
Mesmo com a educa��o a dist�ncia, especialistas apontam que os pequenos est�o sofrendo com problemas psicol�gicos. Um grupo de 1.200 mil m�dicos, entre eles infectologistas, pediatras e psiquiatras, escreveu uma carta direcionada � sociedade mineira defendendo a volta imediata �s aulas. O Estado de Minas teve acesso com exclusividade � carta.
'Decis�o sem precedentes'
“Ao observar lugares onde as aulas n�o foram suspensas, ou que j� voltaram ao normal, percebemos que n�o houve impacto na curva da pandemia por conta da volta presencial. Mesmo que tivesse uma d�vida te�rica, percebemos que na pr�tica isso n�o acontece”, afirma a m�dica. “� �bvio que � preciso ensinar as crian�as a seguirem os devidos protocolos. Mas isso n�o � motivo para as escolas seguirem fechadas”, completa.
Isso porque, cerca de 300 mil pessoas deixaram o trabalho remoto em julho de 2020, o que reduziu de 12,7% para 11,7% o percentual de brasileiros em home office. � o que aponta o estudo do Instituto de Pesquisa Econ�mica Aplicada (Ipea) divulgado no ano passado.
Problemas psicol�gicos
No texto, eles destacam que, "para muito al�m do conte�do pedag�gico interrompido - e do isolamento social que impacta diretamente o desenvolvimento humano - estamos falando tamb�m de m� nutri��o e da obesidade, das crescentes taxas de viol�ncia dom�stica e abusos sexuais e de um aumento flagrante nos casos de gesta��o e abortos na adolesc�ncia, al�m dos transtornos de ansiedade, depress�o e das tentativas de suic�dio em crian�as e adolescentes - e, infelizmente, tamb�m dos casos consumados".
“Transtornos de humor, transtornos alimentares, comportamentos suicidas, al�m de depress�o, ansiedade, falha no desenvolvimento e perda de oportunidade s�o aumentos significativos. Os dados s�o irrepar�veis e muitos deles ser�o irrevers�veis. Quanto mais demorar para abrir as escolas, pior vai ser”, explica a m�dica.
Movimento mundial

PBH estuda mudan�as na recomenda��o para a volta �s aulas
Em janeiro, a PBH j� havia sinalizado que havia chance de retorno das aulas presenciais no in�cio de mar�o.
Confira a carta escrita pelos m�dicos M�dicos Pr�-Educa��o
"Carta Aberta � Sociedade Mineira
Um ano. Em poucos dias, nossas crian�as e jovens completar�o um ano sem aulas presenciais. S�o doze meses de acesso desigual � educa��o, de redu��o da prote��o f�sica e mental e de entrega destas crian�as � pr�pria sorte. Quando a educa��o da nossa juventude � vista como um setor n�o essencial em nossa sociedade, secund�rio diante de todos os outros, qual o futuro nos espera?
Hoje somos um grupo de mais de 1200 colegas m�dicos que se uniram em prol de estudar as condi��es adequadas para a retomada segura das atividades escolares presenciais em Belo Horizonte e em nosso Estado, baseados em ampla literatura m�dica de experi�ncias de retomada e estudos cient�ficos ao redor do mundo, desde mar�o de 2020 at� o presente momento.
Entendemos que o debate em rela��o ao retorno escolar n�o pode girar em torno da essencialidade ou n�o dos servi�os escolares ou da necessidade urgente da prioriza��o da educa��o, j� que estas s�o quest�es indiscut�veis. Escola �, sim, servi�o essencial e educa��o � direito de todos e dever do Estado e da fam�lia diante da constitui��o. �rg�os como o UNICEF j� declararam: “O fechamento global das escolas devido � pandemia da COVID-19 apresenta um risco sem precedentes � educa��o, prote��o e bem-estar das crian�as.” Precisamos devolver � inf�ncia a possibilidade de se desenvolver e ser educada no melhor formato que conhecemos.
Reconhecemos como complexo o debate em torno do equil�brio entre direitos fundamentais � vida, � sa�de e � educa��o, mas insistimos em ressaltar que a suspens�o das atividades escolares presenciais foi medida absolutamente EXCEPCIONAL e tempor�ria, inicialmente adotada como necess�ria para o entendimento da doen�a e prote��o coletiva. Contudo, estamos prestes a completar UM ANO de escolas fechadas, mesmo ap�s a compreens�o de toda a comunidade cient�fica de que, ao contr�rio de outras infec��es respirat�rias virais, a capacidade de transmiss�o da COVID-19 � muito menor em crian�as do que em adultos e de que crian�as e adolescentes representam apenas 8% dos casos de coronav�rus no mundo.
Devemos enfatizar que os casos graves pedi�tricos acontecem em frequ�ncia bastante baixa (2 a 3%) e a mortalidade � bem inferior a 1%. O �ltimo boletim epidemiol�gico do Brasil, divulgado em 12 de fevereiro deste ano, registra que os �bitos em menores de 6 anos respondem por apenas 0,48% do total, havendo um aumento discreto para 0,7% quando englobamos tamb�m os adolescentes. Atualmente, temos sido alertados para um aumento no n�mero de interna��es pedi�tricas por supostos dados provenientes da Inglaterra, mas, ao contr�rio do descrito nas not�cias alarmistas, esses casos s�o proporcionais ao aumento dos casos transmitidos na comunidade. Outra ascens�o de testes positivos na faixa et�ria pedi�trica tem supostamente acometido Israel e pode refletir apenas um aumento das taxas de transmiss�o na popula��o pedi�trica, que, por n�o estar ainda vacinada, � amplamente suscet�vel em um cen�rio de proximidade da universalidade da vacina para os grupos de risco. Aqui, como na Europa, os casos graves de S�ndrome Inflamat�ria Multissist�mica Pedi�trica (SIMP) no Estado de Minas j� somam 64 e apresentam mortalidade ZERO, registrada e evitada pelo olhar atento e zeloso dos nossos pediatras que t�m institu�do tratamento eficaz e evitado as sequelas e a morte.
Mesmo diante das centenas de variantes j� sabidas e daquelas ainda ignoradas, as medidas de mitiga��o s�o bem conhecidas e cabe-nos ensinar aos adultos que parem de transmitir para crian�as e idosos at� que a vacina esteja dispon�vel para todos. Adultos n�o est�o em casa, basta olhar pela janela. S�o apenas oito milh�es de brasileiros em trabalho remoto. Se todos os outros mais de 200 milh�es de brasileiros n�o est�o em casa, pensem onde e com quem estar�o suas crian�as e assim entender�o, em parte, muitos dos riscos j� presentes nestas crian�as e o que est�o fazendo durante a pandemia.
Se, por um lado, hoje sabemos da benignidade da infec��o pelo coronav�rus na inf�ncia, j� n�o h� novidade no conhecimento dos efeitos do prolongamento do isolamento social e da falta de conviv�ncia com seus pares, que trouxeram graves danos � sa�de f�sica e mental das crian�as, especialmente �quelas mais vulner�veis socialmente, exacerbando todas as disparidades sociais j� existentes e amplamente conhecidas. Para muito al�m do conte�do pedag�gico interrompido - e do isolamento social que impacta diretamente o desenvolvimento humano - estamos falando tamb�m de m� nutri��o e da obesidade, das crescentes taxas de viol�ncia dom�stica e abusos sexuais e de um aumento flagrante nos casos de gesta��o e abortos na adolesc�ncia, al�m dos transtornos de ansiedade, depress�o e das tentativas de suic�dio em crian�as e adolescentes - e, infelizmente, tamb�m dos casos consumados.
Diante de danos reais e inequ�vocos, a alega��o de precau��o ou preven��o n�o pode ser utilizada para a n�o ado��o de TODAS as provid�ncias necess�rias para se assegurar, de forma priorit�ria e imediata, o direito fundamental � Educa��o. O melhor interesse de cada crian�a deve estar sempre no centro das decis�es, analisando-se riscos e benef�cios em rela��o � sa�de integral, e n�o somente na perspectiva de sa�de como aus�ncia de doen�a. Esperamos que a sa�de seja vista de novo como resultante n�o apenas do nosso estado biol�gico, mas tamb�m dos nossos aspectos ps�quicos e sociais, que inevitavelmente mostrar-se-�o, cedo ou tarde, indissoci�veis, a despeito da nossa vontade. Que por respeito � nossa sa�de plena seja facultado o direito � escola para os que querem e precisam.
Vacinamos, at� o momento, aproximadamente 3% da popula��o brasileira e assim, mantendo esse ritmo, alcan�aremos a vacina��o para todos em 36 meses, ou 3 anos. Certamente as ind�strias farmac�uticas ir�o acelerar e disponibilizar vacinas em ritmo mais adequado que o atual, mas n�o temos anos a dispor. As crian�as n�o passam isentas ou inc�lumes a essa in�rcia e desinteresse. Confessamos que, como m�dicos, ficamos assustados em observar a retic�ncia de professores que n�o se enquadram no grupo de risco em voltar a seus postos. N�o vimos isso em outros pa�ses onde parece haver compromisso com o processo educacional, mesmo em momentos em que a vacina��o era um processo ainda bastante distante. Tamb�m n�o vimos isso entre m�dicos, enfermeiros, dentistas, fisioterapeutas, t�cnicos e todos os outros profissionais da sa�de. Imaginem se s� trabalh�ssemos diante de vacinas? A� sim estar�amos todos mortos, sen�o pelo COVID, mas pelas doen�as que deixamos de tratar. E a l�gica n�o se reduz ao trabalho dos profissionais de sa�de. Motoristas de �nibus, padeiros, lixeiros, guardas municipais, empregadas dom�sticas, trabalhadores das farm�cias e supermercados, dos restaurantes delivery e seus entregadores, bombeiros, empregados da constru��o civil e tantos outros que n�o se furtaram a desempenhar o seu papel e seu compromisso no momento certo, trabalhando em conjunto para que os servi�os essenciais funcionassem da forma mais segura poss�vel. E a sociedade s� funciona assim, cada um sabendo e atuando com aquilo que lhe cabe e com a devida seriedade.
Pa�ses da �frica, �sia, Europa, Am�rica e Oceania mant�m suas escolas abertas ou assumem uma postura de que a escola � a �ltima a fechar e sempre a primeira a abrir, colocando a educa��o como pilar estrutural da sociedade, da luta contra a pandemia e da recupera��o das sociedades no futuro. Diferentemente do Brasil, parecem entender o valor da educa��o, enquanto n�s, em Belo Horizonte e Minas, parece que nunca entenderemos. Estamos constantemente em p�ssimas posi��es nos rankings de testes internacionais e agora, s� em Belo Horizonte, abandonamos 471.084 crian�as e adolescentes fazendo a educa��o por conta pr�pria, muitas vezes sem supervis�o ou com supervis�o n�o treinada e inapropriada. Foram mais de 30.000 crian�as que n�o se alfabetizaram no tempo certo, 79.636 crian�as que n�o aprimoraram suas habilidades de matem�tica e lingu�stica e que certamente ter�o preju�zo no processo de alfabetiza��o. Foi um sem n�mero de crian�as com atraso de linguagem e de habilidades n�o treinadas em casa ou orientadas por cuidadores talvez inadequados. Os n�meros de crian�as com ansiedade, depress�o e tentativas de suic�dio ou auto-mutila��o n�o s�o oficialmente contabilizados ou publicizados, porque, se o fossem, estariam todos aterrorizados com o fato de que esses casos t�m lotado nossos consult�rios. O que fizemos com a inf�ncia?
Diante dessa defesa pela educa��o, ouvimos de tudo. Para aqueles que julgam que n�s, m�dicos, queremos o retorno escolar por estarmos com os consult�rios vazios, sentimos desapont�-los. Nossos consult�rios mant�m o movimento inalterado, entretanto houve um acr�scimo gigantesco de crian�as com traumatismos f�sicos e altera��es cognitivas e psiqui�tricas graves. Como temos saudades de crian�as levadas e sorridentes � nossa frente! Como temos saudades de crian�as bagunceiras e sapecas, trazendo como queixa apenas uma leve coriza! Infelizmente, nossos consult�rios se encheram de tristeza, agonia e desespero. E estes s�o os bem-aventurados que conseguiram chegar aos consult�rios, j� que a escola, para uma grande maioria, � o principal lugar de acolhimento e diagn�stico inicial das afli��es da inf�ncia. O que est� sendo feito das crian�as que, fora da escola, n�o est�o tendo acesso a qualquer servi�o? Quem dera pud�ssemos resolver o que estamos vendo apenas com uma dose de analg�sico. A dor que as fam�lias est�o sentindo foge �s nossas m�os.
Negligenciamos a inf�ncia! Neglig�ncia do poder p�blico, neglig�ncia dos nossos gestores, neglig�ncia dos nossos cuidadores - essa vai ser a marca desse tempo para com as crian�as. Por sorte, nem todos se acovardaram e t�o pouco se omitiram em defender quem ficou sem voz. O tempo dir� que s� n�o foi pior para as crian�as porque, em algum momento, pessoas se juntaram e decidiram propor condi��es para as crian�as fazerem o que precisam fazer, de forma s�ria, compromissada e respons�vel. O dia que isso for concretizado, a resultante s� pode ser um cen�rio de educa��o facultativa, h�brida e cuidadosa com todas as pessoas envolvidas e seus riscos individuais reconhecidos e contabilizados.
Se para tudo e para todos houve a possibilidade do retorno, se permitimos h� muito que os adultos saiam e transmitam para as crian�as e os idosos, por que n�o se criar normas com par�metros objetivos e transparentes e assumindo a essencialidade da escola e a necessidade de protocolos? As escolas s� voltar�o com suas atividades presenciais se todos estivermos dispostos e abertos a isso, mas que todos durmam sabendo que t�m a preserva��o da inf�ncia nas costas e o peso das decis�es de agora sobre o futuro de nossa sociedade.
Belo Horizonte, 21 de fevereiro de 2021
M�dicos Pr�-Educa��o"
*Estagi�ria sob supervis�o da editora-assistente Vera Schmitz