Livro escancara a rela��o entre trabalho e sofrimento
Fruto de intenso processo de pesquisa, que ouviu mais de 800 pessoas, obra debate causas e consequ�ncias do adoecimento ps�quico em decorr�ncia do trabalho
postado em 13/11/2019 14:10 / atualizado em 13/11/2019 14:10
Para 78% das pessoas, o trabalho contribui ou j� contribuiu para o seu sofrimento (foto: Sydney Sims/Unsplash)
"Escondo minha profiss�o porque o estigma do funcion�rio p�blico � de vagabundo ou corrupto"; "Cada entrevista (de emprego) que vou � a pior entrevista de todos os tempos"; "N�o discuto mais. J� cheguei ao ponto de parar no hospital por crise de estresse". Essas foram algumas das falas das mais de 800 pessoas ouvidas pelo estudo que deu origem ao livro Trabalho e sofrimento ps�quico: Hist�rias que contam essa hist�ria, de autoria dos professores e empres�rios Thatiana Cappellano e Bruno Carramenha, com ilustra��es de Andr� Dahmer, o criador da tirinha Malvados.
Dispon�vel gratuitamente para download em plataforma digital, a obra joga luz sobre a rela��o entre a atividade profissional e revela que, para 78% das pessoas, o trabalho contribui ou j� contribuiu para o seu sofrimento. Os resultados corroboram dados da Previd�ncia Social, que aponta que os epis�dios depressivos s�o a d�cima causa de concess�o de aux�lio-doen�a, com 43,3 mil casos.
Realizada pela 4CO, consultoria especializada em comunica��o e cultura organizacional, a pesquisa contou com a orienta��o te�rico-metodol�gica de Ruy Braga, chefe do departamento de sociologia da Universidade de S�o Paulo (USP) e o maior estudioso das rela��es de trabalho no Brasil, que tamb�m � prefaciador do livro.
� um livro essencial nos dias de hoje. Mais do que um triste relato, como destaca os autores, � uma forma de abrir a discuss�o em cima de fatos e dados s�rios, relevantes e reais. Trabalhadores desalentados, desempregados ou afastados por doen�as ps�quicas s�o um retrato perverso do mercado de trabalho.
No livro, os autores discorrem sobre o resultado do que chamam de "Cinco achados" sobre a rela��o com o trabalho: o trabalho � sempre viol�ncia; o mercado n�o sabe o que quer; o sofrimento vem de cima; renda importa, acesso � sa�de escraviza e o �cio liberta; e O (n�o) futuro do (n�o) trabalho. Diante disso, a��es, tomadas de atitude, ter o assunto em pauta mostra-se urgente.
Os autores Bruno Carramenha e Thatiana Cappellano dizem que os resultados corroboram dados da Previd�ncia Social, que aponta a depress�o como a 10� causa de concess�o de aux�lio-doen�a (foto: Haikai/Divulga��o)
Revelando como frustra��es, ang�stias e medos que se manifestam no contexto do trabalho acabam por deteriorar a sa�de ps�quica das pessoas, os resultados da pesquisa s�o apresentados em cinco achados:
1 – O trabalho � sempre viol�ncia
Neste achado, debatem-se as manifesta��es de viol�ncia que o trabalho apresenta �s pessoas desde a inf�ncia: do trabalho que afasta pais e filhos e mina relacionamentos �s cobran�as por arrumar um emprego ou abusos pela condi��o profissional.
2 – O mercado n�o sabe o que quer
O segundo achado explora uma incoer�ncia que, internamente, nas organiza��es, se manifesta de maneira muito semelhante nos processos de promo��o, sempre percebidos como fraudulentos ou algo de fachada.
3 – O sofrimento vem de cima
Aqui, fala-se sobre chefes que assediam, mas tamb�m muito sobre aqueles que simplesmente s�o omissos, mesmo frente a casos concretos de adoecimento ps�quico. O n�mero de den�ncias por ass�dio moral protocoladas no Minist�rio P�blico do Trabalho corrobora a fala dos entrevistados. Enquanto estes se consideram os "salvadores da p�tria", suas equipes os enxergam como imaturos e pouco preparados para os cargos de lideran�a. Mesmo para os trabalhadores que n�o t�m, hoje, chefe, essa figura aparece discursivamente, em refer�ncia a uma experi�ncia passada ou sobre algum parente ou conhecido.
4 – Renda importa, acesso � sa�de escraviza e o �cio liberta
A maior parte dos entrevistados afirmou concordar com condi��es degradantes de trabalho para garantir sua renda, em especial, para garantir o benef�cio do seguro-sa�de, no caso dos trabalhadores com v�nculo empregat�cio formal. Ao mesmo tempo, pessoas que usufruem de tempo livre (seja pela desocupa��o ou jornada flex�vel) t�m outra perspectiva em rela��o ao trabalho.
5 – O (n�o) futuro do (n�o) trabalho
O quinto e �ltimo achado da pesquisa trata da aus�ncia de consci�ncia e reflex�o acerca do impacto da perda de prote��o social e de mudan�as na configura��o do trabalho tal qual o conhecemos, decorrentes da automa��o e de outras tecnologias.
As escutas da pesquisa – realizadas em formato de focus group e de entrevistas individuais – e o question�rio que trouxe resultados quantitativos confirmam os achados que a 4CO encontra em campo h� mais de 10 anos de atua��o: o adoecimento (mental e f�sico) das pessoas em decorr�ncia do trabalho – em qualquer regime que seja.
Salta aos olhos o fato de o sofrimento aparecer com maior intensidade entre os empregados formais (aqueles com registro em carteira) e, como n�o � privil�gio deste tema, ser maisgrave entre mulheres negras.
"O recado � claro: o trabalho est� adoecendo e matando as pessoas. Mas a interpreta��o desse cen�rio n�o � simples. H�, claro, toda uma quest�o social de perda de prote��o social e de uma constru��o discursiva a respeito do empreendedorismo que se casam perfeitamente neste momento. Mas aos dirigentes das empresas fica um alerta: nenhuma organiza��o ser� capaz de transformar seus neg�cios neste momento de in�cio da quarta revolu��o industrial, com um time adoecido e que trabalha apenas pelo acesso ao benef�cio do seguro-sa�de”, afirma Thatiana Cappellano, s�cia da 4CO.
A idealiza��o do empreendedorismo como a t�bua de salva��o na busca do equil�brio entre as frentes profissional e pessoal tamb�m aparece de forma bastante contundente na publica��o.
"O livro � um chamado � sociedade para refletir sobre o que pode ser feito, individual e coletivamente, para transformar tantas hist�rias de sofrimento. Lan�amos o livro como um convite para uma discuss�o urgente, que interessa a todos", afirma Bruno Carramenha, s�cio da 4CO.
Sintomas do trabalho
Na pesquisa, os autores observararam que praticamente todos os sintomas se agravaram (s�o mais sentidos no presente do que no passado), com exce��o do uso de drogas, do abuso de bebidas alc�olicas e da s�ndrome do p�nico.
O ranking dos sintomas sentidos pelos respondentes se desenha da seguinte forma:
– Estresse: 76%
– Dor nas costas/tens�o: 75%
– Ansiedade: 75%
– Des�nimo: 65%
– S�ndrome do "Fant�stico" (des�nimo no domingo � noite): 53%
– Ins�nia: 46%
– Dor de est�mago/Gastrite: 43%
– Depress�o: 41%
– Enxaqueca: 35%
– Problemas de libido/desejo sexual: 30%
– Transtorno alimentares: 25%
– Uso de rem�dios controlados: 22%
Servi�o
O livro � gr�tis em plataforma digital. Basta fazer o download (foto: Haikai/Divulga��o)
Livro: Trabalho e sofrimento ps�quico: Hist�rias que contam essa hist�ria