Escava��es buscam resgatar parte da mem�ria de cidade hist�rica mineira
Prospec��es na rua mais importante do Centro Hist�rico de Santa Luzia s�o primeiro passo para resgatar cal�amento que compunha o visual de uma das joias do Ciclo do Ouro
postado em 30/08/2019 06:00 / atualizado em 30/08/2019 07:43
Trabalho e sondagem ocorre em tr�s n�veis, para identificar se h� mais de uma camada de pedras (foto: Gladyston Rodrigues/EM/DA Press)
Janela aberta para a hist�ria, a preserva��o do patrim�nio e o resgate de uma antiga tradi��o das cidades coloniais mineiras. Em cumprimento � lei de 15 de abril de 2013, que aprovou o Plano Municipal de Cultura, a Prefeitura de Santa Luzia, na Regi�o Metropolitana de Belo Horizonte, come�ou, ontem, a retirar camadas de asfalto da Rua Direita, no Centro Hist�rico, para revelar o cal�amento de pedra original. Os trabalhos s�o feitos sob supervis�o de uma arque�loga, com acompanhamento de equipe do Instituto do Patrim�nio Hist�rico e Art�stico (Iepha-MG) e da Secretaria Municipal de Cultura. “A retirada do asfalto deveria ter ocorrido at� o fim do ano passado, em cumprimento � lei, por isso instauramos o procedimento para que a prefeitura tome as provid�ncias”, disse ontem o promotor de Justi�a da comarca, Marcos Paulo de Souza Miranda.
A retirada de trechos do asfaltamento feito originalmente no in�cio da d�cada de 1960 come�ou com recortes de dois metros por um, para prospec��o. Segundo o representante do MP, a remo��o da camada que cobre parte da hist�ria da cidade nascida no Ciclo do Ouro ser� gradativa. Al�m de valorizar os casar�es dos s�culos 18 e 19, igrejas barrocas e capelas, o cal�amento dever� fortalecer o turismo e valorizar o acervo. “A Rua Direita � uma das mais bonitas de Minas. H� cidades, como Diamantina, que preservaram o cal�amento – e, nesse caso, a cidade do Vale do Jequitinhonha se tornou inclusive patrim�nio da humanidade”, destacou o promotor de Justi�a. Ressaltando que a camada poder� ser retirada na totalidade ou em trechos espec�ficos, Souza Miranda disse que a iniciativa servir� para frear o excesso de velocidade dos carros que trafegam naquele trecho do Centro Hist�rico.
Acompanhando a primeira interven��o, que deixou parte do cal�amento � vista em frente ao Solar da Baronesa, o secret�rio municipal de Cultura, Ulisses Brasileiro, contou que ver a rua sem a camada de asfalto � sonho antigo. “A cidade tem um conjunto arquitet�nico admir�vel, e esse tipo de pavimenta��o asf�ltica n�o combina com a arquitetura. Temos uma arque�loga na nossa secretaria e, com os estudos a serem ainda realizados, acreditamos que o cal�amento vai retornar”, disse o representante da prefeitura. Ele adiantou que, na sequ�ncia, ser�o abertas outras “janelas” ou prospec��es em quatro pontos: em frente � Capela do Bonfim, � Igreja do Ros�rio, � Escola Estadual Modestino Gon�alves e ao Santu�rio de Santa Luzia e Casa de Cultura, na Pra�a da Matriz.
(foto: Gladyston Rodrigues/EM/DA Press)
Escava��o
A arque�loga da prefeitura local, Giuliana Castiglioni, explicou que foi retirada uma camada de asfalto com espessura de nove cent�metros. “Nosso objetivo � verificar se h� cal�amento mais profundo, por isso, dividimos a �rea de dois metros por um metro em tr�s se��es iguais. Na primeira est�o as pedras, na segunda encontramos a terra e, na terceira, vamos descer mais fundo para tentar achar outro cal�amento”, disse Giuliana, que faz seu primeiro trabalho em centro urbano. A partir dos estudos iniciais ser�o feitas as pr�ximas prospec��es.
Ao lado, a arquiteta Helena Alves, da Ger�ncia de Projetos e Obras do Iepha-MG, explicou que ser�o realizados estudos sobre a viabilidade de remo��o do asfalto em toda a extens�o da Rua Direita, a mais importante do Centro Hist�rico de Santa Luzia, tombado pela institui��o desde 1998 e tamb�m sob prote��o do munic�pio. Se houver pavimenta��o de pedra muito abaixo da superf�cie, as equipes e autoridades ter�o que avaliar com crit�rio a situa��o, tendo em vista a base das constru��es, garagens e outros acessos �s casas e sobrados. O arque�logo do Iepha Fabiano Lopes de Paula tamb�m vai integrar a equipe que faz as escava��es.
Para o presidente da Associa��o Cultural Comunit�ria de Santa Luzia, Adalberto Andrade Mateus, o servi�o � mais do que oportuno. “A maior cr�tica dos visitantes e pesquisadores que v�m aqui recai sobre a incompatibilidade entre o asfalto e as edifica��es. Outro problema s�rio est� na velocidade dos carros”, acrescenta. Ele esclarece que h� trechos, como diante do Solar da Baronesa, da d�cada de 1930; bem anteriores, do in�cio do s�culo 20, perto da Rua do Bonfim, conforme fotos de 1905; e do s�culo 19, no entorno da Pra�a da Matriz.
Moradora da Rua Direita, a aposentada Luzia Vieira se lembra da pavimenta��o poli�drica na d�cada de 1930, quando era prefeito Em�lio Bernardo Zeymer. “Mas em outros trechos n�o havia pedra, era tudo cascalho mesmo. Eu mesma morava em um peda�o da rua que n�o tinha cal�amento”, afirma a senhora, que foi testemunha fundamental na elucida��o de um caso c�lebre, ocorrido h� 16 anos: a recupera��o de tr�s pe�as do s�culo 18, pertencentes � Matriz de Santa Luzia e que iriam a leil�o no Rio de Janeiro (RJ). “Estou achando tudo �timo”, comemorou.
A volta do cal�amento, no entanto, n�o agrada a todos. Com escrit�rio a poucos metros do trabalho arqueol�gico, o advogado Adolfo Silva J�nior, luziense, considerara “ruim” o projeto. “Vejam o caso de Ouro Preto, onde os carros t�m uma s�rie de problemas devido �s pedras. E mais: o tr�nsito pesado j� est� deteriorando o Centro Hist�rico e causando trincas nas casas. O poder p�blico n�o fez nada para proibir isso”, ressaltou.
Para conscientiza��o, o promotor de Justi�a Souza Miranda n�o descarta uma reuni�o com os moradores do Centro Hist�rico para explicar a iniciativa. “A volta do cal�amento n�o � um retrocesso, pelo contr�rio. Estamos cumprindo a lei, pois a retirada do asfalto foi contemplada no Plano Municipal de Cultura, em 2013”, reiterou.
Ideia de retomar o piso original da Rua Direita agrada a moradores como Luzia Vieira (foto: Gladyston Rodrigues/EM/DA Press)
Hist�ria e combates
Banhada pelo Rio das Velhas, Santa Luzia tem mais de 300 anos de hist�ria e foi palco de epis�dios importantes na hist�ria do Brasil, como a Revolu��o de 1842. O �ltimo combate se deu no local denominado Muro de Pedras, e op�s tropas do Ex�rcito, chefiadas por Lu�s Alves de Lima e Silva (1803-1880), o Duque de Caxias, e os liberais sob o comando do mineiro Te�filo Otoni (1807-1869).
Um dos pontos de prospec��o em busca do antigo cal�amento ser� a Pra�a da Matriz, onde fica o pr�dio da Casa da Cultura/Museu Hist�rico Aur�lio Dolabella, que, conforme pesquisas recentes, teria sido hospital para os feridos no conflito de 1842. Como parte das celebra��es c�vicas da revolu��o, que terminou em 20 de agosto, haver� amanh�, das 10h �s 12h, na sede do Instituto Hist�rico e Geogr�fico de Minas Gerais (IHGMG), em BH, a mesa-redonda “Revoltas Liberais de 1842, em S�o Paulo e Minas Gerais”, sob coordena��o do desembargador Marcos Henrique Caldeira Brant e palestras do presidente do Instituto Hist�rico e Geogr�fico de Sorocaba (SP), Adilson Cezar, do promotor de Justi�a Marcos Paulo de Souza Miranda e do tamb�m integrante do IHGMG Adalberto Mateus. O instituto fica na Rua Guajajaras, 1.268, no Bairro Santo Agostinho, na Regi�o Centro-Sul de Belo Horizonte.
Caminho trilhado por Santa B�rbara
(foto: Beto Novais/EM/DA Press - 9/2/09)
As ruas cal�adas de pedras s�o um charme a mais no Centro das cidades mineiras de passado colonial, a exemplo de Ouro Preto, Mariana, Tiradentes, Diamantina e outras de destaque do Circuito do Ouro. Em 2011, o ent�o prefeito de Santa B�rbara, na Regi�o Central, Toninho Timbira, concluiu um projeto de requalifica��o do n�cleo central, iniciado havia tr�s anos, com o objetivo de que a cidade recuperasse sua beleza e tornar a hist�ria mais viva. O projeto contemplou ainda a restaura��o das pra�as da Matriz e da Igreja do Ros�rio e ainda a troca de todo o cal�amento no entorno da Pra�a Cleves de Faria (em frente � prefeitura e � Matriz de Santo Ant�nio) e ruas Governador Valadares, Conselheiro Afonso Pena, Rabelo Horta, Esta��o e a que fica atr�s da cadeia. No resgate de suas caracter�sticas originais, o Centro Hist�rico de Santa B�rbara recebeu uma s�rie de a��es que demandaram investimentos, em valores da �poca de R$ 3,5 milh�es, divididos entre a prefeitura e o governo federal. Entre as interven��es houve a constru��o de nova avenida para receber o tr�nsito pesado, j� que a circula��o de caminh�es e outros ve�culos agredia e estava abalando a estrutura dos principais monumentos, como a Igreja Matriz de Santo Ant�nio, a Casa da Cultura, o pr�dio da prefeitura, a Igreja do Ros�rio, o Hotel Quadrado e outros im�veis de relev�ncia.