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Estado de Minas

Conhe�a as hist�rias dos �rf�os deixados pela trag�dia da Vale em Brumadinho

Parentes assumiram a dif�cil tarefa de explicar �s crian�as e adolescentes que perderam pai, m�e ou mesmo ambos na trag�dia que deixou cicatrizes profundas nas suas fam�lias


postado em 06/03/2019 06:00 / atualizado em 06/03/2019 09:19

Mãos de Carlos Diniz e das duas filhas, de 4 e 14 anos, unidas no sofrimento pela perda, aos 39 anos, de Lenilda, que, segundo ele, deixou %u201Cum vazio muito grande%u201D na casa (foto: Túlio Santos/EM/D.A Press)
M�os de Carlos Diniz e das duas filhas, de 4 e 14 anos, unidas no sofrimento pela perda, aos 39 anos, de Lenilda, que, segundo ele, deixou %u201Cum vazio muito grande%u201D na casa (foto: T�lio Santos/EM/D.A Press)


O mar de lama de Brumadinho arrastou vidas, mas levou tamb�m sonhos, metas, hist�rias. Mulheres e maridos se viram, de uma hora para outra, com a miss�o de falar sobre a morte a seus filhos. Av�s e tios se depararam com o dever de declarar a aus�ncia de pais e m�es. A todos eles, restou o papel de explicar o inexplic�vel aos �rf�os da trag�dia. Na voz de muitas crian�as, o papai ou a mam�e virou estrela. Ser pai e m�e ao mesmo tempo se tornou tarefa s�bita para quem ficou com a responsabilidade da cria��o e educa��o de um n�mero ainda desconhecido de beb�s, crian�as e adolescentes.


O homem que dividia todas as responsabilidades com a mulher, a gerente de uma empresa terceirizada do ramo de alimenta��o que prestava servi�o para a Vale, Lenilda Martins Cardoso Diniz, de 39 anos, se viu de uma hora para outra com todas as decis�es em suas m�os. Sozinho com duas filhas, de 4 e de 14 anos, o t�cnico em eletroeletr�nica Carlos Diniz, de 39, tamb�m funcion�rio da mineradora, conta com o apoio de familiares para encarar a dor e assumir agora o papel tamb�m de m�e das meninas.

Os cachinhos dourados da cabeleira amarrada num rabo de cavalo d�o ainda mais vida � risada de quem, s� mergulhada no mundo da inf�ncia, consegue seguir adiante. � a princesa da casa, chegando da escola. Pouco depois, a mais velha tamb�m adentra a varanda, em uniforme escolar, com sorriso e olhar meigos, fazendo afago no pai. Cada um, � sua maneira, tentando amenizar a dor do outro pela perda do esteio da fam�lia, Lenilda, que era nutricionista no restaurante da empresa. Ela deixou duas joias: Gabriela, a mais velha, e Giovana, a ca�ula.

Carlos pegaria servi�o �s 16h no dia do desastre. Estava na casa da m�e quando uma sobrinha ligou perguntando se a barragem havia rompido. Ligou para a esposa, cujo telefone j� dava desligado. E para mais dois colegas. “Menti para minha filha mais velha, dizendo que tinha conseguido falar com minha mulher. Fui por uma passagem de uma mina desativada de uma minera��o vizinha e, assim, fui um dos primeiros a chegar, pouco tempo depois. Cheguei at� o restaurante e n�o tinha mais nada. De cima da serra, pensei que houvesse sobreviventes. Precisava ir para tentar salvar algu�m. N�o sei como cheguei em casa. �s 22h30, voltei para l�. Ajudamos os bombeiros a tirar um corpo de dentro do �nibus. Passei a noite em claro e, �s 6h, voltei com meus irm�os, mas seguran�as da Vale j� n�o deixaram mais entrar”, se recorda.

"A parte dif�cil foi contar para minha filha pequena. Ela me chama dizendo que quer abra�ar a m�e, a� pe�o para ela abra�ar o pai"

Carlos Diniz, t�cnico em eletroeletr�nica da Vale, que perdeu a mulher, Lenilda, que trabalhava como nutricionista na Mina do C�rrego do Feij�o



“A parte dif�cil foi contar para minha filha pequena. Ela me chama  dizendo que quer abra�ar a m�e, a� pe�o para ela abra�ar o pai”, conta. Desde que voltaram para casa, h� poucos dias, os tr�s dormem juntos na cama grande comprada recentemente, na qual Lenilda dormiu apenas cinco dias. “Minha casa ficou um vazio muito grande. Chego l� e n�o tenho vontade de nada”, relata. Depois da trag�dia, Carlos conta que Giovana ficou mais hiperativa e com medo de tudo, at� de tomar o leite sozinha. Ali�s, n�o fica sem algu�m por perto para nada. A mais velha n�o quis ir ao enterro. E a fam�lia achou melhor n�o levar a mais nova. O pai se preocupa com a sa�de de Gabriela: “N�o sei como isso vai afetar o psicol�gico dela e temo por isso. Ela � muito fr�gil”.

O anivers�rio de 15 anos de Gabriela seria comemorado numa viagem a Canc�n, sonho de Lenilda e da filha. “Sofro porque perdi a mulher que amo, sofro por ver minhas filhas sofrerem, sofro porque perdi colegas de 20 anos de trabalho.”

SEM FESTA Era quinta-feira, anivers�rio da enfermeira Mirl�ia Carla da Silva Machado, de 30 anos. O marido, Ramon J�nior Pinto, de 34, tirou folga de seu posto de analista da Vale para comemorar com a mulher. No fim de semana, a festa estava programada para ser ainda maior, pois a filhinha do casal, Milena, completava 5 anos na ter�a-feira seguinte. Mas a festa t�o esperada e v�rios outros planos foram interrompidos de maneira abrupta. Ramon, que deveria estar de f�rias desde 21 de janeiro e mudou de planos na �ltima hora, � uma dos 186 mortos identificados na trag�dia do rompimento da Barragem 1 da Mina C�rrego do Feij�o. “A Milena viu a movimenta��o estranha em casa, perguntava pelo pai que n�o chegava e por que n�o teve a festa. Dois dias depois, falei a verdade. Ela � madura, e n�o quis mentir para n�o descobrir em outra situa��o. Contei que a lama tinha coberto tudo e que at� ent�o n�o tinham encontrado o papai”, relata Mirl�ia.

“Agora, tenho a responsabilidade de ser pai e m�e. Ser�o muitas crian�as assim. Minha profiss�o me faz ser forte, mas algumas pessoas n�o s�o. Pus o foco na minha filha, tenho que cuidar dela”, diz. A menina questiona situa��es do dia a dia, como quem vai dirigir o carro nas viagens, fun��o executada por Ramon. Embora se referindo a ele no passado, se lembra do pai o tempo todo. “A gente espera que a crian�a chore, que pe�a pela presen�a e isso n�o est� ocorrendo. Fico preocupada, pois pode ser que isso se reflita de outra forma no futuro”, afirma a m�e. Para as duas, domingos s�o os piores dias. Era agenda cheia e, agora, falta um peda�o. “O dinheiro n�o compra a presen�a de um pai. Esse vazio vai ficar com ela.”

"A gente espera que a crian�a chore, que pe�a pela presen�a e isso n�o est� ocorrendo. Fico preocupada, pois pode ser que isso se reflita de outra forma no futuro" - Mirl�ia Machado, enfermeira, que agora tem a responsabilidade de ser m�e e pai de Milena, de 5 anos (foto: T�lio Santos/EM/D.A Press)
SEM AMPARO No Tejuco, no Parque da Cachoeira, em C�rrego do Feij�o, n�o importa o bairro ou a localidade, hist�rias devastadoras se repetem. Beb�s g�meos perderam m�e e pai, que se conheceram na Vale. M�e, ainda desaparecida, deixou filho de apenas 4 meses. Quarenta e um dias depois da trag�dia e apesar de ter feito o registro das fam�lias para o recebimento das doa��es, a Vale ainda n�o sabe informar quantos s�o os �rf�os.

Enquanto isso, fam�lias inteiras t�m que lidar com a dor e prover o amanh� para essa quantidade de crian�as que perderam o amparo e o direito de crescer ao lado de pais e m�es. Na casa de C�sar Almeida, a m�e dele, dona Concei��o, perdeu quatro netos na trag�dia: tr�s homens e uma mulher, filha de C�sar. T�cnica de enfermagem, Let�cia Mara An�zio de Almeida, de 28 anos, estava no refeit�rio da empresa quando ocorreu o rompimento da barragem. Ela deixou o marido e um filho pequeno de 1 ano e meio. O beb� fica agora aos cuidados dos pais e dos av�s.

Emocionado, C�sar, que tamb�m � funcion�rio da Vale h� 16 anos e no dia do desastre pegaria servi�o �s 16h, se recorda da alegria de quando a filha entrou para a empresa, h� sete meses. “Passei um r�dio para meus colegas, dizendo para dar uma for�a para ela, que estava come�ando na empresa naquele dia. Foi um orgulho muito grande para mim”, diz. Agora, � cuidar do netinho que, segundo vizinhos, ainda amamentava e passou dias chamando pela m�e. “Agora ele est� melhor. J� dorme � noite e est� mais tranquilo.”

C�es no radar


Os c�es se tornaram a pe�a-chave dos trabalhos de buscas em Brumadinho, que completam hoje 41 dias. Ningu�m entra em campo e nenhuma m�quina � ligada antes de eles darem o sinal verde. Os bombeiros de quatro patas fazem o reconhecimento do terreno e, diante de alguma indica��o, o maquin�rio pesado � acionado para aumentar a amplitude da sa�da, de forma a viabilizar a entrada da equipe de resgate. Ontem, 109 militares e oito c�es atuaram em 20 frentes de trabalho e contaram com 79 m�quinas e um drone.

 


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