Coronav�rus: grupos continuam fazendo trilhas no entorno de BH
Interditadas antes da pandemia, trilhas que ligam BH a Nova Lima pela Serra do Curral est�o sendo invadidas, assim como o Topo do Mundo e a Serra da Cal�ada
Movimento em caminhos alternativos que cruzam o maci�o que marca limites de Belo Horizonte parece ter aumentado depois do fechamento de �reas de preserva��o da capital (foto: Leandro Couri/EM/D.A. Press )
Com acessos oficiais sendo interrompidos sequencialmente desde 2013, trilhas clandestinas da Serra do Curral que permitem a travessia entre Belo Horizonte e Nova Lima j� vinham atraindo grupos cada vez maiores, e o movimento aumentou com fechamento de parques devido � pandemia, mesmo com o risco de cont�gio pela COVID-19. A equipe de reportagem do Estado de Minas contabilizou nada menos que 13 pessoas, entre aventureiros, desportistas, religiosos, desempregados e menores sem aulas em percurso de oito quil�metros por uma dessas vias.
A situa��o de risco � agravada pelo contato constante de duas popula��es com n�veis de isolamento diferentes: moradores de Belo Horizonte, cidade que segue uma pol�tica mais r�gida de isolamento, e de Nova Lima, em fase de flexibiliza��o. A Guarda Municipal de BH informou que faz patrulhas nesses caminhos para tentar impedir o tr�fego de pessoas, mas numa ter�a-feira quando a reportagem passou por uma delas, nenhum agente foi avistado.
A mais recente interdi��o oficial de acesso ocorreu neste ano, em 17 de mar�o, sob decreto da Prefeitura de Belo Horizonte (PBH), quando o Parque das Mangabeiras e o Parque da Serra do Curral fecharam completamente as portas devido � pandemia do novo coronav�rus (Sars-Cov-2). Com isso, a insist�ncia dos trilheiros em alcan�ar o alto dos 1.300 metros da forma��o montanhosa que pode ser vista de toda a capital se transformou em desafio �s regras sanit�rias.
O tr�nsito constante por esses caminhos pode ser comprovado pelas pegadas de solas de cal�ados impressas por toda parte nos estreitos caminhos vicinais de p�. Outro ind�cio s�o os restos de latas de bebida, copos e embalagens pl�sticas deixadas como lixo no meio das trilhas mais apertadas.
Perto da Vila Mar�ola, em uma das picadas que v�m do aglomerado de comunidades da Serra, na Regi�o Centro-Sul de Belo Horizonte, o movimento re�ne predominantemente quem procura empinar pipas. Os ventos fortes da montanha, a falta de obst�culos e o c�u azul incentivam a pr�tica perigosa, que aglomera jovens e crian�as nas encostas, nenhum deles sequer usando m�scaras protetoras. Papagaios e rabiolas perdidas nos barrancos e agarrados �s �rvores se avolumam como vest�gios de uma pr�tica recorrente. De forma intimidadora, os adultos que por l� estavam deixaram claro que ningu�m conversaria com a equipe de reportagem e que tampouco rep�rteres eram bem-vindos.
Mais adiante, j� numa estrada de acesso �s antenas de telecomunica��es da por��o Sudeste da Serra do Curral, a aglomera��o maior � a de religiosos que empilharam pedras para criar forma��es que simbolizam demonstra��es de f�. Nesses espa�os, pregadores e fi�is, muitos deles crian�as, se re�nem para orar sem qualquer equipamento que os proteja de se contaminar ou a outras pessoas pela COVID-19.
Um grupo foi ainda mais longe em seu contato f�sico que facilita a transmiss�o direta do novo coronav�rus. Formaram um c�rculo de m�os dadas e oravam aos gritos, sem m�scaras protetoras, abaixo da trilha base do Pico Belo Horizonte, a mais alta montanha da cadeia, com 1.390 metros. “Senhor, obrigado por ter me permitido subir a montanha e voltar. Mesmo com as dificuldades. Mesmo com o chinelo que arrebentou e os p�s queimando em brasas”, dizia uma das mulheres do grupo. Os religiosos ainda se arriscaram, pois, em vez de terem subido por uma das trilhas convencionais, erraram o caminho e tomaram um curso de eros�o das chuvas, muito mais �ngreme e inst�vel.
No caminho pr�ximo � mineradora Empabra, que est� com opera��es paralisadas, as eros�es provocadas pela cava exposta consomem progressivamente a mata aos p�s do Pico Belo Horizonte, avan�ando em dire��o ao cume e deixando vo�orocas que lembram pequenos c�nions. As trilhas mais dif�ceis, at� o alto, tamb�m est�o salpicadas de lixo.
Topo do Mundo No fim da tarde de ontem, centenas de pessoas voltaram a se aglomerar no Topo do Mundo, em Brumadinho, na Regi�o Metropolitana de Belo Horizonte. Esse seria um �timo programa de domingo, desde que n�o estiv�ssemos passando por uma pandemia com restri��es e distanciamento social. No flagrante feito pelo Estado de Minas foi poss�vel perceber ainda que poucas pessoas usavam m�scaras de prote��o.
Na regi�o do Topo do Mundo, pessoas sem m�scaras ou qualquer preocupa��o com o distanciamento contemplavam o p�r do sol (foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press)
Minas passou de 454 para 475 mortes pela COVID-19 ontem. De acordo com o boletim epidemiol�gico, divulgado pela Secretaria de Estado de Sa�de (SES), foram registradas 21 mortes a mais em rela��o ao balan�o de s�bado. O n�mero de casos confirmados passou para 21.381.
O Mirante da Serra da Moeda ficou conhecido como Topo do Mundo por causa do restaurante que funcionou no local entre 2004 e 2018. A aglomera��o no local � formada por pessoas de todas as idades, de crian�as a idosos. Alguns preferem ficar dentro dos carros. Uma cena muito parecida foi mostrada pela reportagem em 26 de abril. Depois disso, autoridades interditaram o local. O terreno � particular, mas passou a ser vistoriado pela Prefeitura de Brumadinho para evitar que novas aglomera��es ocorressem durante a pandemia.
Novas medidas de seguran�a foram adotadas: "de acordo com o Decreto Municipal nº 71/2020 de 28 de abril, a Prefeitura de Brumadinho pro�be a entrada de ve�culos e de pessoas em pontos tur�sticos do munic�pio, como o Topo do Mundo, o Mirante da Serra do Rola Mo�a e a Cachoeira da Jangada, em casa Branca", informou nota enviada pela prefeitura em 27 de abril. Os acessos foram fechados pela Secretaria Municipal de Obras com grades de 2,5 metros de altura. Ontem, o EM flagrou parte da estrutura aberta, por onde as pessoas aproveitaram para passar.
Sem fiscaliza��o A Prefeitura de Brumadinho informou que n�o est� fazendo fiscaliza��o, pois a Justi�a, por a��o movida pela Vale, suspendeu o decreto que proibia acesso ao Topo do Mundo e Serra do Rola Mo�a. "Todos sabem que � preciso evitar aglomera��o. A Prefeitura fechou os acessos ao Rola Mo�a e ao Topo do Mundo, mesmo assim as pessoas insistem em invadir os espa�os e n�o respeitar as barreiras. A fiscaliza��o no munic�pio era feita pela Defesa Civil, que n�o tem poder de pol�cia. Apenas acionava a PM em casos necess�rios", informou a nota.
Sendo assim, o trabalho de fiscaliza��o se torna in�til, pois n�o h� como impedir o que n�o est� proibido. "� preciso que as pessoas se conscientizem e evitem aglomera��o em qualquer lugar. O munic�pio recorreu da decis�o da Justi�a, mas n�o teve retorno ainda", finalizou.
Serra da Cal�ada No in�cio da semana, a reportagem do EM esteve tamb�m na Serra da Cal�ada, local muito procurado por quem gosta de fazer passeios em trilhas. N�o foi preciso muito esfor�o para encontrar um grupo de cerca de 30 pessoas em uma trilha que havia sido interditada com fitas de seguran�a colocadas pela Guarda Municipal. O grupo arrebentou a fita e seguiu o passeio, sem se preocupar com o fato de infringir a lei, al�m de n�o respeitar o isolamento social. A informa��o no local � de que nos finais de semana v�rias pessoas se aglomeram por l�, muitas oriundas do condom�nio Retiro das Pedras.
"Trilheiros"sem qualquer prepara��o
Na Serra do Curral, pelos caminhos que levam ao pico Belo Horizonte, ao lado das instala��es de antenas de telecomunica��es e inclusive nas imedia��es de um posto da Pol�cia Militar, muitos jovens s�o encontrados percorrendo a trilha sob o sol forte de um cerrado de raras sombras. Todos sem m�scaras nem camisas, portando garrafinhas com quantidades m�nimas de �gua, cal�ados impr�prios e sem cobertura sobre as cabe�as.
Despreparados, curtem a caminhada como se fosse um passeio, alguns deles rumando para Nova Lima, onde pegariam �nibus para retornar a BH. M�es e pais com filhos pequenos tamb�m se embrenhavam pelas trilhas como se estivessem em um parque. Ningu�m se disp�s a conversar com a equipe do EM, justamente por terem a consci�ncia de que burlavam o isolamento e estavam sem m�scaras.
Esse movimento tem ainda mais impacto sobre o Pico Belo Horizonte, onde o marco de concreto teve a placa de posicionamento geod�sico arrancada e passou a ser usado como base para fogueiras improvisadas. Em volta, o lixo mostra a grande frequ�ncia de visitantes e indica at� pernoites, com latas de cerveja e embalagens de alimentos atiradas pelo mato. Um forte cheiro de dejetos e peda�os de papel higi�nico voando sobre as touceiras de mato mostram que o mais alto ponto da Serra do Curral serve tamb�m de banheiro para os trilheiros, ampliando a degrada��o.
Apesar dos ind�cios, de acordo com a Guarda Municipal de BH, os acessos que levam ao Pico Belo Horizonte e que passam por �reas administradas pela prefeitura da capital est�o sendo impedidos com opera��es di�rias da Funda��o de Parques Municipais e Zoobot�nica, em parceria com a corpora��o. “Essas a��es t�m coibido em 99% a travessia no alto da Serra do Curral, que j� n�o era permitida antes mesmo da pandemia. Outros acessos, igualmente clandestinos, tamb�m ocorrem por �reas de compet�ncia da mineradora Vale e do munic�pio de Nova Lima. A Vale j� foi notificada pela capital e se comprometeu a adotar as medidas de controle”, informou a Guarda.