
Os pastos extensos, coqueirais e matas j� foram paisagens de fazendas de produtores rurais da regi�o de S�o Joaquim de Bicas, Brumadinho e Igarap�, na Grande BH, mas entraram na mira do mais ambicioso plano de expans�o da mineradora MMX, parte do grupo EBX, do empres�rio valadarense Eike Batista. Ao todo, 65 propriedades foram sendo sistematicamente compradas, a valores acima do mercado imobili�rio local, somando 2,5 mil hectares de terras que serviriam para que a MMX aumentasse sua extra��o e processamento de min�rio, de 6 milh�es de toneladas por ano para 25 milh�es de toneladas. Mas, com a crise que se abateu sobre as empresas do grupo e que culminou com a pris�o na �ltima segunda-feira do empres�rio, por corrup��o em neg�cios no Rio de Janeiro, essas �reas se tornaram terras de ningu�m. Lugares baldios e que t�m sido usados para atividades criminosas, trazendo preocupa��o para os vizinhos, antes esperan�osos de que, com a incorpora��o das propriedades pela empresa, haveria mais seguran�as patrulhando suas cercas. Hoje, os terrenos est�o inventariados e, pelo c�lculo estipulado no plano de recupera��o judicial homologado na Justi�a, dever�o render cerca de R$ 45 milh�es.
“A vinda da MMX levou a gente para o c�u muito rapidamente, ganhando muito dinheiro com os servi�os de que eles precisavam na regi�o, mas depois jogou a gente para o inferno na mesma velocidade, quando se foram e deixaram at� d�vidas”, afirma Helenita Andrade, dona de uma pousada e restaurante tradicional em S�o Joaquim de Bicas. Antes, o lugar s� abria aos s�bados e domingos, mas, com a chegada da MMX, passou a hospedar 14 diretores, gerentes e a servir diariamente em m�dia 200 refei��es todos os dias. “Quando eles (da MMX) chegaram, veio muita gente abrindo restaurantes, hot�is, com�rcio... O dinheiro estava circulando. Muita gente vendeu suas terras para eles. Em tr�s anos o sonho acabou. Tinha 4 mil funcion�rios aqui, que sumiram, evaporaram. Foi um quebrando atr�s do outro e a maioria de quem investiu foi embora”, afirma Helenita.

Propriedades ‘depenadas’
O valor que a MMX espera auferir com a venda das fazendas � tido como otimista por vizinhos das propriedades, ainda que poucos queiram comentar abertamente o caso, precau��o tradicional do mineiro do campo. “Quando venderam essas fazendas, a MMX disse assim: voc� tem 1 m�s para tirar tudo o que quiser daqui. S� vamos ficar com o terreno. Depois de um m�s vamos fechar as porteiras”, lembra o vizinho de uma das propriedades da mineradora, que conversa sobre tudo da �poca, mas prefere n�o “meter o dedo na briga de cachorro grande”. “O que teve de caminh�o parando ao lado das casas, �reas de churrasqueiras e jardins das fazendas para levar telhas, janelas, portas... At� privada foi embora. S� ficou o esqueleto das casas. Agora, sem nenhuma benfeitoria e com essas casas invadidas por marginais para serem pichadas, usadas para consumo de drogas e orgias, quem � que vai pagar o mesmo pre�o?”, questiona o fazendeiro.
Em S�o Joaquim de Bicas, na estrada que liga a BR-381 ao Instituto Inhotim, as ru�nas das casas de algumas dessas fazendas se tornaram ponto de encontro de criminosos, segundo afirma��o de vizinhos. A equipe de reportragem do Estado de Minas esteve em algumas dessas propriedades, que ainda det�m placas desbotadas da MMX. Est�o todas pichadas e no interior de uma delas havia v�rias carca�as bovinas espalhadas. Segundo vizinhos ouvidos, sinais de gado roubado e destrinchado dentro do mato. Numa das fazendas � poss�vel observar at� uma picape desmanchada e depois incendiada. Ainda segundo moradores do entorno, desovada na propriedade depois de ter sido roubada.
Por meio de sua assessoria de imprensa, a MMX afirma que “as fazendas est�o praticamente todas arrendadas em contratos de curto prazo e aguardando para a realiza��o da venda, conforme previsto no plano (de recupera��o judicial)”. Sobre a quest�o do uso das terras por marginais, a empresa informou: “Nunca recebemos qualquer reclama��o nesse sentido”. Quanto �s d�vidas com pessoas da regi�o que se sentiram lesadas, a assessoria informou que “a MMX j� recebeu R$ 65 milh�es como parte do pagamento pela venda das minas e transferiu grande parte desse recurso aos credores. Somente n�o transferiu para aqueles que n�o informaram dados banc�rios para a companhia”.
Atoleiro come�ou em f�brica de jipes
Muita gente n�o sabe, mas a primeira companhia aberta por Eike Batista foi uma f�brica de ve�culos fora de estrada em Pouso Alegre, no Sul de Minas. A JPX come�ou suas atividades em 1993 fabricando jipes de uma plataforma francesa e chegou a atender at� a uma encomenda de 400 unidades para o Ex�rcito do Brasil. Contudo, a empresa fechou em 2001, devido a in�meros problemas com partes mec�nicas dos carros e a uma superaquecimento de motor que s� foi resolvido em 2000, sete anos depois que os primeiros autom�veis sa�ram da linha de montagem. A alta do d�lar tamb�m foi apresentada como culpada, j� que 30% das pe�as eram importadas.
Quem tem ve�culos da marca atualmente sofre para conseguir pe�as, com muitos propriet�rios sendo obrigados a recorrer a adapta��es. “A empresa era muito boa, pagava em dia, toda semana. O carro tamb�m era bom. Acho que o Eike foi mal assessorado. Trouxe uns italianos que indicaram para ele usar diferenciais e outras partes que s�o comuns de se trocar na Europa, mas que aqui no Brasil s�o feitas para durar. Com isso, come�ou a haver muita manuten��o e ningu�m mais quis o jipe. Se tivesse usado pe�as nacionais desde o in�cio, teria resolvido o problema”, afirma um ex-trabalhador da JPX, Marcelo Martins Oliveira, hoje propriet�rio de uma oficina mec�nica em Pouso Alegre.
Do tempo em que fazia a regulagem das bombas injetoras dos JPX que n�o tinham turbo de f�brica, lembra que Eike foi duas vezes apenas at� a montadora. “Ele tinha at� um apartamento no Centro de Pouso Alegre, mas s� veio umas duas vezes � f�brica mesmo. A Luma de Oliveira fazia propaganda do jipe e todo mundo ficou curioso com o Eike aqui. Teve uma vez que ele patrocinou uma expedi��o na Amaz�nia com os jipes e um dos motoristas era o ex-piloto Wilson Fittipaldi. Um desses carros voltou aqui para a oficina com o motor cheio de �gua”, lembra.
No local onde a oficina ficava, �s margens da Rodovia Fern�o Dias (BR-381), funciona hoje uma f�brica de chicotes el�tricos para ve�culos japoneses. No entanto, essa ind�stria tamb�m n�o resistiu � crise e est� prevista para este ano sua transfer�ncia para o Paraguai. “A gente n�o sabe o que acontece ali, se � uma cabe�a de burro que est� enterrada, mas a primeira empresa que tinha no lugar foi a primeira do Eike a quebrar tamb�m”, comenta Marcelo.