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Estado de Minas

Projeto de media��o de conflitos quebra barreiras e preconceitos em escolas

A ideia melhora conviv�ncia entre alunos de escola do ensino fundamental


postado em 16/06/2014 00:12 / atualizado em 16/06/2014 07:35

Gabriela mediou discussão entre Alice e Izabelle(foto: Beto Magalhaes/EM/D.A Press)
Gabriela mediou discuss�o entre Alice e Izabelle (foto: Beto Magalhaes/EM/D.A Press)

Um aluno p�e o p� e o outro trope�a. O tombo � o estopim para a briga. Professores tentam apartar e usam o di�logo. Na conversa sincera, o menino agredido faz uma revela��o: o que mais doeu n�o foi a queda, mas o fato de ela ter sido causada pelo melhor amigo dele. Quem deu in�cio a tudo se surpreende ainda mais e, quase incr�dulo, pede perd�o: “Poxa, eu sou seu melhor amigo? Eu n�o sabia. Bem, na verdade, pus o p� de prop�sito. Desculpe-me mesmo”. Palavras ditas, amizade selada. O caso � real e ocorreu entre estudantes do 5º ano do ensino fundamental do Centro Pedag�gico da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Na escola, a meninada tem experimentado um jeito diferente de resolver brigas entre colegas, casos de bullying e desacertos por meio da media��o de conflitos, que saiu do Judici�rio para alcan�ar tamb�m a sala de aula.

Rita Andrea Guimar�es de Carvalho Pereira � psicanalista. Fl�via Resende � advogada e professora de media��o. Alexandre Pimenta � documentarista e jornalista. Beatriz Goulart � psic�loga. Juntos, os quatro coordenadores do projeto quebraram barreiras, preconceitos e a desconfian�a de alunos e professores para inovar na maneira de lidar com conflitos no ambiente escolar. A iniciativa surgiu a partir do mestrado que Rita faz em Buenos Aires. Na capital da Argentina, a media��o � rotina nas escolas p�blicas. “Estamos acostumados com esse recurso, mas sendo usado entre adultos ou entre os adultos e os menores. A ideia � deixar o pequeno com o pequeno”, diz.

No col�gio, as conversas s�o conduzidas da mesma forma que no Judici�rio e t�m a fun��o de resolver problemas diversos, de brigas entre colegas at� mudan�as no card�pio das refei��es. O projeto come�ou com um grupo de 20 alunos e completa um ano este m�s. � uma turminha bem agitada, mas que hoje � exemplo para a escola inteira. Afinal, ningu�m melhor que os causadores de problemas para apontar a melhor maneira de solucion�-los.

O primeiro passo foi fazer os alunos entenderem que eles tinham algo positivo e precisavam p�r isso � mostra. Tr�s semanas depois, o grupo j� estava gastando o hor�rio de almo�o – eles estudam em tempo integral – com a limpeza da sala para receber a equipe de coordenadores da media��o. A escola proibiu a tarefa, por isso, o novo desafio foi entender os motivos daquele n�o. “Decidimos trabalhar limites, leis e combinados. Foi a virada de conceito da norma para o entendimento”, diz Rita.

Como bons meninos sapecas, a comida era reclama��o geral do grupo, que queria, como toda crian�a dessa idade, substituir as refei��es saud�veis pelas guloseimas. Eles tiveram a iniciativa de chamar os colegas e fazer uma pesquisa para comprovar que o desagrado era geral, mas se surpreenderam ao constatar que nem todos pensavam do mesmo modo. Mas n�o desistiram e usaram a preciosa t�cnica da negocia��o para mudar os rumos daquela rotina.

A nutricionista Alcione Aguiar Souza foi chamada � mesa, ouviu as demandas e apresentou a lei de controle do colesterol para explicar a escolha do menu. O di�logo rendeu frutos e novo card�pio foi constru�do em conjunto. Depois disso, sempre com dieta balanceada, a garotada j� se deliciou com carne de hamb�rguer, batata frita e bolo de chocolate. Mas, como toda boa media��o, para conseguir algo � preciso ceder de outro lado e, em se tratando de alimenta��o, o combinado � n�o desperdi�ar.

PR�TICA

Em v�rias ocasi�es, a media��o � sugerida de pronto pelos pr�prios alunos, que incorporaram a pr�tica ao cotidiano. Durante a visita do Estado de Minas, as amigas Izabelle F�lix Utsch, Alice Cota Marques e Gabriella de Souza Silva, todas de 10 anos, protagonizaram uma cena t�pica. Izabelle e Alice discutiam, quando outro colega entrou no caso, num disse que disse danado. Coube a Gabriella mediar e explicar, individualmente, o que cada um falou para resolver o mal-entendido e deixar tudo �s claras. “Eu sa� de perto para n�o dar mais motivo de briga”, contou Alice. “Foi a melhor coisa que voc� fez para n�o arrumar mais confus�o”, acrescentou. No fim, todos se entenderam e o que come�ou com briga terminou em brincadeira em uma partida de peteca.

A menina Laura Pedroso Silva, tamb�m de 10, j� aplicou o m�todo em casa, para apartar uma discuss�o entre o pai e a m�e. Ele guardou a l�mina de barbear em local inapropriado e a garota, desavisada, cortou a m�o. A m�e n�o gostou do resultado. “Eu disse a ela: ‘N�o foi culpa do papai. Humanus passiva errus (do latim, os homens s�o passivos de erro’”, contou, numa naturalidade de causar inveja.

Uma bola furada foi motivo de briga s�ria no passado entre Alice e Iami Nair Rodrigues Avelino, de 10. Hoje, elas s�o grandes amigas. Iami aprendeu direitinho o sentido da nova metodologia e ensina o que � necess�rio para ser um mediador de primeira: “Se souber que as pessoas s�o diferentes de voc� e se respeit�-las, vai poder mediar. Com preconceito, n�o se consegue resolver problemas”.

Coopera��o
na sala de aula


Toda segunda-feira, os alunos selecionados para a media��o t�m forma��o durante uma hora e meia. Em cada fim de aula, fazem um jornal e um di�rio para deixar marcado por onde se deve recome�ar na semana seguinte. Se o embate � pela libera��o do uso de aparelhos eletr�nicos, que eles sejam usados ent�o para melhorar a aula. Um fotografa, outro filma e, assim, dentro do processo de aprendizagem, conquistaram o direito de usar seus equipamentos.

A advogada e professora de media��o Fl�via Resende alerta: a t�cnica � a abertura de um espa�o de responsabilidades para alunos e professores. “N�o significa que tudo pode ou que tudo est� liberado. Queremos construir normas que fa�am sentido e que eles compreendam. A media��o � pedag�gica em todos os sentidos.”

Media��o � sin�nimo de coopera��o. Na sala inaugurada na semana passada, quadros pintados por um dos meninos, o artista da turma, d� vida ao ambiente com mesa e cadeiras. Caio Augusto Gomes, de 10, sente os resultados: “Consigo resolver os conflitos conversando. Ainda perco o controle, mas tenho mais paci�ncia”. A garotada quer mesmo � deixar o lugar bonito. Alice vai levar almofadas. Kyvia Alvarenga Barbosa, de 11, se comprometeu a doar o tapete. E Laura levar� as flores.
O documentarista Alexandre Pimenta afirma que a ideia � dar a professores e alunos instrumentos para trabalhar uma quest�o que est� na ordem do dia: “Com tanta informa��o, os pais trabalhando o dia todo fora, o conflito � premente nas escolas e vai de processos de alunos contra professores at� formas graves de viol�ncia”.

A psic�loga do N�cleo de Atendimento e Integra��o Pedag�gica (NAE), do Centro Pedag�gico, concorda: “A escola assume cada vez mais o papel de transmitir valores, o que � certo ou errado. Antes, a mulher estava em casa e tinha condi��o de ficar atenta a isso. Agora, pela culpa da aus�ncia, os pais tendem a ceder mais e n�o impor limites”.

Professora de portugu�s do 1º ao 3º ano da escola, Fl�via Helena Pontes Carneiro se encantou pelo projeto, embora seus alunos n�o participem da media��o. Ela faz oficina de forma��o para aplicar a metodologia em sala de aula. “Isso deve fazer parte da cultura do professor, que tem de fazer media��o todos os dias, porque diariamente h� conflitos. Fa�o intuitivamente, mas quero fazer com t�cnica.”

O trabalho com essa turma terminar� em setembro para continuar com outros professores e crian�as. Para Fl�via Resende, numa sociedade em crise de valores � escolha de cada um decidir pelo fim do mundo ou abra�ar a oportunidade de faz�-lo melhor. “Entre os extremos de autoritarismo e falta de limites h� um sem-n�mero de possibilidades que podem ser constru�das por meio do di�logo, a maior ferramenta pol�tica que temos”.


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