
Nova Lima e Brumadinho – Inseguran�a, preocupa��o e preju�zos: para centenas de fam�lias retiradas de suas moradias ou privadas de seus meios de sustento desde que a onda de lama varreu a comunidade de C�rrego do Feij�o, em Brumadinho, Grande BH, a volta � rotina � uma inc�gnita, enquanto as perdas s�o bem concretas. Nas outras cidades em que as sirenes de mineradoras determinaram o afastamento de pessoas de suas casas e neg�cios – Nova Lima (no distrito de Macacos), Bar�o de Cocais e Itatiaiu�u, at� a noite de ontem – os afetados contam os dias afastados de seu cotidiano e pertences, ao mesmo tempo em que contabilizam a perda de rendimentos e a quase certeza de que eles dificilmente ser�o compensados a contento.
Pior para os que assistem aos preju�zos se acumularem, como na comunidade de S�o Sebasti�o das �guas Claras, distrito de Nova Lima marcadamente tur�stico, conhecido como Macacos. L�, o medo disseminado a partir do momento em que a Barragem B3/B4 da mineradora Vale n�o teve mais sua seguran�a atestada acertou em cheio n�o s� a rotina da comunidade, mas tamb�m a economia. O alerta sobre o risco do reservat�rio de rejeitos teve resultado instant�neo sobre pousadas e restaurantes, que imediatamente come�aram a perder h�spedes e clientes. Empres�rios temem que o cen�rio negativo gere um efeito cascata em todo o com�rcio local, culminando com o fechamento em massa de neg�cios e a perda de empregos na vila.
Dono de duas pousadas que totalizam 44 quartos, Ronaldo Apar�cio Rodrigues, de 52 anos, diz que todas as acomoda��es j� estavam reservadas para o carnaval antes de a Vale anunciar que a barragem teve o fator de seguran�a alterado de 1 para 2, o que exigiu a evacua��o das pessoas que ocupam a chamada zona de autossalvamento – onde n�o h� tempo para que o poder p�blico atue em caso de rompimento da barragem, e os afetados t�m que escapar pelos pr�prios meios.
"Como vamos pagar pelos produtos que recebemos? Al�m disso, principalmente os produtos de cozinha t�m validade curta"
Alexandre Naurath, dono de pousada
“Estava lotado, mas at� agora j� foram 20 cancelamentos, quase metade da minha capacidade. O normal do carnaval � alugar tudo com dois meses de anteced�ncia, e nos fins de semana normalmente ficamos lotados. N�o h� procura para esses pr�ximos s�bado e domingo”, diz Ronaldo. Ele conta que tem 20 funcion�rios empregados atualmente nas duas pousadas e j� pensa em alternativas. “Vou ter que definir um plano de f�rias ou algo do tipo. As pessoas est�o assustadas com a situa��o. E como a vida vale mais que tudo, ningu�m quer se arriscar. Acho que vai demorar para as coisas voltarem ao normal, mesmo se a seguran�a da barragem for garantida”, completa.
Desde 2006, Alexandre Naurath, de 44, comanda com a esposa a Pousada Farol da Serra. Foram quatro anos de constru��o para conquistar o objetivo de vida do casal. Dos 12 quartos, nove estavam reservados para o carnaval. Todos foram cancelados. O dinheiro das reservas come�ou a ser devolvido ontem. “A pousada � um sonho realizado, que se transformou em pesadelo”, desabafa o empres�rio. Alexandre diz que, por mais que ele e a mulher expliquem que a pousada n�o est� em �rea de risco, as pessoas n�o v�o ficar s� na hospedaria: precisar�o transitar por outros pontos da vila, e por isso n�o querem se arriscar.
Ele acredita que, no caso de um poss�vel retorno para o fator de seguran�a 1 da barragem, que garante a estabilidade da barragem, a situa��o n�o deve ser resolvida facilmente. “Esses relat�rios perderam a credibilidade. Ningu�m acredita mais nessas respostas. Acho que s� vai resolver quando a Vale anunciar o descomissionamento imediato da barragem, porque n�s n�o podemos esperar at� 2021”, diz ele, em refer�ncia a um prazo anunciado pela Ag�ncia Nacional de Minera��o – que ontem mesmo j� come�ou a falar em flexibiliza��o das regras rec�m-anunciadas.
Um problema que � geral entre todos os mais de 70 empres�rios e comerciantes que mant�m empresas e pontos de com�rcio em Macacos, segundo Alexandre, � o pagamento de fornecedores. “Como vamos pagar pelos produtos que recebemos? Al�m disso, principalmente os produtos de cozinha t�m validade curta”, completa.
Mesas vazias j� motivam projetos de transfer�ncia

Um dos pontos de maior movimento em Macacos � o Restaurante do Gerson, que costuma ficar cheio todos os dias da semana, segundo funcion�rios e frequentadores. H� nove anos, o empres�rio Gerson de Souza, de 51 anos, abriu o estabelecimento e j� tocava uma amplia��o para oferecer um parquinho para crian�as – agora deixada de lado. Aos domingos, Gerson chegava a faturar R$ 8 mil, mas vendeu apenas R$ 800 no �ltimo, dia seguinte ao alarme das sirenes que indicava a necessidade de evacua��o em parte do distrito. Na segunda-feira, Gerson nem abriu, pois os funcion�rios n�o conseguiram chegar. Ontem, enquanto o normal era praticamente todas as mesas estarem ocupadas por volta do meio-dia, o que mais se via eram cadeiras vazias.
“Em 2001, quando houve rompimento de barragem aqui em Macacos, as coisas demoraram mais de um ano para voltar ao normal. E agora ningu�m acredita na Vale, est� todo mundo com medo. Se em tr�s meses a situa��o n�o der sinais de retomada, vou procurar outro lugar para abrir”, diz Gerson, que j� avalia oportunidades na cidade de Carrancas, no Campo das Vertentes. A queda no movimento traz impacto direto aos trabalhadores, como o gar�om Mauro S�rgio Santos Oliveira, de 30 anos, que h� seis trabalha com Gerson. “A maior parte do meu rendimento vem dos 10% dos clientes. Estou com medo de faltar trabalho”, diz ele, apreensivo.
O normal da padaria do comerciante Jos� Carlos Cassiano, de 55, � vender 10 quilos de p�o de queijo todos os dias e cerca de 1 mil p�es. Depois das sirenes em Macacos, n�o est� chegando a comercializar 150 p�es por dia e n�o alcan�a 1kg de p�o de queijo. “Acabou o com�rcio. Esta semana joguei fora um monte de produtos de sacol�o. N�s vivemos de turismo, se n�o chegar uma pessoa de peso e garantir que essa barragem � segura, Macacos vai acabar”, alerta.
Moradores e comerciantes informaram que os pr�ximos dias ser�o de protestos no arraial. Hoje, est� prevista uma manifesta��o para as 6h na porta da Mina Mar Azul, da Vale, antes da entrada dos trabalhadores. No pr�ximo s�bado, a ideia da popula��o local � abrir o com�rcio e ocupar o espa�o do Centro da vila, pr�ximo � igreja, para fazer uma manifesta��o exaltando o vilarejo. O movimento est� marcado para as 13h.
Acesso flexibilizado
Depois de muito transtorno causado entre o fechamento dos acessos a Macacos no s�bado � noite at� segunda-feira, ontem o fluxo foi retomado nas liga��es entre a comunidade e cidades como BH e Nova Lima. O acesso principal pela AMG-160 foi permitido. Um bloqueio continuou montado na entrada, �s margens da BR-040, mas a passagem foi liberada e monitorada das 5h �s 20h, conforme anunciou ontem o coronel Ant�nio Balsa, comandante da 3ª Regi�o da PM. Funcion�rios a servi�o da Vale fazem o monitoramento, munidos de radiocomunicadores, para manter os demais pontos de bloqueio informados sobre a passagem de carros. A situa��o se repetiu em outros pontos da vila que tinham sido fechados, mas tiveram flexibiliza��o de acesso. A Vale deve responder hoje sobre o pedido de moradores que foram retirados de casa e hospedados em hot�is de Belo Horizonte, mas reivindicam ir para hospedarias no pr�prio distrito.
