
Os estudantes da Ufop s�o os que mais bebem entre os de 56 institui��es federais de ensino superior no pa�s, segundo pesquisa da Associa��o Nacional dos Dirigentes das Institui��es Federais de Ensino Superior. Em outubro, o levantamento revelou que 29,8% dos alunos da institui��o assumem consumir bebidas periodicamente ou sempre, mais que o dobro da m�dia nacional (14%). A bebedeira chega a ser premiada em eventos como a Festa do Baf�metro, onde ganha quem atingir o mais alto n�vel de embriaguez.
Apesar desses dados, o presidente da Refop, Luiz Philippe Albuquerque, nega que os universit�rios da cidade se excedam mais que os de outros lugares. “Aqui n�o se bebe mais. Talvez a galera ache bonito dizer que bebe. A pessoa se vangloria por beber mais que a outra”, acredita. Ele admite que o consumo de �lcool precisa diminuir. “Mas isso � no Brasil inteiro”, ressalta. “Hoje em dia, o incentivo para que o jovem beba � violento. A pr�pria m�dia mostra o cara que bebe como uma pessoa bem relacionada, que sabe conversar com mulheres, que consegue se dar bem”, avalia ele, que tem 22 anos e estuda direito na Ufop.
O rapaz mora na rep�blica federal Unidos por Acaso, no Bairro Bauxita, onde fica o c�mpus da Ufop. No processo de sele��o de novos moradores, cada rep�blica se baseia em crit�rios pr�prios. “Cada uma tem suas prioridades. Aqui em casa, damos mais valor ao estudo e ao trabalho. Ningu�m pode ficar � toa. J� outras casas d�o mais import�ncia ao conv�vio social”, explica Philippe.
Um dos “bichos” da Unidos por Acaso � Yutaro Nishi, de 19 anos, que morava em Jundia� (SP) antes de estudar economia na Ufop. “Aqui, n�o me senti pressionado a fazer nada que n�o quisesse. Nada, nada”, afirma o t�mido e quase sempre sorridente Yutaro, cujo cabelo foi raspado, como ocorre com todos os novatos. Ele est� gostando da vida na cidade hist�rica mineira e diz estar aprendendo a conviver com pessoas diferentes. “Em Jundia�, eu morava com minha m�e. Ficava o dia inteiro no computador. N�o lavava lou�a, n�o cozinhava, n�o fazia faxina. Minha rotina mudou bastante. Aqui, tudo � aprendizado.”
Assim como a maioria dos calouros em rep�blicas ouro-pretanas, o rapaz fica respons�vel por algumas tarefas dom�sticas, como fazer compras e faxina, p�r o lixo para fora, servir visitas e ser gar�om nas festas. Os moradores mais antigos atuam como administradores e gerem as finan�as.
Em algumas moradias, por�m, essa hierarquia � quase inexistente. � o caso da rep�blica particular feminina Favinho de Mel, localizada no Centro. “Cada uma cuida do seu quarto. Cada uma lava sua lou�a. Tamb�m dividimos as compras de casa”, relata uma das moradoras, Larissa Leite Morais, de 22, estudante de servi�o social na Ufop. Presidente da Associa��o das Rep�blicas Reunidas de Ouro Preto (Arrop) – integrada pelas 23 moradias particulares mais antigas na cidade –, Larissa admite que algumas das casas particulares aplicam trotes vexat�rios, mas acredita que sejam poucas. “Aqui em casa ningu�m � obrigado a fazer nada que n�o queira”, ressalta. Ela diz n�o ter not�cia de nenhum “bicho” que tenha sido pressionado a beber e destaca: “Em todo lugar h� excessos, isso n�o � exclusividade de Ouro Preto”.
Roupas de calouro na rua
Assim como Rafael e Marcos, William* sofreu para estudar durante as duas semanas em que “batalhou” uma vaga em uma rep�blica federal no Centro de Ouro Preto, em setembro de 2008. “Era imposs�vel. Nas vezes em que tentei ler alguma coisa, um dos veteranos dizia: ‘Que � isso, bich�o? Ainda estamos no primeiro m�s de aula. Larga isso e vem beber com a gente’”, conta. O novato se sentia for�ado a aceitar o convite para ir a festas. “Eu ia para agradar. Sabia que se n�o fosse receberia puni��es.” As penas inclu�am amarrar todas as roupas do calouro e estic�-las na rua, como um varal. William, que hoje tem 23 anos e paga R$ 300 de aluguel em uma pens�o, tamb�m teve suas roupas distribu�das por v�rias moradias e precisou beber para reav�-las.
As pr�ticas s�o antigas, a julgar pela hist�ria de um homem que se identifica apenas como Costa, que hoje tem 47 anos e vive em Nova Lima, na Grande BH. Ele morou em uma rep�blica federal por tr�s anos, de 1984 a 1987. As farras j� eram frequentes. “Nunca bebi, mas a press�o era constante. Eu era ridicularizado, chamado de fracote e outros apelidos depreciativos”, relata.
No entanto, a maior parte dos bichos acabava reproduzindo os excessos, n�o apenas com �lcool, mas tamb�m com maconha e outras drogas il�citas, segundo Costa. “Alguns colegas iam � aula b�bados ou drogados. Muitos passavam mal e nem conseguiam chegar ao banheiro para vomitar”, lembra. Os trotes tamb�m eram corriqueiros. “Alguns calouros eram acordados de madrugada com uma panela de �gua fria ou com cerveja sendo despejada na cabe�a.”
O porta-voz das moradias federais, o presidente da Associa��o dos Moradores de Rep�blicas Federais de Ouro Preto (Refop), Luiz Philippe Albuquerque, nega que os trotes ainda sejam praticados, j� que foram proibidos pelo Estatuto das Rep�blicas Federais desde 2010. Pr�ticas como o “vento”, por exemplo, teriam sido extintas. “Hoje, chamamos a aten��o do calouro de formas mais educativas”, afirma. “Por exemplo, se ele deixa a luz do quarto acesa, voc� pode pedir para o ‘bicho’ escrever uma reda��o sobre a import�ncia de economizar energia (el�trica) e pedir para ele ler em outra rep�blica.”
*Nomes fict�cios
Palavra de especialista
Valdir Campos: m�dico integrante da Comiss�o de Controle do Tabagismo, Alcoolismo e Outras Drogas da Associa��o M�dica de Minas Gerais
O �lcool � um depressor do sistema nervoso central, e quanto maior a ingest�o da subst�ncia de uma s� vez, mais prejudicado fica o c�rebro, que pode chegar ao ponto de ter uma pane. Esse � o momento em que a pessoa pode sofrer convuls�o e tamb�m correr o risco de se asfixiar com o pr�prio v�mito ou entrar em coma, devido �s altera��es no metabolismo e � diminui��o do n�vel de glicemia no organismo. Conforme o excesso, os dois quadros podem evoluir para uma parada cardiorrespirat�ria e, consequentemente, a morte da pessoa. Os adolescentes ficam mais suscet�veis a essa situa��o, pois o sistema nervoso central ainda est� em forma��o. Conforme o n�vel de alcoolemia vai aumentando na corrente sangu�nea, os efeitos v�o sendo produzidos: primeiro, a pessoa pode ficar um pouco mais tonta; em seguida, ela perde a coordena��o motora; logo depois, come�a a ver as coisas turvas. As etapas seguintes podem incluir desmaio, perda dos sentidos e da consci�ncia e parada respirat�ria.