
Em um estado que tem nos recursos naturais uma de suas maiores riquezas, gerenciar a quest�o ambiental � uma demanda permanente, que se torna ainda mais importante em um cen�rio em que as mudan�as clim�ticas mobilizam aten��es e preocupa��es em escala planet�ria. Polo de riquezas minerais que deram nome ao pr�prio territ�rio, fonte de sistemas h�dricos que j� valeram a alcunha de caixa d'�gua do pa�s e reserva de biomas estrat�gicos, como a mata atl�ntica e o cerrado, Minas Gerais se v� �s voltas, como poucos, com o desafio de aliar desenvolvimento econ�mico e sustentabilidade. Respons�vel pela miss�o, a secret�ria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustent�vel, Mar�lia Carvalho de Melo (foto), fala nesta entrevista sobre as metas alcan�adas na atual gest�o e das exig�ncias que se imp�em para o setor no pr�ximo mandato do governador Romeu Zema (Novo). Entre os pontos de destaque, a participa��o de Minas na 27ª Confer�ncia das Na��es Unidas sobre Mudan�as Clim�ticas de 2022 (COP 27), no Egito, seguran�a na minera��o, controle do desmatamento e taxa��o da chamada energia limpa. Confira a seguir.

O que vai mudar na gest�o ambiental no segundo mandato do governador Romeu Zema? Quais s�o as �reas onde h� necessidade de mudan�a imediata?
Tivemos muitos resultados importantes no primeiro ciclo destes quatro anos que estamos concluindo. Mas parte significativa se deu com o foco em passivos que precis�vamos enfrentar. Passivos de licenciamento ambiental, autoriza��o de uso da �gua e interven��es ambientais especialmente, que � uma demanda de presta��o de servi�o direto � sociedade. Tamb�m trabalhamos em passivo de estrutura��o de unidades de conserva��o, elaboramos 15 planos de manejo e atualizamos outros seis. O plano de manejo � um instrumento fundamental para conserva��o dessas �reas. Ainda no tema biodiversidade, estruturamos os Centros de Triagem e Reabilita��o de Fauna Silvestre e criamos novos em Patos de Minas e Divin�polis, o que nos possibilitou receber mais de 25 mil animais. A gest�o da fauna dom�stica, cuja atribui��o foi passada � secretaria em 2019, tamb�m avan�ou. Contabilizamos 146 mil esteriliza��es de c�es e gatos e doamos 63 mil microchips para monitoramento de animais dom�sticos aos munic�pios. Implantamos, de forma pioneira, o Sistema Estadual de Manifesto de Transporte de Res�duos, uma ferramenta de rastreabilidade de res�duos gerados e destinados em Minas. Com isso, monitoramos 46 milh�es de toneladas de res�duos, dos quais 39% foram destinados � reciclagem. Na agenda de recursos h�dricos, uma demanda antiga dos 36 comit�s de bacias hidrogr�ficas era para que o recurso da cobran�a pelo uso da �gua fosse descontingenciado. Todo o valor arrecadado nesta gest�o foi integralmente repassado e estamos pagando o passivo, conforme acordado com os comit�s. Importante ressaltar que sa�mos de 12 bacias com cobran�a pelo uso da �gua para 26 j� aprovadas e em fase de implementa��o, dando maior autonomia e condi��o aos comit�s de implementarem projetos e a��es de melhoria de qualidade e quantidade da �gua. Esses s�o alguns dos nossos resultados. Mas considerando a amplitude da gest�o ambiental, temos ainda muito a percorrer.
Quais s�o as prioridades nesse percurso?
Temos algumas prioridades estabelecidas. A universaliza��o do saneamento � uma delas, que dever� ocorrer em parceria com os munic�pios, considerando a compet�ncia constitucional. O estado enviou � Assembleia Legislativa um projeto de lei que prop�s a cria��o das unidades regionais de �gua e esgoto, e de res�duos s�lidos. Isso � central para o avan�o com a atra��o de investimentos no saneamento em Minas. Na agenda de regulariza��o ambiental, tamb�m estamos iniciando um projeto estruturante, que � uma prioridade. Ele far� uma ampla revis�o das 870 normas infralegais que o estado tem, para de fato retomar o licenciamento com um foco na t�cnica de avalia��o e controle de atividades potencialmente poluidoras. Com o projeto, vamos criar regras t�cnicas precisas, com elabora��o de termos de refer�ncia para todas as licen�as ambientais, bem como a moderniza��o dos nossos sistemas de informa��o para o licenciamento, dando maior controle aos processos e previsibilidade �s pessoas que demandam essa presta��o de servi�o no estado. Estamos tamb�m em fase de elabora��o do plano de seguran�a h�drica, que resultar� em propostas de projetos de melhoria de qualidade e de disponibilidade h�drica no estado. Esse � um instrumento fundamental, at� para a adapta��o frente �s estiagens e cheias intensas que o estado tem vivenciado. Outro desafio posto para trabalharmos nos pr�ximos quatro anos � a implementa��o do Programa de Regulariza��o Ambiental no estado. Esse � um instrumento do c�digo florestal brasileiro que permite a regulariza��o ambiental das propriedades rurais. No nosso levantamento, temos um potencial de restaura��o de 3,4 milh�es de hectares no estado com essa a��o.
Grande parte da popula��o em geral tem dificuldades em entender o conceito de controle de emiss�o de g�s carb�nico, quando essas mesmas pessoas ainda n�o t�m o saneamento b�sico e n�o foram educadas para a reciclagem. O que se pode fazer em um cen�rio como esse?
A agenda ambiental � de fato ampla, mas todas as quest�es s�o igualmente importantes para a popula��o, pois geram, em �ltima inst�ncia, qualidade de vida, por isso temos que atuar nas diversas �reas. � o que temos feito. Investimentos em saneamento, incentivos � reciclagem e projetos de educa��o ambiental. Para come�ar, temos o projeto Jovens Mineiros Sustent�veis, que capacita educadores e alunos de escolas estaduais que se tornam multiplicadores de informa��es e novas condutas junto �s fam�lias. O programa atua em uso eficiente da �gua, efici�ncia energ�tica, coleta seletiva e educa��o humanit�ria. J� realizou mais de 100 mil atividades de educa��o ambiental em 65 munic�pios, envolvendo mais de 4 mil estudantes. Outra frente � o Bolsa Reciclagem: os catadores recebem por material recolhido, como uma forma de pagar pelo servi�o ambiental que eles prestam � sociedade. J� foram investidos mais de R$ 15 milh�es para as associa��es de catadores de materiais recicl�veis. Pagamos a eles inclusive o passivo da gest�o anterior. Tamb�m h� parcerias com entidades de atua��o nacional para pontos de recolhimento e log�stica reversa. No saneamento, posso destacar que j� temos mais de 87% da popula��o urbana atendida por coleta de esgoto. S�o 16,5 milh�es de pessoas. Quatrocentos e dez munic�pios t�m coopera��o t�cnica para apoio na gest�o de res�duos s�lidos urbanos e j� s�o 570 munic�pios regularizados na destina��o de res�duos s�lidos. � um trabalho para reduzir os lix�es. Mesmo o saneamento sendo uma atribui��o direta do munic�pio, temos atuado para apoi�-los integralmente. E os resultados mostram que estamos no caminho certo.
A trag�dia de Mariana completou sete anos recentemente. Em breve, o rompimento em Brumadinho completar� quatro anos. A senhora acha que o que est� sendo feito desde ent�o, tanto pelo governo quanto pelas empresas exploradoras dos recursos, amadureceu para que isso n�o ocorra nunca mais, ou ainda corremos algum risco, caso algo n�o seja feito? Ainda sobre o tema, as indeniza��es que o estado vai receber s�o quantias enormes. O que o estado est� separando desses recursos para a conscientiza��o e avan�o da pauta ambiental?
Sempre refor�o que s�o dois epis�dios muito tristes, marcantes e que n�o podem ser esquecidos. Diante do que ocorreu, e da realidade da minera��o j� instalada, foram criadas normas mais r�gidas de controle e fiscaliza��o, com participa��o do governo estadual, do Poder Legislativo e do Minist�rio P�blico. Contudo, � preciso deixar uma situa��o bem clara: a minera��o foi desenvolvida em Minas ao longo de muitas d�cadas e de forma mais intensa a partir de meados do s�culo passado. Existem grandes estruturas que n�o podem ser revertidas no espa�o de tempo que gostar�amos. Envolvem riscos e esse trabalho precisa ser realizado da maneira mais adequada poss�vel, para evitar novos desastres. O que fizemos de imediato foi impedir a utiliza��o dessas barragens, ou seja, aquelas alteadas a montante, m�todo construtivo das barragens que se romperam. Essas estruturas n�o podem receber mais material e as empresas que n�o conseguiram cumprir os prazos de descomissionamento estipulados na lei Mar de Lama, em fun��o dessas quest�es que envolvem as estruturas, firmaram termos de compromisso, com previs�o de multa, para que o trabalho de descaracteriza��o das barragens seja feito mais breve poss�vel, dentro da t�cnica mais adequada. A Funda��o Estadual de Meio Ambiente (Feam), a Ag�ncia Nacional de Minera��o e o Minist�rio P�blico estadual acompanham de perto.
E quanto � situa��o das empresas?
Deve-se destacar que, considerando a previs�o legal, foi estabelecido o pagamento de um dano moral coletivo a essas empresas, que ser� revertido em projetos ambientais e de controle por parte do estado. As empresas tamb�m foram obrigadas a implementar um monitoramento em tempo real dessas estruturas e a investir em medidas preventivas. A Feam tamb�m faz um monitoramento pr�prio das estruturas e a cada dia tem estabelecido parceria com o MPMG para aprimorar o controle, com aux�lio inclusive de auditorias externas gerenciadas pelo MP. Sobre os recursos das indeniza��es e multas aplicadas, os investimentos j� est�o estabelecidos de acordo com as maiores necessidades. O estado tem a pauta ambiental como priorit�ria e os avan�os passam pelo planejamento. J� temos projetos para aplicar as indeniza��es pagas pelas mineradoras em a��es de fortalecimento da gest�o de barragens, moderniza��o e refor�o da fiscaliza��o ambiental, estrutura��o tecnol�gica e f�sica, regulariza��o ambiental, melhorias na gest�o de res�duos e da gest�o das �guas.
Na pen�ltima reuni�o dos conselhos estaduais de Pol�tica Ambiental e de Recursos H�dricos, que tamb�m coincidiu com o encerramento da participa��o de Minas na COP 27, algumas organiza��es n�o governamentais se retiraram dos conselhos e apresentaram os motivos em um comunicado � imprensa. O que a senhora tem a dizer sobre isso?
Minas Gerais � um dos estados onde a participa��o social � historicamente mais forte, inclusive na delibera��o de licen�as ambientais feitas em colegiado. Sempre tivemos uma postura de di�logo e escuta constante, seja nos nossos conselhos ou em outros espa�os institucionais, e reafirmamos essa postura. Sobre a representatividade do terceiro setor nos conselhos, no mandato 2016-2018, as entidades da sociedade civil do segmento de defesa do meio ambiente contavam com 30 representantes no Copam e passaram a contar com 45 no mandato 2020-2022. A amplia��o foi poss�vel em raz�o da diminui��o de vagas destinadas a entidades representativas do setor produtivo junto �s c�maras t�cnicas especializadas e �s unidades regionais colegiadas. No site da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Recursos H�dricos (Semad) consta um calend�rio com datas pr�-definidas para que as ONGs apresentem propostas de temas a serem tratados em reuni�es com os dirigentes da Semad, Feam, Instituto Estadual de Florestas (IEF) e Instituto Mineiro de Gest�o das �guas (Igam). O governo e Secretaria de Meio Ambiente est�o sempre abertos ao di�logo. Entendo que � preciso buscar, de forma democr�tica, manter o equil�brio, a transpar�ncia e a seriedade em todas as a��es ambientais realizadas em Minas Gerais. Os comit�s de bacias de Minas Gerais tamb�m s�o um espa�o institucional importante de participa��o social. S�o aproximadamente 3 mil conselheiros que t�m fun��es estrat�gicas na gest�o dos nossos rios. Temos o claro entendimento de que a constru��o da pol�tica p�blica passa pela participa��o da sociedade, seja por sugest�es de aprimoramento, seja pelo seu papel legal j� estabelecido nos conselhos e comit�s. Nesses espa�os eles s�o, inclusive, agentes p�blicos com compet�ncias e responsabilidades estabelecidas.