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Estado de Minas INSEGURAN�A ALIMENTAR

"Dormir para esquecer a fome", diz m�e, retrato da car�ncia no Brasil

Situa��o como a de C�lia, m�e do menino que pediu ajuda no 190, tamb�m aflige Paula e milhares de brasileiros, em risco por n�o ter o que comer


05/08/2022 04:00 - atualizado 05/08/2022 06:50

Célia Barros com o filho mais novo no colo: 'Ele não entende. Chorava o tempo todo'
C�lia Barros com o filho mais novo no colo: "Ele n�o entende. Chorava o tempo todo" (foto: Fotos: Jair Amaral/EM/D.A Press)

“Tenho medo da fome”, disse C�lia Arquimino Barros, dentro do barrac�o de tr�s c�modos onde mora no Bairro S�o Cosme, em Santa Luzia, na Regi�o Metropolitana de Belo Horizonte. Aos 46 anos, ela desdobra-se para criar os seis filhos. “� muito triste n�o ter nada para comer nos arm�rios. J� teve dias em que dei �gua com a��car para meu beb� para ver se ele parava de chorar. Tentava fazer ele dormir para esquecer a fome”, declara.  Retrato da fome que aflige 33 milh�es de pessoas no Brasil, a hist�ria de C�lia ganhou repercuss�o ap�s seu filho Miguel, de 11 anos, ligar para a pol�cia e pedir ajuda para a fam�lia.

Nos �ltimos dias, o card�pio da fam�lia se baseou em fub� e farinha. Ela relatou que estava sem comprar alimentos havia cerca de tr�s semanas. “Primeiro come�amos comendo s�  macarr�o. A� acabou e ficou o fub�. N�o tinha op��o, n�o podia deixar com fome. Ent�o, eu fazia o mingau doce de manh� e � noite um angu de fub�, porque n�o tinha mais nada”, conta. Segundo C�lia, a situa��o come�ou a piorar h� cerca de sete meses, quando ela teve o Bolsa Fam�lia bloqueado. “O beb� era o que mais me dava trabalho, porque ele chorava muito. Ele n�o entende. Chorava o tempo todo”, relata.

A fome � descrita pela pequena Sara, de 3, filha de C�lia, como uma dor no est�mago como se fosse um soco. “Ela ficava com dor na barriga de fome. O Miguel fez 11 anos e olha como ele � miudinho. Ele j� � um pouco an�mico, por causa da defici�ncia na alimenta��o”, conta com pesar na voz. M�e solo, ela cuida tamb�m de tr�s netos, com idades entre 1 e 4 anos, que moram com a m�e deles em um barrac�o ao lado. “Eu estava desesperada, n�o estava aguentando mais ver aquela situa��o e nem pedir na rua, porque as pessoas acham que voc� est� com pregui�a, que voc� n�o quer trabalhar, e eles n�o entendem a situa��o”, conta C�lia.

Mesmo quando recebia o aux�lio do governo, ela diz que o dinheiro j� n�o era suficiente para sustentar a fam�lia. “Recebia R$ 535. Com o pre�o das coisas, j� n�o comprava nada, n�o dava para manter muito tempo a casa. Voc� faz uma compra que n�o d� para 15 dias. Ainda mais com um beb� em casa”, afirma. Divorciada do pai das crian�as, ela est� desempregada e, desde o in�cio da pandemia, n�o consegue mais bicos para ajudar na renda. “O pai manda s�  R$ 250. Ele tamb�m est� desempregado, o que ele arruma � o que ele manda. Mas ele d� isso s� de m�s em m�s. � s� aquilo e acabou”, conta. Depois da liga��o da crian�a para o 190, a pr�pria Pol�cia Militar iniciou campanha para arrecadar doa��es para a fam�lia, entregues ontem.

Paula Fernandes Pessoa, de 36, vive realidade semelhante � de C�lia. Atualmente, ela tamb�m est� desempregada e � m�e solo de tr�s crian�as: Pedro de 13, Rebeca, de 2, e Samuel, de 2 meses. Al�m dos filhos, Paula mora com o irm�o no Morro do Papagaio, Regi�o Centro-Sul de BH. A fam�lia � assistida pela Central �nica das Favelas em Minas Gerais (Cufa-MG) desde que Paula descobriu que estava gr�vida do filho mais novo. “S� o aux�lio do governo n�o est� dando para alimentar todo mundo. Quando cheguei nessa situa��o de abrir o arm�rio e ver que n�o tinha nada, meu compadre me falou da Cufa.” Desde ent�o, a fam�lia recebe cesta b�sica e assist�ncia da entidade, com doa��es de botij�o de g�s e outros alimentos.

“Antes da pandemia, eu trabalhava de faxineira em um pr�dio perto da minha casa.” Agora, com o filho pequeno, n�o consegue retomar a atividade. Paula passou por momentos de desespero, sem ter o que dar de comer para os filhos. “� o pior sentimento do mundo, como se voc� n�o merecesse ter os filhos que tem. A crian�a olhar para voc� com os olhos brancos, voc� olhar para o arm�rio e n�o ter nada para dar. Pensa em fazer alguma coisa, mas sabe que aquilo n�o vai matar a fome da crian�a.”

Sa�de em perigo


A nutricionista Brenda Ribas Matoso afirma que a m� alimenta��o prejudica a sa�de das crian�as, deixando-as sujeitas a dificuldades de aprendizagem. “S�o tantos riscos que � at� dif�cil saber por onde come�ar. Isso prejudica principalmente crian�as e adolescentes em fase de crescimento, porque elas precisam de nutrientes para crescer e se desenvolver”, comenta. Quanto mais avan�ado o n�vel de inseguran�a alimentar, maior o risco de desnutri��o. “O ideal seria que as pessoas tenham acesso a pelo menos o arroz e feij�o, al�m do ovo, que daria suporte de amino�cidos essenciais e  garantiram acesso a nutri��o. E estamos falando de alimentos b�sicos”, complementa.

Esse cen�rio tamb�m traz problemas psicol�gicos “ A crian�a n�o consegue crescer, pode ter problemas est�ticos, como de cabelo, pele mais fr�gil. Pode acarretar em anemia pelo n�o consumo de ferro. E uma crian�a an�mica n�o tem desenvolvimento cognitivo adequado, podendo ter problemas de mem�ria, por exemplo. S�o preju�zos muito grandes”, afirma a nutricionista. Ela tamb�m refor�a que a crian�a precisa ter aten��o ao ferro: “Porque est�o em fase de crescimento e precisam de uma quantidade de ferro suficiente, al�m das vitaminas do complexo B, para terem desenvolvimento adequado.  E o zinco, que tamb�m � superimportante para essa fase”.

Vulnerabilidade cresce


O presidente da Central �nica das Favelas em Minas Gerais (Cufa-MG), Francis Henrique, explica que antes da pandemia, o atendimento a fam�lias em situa��o de vulnerabilidade alimentar era controlado. “Eram fam�lias que nos procuravam porque estavam com necessidade de alimenta��o. Atend�amos e encaminh�vamos para programas sociais e d�vamos todo o suporte para que elas tivessem uma base ao longo de um tempo. No meio do processo, muitas arrumavam emprego e sua situa��o mudava. � l�gico que havia algumas situa��es mais permanentes.”

Ele diz que ap�s a pandemia a mis�ria cresceu muito. “A propor��o de fam�lias est�o passando fome aumentou e o pior de tudo, sem perspectiva de melhoria da situa��o a curto prazo.” S�o pessoas que j� procuraram emprego e sem conseguir acabam ficando desanimadas. O trabalho da entidade � tentar amenizar essa realidade.

Francis diz que o caso da fam�lia de Miguel � um reflexo do que acontece em v�rias outras. “Tem muita fam�lia que n�o sabe nem a quem pedir ajuda. As institui��es tamb�m est�o sofrendo com diminui��o das doa��es.” Na Cufa essa queda chegou a 85%.
Embora n�o veja chances de melhora a curto prazo, ele destaca que existem a��es paliativas imediatas que precisam ser feitas. “Aumentar o n�mero de pessoas atendidas por programas de transfer�ncia de renda. � fundamental, j� que tem fam�lias que nem se cadastram porque n�o t�m conhecimento ou documenta��o.”

Ele afirma ainda que � necess�ria uma mobiliza��o social que v� al�m dos governos para amparar essas fam�lias. “J� as a��es de longo prazo s�o no fortalecimento da economia. � preciso ter empregos e gerar renda, al�m da educa��o, que � um processo longo de capacita��o de pessoas. Isso � um processo de algumas d�cadas. Enquanto isso, � necess�rio que o governo crie pol�ticas p�blicas que possam amenizar e fazer com que essas pessoas v�o abandonando essa condi��o prec�ria.” A Cufa atende mensalmente cerca de 1.700 fam�lias na Grande BH. Para ajudar, acesse: https://www.cufaminas.org/ (SP, MP, MC)


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