Valquiria Lopes
Pedro Ferreira
Enviado especial

Mariana – A lama, que parece nunca acabar nos povoados atingidos pela avalanche de rejeitos da Barragem do Fund�o e que continuam escorrendo por todo o Rio Doce at� a foz, no Esp�rito Santo, d� a dimens�o do drama que moradores, pescadores, ribeirinhos e todos os demais afetados pela trag�dia de 5 de novembro continuam enfrentando. Muitos ainda precisam lidar com a dor de perder parentes e amigos e lutam para resgatar direitos b�sicos, como a moradia, a autonomia ou propriedades. Comum a todos � a urg�ncia de restabelecimento de suas fontes de renda, uma batalha di�ria sem data para acabar. Pela frente, ainda h� a d�vida se todas as 139 fam�lias v�o conseguir sair dos hot�is e se mudar para casas alugadas e mobiliadas pela Samarco at� o Natal, prazo que j� � praticamente descartado pelo Minist�rio P�blico de Mariana, que acusa morosidade no processo por parte da empresa. At� sexta-feira, 115 fam�lias haviam sido realocadas. Diante da impossibilidade de voltar para suas pr�prias casas, os moradores de Bento Rodrigues e Paracatu de Baixo, os mais afetados pela trag�dia, sonham com novas vilas. Mas � uma realidade bem distante.
O promotor explica que R$ 300 milh�es foram bloqueados em contas da Samarco para serem investidos em solu��es definitivas para as fam�lias atingidas. “A reconstru��o de novas vilas exigir� um processo mais longo e as discuss�es devem come�ar a partir do ano que vem, com a participa��o das v�timas”, disse. A presidente do Ibama, Marilene Ramos, destaca que, para al�m da repara��o ambiental, � preciso que seja providenciada urgentemente uma indeniza��o �s pessoas afetadas ao longo de todo o Rio Doce e seus afluentes e que o abastecimento com �gua pot�vel seja garantido plenamente.
Enquanto trabalham no recolhimento de provas que possam garantir a materialidade do dano ambiental, promotores e t�cnicos do Minist�rio P�blico de Minas Gerais j� vislumbram os desafios futuros. De acordo com o coordenador do N�cleo de Resolu��o de Conflitos Ambientais do MP (Nucam), Carlos Eduardo Ferreira Pinto, o trabalho agora � unificar as a��es nas esferas federal, estadual e municipal, nas 18 comarcas afetadas, para garantir in�cio imediato da recupera��o do rio e de seus afluentes. “Esse processo precisa ocorrer imediatamente”, afirmou. O promotor lembrou ainda que a esfera humanit�ria �, do mesmo modo, urgente.
RENDA Presidente da Associa��o dos Moradores de Bento Rodrigues e representante de todas as v�timas nas negocia��es com a mineradora, Jos� do Nascimento de Jesus exp�e a expectativa dos desabrigados de deixar o hotel at� o Natal. “Mas a gente sabe que � quase imposs�vel, pelo andamento que est�”, constatou Zezinho do Bento, como � conhecido. Segundo ele, n�o s�o todas as fam�lias que receberam o cart�o de aux�lio da Samarco, “Est� dando em m�dia R$ 1,2 mil a R$ 1,3 mil por fam�lia”, disse. “Se � moradia provis�ria, � melhor numa casa do que em hotel. O contrato de aluguel est� sendo feito por um ano, justamente para que haja uma decis�o definitiva, como reconstru��o de um novo Bento, com todo mundo voltando a morar junto de novo”, acrescentou.
O lavrador Jos� Geraldo Marcelino, de 42, a mulher dele, Luciene Ara�jo Lopes da Silva, de 37, e a filha Luciele Aparecida, de 11, deixaram o hotel ontem e foram morar em uma casa alugada. “Estamos felizes, mas a nossa felicidade s� ser� completa no dia em que a gente voltar a ter nossa pr�pria vida, com todo mundo de Paracatu de Baixo morando junto de novo. Queremos de volta a vida que a gente tinha”, disse Luciene. A m�e de Jos� Geraldo, a aposentada Leontina Divina Marcelina, de 78, que vai continuar no hotel com o restante da fam�lia, chorou ao se despedir do casal e da neta, dos quais nunca havia se separado.
PREJU�ZOS Jos� Geraldo conta ainda que na hora de fugir da lama saiu apenas com a bermuda que usava, sem camisa. “Deixei para tr�s mais de 100 galinhas, 12 cachorros e minhas ferramentas de pedreiro”, lamentou. Luciene, que vende cosm�ticos, tamb�m teve toda a mercadoria levada pela lama e tenta agora receber pagamentos atrasados. A dona de casa conta que juntou dinheiro fazendo faxina para reformar a cozinha da casa. “Eu tinha acabado de colocar um balc�o novo. O fog�o eu tinha acabado de tirar da caixa, presente de uma prima”, disse Luciene, enquanto observava a casa onde vai viver por algum tempo. “Nada se compara � minha casa. Este ano, meu quintal deu at� melancia. Eu gostava da minha rotina em Paracatu. Acordava cedo, fazia o caf�, mexia na horta e cuidava da casa”, comentou ela.
