
Nas garagens do Departamento Estadual de Tr�nsito (Detran-MG), na Avenida Jo�o Pinheiro e na Rua dos Aimor�s, em Lourdes, o entra e sai de motos do Batalh�o de Tr�nsito da Pol�cia Militar e da Guarda Municipal de tr�nsito � frequente. Nos acessos, entre as multid�es que buscam os servi�os do departamento, passam servidores, agentes e delegados da Pol�cia Civil. Mas nem a presen�a de todo esse aparato de fiscaliza��o e disciplina parece inibir os motoristas transgressores, que transformaram os arredores do s�mbolo das normas de tr�nsito em Belo Horizonte num territ�rio sem lei, onde avan�os de sinais s�o frequentes e as vagas de estacionamento para idosos, deficientes, pontos de �nibus e de carga e descarga s�o apossadas irregularmente sem medo de puni��o. O desrespeito �s normas de circula��o nas vias e de utiliza��o dos estacionamentos em BH desafia at� os efeitos no bolso do motorista, j� que n�o faltam multas. Segundo a BHTRans, os flagrantes de avan�os semaf�ricos em 2019 cresceram 37% e os estacionamentos em desacordo com as normas e o excesso de velocidade 18%, cada um, na compara��o com 2018 (confira quadro).
A rampa que leva � garagem do p�tio do Detran-MG tem demarcadas, no seu acesso � Avenida Jo�o Pinheiro, uma vaga de deficientes f�sicos de um lado e uma reservada a idosos do outro. Na ter�a-feira, v�rios carros sem credenciais e com pessoas de outros perfis sem direito a estacionar ali bloqueavam as vagas de cidad�os com necessidades especiais. Numa dessas ocasi�es, um Renault Logan Branco, com uma mulher e uma crian�a, e um Volkswagen Voyage prata, conduzido por um homem que deu sinais de ser motorista de aplicativo, se apertaram na vaga de deficientes. Do outro lado, o espa�o para motoristas acima dos 65 anos com credenciamento tinha sido sido ocupado por um rapaz num Fiat P�lio vermelho.
A apenas 10 metros dali, no mesmo quarteir�o, um homem sem qualquer dificuldade motora aparente e que dirigia um Ford Focus se apoderou de vaga de deficientes. Para completar o festival de transgress�es impunes, o espa�o de carga e descarga logo acima dessa vaga foi tomado por taxistas, que implantaram ali uma esp�cie de ponto informal para suas atividades.
Nos arredores do Detron, as infra��es continuam como se o edif�cio nada simbolizasse. Motoristas apressados, sobretudo os que ingressam no cruzamento da Avenida Jo�o Pinheiro com a Rua dos Aimor�s, avan�am o sinal vermelho sem preocupa��o. Motociclistas tamb�m aceleram na luz vermelha assim que a sinaliza��o que permite a travessia de pedestres na faixa pisca alertando que vai ser fechada.
At� os pontos de �nibus do quarteir�o seguinte s�o assediados por motoristas, que os transformam em estacionamentos. Na frente dos dois abrigos para o transporte coletivo desse quarteir�o, que s�o servidos por noventistas de �nibus, a reportagem viu tr�s ve�culos bloqueando os embarques e desembarques para estacionar. Um deles, uma picape Fiat Strada, com duas escadas amarradas na ca�amba e sobre o teto, acabou mesmo deixado sobre as letras O e N da palavra “�nibus” pintada no asfalto, e ali ficou por mais de uma hora, sem qualquer problema para o condutor. “� um absurdo, mas a gente que usa �nibus j� est� cansado de ver isso acontecer. Pode ser a um quarteir�o do Detran, na frente da prefeitura, precisamos de fiscaliza��o para acabar com os abusos. Imagine que idosos e pessoas em cadeiras de rodas precisam entrar na rua para pegar o �nibus, porque uma pessoa folgada est� usando o ponto como estacionamento”, reclama o estudante Ramon Cardoso, de 22 anos.
A reportagem procurou o Detran-MG para saber se o departamento estava ciente da aud�cia de motoristas infratores em seus arredores, muitos deles buscando por servi�os do pr�prio pr�dio p�blico e atrapalhando outros cidad�os que tamb�m os buscam. Por meio de nota, a assessoria de imprensa do departamento informou que “sempre que a popula��o aciona ou s�o detectadas infra��es de tr�nsito no entorno do Departamento de Tr�nsito de Minas Gerais (Detran-MG) s�o tomadas as provid�ncias cab�veis imediatamente. Nos casos em que o ve�culo est� estacionado de forma irregular em vagas de deficientes ou idosos, por exemplo, o propriet�rio do ve�culo � multado em R$ 293,47, recebe sete pontos na habilita��o e o ve�culo � removido para um p�tio”, diz o texto.
Corrida pela seguran�a

N�mero crescente de autua��es de tr�nsito � indicativo da multiplica��o de infra��es e tamb�m, segundo a BHTRans, que a fiscaliza��o “est� sendo eficiente”. Na avalia��o do �rg�o os principais objetivos desse trabalho – a seguran�a e a fluidez do tr�nsito – est�o sendo alcan�ados. “Desde 2000, a frota de BH mais que triplicou, de 679 mil ve�culos a 2,2 milh�es hoje. Mesmo com isso, conseguimos resultados extraordin�rios, como a diminui��o de atropelamentos no per�odo de 4.148, em 2000, para 1.475 em 2018. A mortalidade para cada 10 mil ve�culos era de 4,37 em 2000 e em 2018 ficou em 0,55“, afirma o gerente de an�lise e processamento de infra��es da BHTRans, Leonardo Rios.
Al�m da fiscaliza��o em campo, o gerente destaca tamb�m a melhoria nos sistemas de monitoramento por radar, que funcionam 24 horas e somam 478 aparelhos medidores de velocidade, avan�os e invas�o. “Incrementamos no ano passado os detectores de avan�o em mais 44, chegando a um total de 271. Conseguimos tamb�m reduzir os radares de velocidade que sofriam com vandalismo e isso permitiu uma cobertura mais prolongada”, observa Rios.
O gerente conta que em praticamente todos os bairros mais movimentados h� pedidos de instala��o de radares e vagas especiais e que tudo isso � avaliado. “Quando destinamos certas vagas a pessoas com necessidades motoras, isso ocorre porque h� servi�os importantes para suas vidas na regi�o e isso traz mais proximidade e conforto para esse cidad�o. Quem invade acha que � um espa�o subutilizado, mas n�o v� que obrigou uma pessoa que tinha direito a parar mais longe. No caso das cargas e descargas, isso ainda traz reflexos para o tr�nsito, por isso esses locais t�m uma aten��o maior da fiscaliza��o”, afirma o gerente da BHTRans.
Desrespeito por todos os lados

O desrespeito �s regras de tr�nsito n�o se restringe a uma �nica �rea da cidade. Na Savassi, tradicional bairro comercial e de servi�os, estacionamento em �rea proibida e avan�os de sinal saltam aos olhos. Na Rua Cl�udio Manuel, que � rota para as instala��es de um movimentado col�gio da Regi�o Centro-Sul, os sem�foros s�o ignorados, com as fileiras de ve�culos fechando cruzamentos e se apossando at� da faixa de pedestres.
Os pontos de �nibus s�o se tornam estacionamento com at� tr�s carros disputando a �rea com espa�o m�nimo entre um e outro. Enquanto isso, passageiros s�o obrigados a ficar sempre na rua para conseguir enxergar a chegada dos coletivos e a embarcar e desembarcar no meio da pista de rolamento quando o �nibus finalmente chega e para em fila dupla. O reflexo de tudo isso no tr�nsito tamb�m � imediato, com a redu��o de uma pista, agora ocupada por um �nibus, trazendo mais lentid�o e abrindo oportunidades de manobras arriscadas de motociclistas pelos corredores de carros.
Problemas que tamb�m ocorrem em bairros residenciais, como o S�o Pedro, que � vizinho � Savassi e representa uma liga��o importante entre as avenidas Nossa Senhora do Carmo e Uruguai com os bairros Santo Ant�nio e Cidade Jardim. Na Pra�a Dom Silv�rio, por exemplo, os ve�culos que acessam a Rua Lavras pela Major Lopes e pela Montes Claros fazem o que querem. Ingressam na contram�o, abrem filas duplas pela contram�o, estacionam em �rea de carga e descarga e at� mesmo na pista de rolamento onde n�o h� demarca��o de vagas, ou seja, no meio da rua.
Na esquina com a Ruas S�o Domingues do Prata, um dos principais acessos para o Santo Ant�nio e a Cidade Jardim, a Major Lopes teve a pista tomada por estacionamentos clandestinos, que encolhem a capacidade da via. Isso se reflete em fileiras que atrapalham o tr�fego das avenidas Uruguai e Nossa Senhora do Carmo. Na ter�a-feira, a reportagem do EM contabilizou nada menos do que nove ve�culos estacionados irregularmente em �rea destinada � circula��o.
A principal via do bairro, a Rua Major Lopes, � onde ocorrem mais variedades de infra��es. Na esquina com a Rua Rio Verde, o sem�foro � sempre desrespeitado, obrigando pedestres a correr e os carros de sentido concorrente a esperar os infratores apressados. A faixa de pedestres desse local, por exemplo, j� � prejudicada por ter metade de seu acesso tomado por uma �rvore e um poste. A isso, soma-se ainda o estacionamento de carros e motos dos dois lados, praticamente bloqueando a �rea de travessia de pedestres.
“O desrespeito aqui se tornou regra e tem feito dessas ruas lugares mais perigosos. O movimento tamb�m � grande por haver muitos col�gios na �rea. Passou da hora de termos uma fiscaliza��o mais atuante”, disse a consultora de inform�tica Maria Teresa Tavares, de 63 anos, moradora do bairro que teve dificuldades para passar pela faixa de pedestres bloqueada.
Os estacionamentos de carga e descarga tamb�m foram loteados por carros de passeio, obrigando entregadores e transportadores a formar filas duplas, num efeito cascata que paralisa o tr�fego na regi�o. Diante de sete carros invadindo uma das �reas de carga e descarga, o motorista de caminh�o Hugo Machado Meireles, de 32, h� 10 anos no ramo, afirma se tratar de situa��o recorrente em BH. “Isso � assim em todo o Centro. Aqui, na Avenida Paran�, na Afonso Pena. Ou chegamos bem mais cedo ou n�o tem lugar. A gente d� voltas, atrasa, para em fila dupla, atrapalha o tr�nsito e ainda leva multa”, lamenta.