
"Normalmente, ele � algu�m muito calmo, mas pude perceber em sua voz que havia algo errado", contou Aline Gilet-Caub�re em entrevista � AFP.
O t�cnico anunciou que o pessoal do turno da noite n�o tinha mais acesso aos computadores, nos quais aparecia uma mensagem informando que os sistemas do hospital haviam sido hackeados e criptografados.
Os atacantes fizeram um pedido cl�ssico: forneceriam uma chave para reverter o dano, mediante pagamento em Bitcoin, e enviariam endere�os de e-mail para organizar a transfer�ncia.
"Pens�vamos que, como hospital, �ramos um santu�rio, por causa da nossa miss�o, que ningu�m ousaria [nos atacar]", explicou Gilet-Caub�re.
Os diretores, que decidiram n�o pagar - as administra��es francesas s�o instru�das a n�o pagar resgates - n�o tiveram escolha a n�o ser retornar ao funcionamento manual da era anterior.
Em meio � crise sanit�ria da covid-19, os registros em papel reapareceram. Os m�dicos voltaram a pegar canetas e fazer anota��es.
N�o havia sistema de telefone, ou e-mail. Os dados da folha de pagamento e dos fornecedores foram perdidos. Todas as cerca de 110-120 diferentes plataformas inform�ticas em opera��o no hospital ficaram fora de servi�o.
Mais de tr�s meses depois, as instala��es ainda n�o voltaram ao funcionamento normal, apesar dos esfor�os dos t�cnicos.
"N�o podemos dizer quando isso vai acabar. Com o passar do tempo, outros problemas surgem", disse Gilet-Caub�re.
"Crise dentro da crise"
Os 2.200 funcion�rios do hospital de Dax n�o foram, por�m, os �nicos que tiveram de enfrentar uma emerg�ncia nos �ltimos 18 meses.
Somente na Fran�a, pelo menos meia d�zia de hospitais foram alvo de ataques cibern�ticos desde o surgimento da pandemia, no in�cio de 2020.
Para Cyrille Politi, consultor em tecnologia da Federa��o Francesa de Hospitais, os "hackers" intensificaram os ataques e ultrapassaram a linha moral que tornava os hospitais p�blicos praticamente proibidos.
"� uma verdadeira mudan�a de paradigma", disse � AFP.
De acordo com o ministro franc�s de Assuntos Digitais, C�dric O, 27 hospitais sofreram algum tipo de ataque cibern�tico no ano passado, e houve uma m�dia de um por semana nos primeiros dois meses de 2021.
Em fevereiro, diante do crescente alarme, o presidente Emmanuel Macron anunciou uma verba adicional de 1 bilh�o de euros (US$ 1,2 bilh�o) para a seguran�a cibern�tica no setor da sa�de, chamando a onda de ataques em meio a uma pandemia de "crise dentro da crise".
Impunidade
Embora n�o sejam comuns na Fran�a, os ataques a hospitais t�m sido uma caracter�stica comum do cibercrime global h� anos, especialmente nos Estados Unidos.
"O que esses 'hackers' geralmente procuram s�o alvos com um imperativo operacional", segundo Adam Meyers, da empresa americana de seguran�a cibern�tica CrowdStrike.
"Eles visam a sa�de, porque � um dos setores em que n�o � uma decis�o de dinheiro, � uma decis�o de vida, ou morte".
Tamb�m nos Estados Unidos, a pandemia tem sido vista como uma oportunidade de neg�cios por alguns piratas.
Depois de dezenas de ataques no final de 2020, o FBI (a Pol�cia Federal americana) e as autoridades alertaram a respeito de "informa��es confi�veis sobre uma amea�a crescente e iminente de crime cibern�tico" contra hospitais e prestadores de cuidados de sa�de.
A m� not�cia para os hospitais e outros alvos em potencial � que os ataques desse tipo est�o se tornando mais sofisticados e numerosos.
Tudo - de informa��es sobre vulnerabilidades de computadores de organiza��es a tecnologia de "hacking" e criptografia - est� � venda on-line em f�runs criminosos fechados.
Gangues com nomes como Evil Corp, ou DarkSide, operam fora do alcance das for�as de seguran�a ocidentais na R�ssia, ou nas ex-rep�blicas sovi�ticas, dizem as empresas de seguran�a cibern�tica.
Os "hackers" do hospital de Dax usaram um "malware" chamado Ryak. Segundo seu diretor de inform�tica, Gilbert Martin, os criminosos deixaram "pegadas russas".
"Os envolvidos neste setor multibilion�rio operam com impunidade quase total", comentou Brett Callow, da empresa de prote��o contra crimes cibern�ticos Emsisoft, em conversa com a AFP.
Para o radiologista Nicolas Pontier, do hospital de Dax, a experi�ncia de n�o ser capaz de tratar seus pacientes com c�ncer foi um alerta que ele espera que outros levem em considera��o.
"Nunca imaginei que teria que parar por dois meses", disse ele. "Pensei que seria consertado em uma, ou duas, semanas. Ainda n�o temos um sistema totalmente funcional", completou.