
Uma reformula��o necess�ria h� anos, mas que vem de maneira e em hora erradas. Assim os especialistas resumem a aprova��o do Projeto de Lei 3.267/2019, texto que promove profundas mudan�as no C�digo Brasileiro de Tr�nsito (CBT). O PL foi aprovado no Congresso na ter�a, por�m, sem o necess�rio debate com quem entende do assunto – e em plena pandemia, quando textos que circundam a COVID-19 deveriam ser prioridade. Agora, a mat�ria segue para san��o do presidente Jair Bolsonaro (sem partido).
Entre as altera��es est� a amplia��o do limite para suspens�o da Carteira Nacional de Habilita��o (CNH) para 40 pontos em alguns casos, entre eles os de motoristas que exercem atividade com remunera��o. Por outro lado, trechos pol�micos inicialmente inclu�dos na proposta do governo foram retirados do texto final, como a possibilidade de motoristas que causarem acidentes graves, at� mesmo com mortes, sob uso de �lcool ou drogas, escaparem da cadeia.
Entre as mais diferentes regras que podem mudar caso o texto seja sancionado por Bolsonaro h� pontos que chegam a ser classificados como “absurdos” por Daniel Medrado, diretor jur�dico da Associa��o de Cl�nicas de Tr�nsito de Minas Gerais (Actrans-MG). “No �mbito dos motociclistas, ficou obrigado o uso de capacete ou de vestimentas apropriadas. Se voc� pegar a literalidade da norma, o condutor vai precisar estar ou de capacete ou de jaqueta e cal�a jeans, basicamente. � um ponto absurdo”, pontua.
Essa regra recebeu uma emenda parlamentar proposta pelo Senado. Por�m, a edi��o foi rejeitada pelo relator da mat�ria na C�mara, deputado Juscelino Filho (DEM-MA). � Ag�ncia C�mara, ele explicou que o conectivo “ou”, como est� na reda��o aprovada pelos deputados, � que atende �s preocupa��es dos senadores, ao permitir a aplica��o da multa pela falta de um equipamento ou outro, em vez de condicionar a san��o � aus�ncia de ambos.
"N�s tivemos, de 1997 (quando o atual CBT virou lei) pra c�, um aumento vertiginoso de motoristas profissionais, com aplicativos e outras atividades. Ent�o, um caminhoneiro aut�nomo, que muitas das vezes s� faz avalia��o psicol�gica na hora de renovar sua habilita��o, pode ficar 10 anos sem passar pelo procedimento"
Daniel Medrado, diretor jur�dico da Actrans-MG
O projeto est� recheado de cr�ticas desde que foi apresentado no ano passado pelo presidente da Rep�blica. Na C�mara e no Senado, a proposta desidratou, mas, para Daniel Medrado, alguns pontos que v�o na contram�o da seguran�a no tr�nsito permaneceram. Entre os mais discutidos est� a renova��o da CNH. Atualmente, isso acontece de cinco em cinco anos. A ideia, no entanto, � dobrar esse intervalo de tempo, com avalia��es ps�quicas a cada 10 anos para condutores mais novos que 50 anos. Na mesma toada, aqueles com 70 ou mais v�o precisar renovar a cada tr�s anos. Antes, isso acontecia a partir de 65.
Motoristas
“N�s tivemos, de 1997 (quando o atual CBT virou lei) pra c�, um aumento vertiginoso de motoristas profissionais, com aplicativos e outras atividades. Ent�o, um caminhoneiro aut�nomo, que muitas das vezes s� faz avalia��o psicol�gica na hora de renovar sua habilita��o, pode ficar 10 anos sem passar pelo procedimento”, pondera Daniel Medrado.
Por outro lado, h� quem discorde da vis�o de Medrado, o que exp�e ainda mais as cr�ticas � aprova��o no Congresso “a toque de caixa”, sem debate com especialistas. Para o professor de transporte e tr�nsito da Universidade Fumec, M�rcio Aguiar, a ideia de aumentar o prazo para renova��o � boa e diminui os custos para a popula��o. “A verdade � que os exames de renova��o n�o s�o objetivos. Voc� responde a um question�rio, sempre muito raso. Voc� gasta o seu dinheiro ali e, de fato, se voc� for analisar com crit�rios t�cnicos n�o houve nada de objetivo”, sustenta.
Bebidas alco�licas Antes de passar pelo Senado, onde o texto recebeu emendas parlamentares, o novo CBT, que segue para san��o do presidente, permitia a convers�o das pris�es em penas alternativas no caso de motoristas que provocassem acidentes com morte ou ferido grave sob efeito de drogas ou bebida alco�lica. Portanto, um condutor embriagado que tirou a vida de um pedestre poderia, por exemplo, prestar servi�os comunit�rios, em vez de ser preso.
Diante disso, os senadores apresentaram uma emenda, depois acatada pela C�mara. O c�digo aprovado imp�e pena de reclus�o de 5 a 8 anos para o homic�dio culposo ao volante praticado por motorista embriagado ou sob efeito de drogas. No caso de les�o corporal grave ou grav�ssima, a deten��o vai de 2 a 5 anos.
Carteira
Outro ponto alterado � a eleva��o dos pontos para a suspens�o da carteira. Atualmente, todo e qualquer motorista tem sua habilita��o cassada ao somar 20 pontos em multas. Contudo, o projeto aprovado prev� uma grada��o de 20, 30 ou 40 pontos em 12 meses, conforme haja infra��es grav�ssimas ou n�o.Dessa maneira, o cidad�o s� perde a sua carteira com 20 pontos se cometer duas ou mais infra��es grav�ssimas, como avan�ar o sinal vermelho ou dirigir acima da velocidade permitida, no per�odo de 12 meses. Se at� uma pena desse tipo fizer parte da “ficha” do condutor nesse intervalo de tempo, o limite � de 30 pontos. Se em um ano n�o houver multas do tipo, a nota de corte sobe para 40 pontos.
Tais regras valem para todos os condutores, com exce��o daqueles que exercem atividade remunerada, como taxistas, motoristas de apps, caminhoneiros e condutores de �nibus. Esses, independentemente da quantidade de infra��es grav�ssimas, s� t�m suas habilita��es suspensas se cometerem 40 pontos em multas. Aquele que tem o volante como principal ferramenta de trabalho poder�, por exemplo, realizar at� cinco ultrapassagens proibidas sem ter a CNH suspensa.
Na opini�o do professor da Fumec M�rcio Aguiar, essa eleva��o dos pontos est� longe de ser o maior problema. Tudo gira em torno da fiscaliza��o, que precisa ser refor�ada. “N�o adianta a gente colocar um limite se n�o h� melhoria da fiscaliza��o. Isso � fundamental para diminuir os acidentes. Tem gente na rua dirigindo com carteira estourada por todos os cantos”, diz, lembrando do caso do jogador Juani Cazares, que passou pelo Atl�tico, flagrado na MG-10, na Grande BH, com excesso de pontua��o na CNH. No total, as multas do atleta somavam 154 pontos.
Ainda sobre o motorista que tem o volante como trabalho, a lei permite a participa��o no curso preventivo de reciclagem caso ele some 30 pontos em multas no prazo de 12 meses. Nesse caso, o saldo � zerado ap�s a conclus�o da capacita��o. Isso acontece, hoje, apenas com os portadores das carteiras C, D e E que atingem 14 pontos.
Cheio de pol�micas e aprovado com urg�ncia

Outras duas mudan�as no C�digo Brasileiro de Tr�nsito (CBT) que foram cercadas de cr�ticas durante a tramita��o do Projeto Lei 3.267/2019 no Congresso dizem respeito ao uso da cadeirinha para crian�as. Na proposta do governo do presidente Jair Bolsonaro, a inicial, n�o haveria penalidade para o n�o uso do equipamento de seguran�a. Por�m, o Congresso mudou isso: a proposta que segue para san��o prev� adequa��o ao peso e � altura da crian�a. Sobre a obrigatoriedade de acionamento dos far�is em rodovias, a nova lei s� permite aplica��o de multa nos trechos fora do per�metro urbano.
Apesar de o Brasil ser um dos protagonistas da pandemia da COVID-19, deputados federais viram o projeto de reforma do C�digo Brasileiro de Tr�nsito como priorit�rio. Em junho, a C�mara protocolou um procedimento de urg�ncia para a aprecia��o do projeto em plen�rio, fato que aconteceu no fim daquele m�s. No fim das contas, o projeto foi aprovado por 353 votos a 125. Dos 53 parlamentares eleitos em Minas Gerais, apenas 12 se posicionaram contra a proposta.
Tr�mite parecido aconteceu no Senado Federal. A proposta foi a plen�rio no �ltimo dia 3 e recebeu 46 votos a favor e 21 contra. Todos os pol�ticos eleitos em Minas Gerais votaram pela aprova��o, com exce��o de Ant�nio Anastasia (PSD), que presidia a sess�o.
Quanto � tramita��o, as duas fontes ouvidas pelo EM convergem suas opini�es. “Aqueles deputados que votaram (em junho) n�o foram deputados que tiveram a oportunidade de debater e dialogar com a sociedade civil e os diversos atores que circundam a quest�o, inclusive a comunidade cient�fica”, afirma Daniel Medrado, da Associa��o de Cl�nicas de Tr�nsito de Minas Gerais (Actrans-MG).
“Nesse momento, a gente n�o deve tirar o foco desta pandemia. Esse novo C�digo de Tr�nsito j� deveria ter sido revisto h� mais tempo. S� que eles colocaram em pauta em um momento inadequado. Essa discuss�o deve ser retomada no ano que vem, com especialistas sobre o assunto sendo ouvidos”, sustenta M�rcio Aguiar, da Fumec.