(none) || (none)
UAI
Publicidade

Estado de Minas PREOCUPA��O E D�VIDAS

A surpreendente queda de criatividade em adolescentes do mundo detectada pela OCDE

Pesquisa em dez cidades do mundo aponta que habilidades sociais consideradas importantes para formar cidad�os e profissionais est�o menos presentes em jovens de 15 anos do que em crian�as de 10 anos.


15/11/2021 19:42 - atualizado 15/11/2021 23:35


Adolescentes em sala de aula
Em dez cidades do mundo estudadas pela OCDE, adolescentes demonstraram menos habilidades socioemocionais do que crian�as de 10 anos (foto: Getty Images)

O que faz com que adolescentes de 15 anos de diferentes cidades do mundo se achem menos criativos, curiosos, persistentes e respons�veis do que crian�as de 10 anos? E quais podem ser as consequ�ncias disso para seu futuro como cidad�os e profissionais?

Esses temas permeiam um relat�rio recente da OCDE (Organiza��o para a Coopera��o e Desenvolvimento Econ�mico) sobre essas e outras habilidades socioemocionais, que a entidade diz considerar cruciais para o desenvolvimento presente e futuro de crian�as e jovens em idade escolar - e t�o importantes de serem estimuladas quanto disciplinas como ci�ncias ou matem�tica.

Para mensurar essas habilidades globalmente pela primeira vez, a OCDE realizou uma pesquisa em dez cidades: Bogot� e Manizales (Col�mbia), Daegu (Coreia do Sul), Helsinque (Finl�ndia), Houston (EUA), Istambul (Turquia), Moscou (R�ssia), Ottawa (Canad�), Sintra (Portugal) e Suzhou (China).

Foram aplicados question�rios em estudantes de 10 anos e de 15 anos, a respeito de seus comportamentos, atitudes e prefer�ncias, para avaliar se eles enxergavam em si mesmos um conjunto de 15 habilidades socioemocionais: desde responsabilidade e curiosidade at� persist�ncia, resist�ncia ao estresse, coopera��o, toler�ncia, sociabilidade, autocontrole e criatividade.

Depois, a OCDE entrevistou os pais e professores desses alunos, para ver se a forma como as crian�as viam a si pr�prias era parecida � forma como elas eram vistas pelos adultos - o que de fato ocorreu na maioria dos casos.

E o que chamou a aten��o dos pesquisadores � que, de modo geral, jovens de 15 anos pareciam ter (segundo sua pr�pria vis�o e a dos adultos) quase todas as habilidades socioemocionais muito menos desenvolvidas, em compara��o com as crian�as de dez anos.

Ou seja, aparentemente h� uma queda significativa nessas habilidades � medida que as crian�as crescem e entram na adolesc�ncia.

Essa queda foi mais pronunciada em meninas na maioria das habilidades analisadas - se por um lado as garotas demonstraram mais empatia, esp�rito de coopera��o e responsabilidade do que os meninos, estes reportaram mais regula��o emocional, sociabilidade e energia do que elas.

Por fim, os estudantes de n�veis socioecon�micos mais altos manifestaram, na m�dia, mais habilidades socioemocionais do que os jovens mais pobres, em todas as cidades participantes do estudo.

"Essa queda (entre as idades de 10 e 15 anos) fica muito clara quanto se trata da criatividade, que aparece em n�veis muito mais baixos entre os jovens de 15 anos", afirmou o diretor de educa��o da OCDE, Andreas Schleicher, durante um semin�rio virtual realizado pelo Centro Nacional de Educa��o e Economia dos EUA (NCEE na sigla em ingl�s) em 27 de outubro.

"Pode ser que esses jovens estejam mais inseguros e constrangidos (do que as crian�as de 10 anos), mas pode ser tamb�m que nossos sistemas educacionais n�o estejam incentivando a criatividade dos jovens."

Schleicher ressaltou o valor que essas habilidades emocionais t�m para o mercado profissional do futuro e para a cidadania:

"Sabemos o quanto a curiosidade e a criatividade s�o importantes no mundo em que vivemos. A capacidade de criar � o que nos diferencia da Intelig�ncia Artificial dos computadores."

Al�m disso, disse ele, "a criatividade n�o � algo isolado: os alunos mais criativos tamb�m exibem n�veis muito maiores de empatia, toler�ncia e responsabilidade."

Embora essa edi��o da pesquisa da OCDE n�o tenha sido realizada no Brasil, pesquisadores do tema no pa�s observam um cen�rio semelhante por aqui.


Sala de aula com adolescentes
Autopercep��o sobre criatividade e curiosidade acaba impactando as aspira��es futuras dos jovens, diz diretor da OCDE (foto: Getty Images)

Um exemplo disso vem de uma pesquisa de habilidades socioemocionais feita em novembro de 2019 pelo Instituto Ayrton Senna com 110,2 mil estudantes da rede estadual de ensino de S�o Paulo, divulgada em maio deste ano.

Os alunos do 9° ano do ensino fundamental (que costumam ter por volta de 14 e 15 anos) se perceberam como menos desenvolvidos na maior parte das habilidades estudadas - divididas em cinco grupos, que s�o amabilidade, autogest�o, engajamento com os outros, abertura ao novo e resili�ncia emocional -, em compara��o com alunos do 5° ano (crian�as de 10 anos, mais ou menos) ou mesmo com alunos mais velhos, do �ltimo ano do ensino m�dio.

"Chamou bastante nossa aten��o a queda de confian�a entre os adolescentes", diz � BBC News Brasil Gisele Alves, especialista do Instituto Ayrton Senna. Ela destaca o quanto isso pode afetar o aprendizado, por exemplo, de disciplinas como matem�tica: "Ser cerceado ao cometer erros (em exerc�cios pode provocar) essa baixa na autoconfian�a."

As mudan�as vividas na adolesc�ncia

Durante o semin�rio do NCEE, palestrantes ressaltaram que a adolesc�ncia � um per�odo de grande transforma��o emocional e f�sica dos jovens.

Susan Rivers, pesquisadora de habilidades socioemocionais nos EUA, questionou se as conclus�es da OCDE n�o estariam deixando de levar em conta "o papel da puberdade e do crescimento cerebral ocorridos durante a adolesc�ncia, que � tamb�m uma �poca magn�fica, rica e desafiadora, ent�o n�o surpreende que jovens precisem de habilidades mais fortes para navegar por essas �guas".

Essa mesma observa��o � levantada por pesquisadores brasileiros.

"As crian�as t�m um tipo de demanda para suas habilidades socioemocionais, e da� chega a adolesc�ncia e muda tudo", explica Ricardo Primi, pesquisador do laborat�rio de pol�ticas e pr�ticas educacionais do Instituto Ayrton Senna (EduLab21).

Ocorre um "turbilh�o emocional" que coloca essas habilidades em xeque na adolesc�ncia, fazendo com que os jovens vejam a si mesmos como menos capacitados, agrega Primi.

No semin�rio, Schleicher concordou que esses fatores s�o relevantes. Mas ele argumenta que, mesmo que esse decl�nio de criatividade seja uma mera autopercep��o, o que realmente importa � o impacto que isso vai ter nas expectativas desses jovens sobre seu pr�prio futuro.

"Porque se um jovem de 15 anos se percebe como menos criativo, ou se uma menina de 15 anos se enxerga como menos criativa do que os meninos, isso vai influenciar a escolha que cada um deles far�; vai influenciar a carreira �s quais aspiram", disse Schleicher.


Alunos em escola
Desenvolver habilidades com toler�ncia, criatividade, curiosidade, persist�ncia e coopera��o � considerado pela OCDE crucial para formar cidad�os e profissionais do futuro (foto: BBC)

"A forma como eu me vejo tem muita influ�ncia no meu desenvolvimento, ent�o o papel dos adultos � ajudar nesse per�odo, abrir portas para os jovens, em vez de deixar que elas se fechem em decorr�ncia dessa autopercep��o."

'Armas contra as maiores amea�as do nosso tempo'

Em seu relat�rio, a OCDE argumenta que "sucesso na educa��o atual n�o � o desenvolvimento cognitivo, mas de car�ter", e questiona se, � medida que as crian�as crescem, as escolas n�o est�o reduzindo o espa�o para esse desenvolvimento.

"Trata-se de curiosidade - abrir mentes -, compaix�o - abrir cora��es - e coragem - mobilizar nossos recursos cognitivos, sociais e emocionais a agirem", diz o texto.

"Essas qualidades, chamadas de habilidades sociais e emocionais, tamb�m s�o armas contra as maiores amea�as do nosso tempo: a ignor�ncia - que � a mente fechada -, o �dio - o cora��o fechado -, e o medo, que � o inimigo da a��o."

Outro ponto importante � que, segundo a pesquisa da OCDE, alunos com habilidades sociais e emocionais agu�adas tendem a se sair melhor academicamente: "Ser curioso intelectualmente e persistente s�o as habilidades mais fortemente relacionadas a (boas) notas escolares, tanto para jovens de 10 quanto de 15 anos em leitura, matem�tica e artes".

Para Andreas Schleicher, essas habilidades precisam ser ativamente (e intencionalmente) desenvolvidas nas crian�as e adolescentes, assim como fazemos com o conhecimento tradicional de matem�tica, por exemplo.

E esse � o grande desafio das escolas.

No semin�rio, a pesquisadora Susan Rivers destacou que "j� existe um grande fardo sobre as redes de ensino e sobre os educadores", ao mesmo tempo em que falta apoio institucional "para que crian�as, professores e as pr�prias fam�lias consigam incentivar e nutrir essas habilidades" nos jovens.

Na vis�o de Schleicher, talvez seja preciso redesenhar curr�culos escolares, dando mais protagonismo ao desenvolvimento dessas caracter�sticas positivas.


Crianças em aula de artes
Aulas de arte e esportes, que muitas vezes perdem espa�o no curr�culo escolar de adolescentes, foram apontadas como um importante incentivo �s habilidades socioemocionais (foto: BBC)

"Alguns curr�culos est�o sendo radicalmente redefinidos, como em Cingapura, n�o mais com disciplinas (como matem�tica e idiomas) tendo um papel central e as habilidades socioemocionais acompanhando por fora. (...) Quando voc� d� uma aula de educa��o f�sica em Cingapura, voc� n�o tem que pensar em como o esporte deixa os alunos mais atl�ticos, mas sim em como pode moldar seu car�ter, criar empatia e responsabilidade por si e pelos demais", afirmou o diretor de educa��o da OCDE.

Por sinal, o fato de aulas de esportes e artes muitas vezes perderem espa�o na grade curricular dos alunos adolescentes � considerado por Schleicher uma perda de oportunidades de desenvolverem-se habilidades �teis.

"Crian�as que participam de atividades art�sticas demonstram n�veis mais altos de criatividade e curiosidade, em todos os lugares estudados", afirmou.

"Voc� talvez ache que o tempo dedicado a esportes e artes � tempo em que os jovens n�o estar�o estudando ci�ncias, (...) mas os incentivos � curiosidade e � criatividade ajudam-nos a mais tarde se sa�rem melhor em ci�ncias."

Gisele Alves, do Instituto Ayrton Senna, ressalta, tamb�m, que "a escola � um lugar privilegiado para que essas habilidades sejam desenvolvidas de modo intencional, para explorar experi�ncias, provocar a pensar de forma nova e criar espa�os para a criatividade colaborativa".

Al�m disso, um ambiente escolar agrad�vel foi apontado no semin�rio do NCEE como crucial para permitir que a capacidade socioemocional possa florescer, sobretudo a empatia e o controle emocional.

A maioria dos alunos entrevistados nas dez cidades da pesquisa da OCDE disse gostar de sua escola. Mas causa preocupa��o que cerca de um quarto deles tenha dito que "n�o se sente pertencedor ao ambiente escolar, n�o faz amigos com facilidade e se sente solit�rio".


Crianças indo para a escola, na China
Crian�as indo para a escola, na China, um dos pa�ses participantes de estudo da OCDE; entidade sugere que habilidades socioemocionais sejam ativamente estimuladas (foto: Reuters)

Kimberly Schonert-Reichl, que estuda o tema na Universidade de Illinois em Chicago e que tamb�m foi palestrante do evento do NCEE, disse que suas pr�prias pesquisas mostram que professores ou alunos estressados acabam "contaminando-se" entre si com mais estresse e ansiedade, inibindo o desenvolvimento das habilidades emocionais.

"Quando os professores estavam estressados e com burnout, uma an�lise dos n�veis de cortisol (obtidos por amostras de saliva) dos alunos indicava que os estes tamb�m estavam sob estresse", disse ela.

Por fim, a OCDE destaca que as desigualdades sociais t�m um papel importante.

"Parece que estudantes de estratos sociais menos avantajados t�m mais desafios a superar e menos oportunidade e menos apoio para desenvolver essas habilidades", diz o relat�rio.

No Brasil, Ricardo Primi cita um estudo de 2016 sobre as compet�ncias socioemocionais na popula��o adulta que aponta que � justamente nas classes menos favorecidas economicamente que essas caracter�sticas positivas podem fazer mais diferen�a.

As pessoas que apresentaram mais capacidade de autogest�o (persist�ncia e organiza��o, por exemplo), de confian�a em seu potencial e de abertura ao novo tinham mais ferramentas para superar os obst�culos impostos pela pobreza e a baixa escolaridade.

Dessa forma, argumentam os especialistas, ensinar e incentivar essas compet�ncias desde cedo, na inf�ncia e na adolesc�ncia, ajudaria n�o apenas a melhorar o desempenho escolar dos jovens, como a prepar�-los para os desafios da vida adulta.

J� assistiu aos nossos novos v�deos no YouTube? Inscreva-se no nosso canal!


receba nossa newsletter

Comece o dia com as not�cias selecionadas pelo nosso editor

Cadastro realizado com sucesso!

*Para comentar, fa�a seu login ou assine

Publicidade

(none) || (none)