
A ideia para compor este texto era buscar algo novo no Mercado Central de Belo Horizonte, que dia 7 completa 85 anos, na contagem oficial. Alguma coisa al�m da sedutora e peculiar alquimia de cheiros, cores e sabores, da sempre aberta possibilidade de conviv�ncia com gente de todas as tend�ncias e apar�ncias. Um desafio buscar um epis�dio desconhecido na hist�ria mil e uma vezes contada do centro de compras famoso dentro e fora das fronteiras do pa�s. E n�o � que h� novidade? O Mercado Central vai provar que suas origens n�o est�o plantadas no quadril�tero formado pelas ruas Santa Catarina, Curitiba, Goitacazes e Avenida Augusto de Lima. Suas ra�zes foram plantadas em 1900, no come�o da Avenida Afonso Pena, onde hoje est� a defasada rodovi�ria.
N�o se trata, claro, de uma descoberta. O fato n�o � tratado com relev�ncia na hist�ria da cidade. E, dessa forma, nunca veio a p�blico com a merecida relev�ncia como vir� agora. Amanh�, ser� aberta a exposi��o “Hist�ria e mem�rias do Mercado Central”, que vai fundir a primeira vers�o do centro de compras, de 1900, e a segunda, de 1929, a que � frequentada e reverenciada atualmente. Uma comemora��o de anivers�rio diferente, que deixa ainda mais orgulhosos comerciantes e administradores do centro de compras. E felizes. Afinal, trata-se de uma mem�ria n�o unicamente comercial, mas tamb�m afetiva, ligada � pr�pria trajet�ria de vida de cada um deles, h� d�cadas instalados em lojas e boxes acanhados com a miss�o de receber clientes e trat�-los como ilustres convidados.
O curador da exposi��o � Ozias Ribeiro Neves, do Escrit�rio de Hist�ria. A mostra come�a com um painel. Nele, a foto do mercado municipal de 1901, na Avenida Afonso Pena, pe�a do Arquivo P�blico Mineiro. Foi obra de decreto datado de 1899, do ent�o presidente do estado Silviano Brand�o, conforme c�pias anexadas de documentos da �poca. Era uma constru��o horizontalmente alongada, em estrutura de ferro e vidro importada da B�lgica, inaugurado em 6 de outubro de 1900 e administrado pela prefeitura. “E j� era, naquele tempo, espa�o de conviv�ncia”, diz Luiz Carlos Braga, superintendente do Mercado Central.
Em 1929, em um dos atentados � mem�ria de BH, o pr�dio foi demolido para dar lugar � Feira de Amostras e o mercado foi transferido pela prefeitura para o endere�o atual. E nos anos 1970, em outra agress�o � hist�ria, a Feira de Amostras foi ao ch�o para a cidade erguer a rodovi�ria, que se prometia moderna e funcional. Mas isso � outra hist�ria.

REGISTRADORAS A partir da foto do velho mercado, a exposi��o segue em uma linha do tempo para contar a saga dos comerciantes que o adquiriram do munic�pio para n�o deix�-lo desaparecer. “Vamos mostrar ainda velhas m�quinas registradoras e objetos usados ao longo da hist�ria pelos comerciantes”, diz Ozias. Um rolo de papel de embrulho, que tamb�m j� caiu em desuso, estar� � disposi��o do p�blico para escrever frases dirigidas ao centro de compras. E em uma cabine, diante de foto ampliada da fachada do mercado, visitantes poder�o deixar mensagens de v�deo.
“Bacana. Pens�vamos que t�nhamos 85 anos e, na verdade, estamos fazendo 114. A exposi��o, com documentos da �poca da cria��o, � para mostrar a verdadeira origem do mercado”, diz o presidente do centro compras, Jos� Agostinho Oliveira, de 64 anos, h� 50 anos estabelecido com uma loja de utens�lios dom�sticos. Na linha do tempo, os motivos de d�cadas de dedica��o que se traduz em prest�gio nacional e internacional. O que enche de orgulho Tarc�sio Mauro Braga, de 75, que nunca deixou um cliente sair de sua barraca de legumes com um tomate de m� qualidade. “Cheguei aqui jovem. Vim de Martinho Campo, na Regi�o Centro-Oeste, para estudar. Meu mandava ovos e galinhas, que eu vendia aqui para me manter”.
Tarc�sio n�o saiu mais. De ovos e galinhas a legumes. S�o 59 anos de mercado. “E todos os dias, �s 4h estou na Ceasa. � preciso chegar cedo para comprar os melhores legumes. Emociona-se para dizer que criou e formou quatro filhas trabalhando como feirante, uma m�dica, uma delegada federal, uma dentista e uma empres�ria. “O mercado � tudo, � vida, � paix�o, desprendimento.” Sentimentos iguais comovem Heraldo Nelson Silveira, de 72. Come�ou menino, com o pai, Nelson Vaz de Mello Silveira, na loja de objetos de decora��o, artesanato e utens�lios dom�sticos. Hoje ele divide o gerenciamento do neg�cio com uma das duas filhas. “� a minha casa. Vivo aqui e aqui recebo os amigos.”
Ontem, Tarc�sio e Heraldo se juntaram a Ant�nio Proc�pio Filho, de 79 anos, h� 68 anos no ramo do abacaxi, para uma sess�o de fotos para a divulga��o dos preparativos de comemora��o do anivers�rio do Mercado Central. Festa de 85 anos ou de 114 anos? Oitenta e cinco. A administra��o n�o pensa, por enquanto, em mudar a data de funda��o para 1900. Coisa de tradi��o.
Tradi��o e prest�gio que atraem turistas como as catarinenses de Blumenau Verena Kohler e Sonia Michelon, que foram ontem conhecer o Mercado Central. Sacolas cheias de queijos e doces e com fatias de melancia nas m�os, n�o escondiam a admira��o. “Maravilhoso. � preciso tempo para andar com calma e conhecer tudo. Anivers�rio? Vida longa”, disse Verena.