
“Eu tinha meu barraco na Vila S�o Jos� e trabalhava de carteira assinada. Quando a prefeitura foi l� cadastrar o pessoal para a desapropria��o, por causa da obra de liga��o da Pedro II com a Pampulha, eu estava no servi�o. Um dia, chego cansado e meu barrac�o n�o estava mais l�. Derrubaram tudo. Perdi minhas coisas, como botij�o de g�s, fog�o e outros utens�lios. O processo corre na Fazenda municipal, porque sem resid�ncia fixa n�o consigo arrumar emprego. O sistema me botou na rua”, afirma Divino.
Jean conta que morava no Bairro Santa Terezinha, com a m�e e a av�. “Eu pagava R$ 70 de aluguel ao meu tio. Minha m�e e minha av� morreram, perdi o rumo e parei de pagar pela moradia. Meu tio me expulsou de l�.” Os tr�s abrem as mochilas, tiram as carteiras de trabalho para mostrar que, at� h� pouco tempo, eram pessoas produtivas. Hoje, passam o dia no parque e dormem na Pra�a da Liberdade. “Aqui, os guardas municipais n�o deixam a gente nem escovar os dentes num dos bebedouros. Na pra�a, n�o. A gente at� toma um banho, usando um balde para tirar �gua da fonte”, diz Divino.
Os tr�s s�o cadastrados nos restaurantes populares. Tomam caf� da manh�, almo�am e t�m uma sopa � noite de gra�a. Os dias no parque s�o, invariavelmente, regados a cacha�a, comprada com os trocados que ganham dos frequentadores da �rea verde. “A gente bebe para aguentar essa realidade”, diz Jean, que gosta de viajar, a p�. “J� fui a Santa Catarina e ao Rio. Daqui ao Rio s�o 15 dias de caminhada. Durmo perto dos postos de gasolina e pe�o sobras de comida no restaurante. Viajo para refrescar a cabe�a.”
E a inseguran�a na ruas? “� o preconceito. Somos vistos como ladr�es, bandidos. �s vezes, at� gente bacana nos agride. Temos que dormir de olho aberto porque at� coquetel molotov jogam em n�s. Mas a maioria � gente boa, at� nos cumprimenta.” De repente surge o Grande ou F�bio J�nior, de 38, que se recusa a dar o nome de batismo. Articulado, fala diferente dos demais, mostra conhecimento. “Estudei at� a 6ª s�rie e estou sempre na internet. Uso o computador do BH Resolve ou do Centro Cultural da UFMG. Adoro biografias, que busco no Wilkp�dia.” A condi��o de Grande � diferente da dos demais companheiros de Parque Municipal. Saiu de casa, em BH, porque quis e n�o pretende voltar para curtir com liberdade o seu gosto pela droga e a bebida.
H� quem se sente incomodado com a presen�a deles, como serralheiro M�rcio Henrique da Silva, de 30, morador de Nova Lima, na Grande BH, que passeia pelo parque com os filhos Gabriel, de 3, e Gabrielle, de 5. “Incomodam sim, ocupam bancos e jardins e s�o inconvenientes ao pedir dinheiro.” J� Alex Barros, t�cnico em tele-comunica��es, de 26, e Paola Cristiane Alves, de 23, que est�o sentados com filha a La�s, de um m�s, em frente ao lago dos barcos, n�o veem problema. “N�o nos incomodam. Mas a prefeitura devia tir�-los das ruas.”
Divino, Fl�vio, Jean e Grande comungam a rejei��o aos abrigos municipais. “N�o podemos reclamar do banho, da alimenta��o, dos assistentes, mas os guardas municipais n�o s�o educados no tratamento”, conta Divino. A assessoria da corpora��o informou que todos os cidad�os, independentemente da condi��o social, t�m tratamento igual e s� s�o abordados quando infringem a lei. “O morador de rua tem, assim, seu direito de ir e vir garantido.”