
O espelho da reda��o � a vers�o digitalizada do texto escrito pelos candidatos durante o exame. O tema da reda��o na �ltima prova foi "Desafios para a valoriza��o de comunidades e povos tradicionais no Brasil", na aplica��o regular. Na reaplica��o, o tema foi "Medidas para o enfrentamento da recorr�ncia da inseguran�a alimentar no Brasil".
Para atingir a nota m�xima, o candidato deve atender a cinco compet�ncias que servir�o de crit�rio de avalia��o. A reda��o tem o valor de 1000 pontos, e cada compet�ncia vale 200 pontos.
As compet�ncias que guiam a pontua��o s�o as seguintes:
- Compet�ncia 1 - Demonstrar dom�nio da modalidade escrita formal da l�ngua portuguesa.
- Compet�ncia 2 - Compreender a proposta de reda��o e aplicar conceitos das v�rias �reas de conhecimento para desenvolver o tema, dentro dos limites estruturais do texto dissertativo-argumentativo em prosa.
- Compet�ncia 3 - Selecionar, relacionar, organizar e interpretar informa��es, fatos, opini�es e argumentos em defesa de um ponto de vista.
- Compet�ncia 4 - Demonstrar conhecimento dos mecanismos lingu�sticos necess�rios para a constru��o da argumenta��o.
- Compet�ncia 5 - Elaborar proposta de interven��o para o problema abordado, respeitando os direitos humanos.
Confira, na �ntegra, como foram os textos dos alunos que atingiram a pontua��o m�xima:
- Lu�s Felipe de Brito, de 24 anos
O poeta modernista Oswald de Andrade relata, em "Erro de Portugu�s", que, sob um dia de chuva, o �ndio foi vestido pelo portugu�s - uma den�ncia � acultura��o sofrida pelos povos ind�genas com a chegada dos europeus ao territ�rio brasileiro. Paralelamente, no Brasil atual, h� a manuten��o de pr�ticas prejudiciais n�o s� aos silv�colas, mas tamb�m aos demais povos e comunidades tradicionais, como os pescadores. Com efeito, atuam como desafios para a valoriza��o desses grupos a educa��o deficiente acerca do tema e a aus�ncia do desenvolvimento sustent�vel.
Diante desse cen�rio, existe a falta da promo��o de um ensino eficiente sobre as popula��es tradicionais. Sob esse vi�s, as escolas, ao abordarem tais povos por meio de um ponto de vista hist�rico euroc�ntrico, enra�zam no imagin�rio estudantil a imagem de abor�genes cujas viv�ncias s�o marcadas pela defasagem tecnol�gica. A exemplo disso, h� o senso comum de que os ind�genas s�o selvagens, alheios aos benef�cios do mundo moderno, o que, consequentemente, gera um preconceito, manifestado em indaga��es como “o �ndio tem ‘smartphone’ e est� lutando pela demarca��o de terras?” – ideia essa que deslegitima a luta dos silv�colas. Entretanto, de acordo com a Teoria do Indigenato, defendida pelo ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal, o direito dos povos tradicionais � terra � inato, sendo anterior, at�, � cria��o do Estado brasileiro. Dessa forma, por n�o ensinarem tal vis�o, os col�gios fometam a desvaloriza��o das comunidades tradicionais, mediante o desenvolvimento de um pensamento discriminat�rio nos alunos.
Al�m disso, outro desafio para o reconhecimento desses indiv�duos � a car�ncia do progresso sustent�vel. Nesse contexto, as entidades mercadol�gicas que atuam nas �reas ocupadas pelas popula��es tradicionais n�o necessariamente se preocupam com a sua preserva��o, comportamento no qual se valoriza o lucro em detrimento da harmonia entre a natureza e as comunidades em quest�o. � luz disso, h� o exemplo do que ocorre aos pescadores, cujos rios s�o contaminados devido ao garimpo ilegal, extremamente comum na Regi�o Amaz�nica. Por conseguinte, o povo que sobrevive a partir dessa atividade � prejudicado pelo que a Biologia chama de magnifica��o tr�fica, quando metais pesados acumulam-se nos animais de uma cadeia alimentar – provocando a morte de peixes e a infec��o de humanos por merc�rio. Assim, as ind�strias que usam os recursos naturais de forma irrespons�vel n�o promovem o desenvolvimento sustent�vel e agem de maneira nociva �s sociedades tradicionais.
Portanto, � essencial que o governo mitigue os desafios supracitados. Para isso, o Minist�rio da Educa��o – �rg�o respons�vel pelo estabelecimento da grade curricular das escolas – deve educar os alunos a respeito dos empecilhos � preserva��o dos ind�genas, por meio da inser��o da mat�ria “Estudos Indigenistas” no ensino b�sico, a fim de explicar o contexto dos silv�colas e desconstruir o preconceito. Ademais, o Minist�rio do Desenvolvimento – pasta instituidora da Pol�tica Nacional de Desenvolvimento Sustent�vel dos Povos e Comunidades Tradicionais – precisa fiscalizar as atividades econ�micas danosas �s sociedades vulner�veis, visando � valoriza��o de tais pessoas, mediante canais de den�ncias.
- Carina Moura, de 18 anos
Na segunda metade do s�culo XVIll, os escritores da primeira fase do Romantismo elevaram, de maneira completamente idealizada, o ind�gena e a natureza � condi��o de elementos personificadores da beleza e do poder da p�tria (quando, na verdade, os nativos continuaram v�timas de uma explora��o desumana no momento em quest�o). Sem desconsiderar o lapso temporal, hoje nota-se que, apesar das conquistas legais e jur�dicas alcan�adas, a exalta��o dos ind�genas e dos demais para tradicionais n�o se efetivou no cen�rio brasileiro e continua restrita �s prosas e poesias do movimento rom�ntico. A partir desse contexto, � imprescind�vel compreender os maiores desafios para uma plena valoriza��o das comunidades tradicionais no Brasil.
Nesse sentido, � ineg�vel que o escasso interesse pol�tico em assegurar o respeito � cultura e ao modo de vida das popula��es tradicionais frustra a valoriza��o desses indiv�duos. Isso acontece, porque, como j� estudado pelo soci�logo Boaventura de Sousa Santos, h� no Brasil uma esp�cie de “Colonialismo Insidioso”, isto �, a manuten��o de estruturas coloniais perversas de domina��o, que se disfar�a em meio a avan�os sociais, mas mant�m a camada mais vulner�vel da sociedade explorada e negligenciada. Nessa perspectiva, percebe-se o quanto a invisibiliza��o dos povos tradicionais � proposital e configura-se como uma estrat�gia pol�tica para permanecer no poder e fortalecer situa��es de desigualdade e injusti�a social. Dessa forma, tem-se um pa�s que, al�m de naturalizar as mais diversas invas�es possess�rias nos territ�rios dos povos tradicionais, n�o respeita a forma de viver e produzir dessas popula��es, o que comprova uma realidade destoante das produ��es liter�rias do Romantismo.
Ademais, � n�tido que as dificuldades de promover um verdadeiro reconhecimento e valoriza��o das comunidades tradicionais ascendem � medida que ra�zes preconceituosas s�o mantidas. De fato, com base nos estudos da fil�sofa Sueli Carneiro, � percept�vel a exist�ncia de um “Epistemic�dio Brasileiro” na sociedade atual; ou seja, h� uma nega��o da cultura e dos saberes de grupos subalternizados, a qual � ainda mais refor�ada por setores midi�ticos. Em outras palavras, apesar da complexidade de cultura dos povos tradicionais, o Brasil assume contornos monoculturais, um vez que inferioriza e “sepulta” os saberes de tais grupos, cujas rela��es e produ��es, baseadas na rela��o harm�nica com a natureza, destoam do modelo ocidental, capitalista e elitista. Logo, devido a um not�rio preconceito, os indiv�duos tradicionais permanecem exclu�dos socialmente e com seus direitos negligenciados.
Portanto, faz-se necess�rio superar os desafios que impedem a vilaniza��o das comunidades tradicionais no Brasil. Para isso, urge que o Poder Executivo - na esfera federal - amplie a verba destinada a �rg�os fiscalizadores que visem garantir os direitos dos povos tradicionais e a preserva��o de seus territ�rios e costumes. Tal a��o deve ser efetivada pela implanta��o de um Projeto Nacional de Valoriza��o dos Povos Tradicionais, de modo a articular, em conjunto com a m�dia socialmente engajada, palestras e debates que informem a import�ncia de tais grupos em todos os 5570 munic�pios brasileiros. Isso deve ser feito a fim de combater os preconceitos e promover o respeito �s popula��es tradicionais. Afinal, o intuito � que elas sejam t�o valorizadas quanto os �ndios na primeira fase da literatura rom�ntica.
- Maria Fernanda Simionato, de 21 anos
Sob esse vi�s, � v�lido destacar a fundamentabilidade dos povos tradicionais como detentores de pluralidade hist�rica e cultural, que proporciona a dissemina��o de uma vasta sabedoria na sociedade. Nesse sentido, o Instituto do Patrim�nio Hist�rico e Art�stico Nacional (Iphan) afirma as heran�as tradicionais desses grupos como constituintes do patrim�nio imaterial brasileiro. Dessa forma, sabe-se que a contribui��o desses indiv�duos para a forma��o intelectual do corpo social engloba pr�ticas de sustentabilidade, agricultura familiar e, inclusive, confere a eles uma participa��o efetiva na economia do pa�s. Assim, evidencia-se a extrema relev�ncia dessas comunidades para a manuten��o de conhecimentos diferenciados, bem como para a evolu��o da coletividade.
Entretanto, a falta de representantes pol�ticos eleitos para essa classe ocasiona a desvaloriza��o das suas necessidades sociais, que n�o s�o atendidas pelos demais legisladores. Nesse contexto, a Constitui��o Federal assegura direitos inalien�veis a todos os cidad�os brasileiros, abordando o dever de inclus�o de povos tradicionais nas decis�es p�blicas. Desse modo, compreende-se que a exist�ncia de obst�culos para o reconhecimento da import�ncia de popula��es nativas se relaciona � inefic�cia na incorpora��o de representantes que sejam, de fato, interessados na perpetua��o de saberes e t�cnicas ancestrais propagados para esses grupos. Sendo assim, comprova-se a ocorr�ncia de um grave problema no �mbito coletivo, o qual impede a garantia plena dos direitos b�sicos dessas pessoas.
Diante do exposto, denota-se a urg�ncia de propostas governamentais que alterem esse quadro. Portanto, cabe ao Estado – cuja fun��o principal � a prote��o dos direitos de seus cidad�os – a implanta��o de mudan�as no sistema eleitoral, por meio da cria��o de cotas r�gidas para a elei��o de pol�ticos oriundos de localidades nativas. Tal reestrutura��o ter� como finalidade a valoriza��o de povos tradicionais, reconhecendo a sua fundamentalidade na composi��o hist�rica e cultural da sociedade brasileira.
- Ana Alice Teixeira, de 18 anos
Com efeito, cabe destacar a exclus�o generalizada dos aspectos hist�ricos e culturais referentes �s etnias tradicionais dentro do sistema educacional como fator proeminente � perpetua��o da desvaloriza��o do grupo em quest�o, uma vez que, sendo a escola um dos n�cleos de integra��o social e informacional, a car�ncia de est�mulos ao conhecimento dos povos nativos provoca desconhecimento, e consequentemente, o cidad�o comum n�o tem base da informa��o acerca da indispensabilidade das comunidades origin�rias � forma��o do corpo social brasileiro. Nesse sentido, os versos “Nossos �ndios em algumas poucas mem�rias/Os de fora nos livros das nossas escolas”, da banda cearense Selvagens a Procura de Lei, ilustram a constru��o do ensino escolar pautada no esquecimento dessa minoria, de maneira a ampliar sua desvaloriza��o. Assim, � constat�vel a estreita rela��o entre as lacunas na educa��o e o fraco reconhecimento dos povos e das comunidades tradicionais.
Ademais, vale ressaltar o preconceito cultivado no ide�rio popular como empecilho � import�ncia atribu�da aos povos nativos, posto que, em decorr�ncia da baixa representatividade em ambientes escolares, como mencionado anteriormente, e do baixo respaldo cultural, marcado por estere�tipos limitantes e etnocentristas, isto �, que sup�em superioridade de uma etnia em rela��o � outra, h� forma��o de estigmas sobre pessoas dessas minorias e, por conseguinte, n�o h� o reconhecimento de suas ricas peculiaridade. Seguindo essa linha de racioc�nio, � poss�vel estabelecer conex�es entre a atualidade e a carta ao rei de Portugal escrita por Pero Vaz de Caminha, no momento da chegada dos portugueses ao Brasil, de forma que a perspectiva do navegador em rela��o ao ind�gena, permeada de suposta inoc�ncia, maleabilidade e passividade, pouco alterou-se na concep��o atual, evidenciando a prepot�ncia e a altivez que s�o implica��es da ignor�ncia e do silenciamento das fontes tradicionais. Ent�o, s�o necess�rias medidas de mitiga��o dessa problem�tica para o alcance do bem-estar da sociedade.
Em suma, entende-se o paralelo entre a desvaloriza��o dos povos nativos e o apagamento hist�rico destes, al�m do preconceito sobre este grupo, de modo a urgir atenua��o do cen�rio exposto. Para isso, cabe ao Minist�rio da Educa��o a amplia��o do ensino hist�rico e cultural do acervo tradicional, por meio da reformula��o das bases de assuntos abordados em sala de aula e da contrata��o de profissionais dessas etnias, com o objetivo de pluralizar as narrativas e evitar a exclus�o provocada por apenas uma hist�ria, em conson�ncia com o livro da escritora angolana Chimamanda Ngozie Adichie “O perigo da hist�ria �nica”. Tamb�m, � papel dos ve�culos culturais, como a m�dia, a representa��o ampla e fidedigna desses grupos, com o fito de minorar a vis�o estigmatizada do que foi constru�da. Com isso, o exterm�nio simb�lico denunciado por Krenak ser� minguado.
- Maria Eduarda Braz, de 18 anos
Na obra liter�ria “Triste fim de Policarpo Quaresma”, do autor brasileiro Lima Barreto, a figura do protagonista � constru�da a partir de um ideal ultranacionalista baseado na valoriza��o das quest�es do pr�prio pa�s. Analogamente, fora da fic��o, a sociedade brasileira n�o se comporta com Policarpo, visto que esta n�o se preocupa em valorizar a mem�ria dos povos tradicionais brasileiros, embora sejam t�o importantes para a identidade nacional. Nesse inter�m, entende-se a neglig�ncia estatal e a n�o efici�ncia da legisla��o como causas desse desafio.
A princ�pio, sobre esse assunto, vale ressaltar a import�ncia de um Estado ativo na resolu��o de quest�es sociais. Dessa forma, para o fil�sofo polon�s Zygmmunt Bauman, uma institui��o, quando posicionada de forma a ignorar sua fun��o original, � considerada em um estado de “zumbi”. Sob esse vi�s, o Estado brasileiro � an�logo a esse conceito, visto que, no que tange � valoriza��o e prote��o dessas comunidades, ele � ausente. Isso posto, tal postura negligente contribui para que os povos tradicionais n�o recebam o amparo estatal necess�rio, colocando em risco anos de hist�ria, de resist�ncia e de mem�ria de uma parcela fundamental da sociedade.
Outrossim, a aus�ncia de uma legisla��o que abrace a causa amea�a diretamente a sobreviv�ncia desses grupos. Nessa �tica, a obra liter�ria “Cidad�o de papel”, do jornalista Gilberto Dimenstein, apresenta um contexto social em que as garantias constitucionais est�o restritas apenas � parte escrita, sem ser colocada em pr�tica. Diante disso, essas comunidades originais tupiniquins podem ser consideradas de papel, tendo em vista a n�o efici�ncia das leis e projetos que garantem seus direitos. Assim, ao inv�s de promover a valoriza��o e o reconhecimento dessas popula��es, tais determina��es falhas contribuem para a manuten��o do sentimento de invisibilidade social desses povos.
Dessarte, � ineg�vel que, a respeito dos povos tradicionais, o Brasil possui entraves que precisam ser resolvidos. Logo, o Governo Federal, �rg�o de maior poder pol�tico nacional, deve, em parceria com o Minist�rio do Desenvolvimento Social, criar projetos de reconhecimento e que garantam os direitos desses grupos. Essa a��o ser� viabilizada por meio de campanhas estabelecidas pela Pol�tica Nacional de Desenvolvimento Sustent�vel dos Povos e Comunidades Tradicionais (PNPCT), de forma que a valoriza��o dessas popula��es torne-se cada vez mais uma pauta discutida na sociedade. Para isso, � fulcral a dissemina��o de informa��es acerca da import�ncia de proteger os territ�rios ind�genas e quilombolas, evidenciando a necessidade da n�o reivindica��o desses locais para fins economicos e privados. Dessa forma, ser� poss�vel formar uma sociedade ciente das causas sociais do pa�s e, principalmente, manter viva a mem�ria daqueles que essencialmente formaram a identidade nacional.