
Fora delas, parte do cen�rio real – os o�sis do cerrado – se perde para sempre, consumido pelo fogo. No centro da devasta��o, o homem, patrocinador das queimadas criminosas, numa guerra sem vencedores.
A destrui��o da vegeta��o da vereda permite a forma��o de pasto, um benef�cio imediato e passageiro, mas destr�i as nascentes, um preju�zo permanente, explica o t�cnico do Instituto Estadual de Florestas (IEF) Jairo Viana.
A guerra � dura. Em Bonito de Minas, o Estado de Minas presenciou o combate ao fogo na Vereda da Ema, em 4 de outubro, numa a��o que durou quatro dias e envolveu equipes de brigadistas com apoio de um avi�o do Programa de Preven��o e Combate a Inc�ndios Florestais (Previnc�ndio) do IEF (foto acima).
“Uma vereda da regi�o ficou queimando 128 dias e o fogo s� se apagou depois que choveu”, conta Viana, ao explicar que as chamas atingem n�o apenas os buritis, mas tamb�m a turfa, a mat�ria org�nica acumulada no subsolo, a quatro ou cinco metros de profundidade. “Para extinguir o fogo abaixo da superf�cie � preciso que o solo fique encharcado e s� a chuva pode fazer isso”, completa.
Os preju�zos s�o imensos. A queima da turfa leva ao secamento da vereda. Somente no inc�ndio presenciado pelo EM, foram queimados 178 hectares ao longo de 2,5 quil�metros da Ema, que tem quil�metros de extens�o. Em outro ponto da mesma vereda, localizado abaixo de uma barragem, uma �rea exibe sinais de queimada ocorrida h� dois meses, que devastou cerca de 145 hectares.

No local foram vistos bois se alimentando de capim-gordura, esp�cie nativa nas veredas, que brota ap�s o fogo. “Infelizmente, produtores ateiam fogo na vegeta��o para depois usar o broto do capim para alimentar o gado.
O problema � que eles conseguem o pasto, mas destroem para sempre as nascentes”, diz o t�cnico, salientando que “99% das queimadas nas veredas da regi�o s�o criminosas”. Outro impacto ambiental � provocado pelo pisoteio do gado, que entope as nascentes, destaca.
SEM ESPERAN�A A degrada��o gerada pelas queimadas � vis�vel na regi�o de Pandeiros, tamb�m no munic�pio de Bonito de Minas. Em veredas que j� ocuparam grandes �reas inundadas, hoje h� buritis mortos, vegeta��o seca e ch�o esturricado. Na Vereda da Capivara, que se estende por 6,5 quil�metros, a �gua secou h� 10 anos.
“Ela perdeu toda a sua caracteriza��o. O solo foi totalmente modificado ap�s um processo intenso de degrada��o provocado pelas queimadas”, afirma a pesquisadora Maria das Dores Magalh�es Veloso, a Dora, do Departamento de Biologia da Unimontes, que acompanhou a reportagem ao local, de dif�cil acesso. S� � poss�vel chegar at� a Capivara em carro alto e de tra��o, pelo meio do mato, devido � falta de estradas.

O solo turfoso da vereda tornou-se arenoso ap�s sucessivas queimadas. No lugar que j� foi ocupado por buritis e a gram�nea caracter�stica das nascentes, hoje s�o vistas plantas do cerrado. “A vereda est� totalmente antropizada. Primeiro foi a ocupa��o das terras pelo homem. Depois, vieram as queimadas, seguidas da cria��o de gado. Dificilmente vamos reverter a situa��o”, lamenta a pesquisadora.
Ainda no munic�pio de Bonito de Minas, a vereda do Pindaibal, que forma o c�rrego de mesmo nome, j� foi cheia o ano inteiro. Agora, a fartura de �gua faz parte da hist�ria mostrada em fotos guardadas pela unidade do IEF do munic�pio. A vereda est� completamente seca ao longo dos seus 18 quil�metros de extens�o.
“� de cortar o cora��o da gente”, lamenta o agricultor Joaquim Barbosa dos Santos, de 67 anos. Sem nunca ter lido livros, Joaquim acaba confirmando que conheceu o “antigo brejo cheio d’�gua” no mesmo per�odo do lan�amento da obra-prima de Guimar�es Rosa, que descreve a fartura h�drica da regi�o naqueles tempos.

“Conhe�o esta vereda h� 60 anos. Antigamente, era s� �gua e brejo. Ningu�m passava a p�, e cavalo s� atravessava nadando. Isso aqui era um p�ntano com 10 metros de profundidade. Tinha lugar em que a �gua chegava a 800 metros de largura”, descreve o agricultor, debaixo de uma ponte no leito vazio do Pindaibal, que cinco quil�metros adiante alcan�a o Rio Pandeiros.
“Aqui tinha muito peixe”, diz Joaquim Barbosa, lembrando que a vereda Pindaibal come�ou a secar h� 10 anos. O agricultor afirma que os danos ambientais foram provocados por empresas agropecu�rias que fizeram plantios de arroz, reflorestamentos e cria��o de gado na regi�o nas d�cadas de 1980 e 1990. Segundo ele, as firmas desmataram as �reas de cerrado e drenaram os brejos. H� cerca de 15 anos, abandonaram os projetos sem reparar os danos que causaram.
Na comunidade de Aldeia, perto do distrito de Serra das Araras, no munic�pio de Chapada Ga�cha, o agricultor Joaquim Lopo de Oliveira lamenta o quadro do Rio da Catarina, situado pr�ximo a v�rias veredas e que, muito assoreado, ficou praticamente seco na maior parte deste ano. “� triste ver as veredas secando enquanto a gente passa dificuldades pela falta d �gua.”
