
Uma imigra��o com o sonho de melhorar as condi��es de vida e obter estabilidade financeira, mas que pode terminar com explora��o trabalhista e desespero para retornar ao pa�s de origem. Essa � a realidade de boa parte dos brasileiros que viajaram rumo ao Reino Unido e, meses depois, retornam por causa das dificuldades para se manter no exterior – principalmente depois do Brexit, como � chamada a sa�da da Inglaterra, Pa�s de Gales, Esc�cia e Irlanda do Norte da Uni�o Europeia. O pol�mico processo foi definido em 2016 a partir de um referendo, mas at� hoje n�o saiu do papel. A previs�o, segundo o primeiro-ministro brit�nico, Boris Johnson, � que o passo rumo � sa�da deve ser dado em janeiro, o que pode complicar ainda mais a vida de quem est� no pa�s ilegalmente.
Foram seis meses em Londres. L�, passou por diferentes empregos, ocupando cargos em restaurantes, na constru��o civil e numa terceirizada de uma gigante de vendas on-line. Neste �ltimo posto, o homem pagava 190 libras (cerca de R$ 1 mil) para trabalhar em uma van e realizar entregas em nome da empresa. “Se a van precisasse de alguma manuten��o, eles superfaturavam o conserto, que chegava a at� 400 libras”, reclama. “Voc� acaba trabalhando para pessoas que t�m consci�ncia da sua condi��o, ent�o o empregador que se prop�e a fazer isso vai tirar lucro de voc� de alguma forma. Entendo isso, porque voc�, como empregador, est� correndo riscos. Quem est� legal ganha 14 libras por hora (R$ 74) e a gente ganhava 8, no m�ximo 9 libras por hora”, comenta o mineiro.

Alerta aos imigrantes ilegais
A advogada Vitoria Nabas, que vive na capital brit�nica h� quase duas d�cadas, � s�cia do escrit�rio de advocacia da Casa do Brasil. A organiza��o n�o governamental presta assist�ncia a imigrantes desde 2017. Ela explica que, desde 2016, quando 52% dos cidad�os brit�nicos disseram sim ao plebiscito do Brexit, aumentou o cerco dos servi�os de imigra��o. As condi��es de trabalho tamb�m foram dificultadas. “Agora, � mais importante do que nunca divulgar �queles que pretendem vir ao Reino Unido como turistas e tentar ficar, mesmo ilegalmente, em busca de uma vida melhor e ganhar dinheiro, que n�o devem faz�-lo, porque os empregos diminu�ram e, com o Brexit, a toler�ncia � imigra��o tamb�m est� diminuindo sensivelmente. Cidad�os europeus come�aram a chegar � Inglaterra ocupando vagas de subempregos antes buscadas por brasileiros”, explicou.
Foi o que ocorreu com a aut�noma de 41 anos que saiu de Uberl�ndia, no Tri�ngulo Mineiro, e foi para Londres em mar�o de 2017. Depois de quase tr�s anos, decidiu voltar de forma volunt�ria por meio do projeto. “Vim em busca de trabalho. Cheguei em um s�bado e na segunda-feira j� estava trabalhando. Fazia limpeza nas casas e atuava como motorista. Mas, decidi deixar o pa�s. Ao longo do tempo, consegui enxergar que tudo n�o passava de uma ilus�o. Voc� vem com tantas expectativas e, na verdade, voc� n�o passa de um escravo. Voc� vive o tempo todo fugindo de outros brasileiros com medo de te entregarem para a imigra��o”, lamentou a mulher. Foi por meio de amigas que ela conheceu o projeto Casa do Brasil. “Procurei o projeto e elas foram bem atenciosas. N�o tive qualquer inseguran�a, tive certeza do que queria”, acrescentou. Ela desembarcar� no Brasil ainda hoje."Hoje, o governo est� mais focado no combate � imigra��o ilegal"
Mineiro que vive em Londres em situa��o ilegal
Vida de incerteza e medo
A Casa do Brasil, organiza��o n�o governamental que � refer�ncia em assist�ncia a brasileiros que vivem em pa�ses no Reino Unido, tem se dedicado a combater um problema recorrente para quem entra ou tenta viajar ilegalmente: os coiotes. Essas pessoas, respons�veis por arranjar maneiras ilegais de entrar nos pa�ses, t�m hist�rico de enganar e amea�ar os brasileiros. Qualquer cidad�o brasileiro em situa��o irregular – morando com o visto de turista– pode buscar ajuda na casa. O programa � gratuito e auxilia at� mesmo com passagens a�reas para o Brasil e aux�lio at� a data da viagem. “Ningu�m � for�ado a nada. Se a pessoa mudar de ideia, pode faz�-lo”, completou a advogada da ONG, Vitoria Nabas.
Mas para quem � preso pela imigra��o, o retorno n�o � t�o tranquilo, como relata um mineiro de 30 anos, natural de Bom Despacho. Ele trabalhava em um restaurante internacional e foi detido pela fiscaliza��o em Londres. “Me mandaram para um hotel e depois para o aeroporto”, recorda. Segundo o mineiro, quem � pego em trabalho ilegal n�o tem direito a escolher o aeroporto de destino e deixa a Europa com a roupa do corpo. “Ele s� pode pegar os pertences pessoais se algu�m lev�-los pra ele no aeroporto”, comenta.
Ele, que trabalhava no Brasil como encarregado de obras, embarcou para Londres em agosto do ano passado. Ele conta que com a crise no setor da constru��o civil, ele ficou desempregado e passou por dificuldades para sustentar a filha de 7 anos. L�, ele ficou por um ano at� ser deportado. “Trabalhei em um restaurante. Entrei de ajudante de cozinha e fui subindo de cargo at� me tornar chefe. Eu ganhava 12 libras por hora trabalhada, sendo que trabalhava 11 horas por dia”, explicou. Com esse valor, a despesa mensal era paga e, ainda, sobravam 1,3 mil ou 1,5 mil libras por m�s, que eram enviadas ao Brasil. N�o opini�o dele, a fiscaliza��o aumentou muito ap�s a entrada do novo primeiro-ministro, Boris Johnson."Tinha planos de permanecer no m�nimo mais 3 anos l� para conseguir os valores que calculei para realizar meus planos no Brasil"
Relato de mineiro que vivia ilegal no Reino Unido
“� muito burocr�tico se regularizar no pa�s, � muito caro pra quem n�o tem descend�ncia. A maioria que consegue tem descend�ncia de outro pa�s da Europa. Para conseguir documenta��o inglesa, somente se tiver ascend�ncia comprovada, ser casado com ingl�s/inglesa, comprovar estada durante 15 anos no pa�s e arcar com um custo muito alto”, explicou. Ele foi deportado porque estava no pa�s com visto de turista, mas estava trabalhando. Ele conta que desde o in�cio foi para l� com a inten��o de trabalhar e conseguir juntar um dinheiro para voltar para o Brasil e adquirir a casa pr�pria e abrir um neg�cio. “Fiquei extremamente frustrado. Tinha planos de permanecer no m�nimo mais 3 anos l� para conseguir os valores que calculei para realizar meus planos no Brasil. A vida aqui est� dif�cil com a falta de trabalho e tudo muito caro: moradia, �gua, luz, alimenta��o...”, contou ele.
Al�m de ser deportado, ele conta que foi roubado e alerta sobre aproveitadores no exterior. “H� uma grande quantidade de brasileiros com documenta��o – alguns compram na It�lia – que se aproveitam, exploram e at� roubam brasileiros que est�o l� ilegais”, denunciou. Ele conta que foi roubado por uma landlord (pessoa que aluga um im�vel para terceiros), que n�o reembolsou o valor do dep�sito do aluguel do quarto. “Recomendo a qualquer um que queira migrar pra qualquer pa�s que tome muito cuidado com oportunistas e aproveitadores”, disse. Agora, ele sonha em se regularizar e voltar para o pa�s. O homem contou que est� usando o dinheiro que juntou para investir em renda fixa e na bolsa de valores. “E estou correndo atr�s de documentos para voltar para a Europa. N�o quero migrar ilegalmente de novo.”
Vida interrompida pela viol�ncia

O mineiro Jean Charles foi assassinado aos 27 anos por policiais brit�nicos com oito tiros disparados � queima-roupa, em um vag�o do metr� londrino, em 22 de julho de 2005. O jovem foi confundido com o terrorista et�ope Omar Hussei – naquela que ficou conhecida como uma das mais desastrosas opera��es policiais da hist�ria da pol�cia inglesa, at� ent�o celebrada como a mais eficiente do mundo. A fam�lia do brasileiro sempre questionou o tratamento judicial do caso, porque nenhum policial foi alvo de procedimentos penais individuais, j� que o Minist�rio P�blico considerou que n�o havia provas suficientes para process�-los.