Livraria Amadeu, primeira loja de livros usados de BH, completa 65 anos, com 40 mil exemplares

Prateleiras organizadas sem tecnologia, apenas pelas m�os apuradas dos livreiros. Publica��es raras escondidas entre livros escolares, t�cnicos, infanto-juvenis, enciclop�dias, ao alcance do pedido de um cliente. O mais antigo sebo – loja especializada em livros usados – de Belo Horizonte, a Livraria Amadeu, completa 65 anos. Hoje, s�o cerca de 20 na cidade, muitos deles na sobreloja do Edif�cio Arcangelo Maletta, no Centro da cidade, lugar que virou ponto de encontro para venda, troca e pesquisas em livros usados. Tamb�m est�o na Savassi, Galeria do Ouvidor e Edif�cio Vila Rica.

O primeiro sebo de BH foi instalado por Amadeu Rossi Cocco, o seu Amadeu, em frente � Igreja S�o Jos�, no Centro, em novembro de 1948. Antes, ele trabalhou durante 20 anos em cinco livrarias da capital, onde adquiriu gosto e conhecimento suficientes para abrir seu pr�prio neg�cio. Sentia falta de livros mais baratos, como j� havia visto quando esteve no Rio de Janeiro e S�o Paulo. A primeira biblioteca que ele comprou, do cr�tico liter�rio Milton Pedrosa, quase se perdeu em um temporal que atingiu BH num certo dia: os livros estavam sendo levados para o sebo em uma carro�a e por pouco n�o se molharam.

Anos depois, em 1962, o dono da loja alugada pediu o im�vel e seu Amadeu se mudou com cerca de 20 mil exemplares para a Rua dos Tamoios, 748, onde est� at� hoje gra�as aos seus filhos, Louren�o e Amadeu. Do pai, falecido em 2009, aos 93 anos, eles herdaram muitos ensinamentos. O primeiro deles, difundido entre os outros sebos, � que a principal satisfa��o do alfarrabista � encontrar o livro para o cliente. “Nossa miss�o � achar a publica��o antiga, nossa satisfa��o � conseguir aquele livro pedido”, diz Louren�o Carrato Cocco, de 55 anos. E parece que as palavras do seu Amadeu foram ouvidas longe. Mesmo com sua avers�o ao computador por achar que tira o romantismo das p�ginas de papel, os sebos est�o na internet e com esse prop�sito: entregar o livro a quem o procura. O site mais famoso do segmento, a Estante Virtual, congrega todos os sebos de BH e muitos do Brasil, oferecendo mais de 11 milh�es de livros. E l� est�o os 60 mil exemplares das tr�s livrarias abertas por seu Amadeu.

Na bancada do sebo desde pequeno, Louren�o acompanhou as hist�rias dos clientes e o trabalho do pai. Ele lembra que a biblioteca mais cara que seu Amadeu comprou custou cerca de R$ 6 mil e tinha livros raros de filosofia, arte, latim e grego ensinados em col�gios tradicionais. Conta que muitos leitores buscam n�o apenas pre�o baixo, mas querem raridades para renovar a biblioteca particular, livros que estudaram na inf�ncia e querem guardar, vi�vas que buscam se desfazer das cole��es dos maridos. L�, segundo Louren�o, tamb�m v�o estudantes e pessoas que s� querem entrar, folhear, sentir o cheiro de poeira e papel antigo.

Pesquisa

Curiosa pelo mundo dos alfarr�bios, a soci�loga M�rcia Cristina Delgado escreveu em 1999 o livro Belo Horizonte: uma cartografia sentimental de sebos e livros, resultado de um trabalho de mestrado na Faculdade de Educa��o da Universidade Federal de Minas Gerais (Fae/UFMG). Na publica��o, ela conta v�rias curiosidades que marcam o caminho de um livro ao sebo. E aborda o universo das vi�vas, segundo ela em mat�ria publicada na p�gina da UFMG na internet, respons�veis por boa parte do acervo de muitos estabelecimentos da capital. “H� mulheres que t�m raiva dos livros, pois os parceiros davam mais aten��o a eles do que a elas. Outras, ao contr�rio, resolvem vend�-los para que as lembran�as do marido n�o as fa�am sofrer”, contou na �poca da conclus�o do estudo. Na pesquisa, M�rcia Cristina visitou sete sebos de BH.

Entre os 40 mil exemplares da Livraria Amadeu da Rua dos Tamoios o mais antigo � a segunda tiragem do livro Direito de fam�lia, escrito por Lafayette Rodrigues Pereira, em 1889. As p�ginas est�o bem amareladas, mas conservadas. No alto da prateleira, Louren�o v� mais um t�tulo raro e sobe na escada de madeira, t�o usada pelo pai e a mesma desde a abertura do estabelecimento, para alcan��-lo. � A noiva do tropeiro – Romance dos costumes mineiros, escrito por Ab�lio Barreto, uma edi��o publicada em 1946. Eduardo Ant�nio Tolentino, de 74, resolveu estudar direito anos depois da aposentadoria. � na Livraria Amadeu que ele encontra antigos livros para o curso, mas conta que l� por curiosidade, j� que as leis s�o atualizadas constantemente. “Tinha preconceito com livros usados, mas seu Amadeu, grande amigo que fiz, tirou isso da minha cabe�a. Trabalhava aqui perto e passava todos os dias, ele me ensinou a ter o h�bito da leitura”, disse.
 
Infantis

Nos sebos h� lugar tamb�m para as crian�as. E elas entram, sentam no ch�o, abrem os livros, apontam figuras, e as ainda n�o alfabetizadas tentam seguir a hist�ria pelas cores. Caio Carvalho Cardoso, de 32, � vendedor na loja da Rua Guarani h� 15 anos. �s v�speras do Dia Nacional do Livro Infantil e Dia de Monteiro Lobato, comemorados em 18 de abril, o livreiro conta que, felizmente, parece estar havendo mais interesse das crian�as pela leitura. “Aqui passam crian�as de 5, 6 anos, veem os livros nas prateleiras e querem entrar. Elas sentam, pedem aos pais para contar as hist�rias, � interessante.” Caio conta que adquiriu o h�bito da leitura com seu Amadeu e levou o ensinamento adiante incentivando seus sobrinhos pequenos.


PERSONAGEM DA NOT�CIA: AMADEU ROSSI COCCO PRIMEIRO ALFARRABISTA DE BH
Seu Amadeu nasceu em Passagem de Mariana, Regi�o Central de Minas, em 1916. Seu pai trabalhava na minera��o e morreu jovem, v�tima de silicose. Amadeu, ent�o, teve que cuidar da m�e e os irm�os. Em 1931, chegou a BH e conseguiu emprego como balconista na Livraria Morais. Dali em diante trabalhou em outras quatro livrarias durante quase 20 anos, at� fundar a pr�pria, especializada em livros usados. Em 1948, quando abriu a Livraria Amadeu, ele ainda trabalhava na Livraria Cultura Brasileira e foi l� que ele negociou os primeiros livros usados. Seu Amadeu deixou no comando das tr�s livrarias que abriu seus dois filhos e sobrinhos.


SAL�O DO LIVRO
Entre 9 e 18 de agosto acontece na Serraria Souza Pinto, no Centro de Belo Horizonte, o 2º Sal�o do Livro Infantil e Juvenil de Minas Gerais. No evento, editoras e escritores apresentam lan�amentos, al�m de palestras, debates, conta��o de hist�rias, teatro, shows, cinema, HQ e outras atividades. A programa��o completa e os participantes ainda ser�o divulgados pela C�mara Mineira do Livro.


LINHA DO TEMPO:
S�culo 16 – Surgiram os primeiros sebos na Europa, com a venda de documentos importantes da �poca
1808 – O com�rcio de livros usados come�a se desenvolver no Brasil, ap�s a chegada da Fam�lia Real
1926 – A primeira loja de livros usados do Brasil � aberta no Centro do Rio de Janeiro: Livraria Briguet
1948 – Amadeu Rossi Cocco abre o primeiro sebo de BH, na Rua dos Tamoios, 238, em frente a Igreja S�o Jos�
1962 – Livraria Amadeu, com 20 mil exemplares, muda para a Tamoios, 748, onde est� at� hoje
1969 – O livreiro Ronaldo Lima abre a Shazam, primeiro sebo instalado na sobreloja do Edif�cio Arc�ngelo Maletta
2005 – Administrador de empresas lan�a na internet o site Estante Virtual, com o arquivo de 12 sebos
2009 – Seu Amadeu, considerado decano dos alfarrabistas da capital, morre aos 93 anos
2012 – Estante Virtual chega a 11 milh�es de livros de mais de 1,3 mil sebos do Brasil, e outros sites semelhantes come�am a surgir