Constru��o na Regi�o Norte de BH veio abaixo em setembro de 2022, quando estrutura de cinco andares com hist�rico de problemas ruiu. Moradora que j� ocupava o im�vel morreu (foto: Jair Amaral/EM/D.A Press - 21/9/2022)
O desabamento de um pr�dio, supostamente constru�do em cima da estrutura de uma casa, no Bairro Planalto, Regi�o Norte de Belo Horizonte, completa um ano nesta quinta-feira (21/9) sem que as causas do colapso, que matou uma pessoa, tenham sido esclarecidas. Apesar de estar regular na data do acidente, a obra j� havia sido embargada e o engenheiro respons�vel chegou a ser autuado pelo Conselho Regional de Engenharia e Agronomia de Minas Gerais (Crea-MG) por irregularidades na constru��o, um ano antes. Problemas que, pelo menos a julgar pelos dados oficiais da fiscaliza��o municipal, t�m aumentando consideravelmente na capital. No caso do Planalto, a per�cia da Pol�cia Civil ainda n�o foi conclu�da e n�o h� previs�o para o t�rmino das an�lises.
Desastres como esse levantam a discuss�o sobre um desafio cr�nico: a efic�cia da fiscaliza��o e o risco de obras cujos respons�veis ignoram a legisla��o ou medidas de seguran�a. Apenas neste ano, mais de 3 mil constru��es foram alvo de autua��o em Belo Horizonte por irregularidades, volume quase 10% superior ao registrado no ano passado, segundo dados informados ao Estado de Minas pela prefeitura da capital.
Escombros ca�ram sobre casa ao lado, que teve estrutura comprometida e foi condenada. Hoje, s� resta o terreno (foto: Ed�sio Ferreira/EM/D.a Press)
De janeiro a setembro deste ano, o Executivo municipal fiscalizou 3.834 obras, entre interven��es em im�veis, lotes e vias p�blicas. As autua��es representam impressionantes 84,8% desse total, e somam 3.252 registros. Mas apenas 314 constru��es foram interditadas temporariamente. Outras 2.136 foram notificadas e 802, multadas. No ano passado, foram 2.976 atua��es, o que aponta um crescimento de 9,2% no comparativo com 2023.
Questionada pela reportagem, a prefeitura n�o detalhou a quantidade de vistorias e autua��es em im�veis privados, residenciais ou comerciais. Apesar do aumento do n�mero de puni��es este ano e do alt�ssimo percentual de irregularidades, especialistas e moradores ouvidos pelo Estado de Minas apontam falhas na fiscaliza��o e cobram monitoramento constante do poder p�blico para prevenir a multiplica��o de desastres como o que terminou em morte no Bairro Planalto.
Apesar de ter alvar� de constru��o v�lido at� 2025, a constru��o que desabou h� um ano na Rua Professor Gentil Sales, esquina com Rua Newton Pereira, entrou em colapso matando Lourdes Pereira Leite, aos 73 anos. O marido dela, ent�o com 75, e as filhas do casal, uma de 45 e uma de 40, foram socorridos com vida.
A constru��o era um sonho do propriet�rio, que almejava deixar o im�vel como fonte de renda para a filha mais nova, que tem s�ndrome de Down. Al�m da garagem, o edif�cio tinha quatro andares com apartamentos e estava em fase final de acabamento. Uma fam�lia morava no andar t�rreo, mas, felizmente, n�o estava em casa no momento do acidente.
Vizinha dos im�veis atingidos, Ilma Pereira cobra mais aten��o ao setor: %u201CPor que deixam as coisas acontecerem para depois fiscalizar?%u201D (foto: Ed�sio Ferreira/EM/D.a Press)
O pesadelo dos vizinhos
O pr�dio do Bairro Planalto desabou sobre uma casa ao lado, cujos moradores, marido, mulher e filho, estavam viajando na �poca. Eles ficaram sabendo do desabamento por meio de liga��es dos vizinhos. Os escombros da constru��o permaneceram no local por meses. Com isso, o im�vel, que poderia ter sido recuperado, foi condenado pela Defesa Civil e precisou ser demolido.
Desde setembro, a vida da fam�lia virou um transtorno. Um m�s ap�s a trag�dia, o im�vel foi invadido. Os ladr�es arrombaram o port�o duas vezes e levaram lustres da casa. Hoje, a fam�lia mora de aluguel no mesmo bairro, e aguarda os desdobramentos do caso. “Constru�mos com muito sacrif�cio, trabalhando a vida inteira. Quando tivemos a moradia pronta, aconteceu isso”, relatou a moradora Sueli Abreu Cunha � reportagem do Estado de Minas.
Outro im�vel tamb�m foi atingido e teve que ser parcialmente interditado. No local, funcionava um sal�o de beleza, que paralisou as atividades at� a regulariza��o dos danos na estrutura.
A casa de Ilma Cristina Pereira, de 57 anos, vizinha da que foi condenada e demolida, n�o chegou a ser atingida, mas ainda tem rachaduras nos muros pelo impacto do desabamento. O im�vel foi vistoriado pela Defesa Civil, que assegurou n�o haver riscos estruturais.
Ainda assim, ficou o susto. “� uma tristeza. Foi muita press�o psicol�gica”, conta Ilma. Os vizinhos, segundo ela, j� haviam denunciado a obra, que durante anos foi tocada sem supervis�o de profissional capacitado. Hoje, ela cobra maior atua��o da prefeitura e de entidades respons�veis pela fiscaliza��o do setor.
“Deveria haver mais fiscaliza��o nas obras. Um erro em uma constru��o pode custar a vida de pessoas. O desabamento quase acertou minha casa. Por que deixam as coisas acontecer para depois fiscalizar?”, questiona.
Procurada pela reportagem do Estado de Minas para se posicionar sobre a investiga��o das causas do desabamento no Planalto, a Pol�cia Civil de Minas informou, em nota, que, “devido � complexidade do caso, o inqu�rito policial ainda est� em andamento. Em momento oportuno, outras informa��es ser�o divulgadas”.
(foto: Fabi Ara�jo/Divulgacao)
"� um risco que o construtor assume ao n�o contratar um profissional formado para a realiza��o do projeto e execu��o da obra"
Clemenceau Chiabi Presidente do Instituto Brasileiro de Avalia��es e Per�cias de Engenharia
Hist�rico de irregularidades
A constru��o do pr�dio que ruiu no Bairro Planalto havia sido embargada em 2016, dois anos ap�s o in�cio das obras, por irregularidades no licenciamento urban�stico, laudo que � aprovado ap�s a aferi��o da edifica��o quanto aos par�metros de ocupa��o do terreno previstos no Plano Diretor. Os trabalhos no im�vel permaneceram paralisados at� 2021, quando a situa��o foi regularizada, de acordo com a prefeitura.
A obra em si estava regular, com alvar� de constru��o v�lido at� 2025, mas a presen�a de moradores no im�vel, ainda em obras e sem libera��o municipal para ocupa��o, n�o deveria ocorrer. A edifica��o n�o tinha certid�o de baixa de constru��o, documento popularmente conhecido como “Habite-se”. Al�m disso, em 2021, o respons�vel t�cnico pelo andamento da constru��o tamb�m foi autuado pelo Crea-MG pela falta de identifica��o em rela��o ao servi�o em execu��o, j� que a placa de obra dispon�vel na edifica��o indicava outro profissional.
Fiscaliza��o e informalidade
O desabamento que custou uma vida, al�m de preju�zos e transtornos a vizinhos, exp�e a fragilidade da fiscaliza��o e o desrespeito a exig�ncias de seguran�a. Na avalia��o de especialistas, a capacidade de vistoria atual � reduzida, seja por um efetivo insuficiente ou por projetos que n�o avan�am.
“N�s j� tivemos v�rios acidentes do tipo em Belo Horizonte. Falta de acompanhamento e fiscaliza��es podem multiplicar trag�dias como essa. Temos uma s�rie de programas ligados a riscos sanit�rios, geol�gicos, mas n�o vemos essas coisas sendo implementadas de fato”, afirma Roberto Monte-M�r, pesquisador do Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional (Cedeplar) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
Uma sa�da vi�vel, para o especialista, seria o investimento em educa��o. “Para ampliar a capacidade de rea��o da popula��o frente a situa��es de crise, � necess�rio movimento de esclarecimento, de capacita��o. N�o podemos, diante da situa��o brasileira, jogar tudo nas costas do Estado. � preciso que haja envolvimento das empresas e da sociedade civil”, avalia.
O cen�rio reflete ainda outro problema cr�nico: a falta de investimento em pol�ticas de habita��o. Conforme o presidente do Instituto Brasileiro de Avalia��es e Per�cias de Engenharia (Ibape), Clemenceau Chiabi, mesmo sendo planejada, Belo Horizonte tem um grande volume de edifica��es que integram a chamada “cidade informal”.
O termo, explica, � usado para se referir ao conjunto de constru��es erguidas sem obedecer a regras ou sem as devidas autoriza��es. “A pessoa entra no lote e come�a a construir por conta pr�pria. Nesses casos, � um risco que o construtor assume ao n�o contratar um profissional formado para a realiza��o do projeto e execu��o da obra”, disse, em entrevista ao Estado de Minas.
A preocupa��o em n�meros
O saldo das fiscaliza��es em obras de BH em 2023