
Dezenas de m�es e pais aflitos, acompanhados de suas crian�as enjoadinhas ou com febre, fazem silenciosa romaria at� o consult�rio da pediatra Filomena Camilo do Vale, de 54 anos, localizado na regi�o hospitalar, em Belo Horizonte. Os trabalhos podem seguir madrugada adentro, se for necess�rio. Todos esperam sua vez, pacientemente. Sabem que, mais do que realizar uma anamnese ou prescrever um antibi�tico, a doutora Fil�, como � conhecida, ter� sempre um conselho a oferecer, uma palavra de conforto ou, melhor dizendo, uma “b�n��o” capaz de acalmar o cora��o das fam�lias. “Ultimamente, os pais est�o chegando ao consult�rio abatidos porque um deles ficou desempregado. Ent�o eu digo que o emprego � o de menos e que v�o chegar outras oportunidades. Imagine se ele tivesse de parar de trabalhar porque estava de cama, doente? A� sim, seria tr�gico. Mas voc�s est�o com sa�de e formam uma fam�lia. Aproveitem para ficar mais juntos. Arranjar outra vaga � s� uma quest�o de tempo”, ensina.
Quem est� dizendo isso, nesse momento, n�o � a Fil� da Rua Padre Rolim (ali�s, nem adianta tentar marcar consulta, porque a agenda dela, dedicada prioritariamente a conv�nios, est� fechada at� meados de 2018). Nesse momento, quem assume o palco � essa mulher de apenas 1,54 metro, que est� sempre de salto alto e maquiagem, tentando disfar�ar as olheiras profundas. Em frente ao microfone, Fil� se agiganta, atraindo mais de 1 mil pessoas � Igreja Nossa Senhora Rainha, no Bairro Belvedere, nas noites de ter�a-feira. Suas palestras s�o reproduzidas em 230 CDs e DVDs gravados pela pr�pria par�quia, de forma a ecoar para o maior n�mero poss�vel de pessoas. A m�dica � a primeira de uma s�rie de mulheres que ter�o suas hist�rias contadas pelo Estado de Minas em comemora��o ao 8 de mar�o, Dia Internacional da Mulher.

Na par�quia administrada pelo padre Alexandre Fernandes, ningu�m sabe calcular quantas c�pias foram distribu�das nos �ltimos 10 anos, quando Fil� transferiu para a Zona Sul o grupo de ora��o que surgiu em 1983, no pensionato de mulheres para onde ela se mudou para estudar medicina na capital. Com forma��o nas Irm�s Paulinas, nem a pregadora Fil� faz ideia do alcance de suas palavras: “Deus tem conosco essa liberdade de n�o nos obrigar a acreditar nele. Seu filho tamb�m n�o lhe pertence. Ele est� na sua vida de passagem, somente para ensinar algo a voc� durante o tempo necess�rio. Se voc� conseguir compreender isso, ter� rela��es melhores na sua vida. H� um te�logo que diz que o caix�o pesa o peso das palavras n�o ditas (...). Digo muito para as m�es que abracem os filhos, cheirem-nos bem para, quando eles chegarem � adolesc�ncia, saberem se eles beberam, fumaram ou mexeran com drogas. Conhe�am melhor os seus filhos”.
Ap�s deixar a plateia reflexiva, Filomena desce do p�lpito, respira fundo e torna a vestir o jaleco branco. Na manh� seguinte, bem cedo, estar� cuidando dos beb�s de fam�lias de baixo poder aquisitivo do CTI infantil da Santa Casa de Miseric�rdia, onde d� plant�o desde 1995. Dali Fil� tira inspira��o para suas prega��es e aprende a relativizar pequenos problemas do cotidiano. “Estou agora com o caso de uma m�e cujo filho veio ao mundo com grave comprometimento dos rins. H� tr�s dias, o beb� est� com a frequ�ncia card�aca baixa, s� esperando o momento em que a m�e possa tomar coragem e dizer a ele: ‘Pode ir meu filho, que um dia eu te vou te encontrar...’. A m�e � uma figura importante demais na vida de um filho. S� ela d� permiss�o para que ele possa nascer e tamb�m morrer”, afirma.
Ao fazer a ronda dos leitos da Santa Casa, com 100% dos ber�os doados por uma benfeitora an�nima, Filomena conversa com as fam�lias, uma a uma. “O principezinho est� bem hoje, mam�e”, diz. “Operou o cora��o, papai. Amanh� vai tirar o dreno, a sondinha est� bem.” Quando chega ao leito do beb� em estado terminal, Fil� se det�m por mais tempo. Torna a conversar com a jovem m�e, que n�o arreda p� h� cinco meses da incubadora. “N�o vamos desistir do seu filho at� o �ltimo segundo. A hora em que voc� estiver preparada, podemos coloc�-lo no colo, para morrer com dignidade, perto de quem ama. Ent�o, vamos fazer uma transfus�o de serenidade?”, diz Fil�, que curiosamente n�o teve filhos. Casou-se aos 48 anos com um engenheiro, ap�s a morte de um namorado: “Achei que minha miss�o era s� servir a Jesus. Casar foi s� mais uma delicadeza dele. Mas o casamento me completa”.
Escute mais dicas da doutora Fil� a pais e m�es.
Aos 17 anos, Filomena mudou-se sozinha para Belo Horizonte, com a miss�o de estudar na Faculdade de Ci�ncias M�dicas, com o apoio da tradicional fam�lia cat�lica de Oliveira. At� dois anos antes, participou da coroa��o de Nossa Senhora, em maio. “Aprendi a rezar o ter�o, de joelhos, com meus pais. Em Oliveira, s�o 31 dias de coroa��o, todos os dias. No meu anivers�rio, em 19 de maio, eu tinha a honra de colocar a coroa na m�e de Jesus. Nos outros dias, levava um pratinho com flores”, explica. Ela recomenda como f�rmula de vida “dobrar os joelhos, porque eles te levam aonde os p�s n�o alcan�am”.
Ao chegar � capital, a jovem Filomena n�o conhecia ningu�m. “Meu pai n�o queria que eu sa�sse de casa porque a situa��o era dif�cil e, apesar de ele ser banc�rio, as despesas eram altas. Ele falava que, se eu reclamasse, teria de voltar para casa. Com isso, aprendi a nunca reclamar. Lembro-me das minhas cenas na igreja, ajoelhada, dizendo para Jesus: ‘Estou vindo chorar um pouquinho, mas o senhor n�o se preocupe, porque vou dar conta’. Pode imaginar algu�m tentando consolar Deus?”, recorda-se ela, que s� podia visitar os pais de 15 em 15 dias e dar um telefonema por semana. “S� fiz medicina porque n�o tinha outra forma de ser pediatra. Minha m�e conta que eu, desde cedo, falava que, quando crescesse, cuidaria de ‘nen�m dod�i’”. Tem como discutir com uma crian�a, ainda mais iluminada desde a inf�ncia como a Fil�?
Todas as ter�as-feiras, a partir das 20h, Filomena Camilo do Vale re�ne o seu grupo de ora��o na Par�quia Nossa Senhora Rainha, no Bairro Belvedere. Suas prega��es s�o transmitidas pela R�dio Belvedere FM, �s 22h. Em 4 de junho, a dra. Fil�, como � conhecida, estar� tamb�m na abertura do II Semin�rio Internacional de M�es, falando sobre os desafios na primeira inf�ncia. Mais informa��es sobre o evento, que j� abriu o segundo lote de inscri��es, podem ser
acessadas pelo endere�o www.seminariodemaes.com.br.