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Estado de Minas

Pacientes de hansen�ase que vivem em ex-col�nia de Betim ainda sofrem com estigma e isolamento

Para 46 sobreviventes da antiga Col�nia Santa Isabel, em Betim, o estigma da hansen�ase ainda � sin�nimo de falta de afeto 29 anos depois, o isolamento e o preconceito se mant�m


postado em 20/09/2015 11:00 / atualizado em 20/09/2015 12:43


“Quando nasci, disseram que seria chamado de L�zaro para n�o adoecer mais gente da fam�lia”

 

(L�zaro da Silveira, de 77 anos, internado desde os 7)

L�zaro da Silveira, de Carm�polis de Minas, foi o �nico da fam�lia a carregar a pecha daquela doen�a de nome feio, quase um palavr�o. Os familiares morreram de outras doen�as. Entre todos, restou Lazinho, ironicamente. Ele chegou � Col�nia Santa Isabel no trem de ferro, no munic�pio vizinho de M�rio Campos. “� dona, esse menino precisa ir para Betim. Ao explicar o motivo, a pessoa disse aquele nome horroroso da doen�a, que batia na gente feito uma chicotada”, conta ele, passados inacredit�veis 70 anos. Foi um dos garotos a inaugurar o pavilh�o de crian�as, que brincavam de bola e levantavam cedo para ir � missa.

Hic manebinus op time. A inscri��o em latim, significa “Aqui ficaremos bem”. Afinal de contas, foi essa a promessa feita a homens e mulheres, velhos e crian�as, que chegavam � ent�o Col�nia Santa Isabel, inaugurada com a miss�o m�dica de isolar da sociedade dita ‘sadia’ os pacientes com hansen�ase. Ainda no port�o de entrada, hoje abandonado, a inscri��o transmite candura e dor, delicadeza e aceita��o, horror e confinamento. Com a abertura dos port�es h� 29 anos, desde 1986,  as fronteiras f�sicas e imagin�rias da col�nia perderam totalmente o sentido.

Abandonado no meio da estrada do museu contempor�neo de Inhotim, passando pela rota de Brumadinho, o marco de inaugura��o est� em ru�nas. Era guardado por dois seguran�as, geralmente escolhidos entre os pr�prios pacientes, que se prestavam a esse servi�o remunerado, na falta de pessoas saud�veis dispostas a conviver de perto com a hansen�ase. Sob a supervis�o de um intendente, os pr�prios doentes escolhiam quem deveria entrar ou sair. “Se eu deixasse fugir algu�m, era preso no lugar do doente. Os pacientes eram buscados em casa a cavalo, tirados da cama, do jeito que fosse. Minha ficha � n�mero 13.201”, lembra o ex-seguran�a Delmiro Aleixo Ferreira, de 77 anos, que mora at� hoje a poucos metros do monumento.

Venha conosco cruzar esse portal do tempo e conhecer mais de perto os depoimentos dos �ltimos 46 sobreviventes de Santa Isabel, com idade m�dia acima de 70 anos e 29 anos  de afastamento da sociedade, com a perda de v�nculos e refer�ncias familiares. “Aproveitem para pegar nas m�os da mo�a, ela est� querendo nos cumprimentar. Vamos l�, gente”, diz o interno, como se apertos de m�o estivessem em promo��o naquele dia. Era o gentil Severiano Sousa, de 77, cuja docilidade contraria o apelido de Severo. Est� internado desde 24 de agosto de 1966, data do seu novo nascimento.

"As pessoas olhavam para a gente e enxergavam um doente. Aquilo foi criando o complexo" - Jo�o do Carmo Almeida (foto: Beto Novaes/EM/D.A Press)
Ainda hoje permanece a car�ncia dos pacientes por afeto. “Eu s� queria um abra�o”, entrega Maria das Dores Moreira, de 57, a Dad�, afastada do colo da m�e aos 5 anos, com suspeita de hansen�ase. “Sabia que a Dad� nunca teve a doen�a? Descobri isso h� alguns meses”, explica o m�dico Get�lio Ferreira de Morais, eleito este ano diretor-geral da ex-col�nia. Ele mesmo conta ter sofrido uma esp�cie de discrimina��o da pr�pria fam�lia. H� 28 anos, Ferreira passou no concurso p�blico para assumir o posto de m�dico no lugar. “Avisei � minha fam�lia e sa� de manh� para trabalhar. Quando voltei do servi�o, desinfetaram minhas roupas e sapatos. Senti na pele um pouco da humilha��o sofrida pelos meus pacientes, at� mesmo em fun��o da falta de informa��es sobre a hansen�ase.”

 


Delmiros, severianos e marias resistiram aos piores sofrimentos, tornando-se testemunhas de um passado que n�o deve ser esquecido. S�o remanescentes de uma �poca em que a doen�a n�o tinha cura, sofreram terr�veis sequelas no corpo, mas principalmente na alma. A Col�nia Santa Isabel chegou a abrigar  3,5 mil pessoas. “Era uma �poca em que os pacientes vinham trocar curativos sem necessidade. Era a �nica maneira de conseguirem ser tocados no corpo ferido. At� os m�dicos faziam as consultas a dist�ncia. Existia uma car�ncia absoluta por contato f�sico”, explica uma enfermeira, filha adotiva de um casal de hansenianos.

� preciso lembrar que as portas da Col�nia Santa Isabel est�o escancaradas para permitir a entrada (e a sa�da) de qualquer um, hanseniano ou n�o. De repente, enquanto voc� aguarda na recep��o, esperando para falar com a administra��o da Casa de Sa�de Santa Isabel,  poder� se deparar com a figura de Jo�o do Carmo Almeida, de 80, que se autodenomina “Jo�o da Caixa”. Para evitar a exposi��o das feridas e proteger os olhos do sol, o ex-interno esconde-se atr�s de caixotes de papel�o, decorados com belas mensagens de amor e de esperan�a.


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