Luiz Ribeiro
Enviado especial

S�o Francisco, Pedras de Maria da Cruz e Manga – Para quem sempre viveu no escuro, a chegada da luz el�trica � a realiza��o de um sonho. Moradores das ilhas do Rio S�o Francisco, em Minas, acreditaram que teriam uma mudan�a completa de vida com os equipamentos de capta��o de energia solar que passaram a ser instalados ao lado de suas casas, dentro do Programa Luz para Todos, iniciativa do governo federal em parceria com a Cemig. Entre os anos de 2006 e 2008, foram cadastradas 741 fam�lias em 31 ilhas para o recebimento dos pain�is, que deveriam gerar energia suficiente para a ilumina��o e para ligar uma televis�o ou um aparelho de som. Mas, o que seria um salto na qualidade de vida virou dor de cabe�a para muitos moradores. Ao visitar as ilhas, o Estado de Minas verificou que grande parte das fam�lias, mesmo com os pain�is instalados, continua no escuro, porque os equipamentos pararam de funcionar por falta de manuten��o, por manuseio incorreto ou porque foram danificados pelas enchentes. H� ainda casos de roubo dos aparelhos.
Dorivaldo Gomes Ribeiro, de 64 anos, morava em S�o Paulo. L� trabalhava como pintor de autom�veis. Em 2007, fez uma viagem a S�o Francisco (Norte de Minas) para visitar parentes da mulher, Altamira Alves Figueiredo, de 60. Resolveu adquirir os “direitos” para a ocupa��o de uma faixa de terras na Ilha do Cearense por R$ 16 mil. Como ele conta, al�m do encanto com o Velho Chico, o que mais o seduziu foi o projeto de energia solar que estava sendo instalado nas ilhas. Imaginou que, com o projeto, iria trocar a correria e o estresse do tr�nsito da capital paulista pela vida tranquila na ilha, no meio do S�o Francisco, com garantia de conforto.
Dorivaldo e a mulher se mudaram de mala e cuia. Empolgado, o ex-pintor de autos planejou o plantio de pequenas lavouras e algo mais ousado: a produ��o de cacha�a artesanal. Mas, a alegria durou pouco. O painel de energia solar funcionou somente por tr�s anos e meio. “A bateria descarregou de vez. O que era sonho virou pesadelo”, afirma o ex-pintor de autom�veis. A vida dele mudou para pior. Durante 42 anos, morou em S�o Paulo em contato com todas os recursos da tecnologia. Na ilha, a falta de energia el�trica se soma a outros aspectos “primitivos” com os quais Dorivaldo n�o estava acostumado, como a falta de saneamento b�sico e as m�s condi��es da moradia, de paredes de pau a pique.
O que mais o incomoda � o isolamento. “A gente vive aqui como se estivesse num deserto.” Dorivaldo exp�e o maior medo: ficar doente, pois para chegar a um m�dico ou a um hospital � preciso navegar 20 quil�metros rio acima at� a cidade. A viagem dura duas horas em um barco “rabeta” (movido por um pequeno motor). Outro receio � o de ficar sem ver jogos da Copa por falta de energia el�trica.
Tamb�m morador da Ilha do Cearense, o aposentado H�lio Augusto do Nascimento revela que o equipamento de luz solar instalado na casa dele funcionou por apenas tr�s meses. A falta da luz n�o foi t�o sentida por ele porque passou a vida inteira iluminado por lamparina. A mudan�a que experimentou foi a compra de uma pequena TV, que vendeu ao perceber que n�o teria utilidade sem energia.
PAIN�IS FURTADOS Na Ilha dos Balaieiros, no munic�pio de Pedras de Maria da Cruz, os agricultores Sinvaldo Teixeira do Amaral e Joselito da Silva tamb�m est�o no escuro. Eles contam que receberam os pain�is de energia solar, mas s� puderam acender l�mpadas por cerca de oito meses. “Um dia chegaram uns homens. Disseram que eram da Cemig e levaram as placas (de energia solar)”, conta Sinvaldo, que, somente depois da partida dos estranhos, percebeu que tinha sido roubado. “A gente usa lamparina, mas ela ilumina pouco”, diz Joselito, que mora em casa parede de vara com enchimento de barro.
“Os equipamentos n�o t�m manuten��o e a maioria parou de funcionar. O pessoal pagava R$ 18 de luz por m�s, mas parou de pagar, pois n�o estava recebendo energia em casa”, disse Celino, que reivindica a chegada de uma rede de energia el�trica convencional � ilha. “J� vieram aqui e verificam at� os lugares onde podem ser fincados os postes. A ilha tem condi��o para isso”, argumenta o l�der comunit�rio.
Cemig culpa a enchente
A Cemig informou que os pain�is de energia solar nas ilhas do S�o Francisco foram instalados por meio do Programa Luz para Todos, depois do cadastramento dos moradores, sendo atendidas 741 fam�lias em 31 ilhas. Em nota, a empresa argumenta que a manuten��o dos equipamentos � feita pela suas equipes de servi�os de campo, “ap�s solicita��o pelos clientes”.
A companha alega que o pr�prio estilo de vida dos moradores das ilhas, que costumam deixar as casas durante as enchentes, dificulta a manuten��o dos sistemas de energia solar. “Esclarecemos que a Cemig tem como pr�tica atender/restabelecer o fornecimento de energia somente onde o cliente efetivamente reside, uma vez que o �ndice de vandalismo, em especial o furto de equipamentos, � muito grande nestes locais devido, sobretudo, � baixa taxa de ocupa��o, j� que as moradias ficam desabitadas nos per�odos chuvosos. Esclarecemos ainda que alguns equipamentos foram danificados por inunda��o”, diz a nota da Cemig.
A empresa informa ainda que “os moradores dever�o procurar as ag�ncias de atendimento Cemig para solicitar as devidas provid�ncias, inclusive para o cancelamento de contas cobradas indevidamente”.