Nas letras redondas, quase desenhadas em folha pautada, ocupando linha cheia, palavras de boa sorte e encorajamento para enfrentar, s�bado e domingo, os desafios do Exame Nacional do Ensino M�dio (Enem). Desejos de quem apenas come�a a dar os primeiros passos na escrita a quem vai se preparar para ganhar o mundo. �s v�speras da avalia��o mais importante do pa�s, cartas, algo quase esquecido na era do e-mail, foram o meio escolhido pelas crian�as do 1º ano do ensino fundamental do Col�gio Loyola, na Regi�o Centro-Sul de Belo Horizonte, para valorizar o esfor�o e quebrar a ansiedade dos alunos da 3ª s�rie do n�vel m�dio. Emo��o e carinho estiveram ontem � flor da pele de adolescentes e pequeninos, durante evento surpresa de entrega dos textos.
Eram pouco mais de 15h quando, em filas, as crian�as come�aram a entrar nas salas do 3º ano. Um bando de pequerruchos tomou conta da frente da lousa, causando um misto de surpresa e incredulidade no rosto dos estudantes. A maioria deles j� se conhecia desde o in�cio do ano, quando os alunos do da �ltima s�rie do m�dio “apadrinharam” as crian�as rec�m-chegadas, numa forma de mostrar que, naquele novo col�gio, elas n�o estariam sozinhas e teriam uma refer�ncia. Naquele momento, eles levaram fotos, cadernos e uniformes antigos para mostrar as mem�rias e trajet�ria na escola durante os 12 anos de Loyola. Ao longo do ano, os maiores participam ainda de v�rios eventos do infantil.
Ontem, os pap�is se inverteram e foi a vez da meninada cuidar de seus padrinhos. A professora explica o que est� prestes a ocorrer. Identifica os destinat�rios e, um a um, os pequenos se apresentam para entregar o canudo de papel. Rafaela Fenati, de 6 anos, desejou que seu padrinho tire boa nota no Enem. “Eles j� s�o vitoriosos”, disse.
Pedro Antunes Moreira, da mesma idade, fez votos de felicidade e boa sorte a Elisa Quaresma Ragone, de 17, candidata a uma vaga em direito. “Com essa carta, ela vai se sentir bem e fazer uma boa prova”, afirmou. Elisa, que tem outras duas afilhadas, B�rbara Maria da Cunha e Laura Fr�es Pereira, tamb�m de 6, fez jus ao carinho. Durante todo o ano, foi uma madrinha presente, com visitas frequentes ao pr�dio das crian�as e participa��o efetiva nas atividades delas. “Achei bacana essa iniciativa. � importante para eles, que se espelham na gente, e para n�s que estamos num ano t�o estressante.”
CUIDADO Para a coordenadora do 1º ano do ensino fundamental, Eduarda Quaresma Lannes, a atividade � momento para os estudantes relaxarem. “S�o duas situa��es extremas, de muita tens�o para os do �ltimo ano e de consolida��o da escrita para os pequenos. As crian�as escrevem cartas para que os maiores guardem a caminhada e os momentos que viveram aqui. Depois de serem acolhidos, � a vez deles de cuidar de quem est� saindo. � uma p�lula de incentivo para os jovens.”
Da sala de aula, a confraterniza��o foi direto para o p�tio, com direito a salgadinhos, doces e sucos. Hora de bate-papo e de brincadeiras entre os dois lados. O estudante Pedro Sartori, de 17, que est� de olho numa vaga em engenharia el�trica, ouviu com aten��o os conselhos de Ana Laura Batista, de 7: “Ele tem que ficar quieto durante a prova”. Para o jovem, um al�vio na tens�o nesta reta final: “� muito agrad�vel, principalmente neste momento complicado que enfrentamos”.
Marjorie Vieira, de 18, tamb�m candidata a uma cadeira no curso de direito, recebeu o carinho de Ana Lu�za Brito Furtado, de 6, e de Clara Siatti, de 7. “� muito boa essa intera��o com os pequenos, tanto para n�s quanto para eles. � um momento para desligar e ficar com crian�a realmente relaxa.”
Brincar e aliviar
Quebrar um estado de tens�o, vinculada ao estudo ininterrupto e a expectativas diversas, �s v�speras do Enem. Esse � um dos principais objetivos do encontro dos estudantes do 3º ano do ensino m�dio com os pequenos do 1º do n�vel fundamental. � ansiedade, mistura-se o medo e a certeza de que n�o h� mais tempo para aprendizado. “Quando o menino vem com a letra ainda torta, quem recebe a carta vai curtir a imperfei��o, o inacabado. Vai pensar: ‘Fiz meu melhor, agora est� na hora de desacelerar e ir para a prova”’, diz o coordenador da 3ª s�rie do ensino m�dio, Carlos Alberto de Freitas J�nior.
Ele afirma que a estrat�gia foi usada porque, diante do n�vel de estresse, n�o haveria resultado se ele ou algum convidado pedisse para os alunos diminu�rem o ritmo: “O menino diz: ‘Est� na hora de parar. vamos ali brincar comigo?’. A simplicidade da crian�a consegue esse efeito”’. Carlos Alberto caracteriza a situa��o como um lapso necess�rio, em que os estudantes usam uma informa��o positiva para pensar em outro assunto e, de certa forma, ter uma dose de “irresponsabilidade”, no melhor dos sentidos.
“A ansiedade � natural para quem � respons�vel. Fazemos isso h� cinco anos e vemos o resultado. Al�m disso, os pequenos n�o esquecem”. Para ele, a f�rmula � simples: “Os grandes ajudaram as crian�as a entrar no in�cio do ano. Agora, os pequenos os ajudam a sair”.