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Estado de Minas COVID-19

Crise sem precedentes desafia motoristas aut�nomos e contratados

De um lado, os profissionais do transporte vivem o drama da redu��o da demanda do servi�o e da renda; de outro, enfrentam o temor de levar o v�rus a familiares


26/07/2020 06:00 - atualizado 26/07/2020 15:53

Além dos desafios que encontra pelas estradas durante a pandemia, Vera Duarte percebe segregação dos próprios colegas(foto: Arquivo Pessoal/Divulgação )
Al�m dos desafios que encontra pelas estradas durante a pandemia, Vera Duarte percebe segrega��o dos pr�prios colegas (foto: Arquivo Pessoal/Divulga��o )

A pandemia do novo coronav�rus alterou a vida dos trabalhadores do transporte, n�o importando a modalidade, seja de �nibus e t�xi; seja o servi�o feito por meio de aplicativos e vans. Para alguns deles, a mudan�a n�o se restringiu aos cuidados preventivos para evitar a dissemina��o do v�rus, como o uso de m�scara de prote��o e de �lcool em gel.

Eles passaram a enfrentar verdadeiros dramas, a exemplo da interrup��o do trabalho e consequente falta de recursos para o sustento. Essa realidade � encarada por condutores de vans escolares, que perderam trabalho e renda com a suspens�o das aulas, e tamb�m por transportadores aut�nomos, que se viram obrigados a ficar em casa devido ao fato de pertencerem aos grupos de risco para a COVID-19.

O “novo normal” dos profissionais do volante que atuam em diferentes �reas � o tema da �ltima reportagem da s�rie do Estado de Minas, que, desde segunda-feira, revela os impactos e os riscos enfrentados no setor de transporte em decorr�ncia do coronav�rus. Ontem foi Dia de S�o Crist�v�o, padroeiro dos motoristas, mas a categoria, diferentemente de anos anteriores, passou em branco, sem comemora��es.

� a situa��o do taxista Jos� Carlos Prud�ncio, de 61 anos, de Montes Claros, no Norte de Minas Gerais. Integrante do grupo de risco, n�o somente por causa idade, mas tamb�m por ser hipertenso e ter problemas card�acos, desde 18 de mar�o, inicio da pandemia no Brasil, ele parou de trabalhar. As consequ�ncias da paralisa��o for�ada n�o poderiam ser piores.

“Eu tinha d�vidas equivalentes ao que ganhava com o t�xi e passei a n�o receber mais nada. Tive que tomar dinheiro emprestado de parentes para cobrir as d�vidas”, diz Prud�ncio, que tem 18 anos de profiss�o. Ele � casado e pai de tr�s filhos adultos. “Uma delas � que est� nos mantendo”, conta. Al�m da perda de renda, Prud�ncio teve de arcar com o pagamento de multas avaliadas em quase R$ 2 mil, aplicadas por agentes da Empresa Municipal de Tr�nsito de Montes Claros (MCtrans).

“N�o estou justificando meu erro. Por�m, em todas notifica��es, os agentes n�o identificam o condutor. Como em muitas das vezes pegamos pessoas enfermas, sem condi��es de se locomover, temos que parar em locais proibidos”, reclama o taxista. Em outra frustra��o, ele tentou, mas n�o conseguiu receber o aux�lio emergencial. “Alegaram que eu n�o poderia receber (o benef�cio) por causa da renda de uma filha que morava na minha casa, mas que n�o vive mais aqui.”
 
Prud�ncio diz que, mesmo com tantas barreiras, vai continuar em casa, por entender que a sa�de vale mais do que qualquer outra coisa. “Estou parado e est� dif�cil. Mas prefiro ficar dentro de casa a correr risco de pegar essa doen�a”, admite o taxista. O medo da COVID-19 fez com ele procurasse um ref�gio em um lugar pequeno, em �rea rural, para se afastar das aglomera��es.
 
Diferentemente do colega de pra�a Manoel Ol�mpio Sales, de 80, o “Seu Nem”, como � conhecido, que mesmo integrando o grupo de risco continua na ativa, rodando com o t�xi em tempos de isolamento social.  N�o por vontade pr�pria, mas porque precisa. “Tenho que continuar trabalhando, por necessidade”, diz. “Sou aposentado, mas ganho somente um sal�rio m�nimo, que n�o d� para viver”, completa.
 
O experiente motorista reclama que, ap�s o surgimento do coronav�rus, e com o isolamento social, escolas sem aulas e restri��es no com�rcio, o movimento de passageiros caiu 50%. Mas, al�m da queda do faturamento, por causa da idade, ele tamb�m enfrenta situa��es constrangedoras: “um fiscal da prefeitura recomendou que eu fosse pra casa. Disse que 'lugar de velho � em casa e n�o na rua'. Ouvi aquilo e fiquei calado”, afirma.

Motorista de van escolar há 23 anos, Jader Gonçalves nunca viu turbulência parecida e reclama da falta de apoio dos governos(foto: Cecília Mariana/Divulgação)
Motorista de van escolar h� 23 anos, Jader Gon�alves nunca viu turbul�ncia parecida e reclama da falta de apoio dos governos (foto: Cec�lia Mariana/Divulga��o)

TRISTEZA

Natural do “barranco” do Rio S�o Francisco, na cidade hom�nima do rio, no Norte do estado, Manoel soma 60 anos de trabalho ao volante, dos quais 30 como taxista. Antes de completar a renda com o faturamento das viagens de t�xi, labutou por tr�s d�cadas como motorista de �nibus, no tempo em que n�o existiam asfalto na regi�o.
 
Outro taxista de Montes Claros, Eude Soares de Oliveira, de 47, continua trabalhando “normalmente” durante a pandemia, mas se preocupa com os cuidados para evitar a dissemina��o da COVID-19, usando m�scara de prote��o e �lcool em gel, al�m de manter sempre abertos os vidros do carro. Mas, a cada corrida carrega junto o medo do v�rus.
 
“Se a pessoa espirra dentro do carro, a gente fica cismado”, disse Eude, que tamb�m reclama da queda no faturamento. “Agora que melhorou um pouco. Mas, nos primeiros dias do isolamento, quando o com�rcio foi fechado, fizemos duas ou tr�s corridas por dia. Antes, a m�dia era de 10 a 15 corridas por dia.”
 
Maur�lio Pereira Ribeiro, de 52, dos quais 18 trabalhando como motorista de �nibus em Belo Horizonte, afirma, que, ap�s a chegada pandemia, tem evitado se aproximar das pessoas. “O medo sempre existe. Temos que evitar o contato com as pessoas”, diz Maur�lio.
 
Ele disse que ser motorista de �nibus foi um sonho de crian�a e lamenta a falta de comemora��o do Dia de S�o Crist�v�o neste ano, por causa pandemia. “Em rela��o aos anos passados � muito triste. Nunca imaginamos uma situa��o dessa, sem comemora��es”, lamentou.
 
Condutor de �nibus em Montes Claros, Sandro Ribeiro Ben�cio, de 33,  dos quais quatro na profiss�o, relata que sente o pior efeito da pandemia do coronav�rus ao chegar em casa, ap�s a cansativa jornada de trabalho. “Como tenho contato com muita gente, ao chegar em casa fico com medo de me aproximar dos meus filhos. Preciso evitar o risco de contamina��o”, diz Sandro, que � pai de dois garotos, de 4 e 2 anos.

 
Em contato constante com passageiros, o condutor Sandro Benício enfrenta diariamente o medo de se aproximar dos filhos(foto: Luiz Ribeiro/EM/D.A Press)
Em contato constante com passageiros, o condutor Sandro Ben�cio enfrenta diariamente o medo de se aproximar dos filhos (foto: Luiz Ribeiro/EM/D.A Press)

Com d�vidas e incertezas

Redu��o do faturamento, medo, inseguran�a, apreens�o. H� uma parcela de trabalhadores do transporte que enfrenta consequ�ncia da pandemia pior do que esses percal�os: a interrup��o do trabalho por n�o ter para quem prestar o servi�o. Essa a situa��o dos donos e motoristas de vans escolares, sem atividade desde o inicio da crise j� que as aulas foram suspensas devido ao isolamento social.
 
Sem trabalhar h� mais de quatro meses, Jader Gon�alves da Silva, motorista de van escolar, n�o tem receio de dizer: “A gente n�o consegue mais fazer uma feira completa. Estou sem dinheiro para comprar roupas e outras despesas”. Ele recebeu o aux�lio emergencial do governo, mas resume: “N�o deu pra nada”. Morador de Montes Claros,  trabalha com o transporte escolar h� 23 anos e diz que nunca imaginou que enfrentaria uma crise como a atual.
 
Antes da chegada da pandemia, o motorista transportava 30 alunos por dia, pela manh� e � tarde. Ele conta que a crise afeta muitos companheiros de profiss�o. Montes Claros tem 200 ve�culos cadastrados no transporte escolar. A categoria enfrenta d�vidas, de acordo com Jader Gon�alves.
 
“Para muitos motoristas, a incerteza � se haver� a possibilidade de pagamento da pr�xima parcela que vence da compra do seu ve�culo, o seu instrumento de trabalho; para outros, a incerteza � com o pagamento de uma d�vida com o banco”, lamenta Jader, que apela ao poder p�blico por ajuda � categoria. 

Luta contra o preconceito

A caminhoneira Vera L�cia Duarte, de 60 anos, mais conhecida como Rosinha, como outros trabalhadores do transporte enfrenta os efeitos da pandemia do coronav�rus, com o componente adicional da discrimina��o. Durante o isolamento social, sofreu resist�ncia para descarregar em um terminal. “N�o queriam deixar eu entrar no local ao saberem da minha idade. Tive que ficar esperando tr�s dias para descarregar a mercadoria”, afirma.

Com experi�ncia de 35 anos na profiss�o e, apesar dos tempos atuais de empoderamento feminino, Vera L�cia tem ainda pela frente o grande desafio de vencer o preconceito contra a mulher na estrada. “Enfrento o preconceito, sim. Em v�rios lugares ainda existem at� empresas que t�m uma certa resist�ncia contra a mulher”, afirma a motorista, que � ga�cha, mas est� sempre percorrendo as rodovias pelos diferentes cantos do Brasil, tendo como rota a BR-251, elo entre Montes Claros e a Rio-Bahia (BR-116), no Norte de Minas.

Ela ressalta que os pr�prios motoristas discriminam a mulher. “Existem uns caras bob�es, que quando veem (pelo retrovisor) que tem uma mulher (no carro de tr�s) querendo ultrapassar, apertam o p� no acelerador e n�o deixam  passar”, relata. Uma grande dificuldade que Vera Duarte enfrenta em suas andan�as pelo pa�s � a falta de banheiro femininonas paradas ao longo do caminho.

Transporte arriscado


Hist�rias envolvendo riscos e temores dos profissionais de um setor essencial da vida do pa�s, o de transporte, durante a pandemia do novo coronav�rus foram contadas pela s�rie de reportagens que o Estado de Minas publica desde segunda-feira.

As mat�rias relataram o cotidiano de caminhoneiros que trafegam por �reas em que existe alto �ndice de cont�gio e o crescimento dos roubos de cargas. A apreens�o dos condutores de ambul�ncias e a condi��o prec�ria dos mototaxistas, trabalhadores informais, tamb�m s�o dram�ticas, assim como o medo e os cuidados nas esta��es de metr� e trens.

Os desafios dos motoristas do transporte p�blico urbano chegam at� a agress�es por passageiros. Contudo, a s�rie tamb�m mostrou os casos de supera��o e expectativa num futuro melhor.


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