
Liminar da Justi�a Federal de Passos, no Sul de Minas, reacendeu pol�mica entre 1,5 mil fam�lias donas de terrenos dentro do Parque Nacional da Serra da Canastra e �rg�os ambientais que se arrasta por mais de quatro d�cadas. A decis�o autorizou os moradores a criar gado, cultivar e explorar as terras comercialmente, sem a necessidade de fiscaliza��o por parte do Instituto Chico Mendes de Conserva��o da Biodiversidade (ICMBio), respons�vel pela gest�o da �rea. A liminar, assinada pelo juiz Bruno Augusto Oliveira, foi concedida a favor de a��o civil p�blica proposta por produtores rurais que ocupam �rea de 128.475 mil hectares n�o desapropriada pelo governo federal dentro da reserva.
Para o ICMBio, a decis�o p�e em risco a conserva��o da �rea onde fica a nascente do Rio S�o Francisco. O Parque Nacional da Canastra abrange cerca de 200 mil hectares e faz limite com seis munic�pios do Sul do estado, sendo a maior parte em S�o Roque de Minas. O �rg�o ambiental informou que a decis�o “coloca em risco e sob alta vulnerabilidade ambiental” da regi�o e que o caso j� foi encaminhado � Advocacia-Geral da Uni�o (AGU), que “adotar� as medidas judiciais cab�veis para garantir a prote��o deste importante territ�rio, que conserva in�meras esp�cies amea�adas de extin��o e as nascentes de um dos rios mais importantes do pa�s: o Rio S�o Francisco.”
O Parque da Serra da Canastra foi criado por decreto assinado pelo presidente Emilio Garrastazu M�dici, em 3 de abril de 1972. Em 21 de agosto de 1974, foi assinado um outro decreto, declarando uma �rea de interesse social para fins de desapropria��o de 106.185,50 hectares. O juiz federal de Passos explica que este segundo decreto, por�m, j� � considerado sem validade e que, at� hoje, foram desapropriados mesmo apenas 71.525 hectares, ficando 128.475 hectares de “�reas n�o-consolidadas”, nas quais os agricultores ficaram impedidos de desenvolver atividades produtivas por causa das restri��es impostas pelos �rg�os ambientais.
Segundo o magistrado, desde que parque foi criado houve uma s�rie de a��es judiciais e tamb�m projetos discutidos na C�mara dos Deputados e no Senado sobre a regulariza��o fundi�ria da regi�o, sem que se chegasse um acordo. Enquanto isso, para o juiz Bruno Oliveira, eles continuaram prejudicando produtores de �reas da extens�o do parque nos munic�pios de S�o Roque de Minas, Vargem Bonita, Sacramento, Delfin�polis, S�o Batista do Gl�ria e Capit�lio. Ele ressalta ainda que a regi�o tem grande import�ncia econ�mica, social e cultural, mantendo tradi��es, como a produ��o do famoso queijo canastra.
DESAPROPRIA��ES “Precisaremos de uma met�fora liter�ria para alcan�ar o significado de tantos atos sem fundamento legal praticado por tanto tempo (mais de quatro d�cadas) sobre uma popula��o, em sua maioria hipossuficiente. Do ponto de vista objetivo, o cen�rio � dantesco; sob o ponto de vista subjetivo (daqueles que se encontra h� 45 anos sob inseguran�a quanto a seu patrim�nio � perspectiva de vida), � kafkiano”, relatou o juiz Bruno Oliveira em sua decis�o. Na liminar, ele pro�be o ICMBio, o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Renov�veis (Ibama) e outros �rg�os ou autarquias do Executivo de exercer “qualquer atividade tendente � consolida��o fundi�ria para fins de desapropria��o fundi�ria, por doa��o, desapropria��o ou qualquer outro meio, at� que se edite decreto de interesse social exigido pela ordem jur�dica”.
De acordo com a decis�o judicial, o ICMBio fica afastado de qualquer atua��o sobre as chamadas “�reas n�o consolidadas” do Parque Nacional da Serra da Canastra, com a fiscaliza��o da regi�o sob atribui��o do Ibama, com base nas normas ambientais do C�digo Florestal, “aplic�veis � generalidade da popula��o”. Por meio da liminar, o juiz autoriza os produtores das �reas n�o desapropriadas do parque “exercerem as atividades econ�micas em suas propriedades, sujeitos �s normas administrativas e legais quanto �s atividades de impacto ambiental relevante, tais como licenciamentos e autoriza��es, que dever�o ser obtidas junto aos �rg�os municipais, estaduais ou federais, de acordo com a legisla��o em vigor”. O juiz ressalta que, apesar da libera��o da cria��o de gado, plantios e outras atividades por parte dos produtores da Serra da Canastra, eles devem continuar atentos para a conserva��o do meio ambiente, sofrendo as implica��es da legisla��o ambiental.
FAM�LIAS COMEMORAM A liminar concedida pelo juiz Bruno Augusto Oliveira, da Vara da Justi�a Federal em Passos, que permite as atividades produtivas na parte n�o desapropriada do Parque Nacional da Canastra, foi muito comemorada pelos donos dos im�veis dentro da �rea de conserva��o, que alegam preju�zo ao longo de quatro d�cadas. Uma das propriet�rias de �reas na Serra da Canastra, Ana Trindade, de Delfin�polis, ressalta que com as restri��es do ponto de vista ambiental impostas pelo ICMBio, centenas de produtores da regi�o n�o tiveram mais como fabricar seus produtos. “Muitos deles venderam terras a pre�o de banana”, afirma Ana Trindade, alegando que gera��es inteiras foram prejudicadas pelos conflitos e pelo impasse no processo de desapropria��o para a implanta��o do parque federal no entorno da nascente do Rio S�o Francisco.
Ela lembra que, em 2015, deixou o trabalho numa companhia do ramo de refrigerantes e fundou o Instituto Candeias, com o prop�sito de promover cursos de capacita��o, desenvolver projetos de pr�ticas sustent�veis na agropecu�ria, a recupera��o e conserva��o de nascentes, educa��o ambiental e turismo ambiental na Serra da Canastra. Acabou enfrentando algumas barreiras para realizar algumas obras no terreno da organiza��o n�o governamental, instalada na �rea do Parque da Canastra que n�o foi desapropriada. Ela anuncia que est� trabalhando em um projeto de um viveiro com capacidade para produzir 100 mil mudas de esp�cies nativas por ano na regi�o.
HERDEIROS Outra que comemora a liminar concedida pelo juiz federal de Passos � D�nia Cristina Lopes, do Vale da Gurita, tamb�m no munic�pio de Delfinopolis, localidade onde s�o mantidos produtores herdeiros de v�rias gera��es. “A decis�o do juiz para n�s foi a melhor coisa que podia ter ocorrido, ele nos fez ter esperan�a que podemos sim acreditar na Justi�a deste pa�s. S� quem, como n�s canastreiros, vivemos aqui sabe a preciosidade que � este lugar.Falo de preciosidade porque vivemos em meio a riquezas imensas, cercados de muita �gua, muita mata, plantas e animais de v�rias esp�cies”, comenta.
Ela tamb�m questionou o argumento do Instituto Chico Mendes de Conserva��o da Biodiversidade. “Essa alega��o do ICMBio com todo respeito s� pode ser piada. Como um �rg�o que n�o consegue cuidar da �rea que � de sua responsabilidade pode dizer que a decis�o do juiz � uma amea�a a preserva��o? Sabemos at� aonde podemos ir e o que podemos fazer para preservar o lugar onde vivemos e de onde tiramos nosso sustento”, afirma.