
Minduri – O clima que j� era de mist�rio se transformou em medo na segunda-feira na pacata Minduri, cidade de 4 mil habitantes no Sul de Minas. Desde 2005, os moradores convivem com a indiferen�a de centenas de forasteiros que se mudaram para seis cidades da regi�o para morar em fazendas e trabalhar em com�rcio administrados por grupos de religiosos pertencentes � seita “Jesus, a verdade que marca”. Eles s�o muito reservados e n�o se misturam com quem n�o � do seu conv�vio. Mas, por volta das 5h de segunda-feira, v�rios carros da Pol�cia Federal entraram na cidade “queimando pneu”, segundo moradores, para fazer buscas em im�veis dos “paulistas”. A den�ncia da PF de que integrantes da seita s�o acusados de estelionato, lavagem de dinheiro e de manter todas aquelas pessoas trabalhando em suas fazendas e com�rcio em situa��o an�loga � escravid�o pegou todos de surpresa.
Em Minduri, a comunidade religiosa tem poucos neg�cios, bem diferente das vizinhas S�o Vicente de Minas, Andrel�ndia, Cruz�lia e Caxambu. “H� apenas uma loja, uma f�brica de artesanato e uma pequena propriedade rural alugada, onde plantam cebola”, conta o prefeito Jos� Ronaldo da Silva, o Goiano, (PMDB), que mora ao lado de uma casa alugada pela seita, onde vivem os funcion�rios da f�brica. “S�o meus vizinhos. Moram cerca de 10 crian�as e adultos. Conversam pouco, mas s�o muito educados”, disse.
O prefeito conta que ficou surpreso com a informa��o de trabalho escravo. “Fui algumas vezes � fazenda deles e ningu�m reclamou de nada. Mas sabe como � religi�o, tem esse tal de d�zimo”, comentou. “Se existe trabalho escravo, este � o melhor momento para algum deles denunciar, com a Pol�cia Federal e toda a imprensa em cima”. Os “paulistas”, segundo o prefeito, nunca causaram problemas. “N�o saem para beber, n�o fazem festa, n�o brigam, nada”, disse.
Os poucos momentos em que membros da comunidade se integram � cidade � quando h� festas. “Eles montam barraquinhas para vender comida. Tudo deles � muito bem-feito”, conta Jos� Ronaldo, lembrando que o grupo montou um restaurante na Chapada do Abanador, no munic�pio vizinho de Carrancas, para atender a equipe da grava��o da novela Imp�rio. “Eles s�o violentos na comida. T�m uma rede de restaurantes em Caxambu e em Pouso Alegre”, disse. Segundo a PF, entretanto, os estabelecimentos comerciais s�o usados para lavagem de dinheiro e os funcion�rios trabalham sem carteira assinada e sem sal�rio.
O prefeito conta que a cidade ficou assustada na segunda-feira com o “circo armado” pela PF. “Entraram mais de seis carros no munic�pio em alta velocidade, cantando pneus, e o pessoal que acorda cedo para varrer rua come�ou a me telefonar desesperado dizendo: ‘Prefeito, tem um monte de homens de preto procurando os paulistas. Deram batida at� na casa dos outros.’ Os paulistas tinham vendido uma casa l� em cima e os policiais n�o sabiam. Chegaram de uma vez e o novo dono do im�vel quase morreu”, conta o prefeito. A casa ao lado da dele tamb�m foi vasculhada. Ningu�m foi preso na cidade, disse.
A f�brica de artesanato tamb�m foi alvo da fiscaliza��o e a loja que vende os produtos permanecia fechada ontem. “A funcion�ria me disse que est� tremendo at� hoje. Falou: ‘Entrei em p�nico’”, conta o prefeito. A R�dio Rede FM, tamb�m do grupo religioso, permanece funcionando na cidade.
O dono da padaria, Eder Wesley Macedo, de 41 anos, sabia da exist�ncia da f�brica de artesanato e da loja dos paulistas, essa, por sinal, em frente ao seu com�rcio. “O pessoal deles de vez em quando compra um p�o aqui, mas s� de vez em quando. N�o puxam conversa com ningu�m”, comentou.
Uma fam�lia que mora em frente � f�brica demonstrou medo em comentar qualquer coisa sobre os vizinhos da frente. “N�o sei de nada deles”, disse uma senhora idosa. “N�o mexem com ningu�m. N�o sei o que tem l� dentro. A gente � pobre, sabe, e temos que ficar quietinhos”, disse a mulher, que foi repreendida por uma outra mais jovem, possivelmente filha, que a mandou “calar a boca”. “Bate l�. Conversa com eles. N�o vamos falar mais nada”, reagiu ela. Com a chegada da reportagem, as luzes do interior da f�brica foram apagadas e os funcion�rios ficaram em sil�ncio.
A reportagem retornou � Fazenda Para�so Manancial, em S�o Vicente de Minas, onde vivem mais de 130 fam�lias adeptas da seita. No dia anterior, o diretor da fazenda, Paulo Henrique da Silva, havia recebido prometido abrir as portas da fazenda para mostrar como ela realmente funciona, mas ontem voltou atr�s.
‘Pris�o injusta’
O advogado do pastor C�cero Ara�jo, Leonardo Campos, considerou “injusta” a pris�o de seu cliente e de outros cinco l�deres da seita sob suspeita de explorar trabalho escravo de fi�is. “Em 2005, o Minist�rio P�blico do Trabalho (MPT) declarou que n�o havia isso na comunidade. Se houvesse teriam que libertar os escravos, n�o?”, questiona.