840). Sua elabora��o esteve a cargo de Joseph Kitching, da joalheria Kitching e Abud, de Londres. A coroa foi um dos pertences mais preciosos que Vit�ria teve ao longo da vida.
"Ela usou a famosa tiara como c�rculo fechado em volta do coque quando jovem e, mais tarde, no luto, no seu v�u de vi�va - claramente, uma forma para que ela mantivesse seu amado Albert por perto", explica Molesworth.
Ela destaca que safiras s�o gemas particularmente emblem�ticas para a fam�lia real brit�nica. Tudo come�ou com os desenhos de Albert para Vit�ria, at� chegar ao anel de noivado de Diana.
"Elas simbolizam o azul da realeza, al�m da f� e da verdade e, por isso, s�o ideais para casamentos", afirma Molesworth.
Afinal, essa gema com profundo significado faz o melhor que as joias podem fazer, segundo ela: "cont�m um sinal p�blico e um significado pessoal".
10. O colar de diamantes de Napole�o

O delicado colar de diamantes que Napole�o deu de presente � sua segunda esposa, Maria Lu�sa, continha originalmente 234 diamantes
SmithsonianO hist�rico colar de diamantes de Napole�o foi um presente do imperador franc�s para sua segunda esposa, Maria Lu�sa da �ustria, quando nasceu seu filho, Napole�o 2º, Imperador de Roma, em 1811.
O deslumbrante desenho de ouro e prata foi concebido pela Etienne Nit�t and Sons, de Paris. Segundo o Smithsonian, o colar continha originalmente 234 diamantes: 28 diamantes antigos lapidados em minas, nove pedras em forma de pera e 10 briolettes, al�m de diversas gemas menores.
"Todas as pedras foram extra�das na �ndia ou no Brasil, de onde vinham os melhores diamantes naquela �poca", afirma Hiscox sobre o aspecto magn�tico do colar. "Eles t�m essa qualidade extraordinariamente l�mpida, como �gua."
Ap�s a queda de Napole�o, Maria Lu�sa - da casa de Habsburgo - e suas muitas joias voltaram para sua cidade de origem, Viena. E, ap�s a morte dela, o colar passou para sua cunhada, a arquiduquesa Sofia da �ustria.
Sofia decidiu reduzi-lo, removendo duas pedras que foram transformadas em brincos, cujo paradeiro atual � desconhecido. J� o colar permaneceu na fam�lia at� 1948, quando foi vendido - primeiro, para um colecionador franc�s, depois para a empres�ria norte-americana Marjorie Merriweather Post, que o doou ao Smithsonian em 1962.
No museu, ele continua sendo reverenciado, segundo Hiscox, como "uma das pe�as mais espetaculares do [seu] tempo".
Leia a vers�o original desta reportagem (em ingl�s) no site BBC Culture.
Este texto foi publicado em https://www.bbc.com/portuguese/articles/crgey00y1ezo
*Para comentar, fa�a seu login ou assine