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Estado de Minas BARULHO EM CIMA, EMBAIXO, DO LADO...

Como no filme O som ao redor, belo-horizontinos sofrem com ru�dos dos vizinhos

Em 2012, houve seis ocorr�ncias di�rias de perturba��o do sossego na Grande BH


postado em 26/01/2013 06:00 / atualizado em 26/01/2013 07:15

"Deus, conceda-me serenidade para aceitar as coisas que n�o posso modificar, coragem para modificar aquelas que posso e sabedoria para reconhecer a diferen�a" - Ora��o a que recorre morador da Rua M�rmore, em Santa Tereza, diante do barulho provocado por vizinhos (foto: Euler J�nior/em/d.a press)


Bia acorda no meio da madrugada, com o c�u ainda escuro. O marido ronca ao lado, na cama. Mas o barulho que mais a perturba � o latido incans�vel de um c�o no quintal do vizinho. Sem conseguir recuperar o sono, ela se levanta e, por cima do muro, v� o animal se esgoelar. N�o d� para saber o motivo de tanto barulho. Toda noite o problema se repete. Dessa vez, a mulher toma um comprimido para dormir e enfia outro em um peda�o de carne crua, que joga para o bicho. Pronto: � poss�vel fechar os olhos com tranquilidade.

A cena faz parte do filme O som ao redor, em cartaz em Belo Horizonte desde o dia 11. Premiado em importantes festivais brasileiros e estrangeiros, como os de Gramado (RS) e Roterd� (Holanda), o longa-metragem dirigido por Kleber Mendon�a Filho mostra o cotidiano dos moradores de uma rua de classe m�dia no Recife (PE). Eles parecem estar envoltos em permanente e sutil clima de tens�o, composto, entre outros elementos, pelos pequenos e grandes ru�dos di�rios, como os latidos que destr�em o sossego de Bia.

A exemplo da metr�pole nordestina, a capital mineira tamb�m tem muita gente que sofre com o estr�pito dos vizinhos. Muitos deles n�o manifestam a “presen�a suave” que, segundo a escritora Rachel de Queiroz, � tra�o comum aos mineiros. No ano passado, ru�dos provocados em resid�ncias, somados �queles gerados pelo tr�nsito de ve�culos e por brigas e algazarras em vias p�blicas, resultaram em 2.286 ocorr�ncias de perturba��o do sossego atendidas pela Pol�cia Militar na Regi�o Metropolitana de BH, de acordo com informa��es da Secretaria de Estado de Defesa Social. O n�mero corresponde a uma m�dia de 6,23 casos por dia. Apenas na capital, foram registradas 1.235 ocorr�ncias em 2012.

Os importunos podem habitar o endere�o ao lado, em frente, atr�s, em cima ou embaixo. �s vezes, a funcion�ria p�blica e t�cnica em sa�de bucal Adriana (nome fict�cio) nem sabe direito de onde vem o alarido. “O barulho aqui � infernal”, reclama ela, que tem 40 anos e vive h� mais de 20 no Conjunto Residencial Waldemar Diniz Henriques, no Bairro Santa In�s, Regi�o Leste de BH.

Sentada em um sof� na sala do apartamento onde mora, no primeiro andar de um dos 28 edif�cios do conjunto, a funcion�ria p�blica descreve os in�meros ru�dos que come�am bem cedo. A moradora do apartamento de cima costuma acordar por volta das 4h30. “Sei que ela n�o faz por mal, mas � um barulh�o”, reclama Adriana, que ouve a outra fechar e abrir portas, mexer em arm�rios, bater o p� no ch�o ao andar. Mais ou menos �s 7h, a inquietude muda de fonte. “Acho que � a vizinha aqui do lado que abre a janela com tanta for�a, que parece que vai quebrar”, queixa-se, sussurrando, sem querer que a vizinha escute. At� o grunhido do liquidificador incomoda. “Eu sei como ela liga: d� um impulso e outro, e depois deixa no cont�nuo”. Tamb�m de manh�zinha, tem um carro l� fora que � uma zoada s�. “� um carro velho. O homem fica tentando faz�-lo pegar. Quando consegue, fica esquentando, acelerando. Eu rezo para ele ir logo embora”.

Adriana diz que os barulhos continuam por todo o dia. “No terceiro andar, tem um cachorro que late sem parar”, conta. E duas moradoras t�m um jeito curioso de conversar. Uma vive em frente � outra, em pr�dios vizinhos ao de Adriana. Para poupar esfor�o, as duas trocam palavras em voz alta, cada uma de sua pr�pria janela. “Elas falam de tudo, at� o card�pio do almo�o: ‘�, Fulana, hoje vou fazer arroz, feijoada’”, relata. Isso sem falar que muita gente cultiva o “h�bito horroroso” de chamar algu�m aos gritos, da rua mesmo, em vez de tocar o interfone. Adriana costumava protestar contra tanto barulho. “Eu fazia o maior barraco, mas n�o adiantava”. �s vezes, ela precisa tomar comprimido para dor de cabe�a. Para dormir, j� chegou a recorrer a rem�dios. “Mas parei, tive medo de ficar dependente”. Acabou se conformando. “Eu acordo e espero voltar o sono. Fico mais cansada, impaciente, com menos �nimo para as coisas”.

Ora��o

Jorge e a mulher, L�cia (nomes fict�cios), moram em uma casa na Rua M�rmore, entre as ruas �ngelo Rabelo e Gabro, no Bairro Santa Tereza, Regi�o Leste. Em uma resid�ncia no outro lado da rua, quase em frente, os latidos s�o frequentes. A aposentada L�cia, de 59 anos, acha que eles partem de apenas um cachorro. “Acho que � mais de um, s� pode ser”, discorda, exasperado, o engenheiro civil aposentado Jorge, de 68. “Na hora em que resolvem latir, n�o tem quem fa�a parar. O que irrita � que os donos n�o fazem nada”, constata ele. A mulher tamb�m se irrita, mas se resigna: “Nossa, � um inferno. Coitadinho do cachorro, parece que fica confinado. De vez em quando eu acordo com o barulho. Atrapalha tamb�m quando estou vendo TV. N�o h� o que fazer”.

Outros vizinhos perturbam o casal. Jorge aponta uma casa pr�xima: “Ali, moram umas pessoas estranhas, parecem hippies, usam roupas esquisitas. N�o sei se � viola, bandolim... A qualquer hora, eles tocam aquilo e ficam um temp�o”. Se os ru�dos fossem constantes, n�o incomodariam tanto. “Se fosse uma coisa continuada, perene... Mas, de repente, a gente n�o est� esperando e o trem come�a. Para e volta de novo”, reclama. L�cia � mais resistente ao barulho, mas Jorge logo se enerva. Para tentar se acalmar, ele abre a bolsa pequena em que guarda seus rem�dios e tira um papel impresso com a “Ora��o da serenidade”: “Deus, conceda-me serenidade para aceitar as coisas que n�o posso modificar, coragem para modificar aquelas que posso e sabedoria para reconhecer a diferen�a”. Ele l� e rel�, mas n�o adianta. “N�o consigo ficar em casa. Acabo indo para a rua.”

Furadeira e martelo o dia inteiro

Sair de casa � o artif�cio empregado  tamb�m pelo estudante de gest�o de recursos humanos F�bio (nome fict�cio), de 25 anos. Ele mora em um edif�cio no Bairro Cruzeiro, Regi�o Centro-Sul de BH, e n�o aguenta mais os ru�dos feitos pelos vizinhos do apartamento de cima. H� m�veis se arrastando, portas batendo com viol�ncia... “Eles usam ferramentas, como furadeira e martelo, em hor�rios inoportunos: ou muito cedo, ou muito tarde. O barulho dura o dia inteiro, das 7h � meia-noite”, descreve. Os passos dos vizinhos produzem um som alto, surdo, “como se eles andassem pulando. “Parece que tem um elefante l� em cima.”

F�bio j� tentou fazer com que se compadecessem de sua situa��o. “Conversei com eles duas ou tr�s vezes. S�o dois idosos e uma filha adulta. Foram mal-educados. Ouviram, n�o falaram nada, nem se despediram e fecharam a porta na minha cara. Falei tamb�m com o s�ndico, mas ele n�o fez nada”, recorda o rapaz, que diz se sentir “impotente”. � comum que o barulho interrompa o sono do estudante. “Sabe aquela tarde bacana, em que voc� tira um cochilo? Isso n�o existe pra mim”. Antes de chegar em casa, ele costuma sofrer por antecipa��o, sabendo o que o espera. Diante de tanto estresse, o estudante decidiu procurar outro lugar para morar.

O professor universit�rio L�cio Monteiro, de 42 anos, mora com a mulher em um apartamento na Rua Muzambinho, tamb�m no Bairro Cruzeiro. Ele se incomoda com um barulho que, de t�o corriqueiro, passa quase despercebido por muita gente: o dos alarmes. Em seu edif�cio, por exemplo, quando algu�m deixa aberta a porta de entrada, o apito soa. E �s vezes custa a parar, assim como os alarmes de carros. “Tem muito alarme na regi�o. Disparam a qualquer hora do dia. � comum que mais de um alarme disparem ao mesmo tempo, e voc� nem sabe de onde v�m”, conta. “A todo momento minha aten��o � interrompida, tenho que me esfor�ar para me concentrar de novo. Ao longo do dia, isso vai ficando estressante.”

O pior � quando, no meio da noite, ele acorda por causa da barulheira. “As tarefas cotidianas ficam um pouco mais cansativas”, diz ele. E acrescenta: “A gente vive em uma regi�o barulhenta, � inevit�vel. Temos que lidar com isso”. Para piorar, desde dezembro a constru��o de um pr�dio perto dali aumentou ainda mais o alarido. A mulher de L�cio, a dem�grafa Luciene Longo, n�o se conforma: “�s vezes, o barulho come�a �s 5 da manh�: caminh�es descarregando material, retirando entulho. Eu acordo e fico rolando na cama, n�o consigo dormir”.


COMO RECLAMAR
Se ficar incomodado com algum barulho na vizinhan�a, o cidad�o pode acionar a Prefeitura de Belo Horizonte. Ele deve telefonar para o 156, n�mero do Disque-Sossego, programa que funciona em plant�es �s quintas e domingos, das 19h � 1h, e �s sextas e s�bados, das 20h �s 2h. A reclama��o tamb�m pode gerar uma vistoria agendada, realizada no per�odo diurno por fiscais das ger�ncias regionais de Fiscaliza��o Integrada e Licenciamento. Por�m, a prefeitura atende apenas queixas relacionas a ru�dos originados por atividades industriais, comerciais, de presta��o de servi�os, sociais e recreativas. � a Pol�cia Militar, por meio do telefone 190, que deve ser chamada no caso de reclama��es referentes a outros tipos de barulho.

 


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