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Estado de Minas

Morte de menina de 10 anos estuprada mostra avan�o da criminalidade no interior

Morte violenta da menina Raiane tira dos eixos a pacata comunidade rural de Seriema, onde todos se conhecem, e exp�e o crescimento da criminalidade no interior do estado


postado em 12/06/2016 06:00 / atualizado em 12/06/2016 09:07

(foto: Luiz Ribeiro/EM/D.A Press )
(foto: Luiz Ribeiro/EM/D.A Press )

Buen�polis – O caso da menina Raiane Aparecida C�ndida, de 10 anos, que foi estuprada, morta e teve o cora��o arrancado pelo assassino, quebrou o ritmo tranquilo da zona rural de Buen�polis, na Regi�o Central de Minas deixando em choque moradores de uma comunidade pacata, onde todo mundo se conhece. Para especialistas, o crime demonstra a expans�o da criminalidade no interior, especialmente da viol�ncia sexual (leia texto nesta p�gina).

O crime, que ganhou repercuss�o internacional, ocorreu numa �rea isolada, caracterizada por morros, matas fechadas, casas distantes uma das outras e poucos habitantes. “Quando a menina sumiu, cheguei a falar para a pol�cia que pensava que ela poderia ter sido comida por uma on�a. Jamais imaginaria que ela pudesse ser atacada por um ser humano em um lugar t�o tranquilo, onde todo mundo � amigo”, conta a auxiliar de enfermagem Evane Margareth Viveiros Costa, de 54, tia de Raiane.

“Ficamos muito chocados. A gente nunca imaginou que aqui pudesse acontecer um ato de viol�ncia desse. Seriema � o lugar mais quieto do mundo”, diz a lavradora Zaira Aparecida dos Santos, vizinha da fam�lia da v�tima na comunidade distante 30 quil�metros da sede de Buen�polis. “Aqui tem poucos moradores, quando aparece algum desconhecido, a gente acha estranho”, afirma Pl�cido de Jesus Silva, marido de Zaira. “Foi uma trag�dia. Nunca houve esse tipo de coisa nessa regi�o”, completa o agricultor Raimundo Gilson Abreu, de 24.

A garota foi estuprada e morta na manh� de 1º de junho. Jairo Lopes, de 42, confessou ter abordado a v�tima logo depois que ela saiu de casa para caminhar at� o ponto onde pegaria uma van que rodaria seis quil�metros at� chegar � escola na comunidade de Salobro, tamb�m na zona rural do munic�pio. O homem confessou que, ap�s enforcar e estuprar a menina, arrancou o cora��o da v�tima, para “ter certeza de que ela estava morta” e jamais o denunciaria. Com tamanha brutalidade, o crime ganhou repercuss�o nacional e internacional, com divulga��o em jornais e sites da Europa.

O autor confesso foi capturado por um grupo de vaqueiros numa fazenda no munic�pio de Joaquim Fel�cio, depois de seis dias de uma intensa ca�ada, que envolveu dezenas de policias militares e moradores, helic�ptero e c�es farejadores. Logo depois de ser preso, sofreu tentativa de linchamento por populares. Inicialmente, foi levado para Curvelo e, por quest�o de seguran�a, na noite de quinta-feira, foi transferido para pres�dio de Ribeir�o das Neves, na Regi�o Metropolitana de Belo Horizonte.



Foragido


Alegando ser trabalhador rural, Jairo Lopes, que chegou � regi�o h� cerca de um ano e meio, morava com sua companheira, conhecida como C�cera, numa fazenda na localidade de Saquinho, pr�ximo de Seriema. Aproveitando-se do isolamento da �rea, vivia escondido na regi�o, adotando o nome falso de “Adauto”, j� que era foragido da Justi�a de Montes Claros, onde responde pelos crimes de tentativa de homic�dio, roubo e estupro. Ele conseguiu escapar do Pres�dio Alvorada, na cidade do Norte de Minas, em 2012. Ao ser capturado ap�s o ritual de monstruosidade contra Raiane confessou mais dois homic�dios contra adultos, sendo que tamb�m j� era acusado de abuso sexual contra duas crian�as no distrito de Engenheiro Dolabella, no munic�pio de Bocaiuva.

Raiane morava com o pai, Sebasti�o Costa, numa casa simples, ao lado da moradia da av�, Estelita. A m�e da garota morreu h� oito meses, de problemas card�acos. Na manh� do crime, Raiane acordou, tomou caf�, vestiu o uniforme e pegou o caminho para andar cerca de 700 metros, passando por uma pequena mata, um c�rrego (que est� seco) e tr�s porteiras, at� o ponto onde pegaria a van que a levaria � escola em Salobro. O agricultor Manoel Divino Costa, de 46, tio de Raiane, salienta que a menina sempre percorreu aquela dist�ncia sozinha, sem nenhuma preocupa��o para a fam�lia, “pois aqui nunca apareceu estranho e sempre foi muito tranquilo”.

No dia do crime, Jairo levantou por volta das 5h e se deslocou a p� por seis quil�metros at� encontrar Raiane, que teria sido abordada logo depois de sair de casa. O homem, que, de acordo com as investiga��es premeditou o crime, arrastou a v�tima por quatro quil�metros entre a vegeta��o at� parar no meio de uma mata fechada, onde, depois de enforc�-la com uma corda, cometeu o estupro com a v�tima deitada no ch�o, vestida com o uniforme escolar e com a mochila nas costas.

O fato de a regi�o contar com lugares ermos e ter poucos habitantes ajudou na localiza��o do corpo da menina, que foi deixado dentro da mata fechada, em um local de dif�cil acesso. “Como n�o passa muita a gente por aqui, n�s seguimos as pegadas do homem e da menina dentro do mato”, conta o agricultor Manoel Divino, que, com outras cinco pessoas, localizou o corpo da garota com abd�men aberto e sem o cora��o, coberto de ramos, em 2 de junho, um dia ap�s o desaparecimento dela.


A ferida exposta da viol�ncia


O estupro e morte da menina Raiane Aparecida C�ndida em uma regi�o isolada da zona rural de Buen�polis demonstra a banaliza��o da criminalidade, revelando tamb�m que a viol�ncia e abusos sexuais contra crian�as e adolescentes est�o presentes em todos os lugares, apesar da subnotifica��o dos casos, afirmam especialistas ouvidos pelo Estado de Minas. “A afirma��o de que o interior n�o tem viol�ncia n�o passa de uma lenda. A viol�ncia aumentou e muito. Quem mora no interior pode explicitar isso”, observa a professora e pesquisadora Maria �ngela Figueiredo Braga, do Departamento de Pol�tica e Ci�ncias Sociais da Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes).

“Mesmo sendo um fen�meno que perpassa todos os segmentos da nossa sociedade, sem distin��o de classe, g�nero, cor e outros, a viol�ncia � diferente no interior e nos grandes centros. No interior, o risco de tomar uma bala perdida no meio da rua � quase inexistente. Entretanto, ao voltar para casa, pode-se encontr�-la arrombada e com alguns de seus pertences sumidos”, comenta a pesquisadora.

Para o professor da Pontif�cia Universidade Cat�lica de Minas Gerais (PUC-MG) Robson S�vio Reis Souza, integrante do F�rum Brasileiro de Seguran�a P�blica, crimes como o cometido contra Raiane mostram a dimens�o da viol�ncia sexual contra crian�as e adolescentes, que segundo ele, muitas vezes, � subnotificada devido � descren�a na pol�cia e na Justi�a, discrimina��o e falta de pol�ticas p�blicas de acolhimento e prote��o das v�timas. Ele lembra que o estudo “Estupros no Brasil: uma radiografia segundo dados da sa�de”, do Instituto de Pesquisa Econ�mica Aplicada (Ipea), aponta que apenas 10% dos casos viol�ncia sexual contra crian�as e adolescentes chegam ao conhecimento da pol�cia.

“Na verdade, quando um ou outro caso aparece e tem repercuss�o social e midi�tica aponta simplesmente para uma pontinha do iceberg. Por isso, n�o d� para falar de aumento desse tipo de viol�ncia. Trata-se de um crime muito mais comum, sistem�tico e permanente do que se imagina. Talvez, esse caso tenha ganhado mais visibilidade pelo n�vel de perversidade: arrancar o cora��o da v�tima”, avalia Reis Souza.

Ele lembra ainda que F�rum Brasileiro de Seguran�a P�blica projeta que tenham ocorrido entre 136 mil e 476 mil casos de estupro no Brasil no ano passado. “A proje��o mais ‘otimista’ est� baseada em estudos internacionais, como o National Crime Victimization Survey, que aponta que apenas 35% das v�timas desse tipo de crime prestam queixa”, relata.

O especialista afirma ainda que a viol�ncia sexual contra crian�as e adolescentes atinge “todos os estratos sociais, nas cidades do campo. “Faz parte de uma cultura machista, opressora e violenta, que conta com a coniv�ncia de um sistema de justi�a criminal que, nesses casos, via de regra, condena a v�tima e protege o agressor, na maioria das vezes um parente pr�ximo da v�tima”, opina o especialista.

Dor por uma aluna aplicada


Raiane Aparecida C�ndida, de 10 anos, era uma menina determinada e bem aplicada na Escola Municipal Verador An�zio Maciel de Figueiredo, onde cursava o 5º ano na localidade de Salobro, na zona rural de Buen�polis. “Neste ano, ela n�o matou nem um dia de aula. Ela era uma das melhores alunas da classe”, relata Jhony Reis Abreu, de 10 anos, que era colega de Raiane, assassinada no dia 1º. O estudante conta que a professora da menina, chamada Magda, passou mal ao tomar conhecimento do crime. “Todos os funcion�rios da escola choraram muito”, recorda-se.

A lavradora Divina Santos Ferreira, de 51, tia de Raiane, disse que considerava a sobrinha como filha e foi uma das primeiras pessoas a perceber o desaparecimento dela. “Eram duas da tarde. A gente achava que a Raiane tinha ido para a escola. S� que ela n�o voltou. A�, entrei em desespero”, afirma Divina, revoltada com o caso. “A gente fica muito triste e queria que ela voltasse. Mas sabemos que ela n�o vai voltar mais”, lamenta.


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