Campanha busca 'padrinhos' para imagens sacras em Ouro Preto

Ouro Preto – Um tesouro barroco de Minas, desses fabulosos que fazem bem aos olhos, valorizam a cultura e fortalecem a devo��o, ganha a partir de hoje uma campanha in�dita no estado. E, sem d�vida, dever� ultrapassar fronteiras pela ideia original de preserva��o. Considerada uma das igrejas mais antigas de Minas, com a constru��o iniciada em 1727, e tamb�m das maiores em tamanho e suntuosidade, o Santu�rio Nossa Senhora da Concei��o , no Bairro Ant�nio Dias, em Ouro Preto , na Regi�o Central, come�a uma a��o de apadrinhamento de 23 imagens sacras do s�culo 18.

� frente da campanha "Apadrinhe uma imagem", o p�roco e reitor do santu�rio, padre Edmar Jos� da Silva, explica que objetivo � recompor o conjunto de pe�as n�o contemplado no processo de restaura��o do templo tombado desde 1939 pelo Instituto do Patrim�nio Hist�rico e art�stico Nacional ( Iphan ) – as obras iniciadas em 2014 na edifica��o, com recurso federal, t�m previs�o de t�rmino ainda este ano. J� a campanha, com apoio do Iphan, ter� as pe�as restauradas pela Anima Conserva��o e Restaura��o, de S�o Jo�o del-Rei. A expectativa � de que o servi�o completo dure um ano.

Na manh� de ontem, cheio de entusiasmo, o padre Edmar, h� pouco mais de um ano como p�roco e reitor do santu�rio, falou sobre a boa receptividade na comunidade. "J� temos 18 fam�lias comprometidas em apadrinhar as imagens, o que nos deixa muito felizes. Elas poder�o acompanhar todo o restauro, que j� come�ou no ateli� montado no consist�rio (antiga sala de reuni�o das irmandades) no santu�rio", disse o religioso. Ele informa que apenas pessoas da comunidade participam da campanha, e n�o empresas. E, com bom humor, avisa aos padrinhos : "Como manda a tradi��o, sempre que quiserem, venham visitar seus afilhados".

As pe�as do acervo, em tamanhos que variam de 20 cent�metros a 1,75 metro de altura, em madeira policromada, se encontram em mau estado de conserva��o, com perda de policromia, de pinturas e outras agress�es, conforme mostrou o restaurador da Anima, Gilson Felipe Ribeiro, diante das maiores imagens do conjunto: Santa B�rbara e S�o Jo�o Nepomuceno. O acervo se completa com as esculturas de Santa Apol�nia, Nossa Senhora da Assun��o, S�o Sebasti�o, Santa Rita, S�o Br�s, S�o Roque, S�o Judas Tadeu, Nossa Senhora da Boa Morte, S�o Jos� de Botas, S�o Francisco de Paula, S�o Zacarias, Nosso Senhor do Bonfim, S�o Domingos Gusm�o, Santo Ant�nio, Sagrado Cora��o de Jesus, S�o Gon�alo Garcia, Nossa senhora do Ter�o, Nossa Senhora das Merc�s, S�o Miguel Arcanjo, Crucificado da Agonia e uma cruz usada em prociss�es.

Mostrando os objetos de f�, padre Edmar destacou: “Como � muito comum durante as obras de restaura��o, vamos descobrindo novos elementos art�sticos que precisam de reparos. E isso ocorreu tamb�m com a nossa igreja matriz, que, nessas obras, tem o acompanhamento do chefe do escrit�rio t�cnico do Iphan em Ouro Preto, arquiteto Andr� Macieira".

 

Para a superintendente do Iphan em Minas, D�bora do Nascimento Fran�a, a a��o traz muito orgulho, por ser fruto de uma parceria em constru��o direta com a sociedade. "O Iphan apoia e admira a iniciativa, que partiu do padre Edmar Jos� da Silva. A��es como essa demonstram a import�ncia do patrim�nio cultural para a sociedade e d�o um exemplo de como tais parcerias podem ser trabalhadas em prol da preserva��o de um patrim�nio t�o rico como o de Ouro Preto."

Compromisso

A campanha j� tem 18 fam�lias envolvidas. "Trata-se de uma iniciativa importante em todos os sentidos, principalmente do pertencimento aliado � valoriza��o da arte e ao fortalecimento da f� ", ressaltou a professora Dulcin�a Corr�a Fran�a. Segundo a professora, oito pessoas da fam�lia se juntaram para apadrinhar a imagem da Nossa Senhora da Assun��o, de devo��o da tia Elizabeth Lopes Fran�a. Sobre Santa Apol�nia, tamb�m apadrinhada pela fam�lia, Dulcin�a confessa que nada sabia, e, ao pesquisar, descobriu que foi uma crist� martirizada durante o Imp�rio Romano, sem jamais negar sua f�.

 

H� v�rios tipos de participa��o na campanha, incluindo contribui��es via carn�. "Dessa forma, podemos participar com muita alegria", disse a dona de casa Maria das Merc�s Costa Dias, casada, com tr�s filhos, ao admirar, no ateli�, a imagem de S�o Miguel Arcanjo, "aos cuidados" da restauradora Sueli Herm�nia Gomes Silva. No espa�o, o restaurador Rafael Mendes restaura a imagem de Santa B�rbara.

Como a imagin�ria da igreja n�o estava contemplada no processo de restaura��o, com exce��o da escultura da padroeira Nossa Senhora da Concei��o, uma conversa entre integrantes dos conselhos da par�quia e da Irmandade de Nossa Senhora da Concei��o apontou a dire��o. "E assim surgiu a ideia de se fazer uma grande campanha, envolvendo ouro-pretanos, amigos da par�quia e os amantes da arte e da cultura para a restaura��o das imagens que comp�em os ret�bulos e nichos do santu�rio”, afirmou o padre.

 

Para participar, os doadores poder�o apadrinhar uma imagem, oferecendo o valor integral do restauro, parcelado ao longo do ano de 2021, ou doar qualquer quantia, seja via dep�sito ou carn�. Em contrapartida, os doadores poder�o acompanhar o processo de restaura��o da imagem apadrinhada, visitando o ateli� ap�s agendamento pr�vio e recebendo, ao final do processo, um selo de agradecimento e participa��o. Ao final da campanha, ser�o programadas cerim�nias de reentroniza��o das imagens, com a participa��o dos padrinhos.

Hist�ria

Conhecida como Matriz de Nossa Senhora da Concei��o de Ant�nio Dias, o santu�rio (vinculado � Arquidiocese de Mariana) foi erguido pelo grupo do bandeirante Ant�nio Dias, no ent�o arraial hom�nimo, como uma pequena capela devotada a Nossa Senhora da Concei��o. Por volta de 1705, a ermida foi ampliada, reflexo do desenvolvimento local e da subsequente demanda pela constitui��o de uma par�quia pr�pria. A freguesia de Ant�nio Dias, junto com a de Nossa Senhora do Pilar, passou a compor a rec�m-fundada Vila Rica, unificando, sob a mesma jurisdi��o pol�tica e administrativa, dois dos principais arraiais de Ouro Preto.

 

Em 1727, o templo come�ou a ser reconfigurado e ampliado por Manoel Francisco Lisboa, pai de Ant�nio Francisco Lisboa, o Aleijadinho. Nos anos seguintes, a igreja passou por diversas obras, interven��es e melhoramentos internos at� a segunda metade do s�culo 18. A Matriz de Nossa Senhora da Concei��o, tombada isoladamente pelo Iphan em 1939, foi sede de v�rios eventos hist�ricos importantes, como a posse do governador Gomes Freire de Andrade, em 1735. Tamb�m abriga os restos mortais de Ant�nio Francisco Lisboa, o Aleijadinho (1738-1814), patrono das Artes no Brasil, sepultado em frente ao altar de Nossa Senhora da Boa Morte; e de seu pai, Manoel Francisco Lisboa, na capela-mor. Na antiga sacristia est� instalado o Museu Aleijadinho, onde podem ser admiradas v�rias obras do mestre, como a imagem de S�o Francisco de Paula e um Cristo crucificado.

 

Um dos mais importantes exemplares da arquitetura religiosa brasileira – tanto no contexto arquitet�nico no panorama das matrizes mineiras setecentistas, quanto na excepcionalidade da qualidade art�stica do seu acervo de bens integrados –, a edifica��o passa pela segunda etapa de restaura��o, iniciada em 2019. Os trabalhos em execu��o est�o em est�gio avan�ado do cronograma f�sico e incluem servi�os de conserva��o e restaura��o. “O desejo � devolver � comunidade n�o somente o templo restaurado, mas tamb�m as imagens que comp�em o espa�o religioso do santu�rio”, diz o padre.