(none) || (none)
UAI

Continue lendo os seus conte�dos favoritos.

Assine o Estado de Minas.

price

Estado de Minas

de R$ 9,90 por apenas

R$ 1,90

nos 2 primeiros meses

Utilizamos tecnologia e seguran�a do Google para fazer a assinatura.

Assine agora o Estado de Minas por R$ 9,90/m�s. ASSINE AGORA >>

Publicidade

Estado de Minas VICIADOS EM �LCOOL

Herdeiros da depend�ncia: alcoolismo dos pais multiplica riscos dos filhos

Crian�as com hist�rico familiar de alcoolismo enfrentam sofrimentos e perigo para toda a vida: t�m 70% de chances a mais de desenvolver a doen�a. Consumo de m�es durante a gesta��o � devastador para sa�de dos beb�s


postado em 12/11/2019 06:00 / atualizado em 13/11/2019 09:10



“J� fiquei triste porque meu pai teve muitas oportunidades, mas n�o quis parar de beber. � poss�vel mudar se a pessoa tiver foco, por mais que o v�cio e a doen�a sejam fortes. Do�a muito. Ultimamente, n�o d�i mais.” As palavras s�o de uma menina que durante seus 14 anos de exist�ncia viveu na pele experi�ncias cujas cicatrizes s� o tempo ser� capaz de apagar. A fala � objetiva e a firmeza das palavras surpreendem, ao mesmo tempo em que denunciam a fragilidade de quem at� pouco tempo era apenas uma crian�a j� com marcas t�o profundas.

Carolina* se fortalece com ajuda terap�utica e o amparo do amor para fugir de uma estat�stica que � a prova de como o �lcool faz muito mais v�timas do que seu dependente exclusivamente. Quem tem hist�rico familiar de alcoolismo tem 70% a mais de chance de desenvolver depend�ncia na compara��o com a popula��o em geral. “A depend�ncia pode ser desenvolvida em qualquer idade e isso tem como causa v�rios fatores biol�gicos. A crian�a tem menos capacidade de autocontrole, por isso, n�o se poderia beber antes dos 18 anos. Ela deve ser protegida”, afirma o psiquiatra Guilherme Rolim Freire Figueiredo, titular da Associa��o Mineira de Psiquiatria, coordenador no Instituto Raul Soares (Rede Fhemig) e s�cio da Cl�nica Mangabeiras.

No caso de Carolina, um longo hist�rico familiar pesa sobre sua vida. A av� materna era alco�latra e morreu em decorr�ncia disso. Mais pr�ximo est� o pai, que a fez protagonizar cenas que a mem�ria tenta bloquear, como a vez em que a m�e, para proteger os nove filhos, fugiu com eles para debaixo de um viaduto. Ou, ainda, de quando o pai tentou fugir com ela. “Minha m�e chamou a pol�cia e me lembro de ter ficado bastante assustada”, conta. “Onde tem �lcool tem viol�ncia, n�o s� f�sica, mas tamb�m psicol�gica.”
 
Aos 14 anos, Carolina* guarda marcas do alcoolismo do pai. Hoje, vive com a mãe adotiva e recebe apoio terapêutico. 'Doía muito. Ultimamente, não dói mais', diz(foto: Túlio Santos/EM/DA Press)
Aos 14 anos, Carolina* guarda marcas do alcoolismo do pai. Hoje, vive com a m�e adotiva e recebe apoio terap�utico. 'Do�a muito. Ultimamente, n�o d�i mais', diz (foto: T�lio Santos/EM/DA Press)

H� alguns anos, a menina vive com a m�e adotiva, uma antiga vizinha, apesar de manter contato com a m�e biol�gica e os irm�os. A cozinheira, de 46 anos, conseguiu no ano passado a guarda definitiva. “O �lcool toma a pessoa por algo emocional e a prende at� n�o ter mais como sair”, diz Carolina. Al�m das experi�ncias pessoais, frequentar um grupo de crian�as e adolescentes em situa��o de vulnerabilidade numa comunidade terap�utica a ajuda compreender a situa��o e a n�o querer entrar em algo que sabe ser perigoso. “N�o quero e n�o vou seguir. Tenho certeza de que isso � traumatizante para minha m�e, que viveu a maior parte do problema. Seguir o mesmo passo n�o � solu��o.”

Na vis�o da garota, �lcool � ref�gio encontrado por muitos para aliviar as dores da vida. “Toda dor � cur�vel e bebida n�o � a melhor solu��o. � bem ruim, destr�i as fam�lias”, afirma. Carolina quer ser psic�loga de hospital, para ajudar, assim como ela, quem precisa de palavras para reconduzir a caminhada. E para isso, conta com o apoio da m�e adotiva: “O amor que sinto por ela � incondicional”.

Preven��o


Assim como Carolina, outras crian�as e jovens de at� 21 anos s�o atendidos na Terra da Sobriedade, comunidade terap�utica localizada em Venda Nova, em Belo Horizonte, por meio do Meninos da Terra, um programa de preven��o para v�timas do tr�fico e do uso de tabaco, �lcool e outras drogas, e de suas consequ�ncias, tais como viol�ncia, neglig�ncia e abusos. A ideia � cuidar de quem t�o cedo apresenta comprometimento em seu desenvolvimento f�sico, moral, psicol�gico, escolar e social.

Sorte diferente teve o jovem Paulo*, de 24 anos. Ele � filho de alco�latra e o mesmo problema recaiu sobre dois irm�os. O rapaz conta que come�ou a misturar bebida no suco aos 8 anos e, aos 10, j� usava a bebida alco�lica pura. Aos 15, sa�a para as festas e ficava largado no meio do mato, pelos cantos, e voltava s� no dia seguinte. Contava com a ajuda de amigos que guardavam seus pertences para que nada lhe fosse roubado. “Achava que ia dar conta de parar, mas tudo o que conseguia era me afundar ainda mais. Chegou um momento em que tive de pedir ajuda”, relata. *Nomes fict�cios

Efeitos em s�rie desde a gesta��o

Bebês em CTI neonatal: síndrome alcoólica fetal é a mais trágica das consequências do uso de bebidas etílicas por gestantes(foto: Paulo Filgueiras/EM/D.A Press)
Beb�s em CTI neonatal: s�ndrome alco�lica fetal � a mais tr�gica das consequ�ncias do uso de bebidas et�licas por gestantes (foto: Paulo Filgueiras/EM/D.A Press)

A chance de ter um filho alco�latra ganha ainda mais destaque quando o consumo da bebida se d� numa fase crucial da vida: a gesta��o. Segundo a Coordena��o de Sa�de Mental da Secretaria Municipal de Sa�de, entre todas as subst�ncias nocivas, o uso de �lcool � o principal problema entre gr�vidas, � frente de tabaco, abuso de medica��o e, por �ltimo, drogas il�citas. De acordo com a Sociedade Mineira de Pediatria (SMP), estudos feitos no Brasil estimam uma frequ�ncia de consumo de �lcool em torno de 10% a 40% entre as gestantes. A imprecis�o dos dados se deve � tend�ncia de as mulheres omitirem ou negarem o consumo durante o tempo em que carregam o beb� no ventre. Consequ�ncias ultrapassam esse per�odo, com reflexos pra toda a vida.

O servi�o p�blico tamb�m n�o tem informa��es oficiais, de acordo com a Secretaria Municipal de Sa�de. O coordenador de Sa�de Mental da pasta, Fernando Siqueira, relata a lida di�ria com gestantes que fazem uso abusivo de �lcool e que t�m quadro classificado como depend�ncia. “O fato � ignorado pelas pessoas que fazem pr�-natal, tanto enfermeiras quanto m�dicos da sa�de da fam�lia, que se esquecem de perguntar sobre uso de �lcool e outras drogas. Profissionais de sa�de t�m de ficar atentos e fazer esses questionamentos dirigidos sobre a bebida”, cobra.

Siqueira lembra que o uso abusivo deve ser identificado antes mesmo da gravidez. Durante a gesta��o, os profissionais de sa�de devem orientar as m�es sobre o fato de o �lcool n�o ser indicado em quantidade alguma tamb�m no per�odo da amamenta��o. “Perguntas dirigidas podem identificar se h� o problema na gravidez. Se sim, � necess�rio fazer interven��o para reduzir o dano causado, como s�ndrome alco�lica fetal e problemas relacionados ao beb�”, afirma. Com as gestantes, o tratamento � feito com psicoterapia, retirada gradual da subst�ncia e, �s vezes, com aux�lio de alguma medica��o para reduzir os sintomas de abstin�ncia.

Os efeitos do �lcool sobre o feto s�o in�meros e persistem depois do nascimento, acompanhando o indiv�duo durante toda a sua vida. S�o relatados maior incid�ncia de aborto, malforma��es cong�nitas, defici�ncia de crescimento e retardo mental. A bebida pode ainda causar redu��o de peso do beb� ao nascer, pr�-ecl�mpsia, prematuridade, retardo do desenvolvimento neuro- psicomotor, transtornos mentais ao nascer ou na fase adulta. A mais tr�gica das consequ�ncias, no entanto, � a s�ndrome alco�lica fetal (SAF), que se manifesta por altera��es f�sicas, mentais, comportamentais e de aprendizado.

“H� uma rela��o entre a quantidade de �lcool ingerida e o aparecimento de sinais e sintomas mais ou menos graves, ou seja, quanto mais �lcool a gr�vida consome, maior a probabilidade de ocorr�ncia do quadro completo da SAF. A s�ndrome leva a malforma��es faciais caracter�sticas, por�m, o mais importante s�o os danos cerebrais”, explica a vice-presidente do Departamento Cient�fico de Neonatologia da SMP, Erika Lima Dolabella Teixeira da Costa.

Ela acrescenta que uma s�rie de problemas podem surgir ao longo da vida: retardo mental, dificuldade de aprendizado, problemas de sa�de mental, comportamento sexual inadequado, incapacidade de viver de forma independente, interrup��o da escola, problemas com o emprego, problemas com �lcool e drogas. Nos portadores do espectro de desordens fetais alco�licas, a frequ�ncia de problemas com �lcool e drogas alcan�a n�veis superiores a 50% nos indiv�duos do sexo masculino e 70% nos indiv�duos do sexo feminino.
 
 

Tr�s perguntas para


Erika Lima Dolabella Teixeira da Costa
Vice-presidente do Departamento Cient�fico de Neonatologia da Sociedade Mineira de Pediatria

Um gole de �lcool num feto corresponde a qual efeito num adulto?
N�o se sabe a quantidade de �lcool que � lesiva ao desenvolvimento embrion�rio/fetal. Al�m disso, a mesma quantidade de �lcool tem efeito diferente em cada pessoa. No caso de feto, isso � determinado por quest�es gen�ticas da m�e e do feto.

A mulher descobre a gravidez. Ela tem que parar imediatamente ou at� certo tempo o �lcool n�o faz mal?
A ingest�o alco�lica deve ser interrompida assim que � descoberta a gravidez. Preferencialmente, deve-se parar de beber antes de engravidar. O �lcool causa efeitos delet�rios ao feto em todas as fases da gesta��o. N�o h� um n�vel seguro de consumo de �lcool durante a gravidez. A quantidade lesiva ao desenvolvimento fetal n�o � conhecida.

No caso da mulher que ingeriu bebida alco�lica sem saber que estava gr�vida. O que fazer?
N�o h� tratamento para impedir ou reverter os efeitos do �lcool sobre o feto. A exposi��o cr�nica � subst�ncia, entretanto, agrava e aumenta as chances de a crian�a nascer com problemas ou desenvolv�-los posteriormente. A mulher deve interromper completamente o uso de �lcool assim que descobrir a gravidez.

Efeitos nocivos em s�rie


Desde domingo, os efeitos do uso abusivo do �lcool s�o temas de s�rie de reportagens do Estado de Minas, que termina nesta edi��o. A primeira delas mostrou que o consumo de bebidas et�licas mata 3 milh�es de pessoas por ano no mundo, mais do que o crack, e o longo caminho enfrentado por quem precisa e quer se livrar do alcoolismo. Ontem, o enfoque foi a codepend�ncia: a doen�a silenciosa que afeta os entes mais pr�ximos dos viciados e a onda de viol�ncia provocada pela subst�ncia.


receba nossa newsletter

Comece o dia com as not�cias selecionadas pelo nosso editor

Cadastro realizado com sucesso!

*Para comentar, fa�a seu login ou assine

Publicidade

(none) || (none)