
Como outras cidades do semi�rido mineiro, o munic�pio de Pai Pedro - de 5,9 mil habitantes, a 582 quil�metros de Belo Horizonte, no Norte de Minas, sofre com a seca. A cidade tem cerca de 400 fam�lias que precisam ser abastecidas diariamente e a prefeitura tem dificuldade para atend�-las, j� que conta somente com um caminh�o-pipa. A sa�da para amenizar o problema � a perfura��o de po�os tubulares. Al�m da escassez de �gua doce na superf�cie, Pai Pedro enfrenta outro drama: a �gua subterr�nea da regi�o � salobra (tem alta concentra��o de sal), sendo impr�pria para o consumo. Dessa forma, surgiu um novo com�rcio na cidade: a venda de �gua pot�vel.
Todos os dias, o agricultor Santos Mendes da Silva, de 48 anos, deixa o seu sitio e desloca 15 quil�metros at� a sede do munic�pio, dirigindo um trator, que puxa uma carretinha carregada com tambores d´ï¿½gua. A popula��o recebe �gua tratada em casa. S� que �gua, captada em po�o tubular, tem excesso de sal e n�o serve para matar a sede. Assim, a sa�da encontrada pelos moradores � comprar �gua doce ou, ent�o, buscar o produto em Porteirinha, a 25 quil�metros de dist�ncia, medida adotada por aqueles que t�m carro.
O secret�rio municipal de Agricultura de Pai Pedro, Hamon Ferreira de Souza, relata que o problema � t�o s�rio que, h� quatro meses, a prefeitura conseguiu recursos e perfurou um po�o tubular na comunidade rural de Salinas 5. O po�o seria a solu��o para o abastecimento das 22 fam�lias do lugar. “Mas, a �gua subterr�nea � t�o salgada e apresenta tanto calc�rio que n�o teve nem como equipar o po�o”, lamenta. “O jeito continuar enviando a �gua no caminh�o-pipa”, acrescenta Hamon. Ele disse que a prefeitura n�o est� conseguindo atender a demanda de �gua para os flagelados da seca. “Temos somente um caminh�o-pipa rodando no munic�pio. Para atender todas as fam�lias necessitadas nesta �poca, precisamos de pelo menos 10 caminh�es”, disse.
O Governo Federal anunciou o Programa �gua Doce, para instalar dessalinizadores em 69 comunidades mineiras. Pai Pedro est� na lista dos munic�pios a serem beneficiados. Mas, enquanto o programa n�o sai do papel os moradores se viram como podem para ter �gua doce em casa.
A pr�pria prefeitura da cidade providencia a busca �gua doce em carro-pipa e outros ve�culos em Porteirinha para o atendimento de creches e escolas e para o consumo dos funcion�rios de suas reparti��es. Comerciantes da cidade adotam o mesmo mecanismo. � o caso de Alvelina Gomes, a “Nenzinha”, dona de um restaurante em Pai Pedro. A comerciante conta que um sobrinho dela busca �gua doce, de carro, a oito quil�metros de dist�ncia. “� o jeito. A �gua que recebemos aqui n�o serve para cozinhar. S� presta mesmo para o banheiro e para limpar o ch�o”, lamenta a mulher.
Moradores que n�o t�m carro para transportar �gua de uma localidade vizinha precisam recorrer ao servi�o “delivery” de Santos Mendes, que todas as manh�s carrega 10 tambores de 240 litros cada (total de 2.400 litros). “As pessoas ligam para meu celular e eu entrego a �gua”, afirma Santos, que faz a capta��o de �gua doce que “brota” de uma serra nas proximidades do seu s�tio.
Ele cobra R$ 15,00 pelo tambor de 240 litros. “Mas, n�o vendo �gua. Cobro somente pelo servi�o de levar �gua at� a cidade”, despista Santos, que faz o “servi�o” h� 20 anos e de l� pra conseguiu melhorar de vida. “Eu gosto de servir o povo e ao mesmo tempo, (as pessoas) me ajudam tamb�m”, completa. Ele disse que fatura em torno de R$ 800, 00 por m�s.
A biom�dica Vanessa Moraes Santos, de 31 anos, � uma das pessoas de Pai Pedro que compram �gua doce. Ela conta que chegou � cidade recentemente e que desconhecia o problema com a �gua que chega as casas. “Eu n�o sabia que existia isso aqui. Usei a �gua (da tubula��o) para cozinhar, mas a comida ficou escura e com um gosto ruim”, diz Vanessa, acrescentando que tamb�m usou a �gua salgada para dar banho no filho Adones, de dois anos, e a crian�a teve alergia nos bra�os e no cabelo. “A �gua salobra n�o serve pra nada”, reclama a biom�dica.

Como reconhece o pr�prio vendedor Santos Mendes, “existem pessoas em Pai Pedro que n�o tem um sal�rio suficiente para comprar �gua e, muitas vezes tem que beber �gua salobra ou passam sede”. A aposentada Leonor Maria de Jesus, de 58 anos, enfrenta dificuldades financeiras. Todos os dias, por diversas vezes, ela caminha por cerca de 500 metros e vai at� o Rio Serra Branca para apanhar �gua, que carrega em tambores, conduzindo um carrinho de m�o. A �gua que retira no manancial n�o tem tratamento, “mas n�o � salgada e serve para beber”, diz a moradora.
Leonor sente a aproxima��o de viver maior drama ainda, pois no per�odo critico da estiagem, o Rio Serra Branca seca completamente. “A�, terei que usar a �gua salobra mesmo, pois cuido de sete netos”, diz a aposentada, explicando que n�o sobra dinheiro para comprar �gua doce.
Drama de comunidades rurais
Em v�rias comunidades rurais de Pai Pedro existe po�o tubular, mas os moradores do atendimento feito pelo caminh�o-pipa porque a �gua subterr�nea � impr�pria para o consumo humano. A situa��o � verificada na localidade de “Atr�s dos Morros”, a 25 quil�metros da �rea urbana. O agricultor Osvaldo Lima da Silva, explica os “males” provocados pelo uso da �gua retirada do po�o tubular aberto na comunidade. “A �gua tem muito sal. Se a gente lavar o cabelo com ela, o cabelo fica duro e o pente embara�a. Tamb�m n�o serve para lavar roupa”. Segundo ele, o excesso de sais na �gua � tanto que prejudica at� as plantas. “A �nica planta que d� certo com essa �gua � o coqueiro. Usei a �gua do po�o para irrigar uma planta��o de banana, mas passou dois anos e as bananeiras morreram”, diz ele. “A gente s� usa a �gua do po�o mesmo para dar para os animais”, assegura o agricultor.
A mulher de Osvaldo, Josefina Barbosa de Souza, tamb�m reclama da pouca serventia da �gua retirada do len�ol fre�tico. “Para cozinhar n�o d� que empreta a comida e panela. Se usar (a �gua) para lavar casa, o sal “come” (corr�i) o p� da parede. Ent�o, s� uso a �gua salobra mesmo para enxaguar roupa”, informa Josefina. A fam�lia recebe �gua doce do caminh�o-pipa da prefeitura, que visita a comunidade com intervalo de mais de 30 dias.
Osvaldo conta que tamb�m ameniza o problema com a capta��o de �gua de chuva, que � armazenada numa cisterna com capacidade para 16 mil litros.O morador Evangelista Alves da Silva, de 69 anos, conta que o po�o tubular da localidade de Atr�s dos Morros foi perfurado h� 30 anos e tem 90 metros de profundidade. “Certa ocasi�o, usei a �gua do po�o para molhar uns p�s de laranja e as plantas morreram”, recorda.
A quantidade excessiva de sais em �guas subterr�neas � verificada em outros munic�pios do extremo Norte de Minas, onde moradores de comunidades rurais sofrem com a pouca disponibilidade dos recursos h�dricos na superf�cie, por conta das secas incessantes. O agricultor Jos� Mendes Silva, da localidade de S�o Sebasti�o, no munic�pio de Monte Azul, mostra uma �gua com uma colora��o escura em uma caixa, que � retirada de um po�o. “Esta �gua � salobra e s� serve para o gado”, afirma Jos� Mendes, que apanha �gua doce no s�tio de um vizinho, que, por sua vez, recorre a capta��o de uma serra, como tamb�m faz outros moradores de S�o Sebasti�o, distante 40 quil�metros da �rea urbana. “Mas, existem lugares mais isolados do munic�pio, onde n�o chega o carro pipa para levar �gua pot�vel e as pessoas t�m que se contar em beber �gua salobra mesmo”, revela Francisco de Assis Gon�alves (PP), vereador em Monte Azul. (Com Mateus Parreiras).
Suspeita de contamina��o por enxofre
A �gua retirada de um po�o tubular perfurado pr�ximo ao Assentamento Santa Claudia, no munic�pio de Pai Pedro, n�o tem serventia para o consumo humano. O motivo do n�o aproveitamento do po�o � que a �gua apresenta um cheiro muito ruim. Segundo Gilberto Siqueira, t�cnico da Empresa de Assist�ncia T�cnica e Extens�o Rural (Emater-MG) no munic�pio, a suspeita � que a �gua do po�o tem contamina��o por enxofre, elemento altamente nocivo para a sa�de, que pode provocar c�ncer. “Coletamos a amostra da �gua, encaminhamos para an�lise e ainda estamos esperando o resultado”, diz o t�cnico. As 49 fam�lias do assentamento s�o atendidas por interm�dio de dois po�os abertos na regi�o, que, segundo a Prefeitura de Pai Pedro, contam com �gua doce, sem apresentar o problema da saliniza��o.
Copasa diz �gua n�o faz mal para a sa�de
O chefe do distrito regional da Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa), Helber Garibaldi, que responde por Pai Pedro, disse que companhia usa um processo de tratamento da �gua captada em po�os tubulares que provoca um “abrandamento” da quantidade de sais, permitindo que a �gua sirva para o consumo humano, sem causar mal � sa�de. “Usamos elementos que reduzem a dureza da �gua, que � colocada dentro do padr�o de qualidade exigido pelo Minist�rio da Sa�de e pela Organiza��o Mundial de Sa�de (OMS), afirma o representante da Copasa. “Al�m disso, s�o coletas amostras e feitas an�lises da �gua dos po�os tubulares, de duas em duas horas. A �gua n�o oferece nenhum risco para a sa�de, pois � tratada”, assegura Garibaldi.