
Tr�s meses depois da morte misteriosa de dois brasileiros na Amaz�nia peruana, as investiga��es pouco avan�aram e os suspeitos de assassinato ainda n�o passam de suspeitos. O engenheiro mineiro M�rio Augusto Soares Bittencourt, de 61 anos, e o ge�logo paulista M�rio Gramani Guedes, de 57, desapareceram em 25 de julho, quando faziam estudos para a instala��o de uma usina hidrel�trica �s margens do Rio Mara�on, na regi�o de Pi�n, no Norte do pa�s. Eles foram encontrados mortos dois dias depois, com sinais de envenenamento. O local � palco de manifesta��es frequentes e at� violentas de moradores contr�rios � constru��o de usinas. Mas, diante do resultado inconclusivo dos exames toxicol�gicos feitos em Lima, uma comiss�o brasileira esteve recentemente no pa�s vizinho, a convite da embaixada brasileira, para cobrar empenho nas investiga��es, que tiveram prazo prorrogado. Nem mesmo o sigilo telef�nico dos celulares dos brasileiros tinham sido quebrados. Somente agora autoridades peruanas decidiram rastrear os �ltimos passos do ge�logo e do engenheiro.
Um dos elementos que causam estranheza � fam�lia do ge�logo M�rio Guedes � o fato de que a filha dele ligou para o celular do pai um dia depois da data em que ele teria morrido, segundo laudo cadav�rico, e um homem teria atendido o telefone. O aparelho n�o foi apreendido dentro do carro em que viajavam os brasileiros e somente foi entregue � pol�cia local dias depois, por um dos engenheiros peruanos que acompanhavam o grupo. Irm�o do ge�logo M�rio Guedes, Carlos conversou pessoalmente com o respons�vel pelo inqu�rito, Cesar Terrones, da Fiscal�a do distrito de Cumba, �rg�o que se assemelha ao Minist�rio P�blico. Segundo ele, s� agora a pol�cia vai identificar as liga��es feitas e recebidas pelos brasileiros, bem como os locais por onde eles podem ter passado.
“Eu ainda tenho esperan�as no bom senso dessa autoridade. Estive tamb�m com o m�dico legista que fez a necropsia dos corpos, mas ele sugeriu por diversas vezes que os dois tiveram morte s�bita e n�o tivemos uma boa impress�o. O exame toxicol�gico, que poderia comprovar o envenenamento, deu inconclusivo porque as amostras n�o foram armazenadas da forma correta, com refrigeramento, e s� foram encaminhadas para Lima nove dias depois. � claro que os tecidos estavam em avan�ado est�gio de decomposi��o. Mas chega a ser uma piada, um atentado contra a nossa intelig�ncia, dizer que duas pessoas experientes como eram tiveram morte s�bida ao mesmo tempo”, afirma Carlos Gramani Guedes.
O inqu�rito deve ser conclu�do at� 4 de dezembro, j� com o prazo ampliado. Ainda assim, a Fiscal�a pode solicitar mais 60 dias para as investiga��es. As autoridades peruanas solicitaram �s fam�lias das v�timas, via Itamaraty, um hist�rico m�dico completo. O documento ser� traduzido pelo pr�prio Itamaraty e encaminhado � Fiscal�a de Cumba. Os dois engenheiros peruanos que faziam parte do grupo de trabalho sobre a instala��o da hidrel�trica dever�o ser ouvidos novamente. Foram eles que indicaram os suspeitos e informaram os momentos em que os camponeses se encontraram com o grupo.
Um dos suspeitos, de acordo com as investiga��es, � Juan Zorrilla Bravo, l�der comunit�rio que participou de diversas manifesta��es contra usinas hidrel�tricas. Durante as buscas pelos brasileiros desaparecidos, ele desviou as equipes da pol�cia, indicando caminhos que levavam para longe de onde os corpos foram encontrados dias depois. Dono de uma barraca no in�cio da trilha, J�sus Sanch�z tamb�m � investigado por suposto envolvimento na morte. Amigo de Zorrilla, ele ofereceu �gua aos brasileiros no in�cio da caminhada. A pol�cia peruana chegou a fazer uma reconstitui��o, mas os dois negam as acusa��es.
VIOL�NCIA A viagem do grupo brasileiro ao Peru ocorreu h� cerca de tr�s semanas e a comiss�o p�de testemunhar como a situa��o � arriscada na regi�o. Abordados por milicianos armados, os integrantes precisaram de escolta policial e coletas � prova de balas para deixar o lugar. Um policial federal adido � Embaixada do Brasil no Peru acompanhou o irm�o do ge�logo e um advogado contratado pelo governo brasileiro para acompanhar a visita. De Bagu� Grande, cidade mais pr�xima de onde os brasileiros foram encontrados mortos e onde tiveram seus corpos examinados, o grupo seguiu para Lonya Grande, a tr�s horas de dist�ncia, j� na subida dos Andes.
“Numa estrada de terra, fomos parados por uma mil�cia. Quatro homens armados pediram dinheiro para que a gente pudesse passar. Depois, voltamos em viaturas policiais e com coletes � prova de balas. Ali, a vida n�o vale nada. A situa��o � muito prec�ria. Isso � outro indicativo de que h� um grande equ�voco na avalia��o de que eles morreram de causas naturais”, diz Carlos Gramani Guedes.
Entenda o caso
23 de julho
O engenheiro mineiro M�rio Augusto Soares Bittencourt, de 61 anos, e o ge�logo paulista M�rio Gramani Guedes, de 57 anos, desembarcaram em Lima e seguiram de avi�o para Chiclayo, no Norte do pa�s, e de l�, de carro, para Ja�n, a 600 quil�metros.
Eles foram fazer estudos de viabilidade para constru��o de uma usina hidrel�trica na regi�o da floresta amaz�nica peruana.
25 de julho
O trabalho de campo come�ou cedo. A dupla brasileira, um engenheiro e um ge�logo peruanos caminharam por uma estrada abandonada por cerca de duas horas e meia. Segundo o depoimento dos peruanos, Bittencourt sentiu dor no joelho e se sentou � beira da estrada.
Guedes e os colegas seguiram por um trecho de subida. Quando voltaram, meia hora depois, o engenheiro mineiro j� n�o estava mais l�. Guedes, ent�o, decidiu esperar no local pelos peruanos, que tentaram acesso por outra trilha para chegar ao Rio Mara�on.
Os peruanos contaram � pol�cia que retornaram uma hora depois e Guedes tamb�m n�o estava no local. Segundo eles, a impress�o foi de que os dois brasileiros teriam retornado para o carro e estacionado no in�cio da estrada, onde o motorista os aguardava.
De acordo com o inqu�rito peruano, os funcion�rios da SZ Engenharia s� perceberam o desaparecimento quando um outro colega, respons�vel pela log�stica, levou �gua aos pesquisadores e comentou que n�o havia cruzado com os brasileiros na estrada.
27 de julho
Os dois corpos foram encontrados pela pol�cia peruana �s 8h, a 100 metros da estrada principal, em �rea de cerrado. A dist�ncia entre os dois era de 200 metros. Nada foi roubado e n�o havia marcas de viol�ncia, segundo a pol�cia.
Segundo o engenheiro e o ge�logo peruanos, dois camponeses s�o investigados pela morte de Bittencourt e Guedes. Um deles, Juan Zorrilla Bravo, � l�der comunit�rio e participou de manifesta��es contra usinas hidrel�tricas. Ele teria atrapalhado as equipes de busca, conforme depoimento dos peruanos. O outro, J�sus Sanch�z, teria oferecido �gua aos brasileiros no in�cio da caminhada.
Os corpos foram examinados no Peru, mas n�o havia ind�cios de viol�ncia. A pedido das fam�lias, amostras foram trazidas para serem analisadas no Brasil. Na semana passada, autoridades peruanas fizeram reconstitui��o, com a participa��o de Zorrilla. Os acusados j� prestaram depoimento e negam envolvimento nas mortes.
31 de agosto
O Instituto M�dico-Legal (IML) de Bras�lia divulgou resultado das an�lises histopatol�gicas e do exame toxicol�gico, que n�o detectou nenhum tipo de veneno para os padr�es e dosagens pesquisados. Os testes foram feitos com pelo menos 10 tipos de veneno mais frequentes em casos de assassinato. Venenos de plantas e cobras, por exemplo, n�o foram testados.
1º DE SETEMBRO
O Instituto M�dico-Legal (IML) de Belo Horizonte confirmou oficialmente que o engenheiro mineiro n�o morreu de causas naturais. Os exames minuciosos, pedido exclusivo da fam�lia de Bittencourt, descartam outros tipos de morte violenta, mas n�o s�o conclusivos para an�lises toxicol�gicas.
Peritos do Setor de Antropologia testaram 816 subst�ncias e n�o encontraram elementos inorg�nicos comuns em envenenamentos, como medicamentos, estricnina, cianureto ou ars�nico. O corpo j� estava em est�gio avan�ado de decomposi��o.
Venenos org�nico – de ervas, r�pteis e anf�bios, por exemplo – n�o foram detectados, porque s�o subst�ncias que se desintegram com o corpo. Nenhuma mordida de cobra foi identificada.
Segundo o IML, duas hip�teses n�o puderam ser descartadas: a de envenenamento por subst�ncias org�nicas e de sufocamento.
16 de setembro
Os testes laboratoriais feitos em Lima teve resultado inconclusivo. Os exames de sangue tiveram resultados negativos para as subst�ncias investigadas, assim como das amostras de tecidos estudados – c�rebro, f�gado, ba�o, p�ncreas, cora��o, pulm�o e rim – porque as c�lulas j� estavam em decomposi��o.
Um advogado contratado pela Leme Engenharia enviou as roupas das v�timas para per�cia particular, que apontou sangue e v�mito, ind�cios de envenenamento.