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Estado de Minas LETALIDADE POLICIAL

Maioria dos mortos pela pol�cia no pa�s s�o negros e jovens

Em 2022, 83% das v�timas de a��es policiais eram de pele negra e 52,9% tinham de 12 a 24 anos. Quadro mobiliza Conselho dos Direitos das Crian�as e Adolescentes


03/09/2023 04:00 - atualizado 03/09/2023 07:25
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São Paulo, Brasil - Ativistas de direitos humanos protestam em frente à Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo contra operação policial que matou 16 pessoas nas cidades de Guarujá e Santos, em 3 de agosto de 2023
Ativistas protestam em S�o Paulo contra opera��o policial que resultou em diversas mortes no Guaruj� e em Santos, no litoral (foto: NELSON ALMEIDA / AFP)
Somente nos casos de maior repercuss�o em agosto, as pol�cias brasileiras foram respons�veis por pelo menos 64 mortes, em uma onda de viol�ncia que atinge, principalmente a Bahia, um dos estados com maior letalidade policial em todo o pa�s, al�m de S�o Paulo, Rio de Janeiro, Esp�rito Santo e Mato Grosso.
Os casos recentes de mortes nessas a��es policiais acenderam alerta no governo federal e tamb�m no Conselho Nacional dos Direitos das Crian�as e Adolescentes (Conanda), j� que parte consider�vel das v�timas integra essa parcela da popula��o. Somente ano passado, 83% dos mortos no Brasil pela pol�cia eram negros e 52,9% tinham entre 12 e 24 anos.
 
Caso, por exemplo, de Guilherme Gomes da Silva, de 17 anos, morto pela PM da Bahia, em Lauro de Freitas, na Regi�o Metropolitana de Salvador, em junho passado. Ou do adolescente Thiago Menezes Flausino, de 13 anos, baleado com cinco tiros por policiais na Cidade de Deus, Zona Oeste da capital fluminense, durante opera��o no come�o de agosto. Na semana passada, os policiais foram indiciados por fraude, acusados de plantar uma arma junto ao corpo da v�tima.
 
O Conanda chegou a propor a ado��o de c�meras por todas as pol�cias e uma revis�o da forma��o profissional de agentes de seguran�a como medidas para reduzir os casos de letalidade policial. Estudo realizado pelo FBSP em parceria com o Unicef sobre os resultados de uso de c�meras por policiais em S�o Paulo, estado pioneiro nessa utiliza��o, registrou, entre 2021 e 2022, queda de 63,7% da letalidade geral no estado e de 76,2% nos batalh�es em que as c�meras passaram a ser utilizadas. Mas a ado��o dessa tecnologia para barrar a letalidade n�o � consenso entre especialistas da �rea de seguran�a.
 
Para Jacqueline Muniz, professora do Departamento de Seguran�a P�blica da Universidade Federal Fluminense (UFF), para que a c�mera no uniforme da PM produza resultados “para al�m do imediato, � preciso criar um programa de controle e desempenho da a��o policial, voltado para a redu��o da letalidade e da vitimiza��o da pol�cia”.
 
A pesquisadora do tema aponta a��es fundamentais, como a cria��o de protocolos atualizados e de conhecimento p�blico, controle do uso individual de armamento e do gasto de muni��o. Lista ainda a apresenta��o de crit�rios de desempenho apoiados nos protocolos, programa de capacita��o continuada no uso potencial e concreto de for�a, por tipo de armamento menos e mais letal, al�m de controle de stress da a��o policial e capacidade de armazenamento e registro das c�meras com certifica��o da Defensoria e Minist�rio P�blico.
 
“Sem isso, ficaremos apenas com os resultados iniciais das c�meras e depois haver� acomoda��o, pois atr�s de um equipamento que v� tem um olho que decide o que pode e o que n�o pode ser visto”, avalia. Segundo ela, esse controle � fundamental e foi adotado por outros pa�ses que tamb�m apostaram nas c�meras.

Belo Horizonte - MG. Operação da Polícia Militar de Minas Gerais no Bairro Primeiro de Maio
Viaturas em opera��o: segundo especialista, letalidade da pol�cia em Minas � baixa para o pa�s, mas alta para padr�es internacionais (foto: Ed�sio Ferreira/EM/D.A Press - 2/9/22)

Estudo mapeia a mortalidade em Minas

Em Minas Gerais, quase 1.300 pessoas perderam a vida na �ltima d�cada em decorr�ncia de interven��es policiais. Segundo estudo feito sobre seis anos de registros policiais, na maioria dos casos os agentes apontam a��o em leg�tima defesa para “repelir injusta agress�o”. Essa justificativa aparece em 86% dos boletins de ocorr�ncia em que foram registradas v�timas civis em decorr�ncia da atua��o das for�as de seguran�a, segundo levantamento do N�cleo de Estudos em Seguran�a P�blica (Nesp) da Funda��o Jo�o Pinheiro.
 
Em parceria com o Minist�rio P�blico de Minas Gerais, por meio da Centro de Apoio Operacional de Direitos Humanos (CAO-DH), pesquisadores do Nesp analisaram durante 18 meses 3.605 registros de ocorr�ncias, relativos ao per�odo de 2013 a 2018, sobre mortos e feridos em decorr�ncia de interven��es que tiveram policiais como v�timas ou autores.
 
Al�m do perfil detalhado das v�timas, o estudo aponta caracter�sticas predominantes entre elas. Na maioria dos casos (90%), as mortes foram causadas por PMs, os mortos eram homens (97%), tinham entre 12 e 29 anos (67%) e eram pretos ou pardos (68,4%).
Na maior parte das ocorr�ncias (88%), os agentes envolvidos estavam em servi�o e as mortes (73,7%) aconteceram fora de vilas e favelas, em vias p�blicas (77,9%), durante a noite ou madrugada (62%) e em a��es de rotina (55%), e n�o em opera��es especiais.
 
Para Luiz Felipe Zilli, um dos pesquisadores do Nesp, os dados indicam que as mortes causadas pela pol�cia em Minas s�o decorrentes de a��es de patrulhamento, e n�o de opera��es especiais em comunidades, como as que rotineiramente deixam mortos no Rio de Janeiro, por exemplo.

A inten��o do estudo, segundo ele, � transpor em dados a atua��o das for�as de seguran�a, para que o estado possa agir para coibir a viol�ncia policial, uma das menores em termos nacionais, mas ainda alta para par�metros internacionais.
 
O promotor que coordena o CAO-DH, Francisco Angelo, disse que esse raio-x, “quantitativo e qualitativo” da atua��o policial � importante para que tanto o MP quanto as for�as de seguran�a e o estado possam atuar para coibir a letalidade policial, assim como a vitimiza��o de policiais. “O ideal � que n�o haja mortes de nenhum lado”, destaca o promotor.
 
Para ele, essa letalidade pode cair com o uso das c�meras pela PM, projeto-piloto adotado pelo estado em janeiro deste ano e que � acompanhado pelo CAO-DH. Por�m, ele pondera que a tecnologia � importante, mas n�o milagrosa.
 
� preciso que haja investiga��o “pronta e justa” por �rg�o independente, para saber se cada morte ocorreu em decorr�ncia de confronto ou n�o. Segundo ele, respeitando a independ�ncia funcional dos promotores, o CAO-DH expediu orienta��es para apura��o dos casos de letalidade policial.
 
Essa � uma das maiores dificuldades enfrentadas para esclarecer os casos, pois, como revelam os n�meros, muitas vezes a cena do crime � alterada, os PMs envolvidos s�o recolhidos em seus batalh�es, as armas n�o s�o entregues de pronto para a per�cia e os casos n�o raro chegam ao MP tardiamente. “Esse � um dos grandes desafios”, afirma o promotor.

Pol�cia militar


O deputado estadual Sargento Rodrigues (PL), que representa a corpora��o no Legislativo mineiro desde 1999, avalia a letalidade policial, como resultado da cultura brasileira de “desrespeito � lei” e responsabiliza os “criminosos”. Para ele, a pessoa que atira contra a pol�cia n�o est� preocupada com a pena, porque sabe que no Brasil ela � branda.
 
“Ent�o, o criminoso calcula”, afirma o deputado, que defende que as penas, principalmente para crimes contra a vida, sejam “certas, c�leres e severas”. “Outra coisa � a facilidade com que criminosos adquirem armas”, destaca o parlamentar.
 
Procurada pela reportagem para comentar os dados, a PM, por meio de sua assessoria, afirmou que a corpora��o “possui uma das menores letalidades policiais entre os estados da Federa��o, conforme dados do F�rum Brasileiro de Seguran�a P�blica”. “O resultado demonstra que a��es com uso de for�a letal pela corpora��o s�o exce��es, uma vez que a institui��o mant�m um investimento cont�nuo do seu efetivo quanto ao uso diferenciado da for�a.”
Belo Horizonte - MG. Robson Sávio, presidente do Conselho Estadual de Direitos Humanos
� preciso uma mudan�a cultural nas for�as policiais, que na verdade protegem seus integrantes violentos para preservar a institui��o (foto: Jair Amaral/EM/D.A Press - 13/12/17)

Entrevista / Robson S�vio - Presidente do Conselho Estadual de Direitos Humanos

“Brasil tem uma das pol�cias mais violentas do mundo”

Integrante do F�rum Brasileiro de Seguran�a P�blica e presidente do Conselho Estadual de Direitos Humanos, Robson S�vio, professor universit�rio, afirma que o Brasil tem uma das “pol�cias mais violentas e de maior letalidade do mundo”. Problema grave, destaca, que pode ser comparado a uma “verdadeira pol�tica de exterm�nio” da popula��o jovem, negra e perif�rica, principal v�tima das a��es policiais no Brasil. Nesta entrevista ao Estado de Minas, ele aponta caminhos e cobra responsabilidade das institui��es p�blicas e uma mudan�a cultural da sociedade e das pr�prias for�as de seguran�a para combater o problema crescente s� cresce no pa�s, segundo ele sob a omiss�o dos governos, que n�o criam mecanismos de controle, do Minist�rio P�blico, do Judici�rio e do Legislativo.

Como combater a letalidade policial no Brasil?

� uma bobagem dizer que oferecer cursos de direitos humanos ou treinamento ser� suficiente para resolver o problema. Eles s�o necess�rios, mas n�o suficientes. � preciso uma mudan�a cultural nas for�as policiais, que na verdade protegem seus integrantes violentos para preservar a institui��o. � necess�rio mudar tamb�m a sociedade, que n�o somente aplaude, mas na maioria das vezes ratifica a letalidade policial. S�o necess�rios mecanismos de controle externo eficientes. O Minist�rio P�blico n�o controla as pol�cias, n�o obstante a Constitui��o Federal determinar, e o Poder Judici�rio � conivente com todas as arbitrariedades policiais, tornando os processos morosos e sem senten�a e puni��o definitiva.

O senhor avalia que h� uma sequ�ncia de omiss�es?

H� uma rede e uma estrutura que na verdade ratificam a viol�ncia e a letalidade policial, desde a omiss�o dos �rg�os de controle, a coniv�ncia no Judici�rio, passando por uma cultura social que � vingativa e de viol�ncia e que aplaude esse tipo de a��o arbitr�ria. Al�m das pr�prias institui��es policiais, que protegem mais o patrim�nio de quem tem renda, lucro e dinheiro, e a classe m�dia, que tem alto poder de vocaliza��o, do que na verdade prov�m seguran�a. H� tamb�m uma omiss�o do Poder Legislativo, cada vez mais povoado por representa��es truculentas, sejam de policiais ou de pessoas que gostam desse modelo violento e letal.

Como avaliar dados que apontam a morte sistem�tica pelas pol�cias de jovens negros, maior parte das v�timas, segundo as estat�sticas?

� uma a��o totalmente discricion�ria dos agentes policiais em rela��o �queles que s�o caracterizados como indesej�veis por parte de segmentos da popula��o brasileira – pretos, pobres, jovens e das favelas, esse � o p�blico que � v�tima. Obviamente, h� toda uma campanha de criminaliza��o dessas pessoas, como na ideia de que somente essas pessoas s�o usu�rias e os traficantes de droga, quando sabemos, por pesquisas do F�rum Brasileiro de Seguran�a P�blica, que 80% dos jovens apreendidos por tr�fico de drogas s�o pequenos traficantes e pequenos usu�rios.

Por que o senhor considera que isso ocorre?

A pol�tica de guerras �s drogas protege primeiro os grandes produtores, os grandes distribuidores, que s�o empres�rios, gente que tem dinheiro. Eles t�m a prote��o do aparato do Estado nos poderes Executivo, Legislativo e Judici�rio, que s�o corrompidos e coniventes com esse sistema de produ��o e distribui��o, sempre conectado com outros crimes, como tr�fico de armas e de pessoas, lavagem de dinheniro, corrup��o ativa e passiva. � uma rede que protege os grandes tubar�es e prende os lambaris magrinhos. 


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